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História O destino de Kelsey - Fanfic - Olhos azul cobalto


Escrita por: RafaelaAzv

Notas do Autor


Feliz 2017, tenha uma boa leitura nesse capítulo ENORME!

Capítulo 5 - Olhos azul cobalto


Fanfic / Fanfiction O destino de Kelsey - Fanfic - Olhos azul cobalto

Aconteceu novamente, enquanto eu estava tomando banho na manhã seguinte.

Levantei da cama e caminhei direto para o chuveiro a fim de lavar o suor que cobriu o meu corpo durante a madrugada inquieta. Os pesadelos confusos não me deram trégua naquela noite, tanto que mal pude dormir duas horas sem acordar ofegante e me segurando para não gritar e acabar alarmando os outros na casa.

Não pude fazer nada enquanto observava a água do chuveiro escorrer para o ralo, e senti o clarão branco começando a envolver gradativamente a minha visão. À distância, ouvi meus joelhos bateram no chão. Mas não senti nada, a não ser aquela corda invisível insistindo em puxar a minha consciência para outro lugar.

Porém, dessa vez, eu não tive que ver a imagem assombrosa de um homem sendo torturado por outro.

Não. Dessa vez eu assisti à um espetáculo de circo.

No sonho, o circo estava com as arquibancadas lotadas, mas uma névoa branca impedia que eu vislumbasse mais do que a cabeça e a silhueta das pessoas sentadas na minha frente e de costas para mim. Ousei me virar para o assento ao lado do meu e vi um garoto de rosto jovial com cabelos e olhos castanhos sentado ali. Ele olhava excitado para algo acontecendo lá embaixo, então desviei minha atenção naquela direção e peguei o momento em que um homem, que parecia ser o apresentador do circo, cutucava um enorme tigre branco para o lado de fora de sua jaula.

O tigre parou no centro do espaço e voltou seus olhos para o apresentador, esperando calmamente uma ordem.Segurei nos braços da cadeira e me inclinei para frente, absorvendo cada detalhe do show.

O som do chicote estalava por perto, mas nunca o atingia, e o domador que brandia o chicote conduziu o tigre em vários números complexos, e foi aplaudido animadamente pela multidão, e por mim.

A fera impressionante pulava, saltava e girava em banquetas com uma facilidade surpreendente apesar do grande tamanho. Prendi a respiração quando ele teve que atravessar um arco incendiado, com medo de que queimasse o pêlo. Depois ficava de pé apenas com as patas traseiras e realizava saltos incríveis.

O tigre com certeza era bem treinado, pois só precisava de pequenos avisos para fazer os truques e os malabarismos que o domador queria. Fiquei apreensiva quando ele colocou a cabeça na boca do tigre, mas passou quando ele saiu de lá são e salvo, e encaminhou o tigre devolta para a sua jaula, anunciando o fim do número, recebendo mais aplausos.

Analisei o tigre mais atentamente, desejando que aquela névoa sumisse para que eu pudesse vê-lo melhor. E de repente, como se atendesse ao meu pedido, uma brisa fez com que a névoa fosse varrida do centro do circo, me dando uma visão total dele. Tive um vislumbre dos olhos do tigre quando estes se dirigiram aos meus, antes de se desviarem, e meu coração pareceu parar de bater.

Aquela mesma brisa me trouxe um bilhete, que peguei no ar para ler:

O PARQUE DE EXPOSIÇÕES DO CONDADO DE POLK
DÁ AS BOAS-VINDAS AO CIRCO MAURIZIO
APRESENTANDO
OS ACROBATAS MAURIZIO E O FAMOSO DHIREN!

Quando a apresentação chegou ao fim, observei o tigre branco subir a rampa e voltar para dentro. Manti meus olhos nele até que ele desaparecesse em meio à névoa e eu fosse levada devolta para o meu corpo no chuveiro.

Arquejei respirando fundo várias vezes, e após alguns minutos, por fim consegui me recompor o suficiente para desligar e sair do chuveiro. Me enrolei em um robe e sentei na beira da cama.

- O que foi isso? - sussurrei para mim mesma e repassei toda a visão em minha cabeça.

Assustada, percebi que a visão se esvaia aos poucos, então corri para a cômoda pegando o caderno e a caneta que eu havia visto ali para tentar anotar o máximo de informações antes que estas sumissem. Passei as páginas riscadas procurando uma em branco, e quando voltei para o início sem achar nenhuma, eu reconheci aquele caderno.

- Meu diário. - repassei as folhas procurando a data rapidamente, até que abri ele na metade e vi o que eu desenhara há dois anos atrás.

O desenho foi feito basicamente à lápis e sombreado com carvão, como eu havia aprendido durante a adolescência. Não era um desenho perfeito, mas reconheci o tigre da minha visão por causa das listras em seu rosto e o formato arredondado de seus olhos.

Aqueles olhos... o tigre...

Ele era o famoso Dhiren!

Sorri quando enfim consegui entender alguma coisa daquela loucura toda, e enquanto tentava encaixar todas as peças, me perguntei se aquela visão não teria sido algum vislumbre do passado. Aquilo estava me ajudando a me lembrar, mas o que realmente era aquilo? Quem estava me mandando aquelas visões?

Olhei para o desenho. Fui eu quem fiz aquilo, então aquelas visões eram reias. Peguei a caneta e rabisquei na parte branca da folha:

Olhos azuis cobalto. Circo Maurizio. 17/18 anos.

Decidi mostrar o desenho à Ren, mais tarde. E se ele confirmasse que aquele tigre era ele, então... Então o que? Se eu contasse sobre as minhas visões para ele, tanto Ren quanto Kishan, poderiam ter falsas esperanças de que minha a memória estava voltando, o que não era o caso, já que eu apenas via vislumbres do passado, mas nada concreto. E ainda por cima sofria com os pesadelos noturnos que perturbavam a minha mente. Eu poderia esconder essa parte, claro, mas teria que descrever as partes perturbadoras sobre tortura que eu passo a maior parte da noite tentando não pensar.

Respirei fundo e fechei meu diário quando ouvi uma batida suave na porta e a voz de Nilima entrou no quarto

- Senhorita Kelsey? - ergui meus olhos para ela e vi que já estava arrumada para sair.- Eu estou indo para o trabalho agora, mas o café da manhã está na mesa.

- Tudo bem. Já estou indo, Nilima. - respondi calmamente, guardando meu diário na gaveta.

Nilima acompanhou meus movimentos com os olhos mas não disse nada sobre o diário. Ela veio até a mim e me deu um pequeno abraço que retribui.

- Se acontecer alguma coisa, é só me ligar. - ela me soltou e me entregou um celular. - Meu número está aí, e estarei disponível para atender sempre.

- O que pode acontecer? - perguntei preocupada, fazendo Nilima sorrir.

- Oh, nada de mais vai acontecer. Isso é apenas para se você quiser ter alguém que não seja os irmãos Rajaram para conversar durante o dia. O que eu acho que não vai acontecer, pois eles adoram a sua companhia e creio que não pretendem deixá-la sozinha. A não ser que você mande eles a deixarem em paz. - Nilima sorriu, conspiradora, e eu dei uma risadinha nervosa.

- Se falar comigo a fizer se sentir melhor com tudo isso, pode ficar à vontade e me ligar o dia todo, ficarei feliz em atender.

- Quando você volta do trabalho?

- Eu geralmente tento voltar antes das 18 horas. Mas há tanto serviço que só consigo sair depois das 19 horas.

Olhei para o relógio na cômoda. Eram 7 da manhã.

- Mas isso é muito tempo. - eu disse, impressionada. - Nilima, você trabalha demais. Deveria sair mais cedo e descansar um pouco.

- Depois que o vovô morreu, eu tenho muito mais trabalho agora do que antes. - Nilima sorriu docemente. - Mas não se preocupe comigo, estou acostumada a trabalhar duro. É você quem deveria descansar depois de passar por todos aqueles desafios e demônios.

Me lembrei dos pesadelos que tive de noite e estremeci pensando que seria atacada por outra visão. Mas esta não veio. Nilima interpretou a minha reação como medo de ficar aqui sem ela.


O que eu admito: era mais ou menos verdade. Só de pensar em ficar sozinha nesta casa com dois homens indianos lindos de morrer e charmosos até em movimentos insignificantes, já me deixava nervosa e com as mãos suadas.

- Os meninos vão cuidar de você, Srta Kelsey. Não se preocupe, Ren e Kishan nunca fariam mal à você. Eles te amam... - disse Nilima diminuindo a voz nessa última afirmação e parecendo envergonhada quando percebeu o que disse.

Corei e assenti, desviando o olhar para minha cômoda, como se pudesse ver o anel de Kishan dentro da gaveta. Eles me amam.

Pensei que seria fácil eu vir a amá-los novamente. Eles eram lindos, elegantes, e me fascinavam com suas palavras. Porém, eu teria que ir com calma nisso, pois eles estavam querendo algo de mim que eu não podia dar. Não ainda.

- Bem, tenha um bom dia no trabalho. - respondi por fim encerrando o assunto.

- Me ligue se precisar. - lembrou Nilima, e olhou com preocupação para o meu rosto antes de sair.

Escutei os passos dela se afastando e desmoronei na cadeira da penteadeira. Fiz uma trança apertada nos cabelos e a amarrei com uma fita azul de uma grande e linda caixa de fitas.

Entrei no closet procurando algo para vestir e dei de cara com as roupas que eu não tinha visto ontem. Vestidos. Vestidos de seda indianos com saias longas e um minúsculo top para cobrir a parte de cima.

Passei a mão por eles, sentindo a textura fina e macia.

Um deles me chamou a atenção mais do que os outros: ele era azul-marinho e bordado com detalhes em prata e pérola ao longo da borda da saia longa, e o top brilhava com as pérolas e os fios de prata entrelaçadas no decote e nas mangas.

Peguei ele em meus braços e por um momento fiquei tentada a vesti-lo só para girar e ver o efeito daquela saia. Mas me lembrei de que Kishan havia dito que iríamos lutar wushu hoje, então coloquei o vestido devolta no lugar, planejando usá-lo numa outra ocasião.

Me vesti com uma simples camisa, jeans e tênis novamente. Olhei-me no espelho e suspirei quando vi que estava com olheiras embaixo dos olhos. Eu tinha a aparência cansada de quem não dorme há dias. Imaginei se não foi por isso que Nilima havia me olhado daquele jeito. Deixei o espelho de lado com um último suspiro e sai do quarto.

Encontrei Ren e Kishan à minha espera na cozinha. A primeira coisa que Ren percebeu, foi a fita na minha trança. Pigarreei e tentei ao máximo disfarçar o meu nervosismo.

- O que temos para o café? - eu disse como bom dia, peguei um prato e me sentei ao lado de Kishan.

- Tudo o que Nilima comprou. - respondeu Ren, indicando com a mão os pães, sucos, as frutas e os biscoitinhos recheados distribuídos pela mesa.

Optei por uma fatia pão doce e um copo de suco de manga, sabendo que mesmo aquele café da manhã leve pesaria no meu estômago.

Ao meu lado, Kishan também pegou as mesmas coisas que eu, mas em quantidade maior.

Ele devorava tudo com paixão e sorri quando ele se serviu de suco pela terceira vez. Ren encheu seu prato de biscoitos da mesma altura que o de Kishan, e comeu com o mesmo intusiasmo. Pelo menos na hora da refeição os irmãos Rajaram eram idênticos. Eles saboreavam de tudo um pouco e fiquei impressionada com a fome colossal deles. Fome de tigre.

Dei uma risadinha fazendo eles me olharem confusos. Ri denovo.

- Dormiu bem esta noite, bilauta? - perguntou Kishan, enquanto passava manteiga no pão.

Dei uma mordida na minha fatia antes de responder sinceramente:

- Na verdade não. Fiquei rolando na cama por um tempo. Mas estou ansiosa para praticar wushu hoje.

Kishan me olhou, e percebendo minhas olheiras, largou o pão.

- Se você estiver muito cansada, acho que...

- Tudo bem, não estou cansada. Eu apenas estranhei o quarto essa noite. Parecia muito grande e vazio.

E isso era verdade. Quando fui dormir pensando em Kishan naquela noite, tive uma leve impressão de que ele deveria ter ficado ali e dormido comigo. Mas aquilo era loucura, e me assustei por ter imaginado que ele dormia na mesma cama que eu. Mesmo sendo meu noivo.

Olhei para Kishan.

- Hã, Kishan? - perguntei hesitante. - Nós... dormíamos juntos? Você sabe... antes de eu perder as memórias?

Corei até à raiz dos cabelos quando ele ergueu a cabeça e fez contato visual comigo, dando um sorriso lento.

- Sim, as vezes nós dividíamos um quarto. - ele respondeu e bebeu do seu suco enquanto me observava.

Aquilo não respondia à pergunta que eu realmente queria fazer. Então tentei ser mais clara.

- Como assim, dividíamos? Nós não dormíamos na mesma cama? Como um casal?

Ouvi um som de risada abafada vindo do outro lado da mesa, onde Ren estava sentado na minha frente. Mas continuei a olhar Kishan.

Ele pareceu entender o que eu queria saber, por que respondeu:

- A noite eu dormia como tigre no chão ao lado da cama, e de manhã simplesmente deitava como homem em sua cama, esperando você acordar. - seus olhos dourados brilharam como ouro reluzente. - Isso foi quando estávamos no iate e você tinha uma suíte lá.

- E quando estávamos viajando para encontrar as oferendas?

- Nesse caso nós acampamos e usamos o Lenço Divino para criar uma barraca e sacos de dormir.

- Que interessante, essas oferendas são uma mão na roda. - olhei de Kishan para Ren. - Onde você dormia?

Ren deu uma grande mordida numa maçã e me fitou enquanto mastigava calmamente. Esperei até que ele engolisse.

- Eu dormia com você também.

Inspirei forte e engasguei quando o suco que estava bebendo desviou seu caminho para minha laringe, comecei a tossir descontrolada e senti umas batidinhas suaves nas costas, vindas de Kishan.

- O quê? - perguntei rouca, tossindo mais uma vez. - Dormíamos os três todos juntos?

Ren franziu a testa para mim.

- Você nem sempre foi noiva de Kishan. - disse ele, com raiva que eu sabia que não era dirigida à mim.

- Antes de ele aparecer, você dormia comigo e me usava como um travesseiro quente quando eu estava na forma de tigre.

Ergui as sobrancelhas para o ciúmes na sua voz e ele deu de ombros.

- São palavras suas. Desde o começo, quando éramos apenas nós dois, dormi ao seu lado para aquecê-la e para que você não sentisse medo na selva a noite. - lançou um olhar rápido para Kishan. - E quando acampávamos dormíamos todos juntos para proteção mútua. - ele sorriu. - E porque você sempre gostou de ter um tigre que ronronava por perto quando ia dormir.

Senti os batimentos aumentarem.

- Mas tigres não ronronam. - gaguejei. - São grandes demais para isso, eu li em um site na Internet.

- Posso garantir que eles ronronam, sim. - disse Ren, baixo e grave, me lançando um sorriso luminoso. Mordi a boca e desviei o olhar corando.

- Se você diz...

Quando Kishan estava na sua sexta fatia de pão, olhei para cima e vi que Ren estava me observando.

- Você não vai comer? - perguntou ele, olhando para a minha fatia de pão pela metade.

Parei com o copo de suco que eu estava girando e o pousei na mesa.

- Não estou com muita fome. - olhei Kishan de soslaio. - Kishan pode comer por mim.

Ele apontou meu pão e depois para mim.

- Coma, senão não terá força suficiente para lutar hoje e teremos que adiar. - disse ele, sério.

Depois disso, me obriguei a comer o pão e beber todo o suco. Quando terminamos de comer, guardamos as coisas nos armários e deixamos a louça na pia.

- Quem cair mais vezes lava os pratos. - falei e os garotos sorriram enquanto nos dirigíamos à sala de treinamento lá embaixo.

- Então Ren pode ir começando com os copos. - Kishan provocou, alegremente.

- Tudo bem, eu ajeito eles para que você os lave, Kishan. - Ren replicou. Estavam um de cada lado meu.

- Se acalmem, tem muita louça para dividirem. - cantarolei e sai na frente, entrando no estúdio cheio de armas antigas.

- Cuidado, Kells. - avisou Kishan, rindo e me entregando uma muda de roupas apropriadas para praticar wushu. - Você pode ser a primeira a cair.

- Não conte com isso. - ergui o queixo e arranquei as roupas de mão dele.

Ouvi os irmãos rirem divertidos, virei as costas para eles e entrei no vestiário para tirar os tênis e o jeans. Vesti a calça de pano folgada, uma camiseta apertada e as sapatilhas.

Quando sai, Ren e Kishan já haviam trocado a roupa normal para uma parecida com a minha. A camiseta igualmente apertada destacava a boa forma física de ambos os irmãos.

Os encarei de boca aberta enquanto eles conversavam em híndi.

- O que vocês estão falando aí? Não gosto quando fazem isso, parece que estão escondendo segredos ou falando de mim pelas costas. - falei com irritação, para tentar disfarçar o meu olhar deslumbrado para seus corpos musculosos e esguios.

Eles pararam imediatamente e se voltaram para mim.

- Estamos conversando sobre como deveríamos começar com você. - disse Kishan, parecendo agoniado pela minha raiva. - Vamos iniciar com o aquecimento padrão e depois Ren e eu vamos lutar para você se familiarizar com os movimentos.

- Ah tudo bem, mas conversem em inglês, por favor. - falei arrependida de ter sido impaciente com eles. - Me deixa nervosa não saber o que vocês estão falando.

- Desculpe, Kells. - disse Ren.

- Não desejamos que fique desconfortável. - Kishan adicionou.

Sorri de leve.

- Obrigada. Bem, podemos começar então?

Eles concordaram e fomos para o tatame que ocupava a maior parte do chão do estúdio de artes marciais.

Fizemos aquecimento e alongamento dos músculos, flexibilidade e velocidade. Fiquei admirada com a minha imprevista habilidade em copiar os movimentos dos irmãos com facilidade.

Eles indicavam os movimentos e me observavam admirados enquanto eu os recriava perfeitamente bem. Era como se eu sempre treinasse com eles. Mas isso não fez com que nenhuma memória surgisse e tentei não parecer triste enquanto encostava os dedos das mãos nos dos pés, alongando todos os músculos das costas e das pernas, sentindo apenas uma pequena ardência nos músculos já acostumados.

Após a rodada de alongamentos, arranjei um cantinho distante, com visão privilegiada de cima de uma mesa e observei os irmãos ficaram um de frente para o outro e começarem a luta.

Eles iniciaram andando em círculos, e eu achei aquilo familiar. Se encararam e Ren fez o primeiro movimento, se aproximou de Kishan girando e lançando um soco. Kishan se desviou rápido e usou o impulso para dar um chute circular, para afastar Ren e se aproximar dele pela lateral.

Sem espaço para se mover, Ren recebeu o chute poderoso de Kishan com o antebraço, se desequilibrando levemente até mudar o peso de uma perna para outra e sair da direção do soco que Kishan desferiu contra seu peito. Afastados mais uma vez, Kishan se deslocou para a esquerda, obrigando Ren a se mover para a direita e desviar outro chute de Kishan. Voltando ao seu centro, Ren se lançou veloz para Kishan e deu uma rasteira por trás dos joelhos dele, mas Kishan simplesmente pulou e desviou do chute que Ren dava.

Como se já soubesse todos os movimentos do irmão. Irritado por não conseguir acertá-lo, Ren aplicou uma série de socos elaborados, e vi que Kishan nem fazia força para bloquear, apenas desviava e usava a própria força de Ren para fazê-lo perder o equilíbrio.

- O que foi irmão? - perguntou Kishan. - Está se sentindo cansado?

Ren desferiu-lhe um soco circular, que atingiu Kishan com força na cara.

- Estou apenas me aquecendo. - ele sorriu.

E foi aí que começaram a lutar de verdade.

Os irmãos realizavam manobras elaboradas que vi apenas em filmes de kung fu e karatê do tipo Jackie Chan e Bruce Lee para acertar um ao outro. Atacavam com golpes clássicos que eram dignos de mestres de artes marciais muito antigos. Ren agarrou o pé de Kishan e girou para derrubá-lo. Kishan se apoiou no ombro de Ren, e usou a mão que segurava seu pé, para dar impulso e se jogar nos ombros de Ren. Os dois foram ao chão, com Ren por baixo.

- A louça é sua. - Kishan gargalhou enquanto se levantava. Dei uma risadinha e ele fez contato visual comigo, sorrindo largo.

Ren deu um salto e se pôs de pé. Aproveitando a distração do irmão, ele elegantemente deu um giro e acertou a cabeça de Kishan, fazendo ele tombar no chão. Ren usou os joelhos para comprimir Kishan de barriga no chão e segurou seus pulsos para trás, imobilizando Kishan.

- Os copos são seus.

A cara de Kishan estava colada no chão e sua voz saiu abafada quando falou.

- Você caiu primeiro.

- Caímos juntos.

- Eu te derrubei e estava por cima.

- Sem chance. Não conta quando você também cai e é imobilizado dois segundos depois de derrubar o oponente.

Soltei uma gargalhada e eles olharam para onde eu estava.

- Ora, andem logo com isso. Vamos fazer assim: vou ajudar quem perder a secar a louça.

Kishan se moveu ferozmente como um touro bravo e Ren saiu ligeiro de suas costas. Kishan passou uma rasteira nas pernas de Ren enquanto este disparava um soco duplo contra o seu estômago. Eles acertaram um ao outro, Ren caiu no chão e Kishan se dobrou de joelhos com os socos.

Ri quando percebi que eles tentaram perder de propósito.

- Que molenga vocês são.

Pulei da mesa e caminhei até eles.

- Não sei quem perdeu, então vamos todos lavar a louça hoje.

Kishan apontou Ren, sem ar.

- O verdadeiro perdedor é Ren.

Arqueei uma sobrancelha.

- Então você quer que eu ajude ele com a louça?

Ren sorriu torto para o irmão.

- Não! Estou apenas informando quem caiu primeiro, mas nega mesmo assim.

- Você é um trapaceiro, pois caiu ao mesmo tempo que eu. - replicou Ren.

- Eu cai com elegância, e não como um saco de batatas como você.

Eles se levantaram e novamente se encararam, como se fossem lutar comigo ali no meio deles. Afastei os dois colocando a mão em seus peitos fortes e músculos, e olhei nos olhos raivosos de cada um.

- Parem com isso, vamos todos arrumar as coisas e pronto. - eu disse, firmemente. - Agora quero saber quem é que vai lutar comigo.

Eles se entreolharam e Ren se afastou para a mesa onde eu estava sentada antes. Quando passou por mim, deu uma leve puxada na ponta da minha trança.

Franzi a testa para ele que sorriu misteriosamente.

- Cuidado com ela. - Ren disse para Kishan, se encostou na mesa e cruzou os braços de mãos fechadas.

- Sou eu quem costuma treina-lá. Porque por algum motivo que não compreendo você não consegue bater em Ren. - respondeu Kishan, chamando minha atenção para ele. - E porque sou melhor que ele na luta.

Ren fez uma carranca, mas o ignoramos e ficamos de frente no tatame.

- Vamos começar com golpes simples, afaste os pés na altura dos ombros e ... - começou Kishan, mas eu o interrompi.

- Apenas lute comigo como lutou com Ren.

Ele ficou imóvel.

- Kelsey.

- Faça isso, lute sem se reprimir. Se eu achar que estiver muito forçado para mim, prometo que vou dizer.

Plantei os pés no chão e o encarei com as sobrancelhas erguidas num desafio.

Kishan balançou a cabeça.

- Tudo bem, bilauta.

Começamos andando em círculos como eles haviam feito, Kishan atacou primeiro, tentou me passar uma rasteira baixa pelos pés que desviei indo para a direita. Usei a velocidade do movimento para acertar um soco circular no queixo de Kishan, ele não estava esperando por isso, e recebeu o golpe de raspão quando se abaixou.

Olhei para ele, sorrindo, e pisquei os cílios inocentemente.

- Vai ficar me olhando de boca aberta ou pretende lutar ainda hoje?

Kishan sorriu.

Ele girou para trás de mim e agarrou-me os braços por trás, tentei me soltar, mas era como se eu tivesse sido presa por grilhões. Seu corpo firme pressionou minhas costas e de repente me senti muito pequena e delicada sendo abraçada por ele.

- Vamos ver do que você se lembra então. - Kishan sussurrou na minha orelha. Sua respiração era quente em meu pescoço e estremeci.

Ele gargalhou baixo, provocante, e senti as vibrações do seu peito quando tentei me afastar dele.

Quando não deu certo, percebi que era por causa do nervosismo de estar tão perto dele que eu não conseguia me livrar do seu aperto. Parei, respirei fundo, me acalmando e ergui as pernas juntas, usando o chão e os braços de Kishan para pegar impulso para cima e depois girar com a ponta dos pés, os quadris e o tronco para o lado. A força levou Kishan comigo, mas mesmo assim o seu aperto continuou, mais fraco agora.

Usei a oportunidade para dar um coice em seu joelho, fazendo ele me soltar e corri para longe dele. Kishan se endireitou e veio para cima de mim com um brilho de determinação no olhar e senti como se estivesse sendo caçada. Aquilo fez os meus sentidos se aguçarem e impressionada, descobri que podia prever os movimentos que ele faria antes que este os realizasse.

Kishan deu um giro, pretendendo me agarrar novamente, mas antes que ele conseguisse fazer isso, me abaixei e distribui três socos rápidos e fortes em seu abdôme. Ele pegou meu pulso e o girou para fora, me desequilibrando.
Cai e rolei no chão desviando dos golpes de Kishan.

Ele não estava me poupando mesmo, pensei ofegante.

- Se quiser uma pausa é só dizer. - disse Kishan, animado por saber que eu não estava fora de forma.

- Nunca. - falei entredentes e apoiei as mãos no chão, me levantando graciosamente com uma manobra estilo bananeira.

Novamente fiquei embasbacada por saber que mesmo não me lembrando do wushu, eu usava os golpes como se fossem por instinto e uma prática incansável. Meus músculos reconheciam os golpes que eu tinha em mente e quando eu via, já estava atacando.

Sorri selvagem, espelhando o sorriso de Kishan e dessa vez ataquei primeiro.

Com um grunhido, corri até ele erguendo o punho para acertar seu rosto e ele se retesou erguendo as mãos no alto para me impedir. No último momento desfiz o golpe e me joguei girando o corpo no ar, com os dois pés em direção ao peito de Kishan. Ouvi sua respiração sair dos pulmões e uma gargalhada alta e gostosa vinda dos fundos do estúdio. Kishan caiu de costas no chão, batendo os cotovelos quando os usou como apoio para não bater a cabeça. Aterrisei de pé ao seu lado.

- Oh meu Deus. - eu disse, estridente. - Me desculpe, Kishan. Você está bem? Consegue respirar?

Apoiei a mão em seu ombro e dei tapinhas nervosos enquanto ele buscava ar. Kishan se recuperou rápido, e quando olhou para mim, parecia emocionado.

- Essa é a minha garota. - disse rouco, e me ajoelhei ao seu lado.

- Está feliz por tê-lo chutado? - dei um sorriso tímido.

Kishan levantou a mão e acariciou minha bochecha.

- Estou feliz por você ter se lembrado do wushu. Sinto ciúmes dele.

- Ah. - eu disse e fiz mais uma coisa familiar: afastei o cabelo bagunçado dos olhos dele.

Ficamos nos encarando até que minhas bochechas pegassem fogo e até Ren nos interromper batendo palmas.

- Parabéns, iadala. - ele estendeu a mão para mim, me ajudando a levantar e ir para longe de Kishan. - Está claro que você se lembra muito bem de como lutar.

- É, mas foi apenas isso que me lembrei. - dei de ombros. - Não foi como se eu precisasse lembrar, era mais como algo que eu já sabia e que veio à tona quando necessário. Fui mais pelo instinto do que por qualquer outra coisa.

Kishan se levantou.

- Isso deve ser porque seu subconsciente soube que você precisava usar aquelas informações nubladas para determinadas ações e as entregou novamente em seu consciente. - Kishan divagou.

- Muitas vezes testemunhei soldados aposentados que largaram a espada por anos sem praticar, serem atacados e se lembrarem de como empunha-lá e brandir golpes corretamente, matando o inimigo com apenas pequenos esforços. É claro que estavam enferrujados, e precisaram usar mais força do que necessário, mas quando se pratica ou faz algo por muito tempo e depois deixa isso de lado, a coisa se torna familiar. Quando você precisar, suas lembranças vão estar lá como um instinto natural.

Ren concordou com um aceno.

- Se levássemos a Kells para os templos de Durga e ela fizesse o ritual de invocação da deusa por conta própria, ela poderia lembrar de parte de suas lembranças ocultas. - ele propôs.

- Não. - Kishan o cortou. - Se invocamos Durga, Phet saberá que estamos tentando trazer as memórias de Kelsey devolta.

- Ele não poderia nos impedir de querer isso. - disse Ren, com raiva. - Já pagamos tudo o que tivemos que pagar à Durga e à ele. Agora é a vez deles de nos deixarem viver nossas vidas em paz. Phet disse que não havia um gatilho. Se ele nos encontrasse lá, poderíamos dizer que estamos simplesmente pedindo bênçãos à Durga, nossa mais nova deusa.

Kishan ficou nervoso.

- Se ele nos encontrasse lá não acha ele se perguntaria o porquê de Kelsey estar nos acompanhando? já que tecnicamente ela não se lembra de nós! - gritou ele para o irmão.

- E o que ele teria a ver com isso? - Ren também gritou. - Somos todos livres para fazermos o que quiser agora.

- É arriscado!

- Combinamos que tentaríamos de tudo para que ela se lembrasse!

- Ele pode querer tomar ela de nós para pagar o tributo que EU deveria ter pago. - Kishan parecia prestes a pular na garganta do irmão. Ren estava com a mesma inclinação.

- Pois então você deveria ter ficado ao invés de obrigar Kelsey à sacrificar suas memórias!

Aquilo pareceu atingir Kishan mais forte do que um soco. Ele cambaleou para trás magoado e eu fiz contato visual com ele. Meu coração disparou e meus batimentos aumentaram no peito.

- Ele não quis dizer isso Kishan. - sussurrei, sem ar. Lancei um olhar de raiva para Ren. - Você. Cale a boca, qualquer decisão que eu tenha tomado foi por decisão MINHA e não por negligência da parte de ninguém.

Ren se assustou com o tom de desprezo em minha voz e tentou se desculpar. Não dei tempo a ele.

- Ninguém aqui vai ficar apontado o dedo e se acusando por causa de uma coisa que já está feita! Podem parar de colocar a culpa um no outro e em si mesmo.

- Kelsey, nós não... - começou Kishan.

- Iremos para os templos de Durga, e eu farei os malditos rituais! - gritei mais alto que sua voz. - Não sou nenhuma menininha assustada e não tenho medo de ser levada à força para lugar nenhum, até porque não permitirei que façam isso. Se esse tal Phet aparecer creio que vocês podem dar conta dele se eu não estiver errada.

Os irmãos me fitaram e eu respirei fundo, sentindo uma tontura. Pisquei, assustada com minha explosão.

- Uau, isso foi ótimo, mas, conscientemente eu estou sentindo os resultados da luta agora. - diminui o tom de voz. - Vou subir e tomar um banho.

Sai correndo da sala de treinamento antes que eles pudessem me impedir. Me sentia acalorada e irritadiça quando bati a porta do quarto, arranquei as roupas de wushu e desfiz minha trança para tomar um banho. Registrei vagamente que a fita que segurava minha trança havia desaparecido. Ela deve ter se soltado durante a luta com Kishan.

Entrei no chuveiro e me deliciei com a água fria por um tempo, temi ter outra visão daquelas durante o banho, mas as tonturas passaram junto com a dor nos músculos trêmulos e eu passei a relaxar debaixo d'água. Sai do banheiro para o quarto e vesti um calção jeans, camisa e chinelos confortáveis.

Trançei os cabelos novamente e a amarrei forte com uma fita dourada. Cogitei ligar para Nilima, mas não quis incomoda-lá, então passei o dia todo no quarto lendo o meu diário, e ocasionalmente ouvi batidas na porta que manti trancada. Não respondi aos chamados para comer durante o dia e sai apenas quando o sol já se punha pela janela do quarto, lançando luzes espectrais rosas, douradas e roxas pelo chão do quarto.

Desci até a cozinha mas não encontrei ninguém ali. O jantar já estava preparado e posto na mesa. Olhei o relógio e vi que já eram sete da noite. Nilima já deveria ter chegado pois havia uma bolsa feminina jogada em uma cadeira.

- Senhorita Kelsey? - disse Nilima, me pegando de surpresa. Me virei e quase acertei um soco nela.

Ela arregalou os olhos e pulou para trás.

- Nilima! - exclamei, puxando as mãos e tapando a boca com elas. - Me desculpe, e-eu não quis... Me desculpe.

- Tudo bem, acalme-se senhorita. Não foi nada. - ela me tranquilizou, se endireitou e arrumou os cabelos cor de ébano. - O que aconteceu aqui que te deixou tão arrisca?

Olhei para o chão, envergonhada.

- Hã, nada. Porque você acha que aconteceu alguma coisa?

Ela cerrou os olhos e me analisou.

- Você iria dar um soco, mas parou quando viu que era eu.

- Eu não ia socar ninguém, foi apenas um reflexo. Você me pegou de surpresa.

Nilima arqueou uma sobrancelha.

- E onde estão Ren e Kishan?

- Lá em cima, em seus quartos. - e bem quando eu terminei de falar, Ren e Kishan entraram pela porta vindos do lado de fora da casa, me desmentindo totalmente.

Nilima me encarou com interrogação no olhar, mas apenas sorri levemente. Ela me deu um olhar que eu sabia que requeriria explicações mais tarde e saiu cumprimentando os garotos antes de subir para o seu quarto.

- Eu já comi no trabalho então aproveitem o jantar. - ela disse antes de sumir.

Eu e os irmãos nos encaramos nervosamente.

- A comida está esfriando. - falei, quebrando o silêncio. Sentei e eles me acompanharam.

Comemos sem trocar palavras e podia-se sentir a tensão no ar.

- Me desculpem por hoje de manhã. - eu disse baixinho. - Não quis gritar com vocês.

Kishan me olhou.

- Nós pedimos desculpas, não deveríamos ter discutido daquele jeito na sua frente.

- Desculpe se a assustamos.

Larguei o garfo e soltei uma risada.

- Eu não tenho medo de discussão. Aquilo não me assustou, só me deixou irritada vocês novamente estarem falando sobre mim como se eu não estivesse ouvindo tudo.

Me levantei, levando meu prato na pia.

- Aliás, quem lavou a louça? - perguntei lavando meu próprio prato.

- Eu lavei e Kishan secou. - disse Ren vindo para o meu lado com seu prato.

- Que bom que se entenderam.

Nós três rimos juntos, limpamos a mesa e lavamos as coisas. Me senti tão em paz brincando com eles e dei um beijo em cada um quando subi para o quarto.

Naquela noite, antes de dormir fui até a porta em frente à minha do outro lado do corredor e bati.

Ren atendeu e piscou quando me viu parada ali de pijamas.

- Posso falar com você? - perguntei.

Ele saiu da frente, oferecendo caminho.

- Claro, entre.

Pus os pés hesitante dentro de seu quarto. Eu havia vindo aqui com Nilima, o quarto era grande como todos os outros na casa, mas nele não tinha a decoração que descrevia quem dormia ali. Apenas uma coisa parecia ter sido decorado por Ren, caminhei até parar perto da escrivaninha dele. Ren fechou a porta suavemente e se virou para mim, mas eu estava com a atenção voltada para os livros e poemas que cobriam sua mesa. Peguei alguns dos livros e reconheci os títulos.

- O conde de Monte Cristo. - passei a mão pelas letras douradas da capa. - Eu já li este.

Ren parou atrás de mim, tão perto que senti o seu cheiro de sândalo inebriar os meus sentidos.

- Eu sei, foi você quem me deu o livro. Para que pudéssemos ler juntos.

Abaixei o livro e peguei outro.

- Romeu e Julieta. - sussurrei. - Amo esse.

- Você o leu para mim no circo quando eu ainda era um tigre e não sabia que eu podia me transformar em homem. É minha história preferida. - disse com carinho. - Embora eu ainda ache Romeu um tolo.

Deixei os livros e peguei os poemas.

- Foi você quem escreveu e os deu para mim.

Não era uma pergunta, mas ele respondeu mesmo assim.
- Sim.

- A pérola inestimável é o meu poema preferido. Os outros me fizeram esquentar, mas não tanto quanto ele. Eles é especial e senti as palavras tocarem o meu coração e alma enquanto lia.

- Que bom, porque elas saíram do meu coração para o seu.

Estremeci.

Me virei e finalmente o encarei. Seus olhos azul cobalto analisavam os meus, observando minha expressão. Ergui minha mão e mostrei o diário.

- Eu escrevi tudo aqui. Seus recados, seus poemas, anotações sobre você. - soltei um risada baixa. - Fiz até desenhos seus.

Ele tirou o diário delicadamente da minha mão e o abriu justo na página de seu desenho como tigre. Vi quando ele leu as anotações da visão que eu havia feito hoje cedo e me olhou confuso.

- O que é isso?

- Você é o famoso Dhiren? - perguntei simplesmente.

Ele franziu a testa.

- Meu nome é Dhiren, mas não sou nada famoso.

- Você é o tigre branco que eu desenhei?

Ele hesitou.

- Sou.

- E sente vergonha por ter sido um tigre de circo? - perguntei delicadamente.

- O que? Não. - ele disse rapidamente. - É que... você sempre parecia gostar mais do tigre do que de mim. - soltou uma risada nervosa e continuou. - E agora o famoso Dhiren não existe mais.

- Acha isso ruim?

Ele fez contato visual comigo e senti meus joelhos tremerem com a intensidade do seu olhar. Dentro de seus olhos podia ver a chama da nossa conexão ardendo, e podia apostar que a mesma brasa brilhava em meus olhos também.


- Você acha? - ele perguntou com a voz grave, se aproximando ainda mais.

Dei passos para trás me afastando de seu avanço.

- Eu não posso responder sem antes saber como você era como tigre. Não tenho como comparar, sabe. - me enrolei com as palavras e Ren chegou mais perto, quase acabando com o espaço entre nós.

- Você leu os meus poemas. Eu pensei em boa parte deles quando estava na forma de tigre e não podia dizê-los em voz alta para você. - ele estendeu a mão e puxou minha trança para frente.

E grunhiu quando viu a fita dourada amarrada na ponta.

- Parece que quando não estou por perto você sempre o escolhe. - Franzi a testa, sem entender.

Ren colocou a mão no bolso e tirou minha fita azul de lá, balançando ela no meu nariz.

- Foi você quem pegou. - acusei e estendi a mão para ela. Ele ignorou minha mão e em vez disso amarrou a fita azul com a dourada.

- Você a deixou cair. - ele sorriu, passando minha trança para trás e roçando os dedos de leve em meu pescoço me fazendo arrepiar com aquele contato eletrizante.

Dei um gritinho de frustração e empurrei sua mão.

- Pare de fazer isso.

Ele piscou, inocente.

- Isso o que?

- Essa coisa de ficar me dando choques e me fazendo arrepiar. - falei entredentes.

Ele me deu um sorriso canalha

- Não sou eu quem está fazendo. - Ren aproximou a boca do meu ouvido, sussurrando. - É apenas a sua reação natural à mim.

Tremi na base e Ren gargalhou baixinho.

- Não é não. Você está fazendo alguma coisa comigo.

Me abaixei e sai de perto dele. Peguei meu diário e corri até a porta.

- Já perguntei tudo o que queria saber.

Ren me seguiu.

- Espere, iadala.

- Boa noite, Ren.

Escancarei a porta e encontrei Kishan prestes a bater na minha porta, ele se virou e olhou de mim para Ren saindo de seu quarto, nós todos paramos. Eu sabia que deveria estar com as bochechas coradas, mas fingi que não estava abalada e caminhei até Kishan.

- Oi, você queria falar comigo? - perguntei docemente.

Kishan olhou Ren com a testa franzida antes de responder.

- Eu estava indo te chamar para dar uma volta pelo jardim e talvez ver a floresta ao lado da casa.

- Eu adoraria. Espere um minuto.

Ele me deu um sorriso animado, passei por ele, entrando no quarto e guardei o diário antes de voltar e pegar na sua mão entendida. Começamos a caminhar para longe de Ren que estava de braços cruzados e uma expressão de satisfação na porta.

- Shubharatri, Kells. - ouvi ele dizer, antes que Kishan me levasse para longe o bastante.

Revirei os olhos e Kishan viu.

- Alguma coisa errada, bilauta? - perguntou.

- Ele falou algo em híndi. - eu disse, frustrada. - O que ele quis dizer?

Kishan riu.

- Ele só disse "Boa noite".

Abri a boca e depois a fechei, sem acrescentar nada. Caminhamos pela sala em que acordei sem memórias de nada há dois dias atrás. Havia um enorme pavão estampando a parede com suas penas enormes que eu não tinha percebido antes.

- O que você fazia no quarto dele? - Kishan perguntou calmamente.

Senti as bochechas queimarem e desviei do seu olhar.

- Eu só... fui fazer algumas perguntas à ele. Como eu fiz com você. Isso pode se tornar comum, então não estranhe.

Saímos pela porta de vidro dos fundos e Kishan me conduziu pelo jardim iluminado.

- Entendo. - ponderou Kishan. - Mas não é necessário que você vá até o quarto dele para perguntar.

Olhei-o de soslaio.

- Não se lembra de que você foi no meu ontem a noite?

Ele apertou levemente a minha mão.

- Isso é diferente. - murmurou.

Sorri levemente.

- Está com ciumes, Kishan? - provoquei.

- Estou. - respondeu ele irritado.

- Não fiquei. - dei uma puxadinha em sua mão. - Você sabe, não precisa ficar com ciúmes porque eu não sou de nenhum dos dois.

Kishan parou de repente e olhou para mim. Na escuridão seus olhos pareciam absorver a luz da lua, pois brilhavam incandescentes.

- Eu sei. Só não quero que ele faça algo que te deixe... que faça com que você queira voltar correndo para casa.

- Ele não faria isso.

- Não, não faria. - grunhiu. - Pois eu o mataria.

- Chega de ameaças, Kishan. - o puxei pela mão e nós continuamos a andar. - Não gosto quando vocês dois brigam por minha causa. Eu disse que queria um tempo, lembra?

- Não estou brigando por sua causa. Estou brigando por causa dele. Eu o avisei que você decidiu que não gostaria de ser cortejada e mesmo assim ele continua te provocando e insinuando coisas.

Dei uma risadinha.

- Kishan... você também faz isso, apenas não percebe o quanto me abala. Ou por que então estaria me levando para dar uma volta neste exato momento? - inspirei o ar da noite e estremeci de frio.

Kishan soltou minha mão e passou o braço pelos meus ombros.

- Estou apenas sendo agradável.

Nós rimos juntos e a conversa tensa acabou. Andamos por vários minutos, com Kishan me apontando e falando sobre os tipos de flores cultivadas no jardim que ele ajudou Nilima a arrumar. Quando ele me levou devolta para casa, percebi uma sombra na varanda ao lado de meu quarto. Senti mais do que vi, olhos azul cobalto fixos em mim enquanto eu entrava devolta na casa.

Kishan me levou até a minha porta e depositou um beijo quente na minha mão.

- Durma bem, bilauta. Porque amanhã iremos visitar os templos de Durga.

Notas Finais


FELIZ ANO NOVO!
Pessoal muito obrigada pelos comentários e pelos favoritos na fic. Isso me deixa bastante feliz e motivada a escrever mais, sério mesmo vcs são super fofos. Agora... Depois desses dois capítulos, vocês são #TeamRen ou #TeamKishan? Hauhauhau
Ah mais uma pergunta: vcs acharam esse capítulo grande demais? Escrevi ele na praia viu kkkk se vcs preferirem capítulos desse tamanhão eu continuo blz? Ou não.
Bjs


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