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História O dragão solitário - Capítulo Único


Escrita por: Snowcrash

Capítulo 1 - Capítulo Único


                No topo da montanha vivia um dragão.

                O grande corpo cinzento tomava todo o largo cume. Suas mandíbulas eram maiores que a dos outros. Pertencia a uma espécie ancestral de dragões, e aquelas eram sua herança. Bem como o coração que carregava do lado de fora do corpo. Ele palpitava, vermelho, grande e forte, na barriga do dragão. Por essa razão tinha se exilado no cume daquela montanha. Era difícil para qualquer dos homens chegar até ali, com aquela cobiça que só eles tinham. No começo, no dia de seu nascimento, achava-se uma aberração, mas logo sua mãe lhe contara histórias sobre os seus descendentes, e ele se sentiu como o próximo rei dragão.

                A verdade era que, a herança dos seus ancestrais, aquele enorme coração para fora do corpo, era o símbolo do poder dos Dragões Alados. Podia desejar qualquer coisa para si com apenas um urro. Enganava-se quem pensava que dragões eram estúpidos e seres irracionais. Na realidade, eram bem mais inteligentes do que qualquer criatura que já pisara no universo.

                Os Dragões Alados nasciam a cada uma era, e aquela era a quarta. Com o poder que possuíam, geralmente eram vistos como reis, mesmo que tivessem poderes de deuses, construindo para si fortalezas e riquezas, os mais variados pratos; carnes de todas as raças. Um dia sua mãe lhe dissera que nasceu um Dragão Alado tão guloso que conjurara mil exércitos de homens para o próprio consumo. Além de coisas mundanas, podiam trazer o inverno, o verão; até o fim do mundo, mas isto era proibido. A pedido de servos, eles também invocavam uma esposa para um, um filho para com outro, porém havia uma regra: eram desprovidos de amor. Amor fraterno, ou aquele outro tipo de amor - esses os dragões desconheciam. Essa era razão dos Dragões Alados, e dos dragões comuns também, geralmente morrerem. E era a razão também do dragão no topo da montanha, Rasdrag, ser tão solitário.

                Os Dragões Alados eram seres nascidos para equilibrar o mundo, retirados do ovo da mãe-dragão logo quando era visto que o coração ficava para o lado de fora. O primeiro, contara a mãe-dragão de Rasdrag, fora um dos mais sábios de todos; este morreu com um flechada mágica bem no meio do coração. O segundo, porém, fora o tal do comilão, que só se bastou quando explodiu o corpo, e o coração, de tanto comer e comer. O terceiro era rebelde; só sabia de fazer guerras e mais guerras, culpando a falta de amor que recebera do universo, conjurando até o fim do mundo (foi parado por um Celestial vindo dos céus, que o matou). Por algum tempo, as civilizações ficaram sem ter um Dragão Alado equilibrando as coisas, até que nasceu Rasdrag.

                Durante certo tempo o dragão tentou se igualar ao seu bisavô. Tentara ao máximo equilibrar o universo, matando os que devia, conjurando as estações nos momentos certos, deixando guerras rolarem quando não podia intervir, mas, como o avô, aquele rebelde Dragão Alado, o universo começou a mostrar a verdadeira face. Muitas vezes Rasdrag fora perseguido por homens em cavalos com exércitos gigantescos, até gigantes e outras raças, com armas de cerco mirando em Rasdrag, todos querendo aquele coração forte e poderoso. Deixou a bondade de lado para poder sobreviver aos atentados contra sua vida. Até que um dia se revoltara, e conjurou o mais próximo que podia do fim do mundo; inundações, pragas, secas, e outras mais.

            E o universo lá embaixo vivia as cicatrizes das escolhas de Rasdrag.

           Vendo o desastre que causara, buscou exílio. Temia mais o Celestial, e tentara fugir dele também. Não queria ver mais nenhum ser vivo por muito tempo. Todos eles eram desprovidos do que Rasdrag mais desejava, mas não podia conjurar com seu coração: o amor.

                A primeira montanha que tomou para si era um tanto baixa. De vez em vez, um dos Últimos Homens, como apelidara, desafiava Rasdrag, geralmente montado em outro dragão (os dragões não sofreram das desgraças de Rasdrag, não podia culpar sua raça pelos pecados dos homens). Das costas da criatura, gritava:

                — Se renda de uma vez, ó mais terríveis dos dragões! Me dê esse coração e o universo eu salvarei!

                Com um lamento e um urro, Rasdrag conjurava raios do céu, os mais poderosos que os deuses do céu pudessem mandar, o qual atingia o inimigo, que caia do dragão e estatelava-se lá embaixo.

                De montanha em montanha, Rasdrag ia voando, tentando achar o local certo para exilar-se em paz, sem que aqueles homens montando dragões lhe perturbassem a paz com sua ganância. Todos eles desejavam o coração forte de Rasdrag, mas Rasdrag sabia que não salvariam o universo. Claro que não. Aquele não era o jeito dos homens. Queriam o forte coração de Rasdrag para serem eles mesmo deus de todo o mundo, escravizando todos para o seu próprio bem, tudo para o seu próprio bem. E Rasdrag sentia-se na responsabilidade de não deixar aquilo acontecer.

                Uma das montanhas pelo qual passou o mais tempo possível antes da atual era localizada numa ilha. Lá permaneceu alguns meses, quando os Últimos Homens vieram atormentar sua a paz novamente. Era o maior exército que vira depois daqueles dos dias rebeldes dos humanos. Alguns montados em dragões, outros vinham com navios carregando aríetes, balistas, catapultas, e outras armas de cerco, carregadas de magia de seres restantes que possuíam tal conhecimento. Daquela vez, não usou seus poderes ancestrais. Daquela vez Rasdrag queria saborear o gosto da vitória vindo do próprio paladar, que se juntara à vingança.

                Destruiu tudo na força primitiva dos dragões comuns: o fogo. Incendiou corpos de carne e de magia, e os cascos de madeira dos navios. Com sua telepatia, conseguiu manipular alguns dos dragões para virarem-se contra seus montadores. De repente, via-se dragões devorando homens, e Rasdrag apenas pousou no cume da montanha da ilha, observando. No final, o cheiro de morte e enxofre dominava a ilha. Ele voou para longe novamente.

                Em seus pensamentos certeza já tinha: não acharia nunca tal montanha. Teve de conjurar para si uma.

                Era tão alta que nenhum dos grandes castelos restantes que sua raça, ou os próprios homens, construíram, podia ser visto dali. Era tão alta que uma densa névoa tomava toda a terra lá embaixo. O cume era grande o bastante para caber dois da espécie de Rasdrag, para seu próprio aconchego. Ali em cima, se sentia com o próprio Celestial; aquele que vinha para equilibrar o mundo quando um Dragão Alado não cumpria a tarefa. Se sentia ele próprio o Celestial. Sentia-se um tanto solitário, porém. Um sentimento que o dominava cada vez mais. Mas ali em cima, na sua montanha, se sentia novamente o Poderoso Rasdrag, um Dragão Alado. Era o lugar ideal: nenhum dragão jamais conseguiria voaria até ali, nenhum ser existente lá embaixo tentaria novamente tomar o coração de Rasdrag.

. . .

                Agora, Rasdrag hibernava. Sonhava sonhos de dragão, o que ninguém nunca soube como eram.

                De sentidos apurados, um ruído cristalino tomou conta de suas orelhas de dragão. Rasdrag ouvira, mesmo hibernando, mas o ruído foi suficientemente, e estranhamente, incômodo, para despertar o sono do dragão. Porém, Rasdrag nada disse. De olhos fechados, esperou outro ruído... Que não veio.

                A espera incômoda de alguma coisa nas redondezas fê-lo abrir os olhos e levantar a cabeça.

                O olfato detectou um cheiro que nunca sentira. E, lá debaixo, subindo com um bater de asas, um dragão botou a cabeça no cume de Rasdrag. Uma fêmea, reconheceu Rasdrag. O que ela quer de mim? Ela tinha o corpo cor de cobre, e logo tratou de se acomodar ali no cume também. Não era tão grande como o outro, então coube bem.

                — Radrag? – Disse a dragão

                — Eis-me aqui.

                — O poderoso Rasdrag?

                — Eis-me aqui – repetiu – O que queres?

                — Saudações, vossa graça...

                — Não – interrompeu Rasdrag.

                Ela baixou a cabeça, mas retomou:

                — ...vim em busca de um lugar para ficar. Os dragões lá debaixo agora só pensam guerra. Organizam-se em clãs, e só tratam de maltratar os outros de seu próprio sangue.

                — Hum... – refletiu por um momento Rasdrag – Um lugar para você darei. Já me sinto solitário faz um tempo. Saiba que atrapalhou meu sono.

                — Desculpa, vossa... Rasdrag.

                — Diga-me o teu nome.

                — Shy’Ha.

                — Conheço sua espécie. Todos dessa cor de cobre, se bem me lembro.

                — Perdi todos para os homens – disse ela, friamente.

                Rasdrag encarou-a por um tempo. Algo nos olhos dela fazia-o ter calafrios. Gostava daquilo.

                — Algo de errado, senhor?

                — Jamais. Apenas me sinto melhor por ouvir outra voz a não ser a minha.

 

                Não a culpava mais por ter atrapalhado o sono. Durante muitos dias posteriores àquele que Shy’Ha aparecera, conversaram assuntos de dragões, e também de humanos, um com o outro. Falavam de dias passados, onde tudo fora muito bom. De vez em vez, Rasdrag conjurava lembranças vívidas, e assim podiam andar no passado, observando tudo. Foram até os tempos do bisavô de Rasdrag e o viram governando com clareza e sabedoria todo o primitivo universo. Viu outras eras também. Riram risadas de dragões e choraram lágrimas de dragões. Ele contara-lhe sobre a sua espécie de Dragões Alados, e muitas histórias que sua mãe-dragão contou. Shy’Ha não ficou só ouvidos para Rasdrag. Contara-lhe também histórias que o dragão nunca tinha ouvido falar, pensou até que fossem falsas, mas ela mostrou-lhe através das lembranças vívidas. Durante aquele tempo, junto de Shy’Ha, Rasdrag sentira algo que fez seu coração forte mais poderoso ainda. Algo que lhe enchia o peito de tão bom que era. Rasdrag sentiu amor pela primeira vez.

. . .

                Numa noite, Rasdrag e Shy’Ha faziam o amor de dragão. Parecia estranho para outras raças, mas para eles era como as das outras: o maior prazer de todos.

                Os dois deitaram-se juntos, Rasdrag debruçado sobre Shy’Ha. Sentia que a protegia de todas os males do mundo. Ali, no alto da montanha, só ele e ela.

 

                Shy’Ha se mexeu no lugar. Talvez queria espaço, deduziu Rasdrag.

                Subitamente, o dragão sentiu a pata de Shy’Ha sobre o seu grande coração. Ele abriu os olhos de imediato:

                — O que está fazendo?

                — O Poderoso Rasdrag. Sabia que não era digno de tal fardo – sua voz soava fria, e Rasdrag sentiu tristeza. Ela continuou:

                — Lembranças falsas, corpo de dragão falso. Devia temer-me, mas não o fez. E agora, vim cobrar o que você deixou por fazer.

                De repente, ela já não era mais um dragão. Se transformou numa forma indescritível por baixo de um manto negro, de onde saia uma forte luz que doía os olhos. Possuía três metros de altura e no que parecia ser as mãos, o forte e poderoso coração de Rasdrag estava. Era um Celestial. Rasdrag sentia um aperto na garganta; sem o coração, não era mais nada.

                — Você brincou do jeito errado, Rasdrag. Assim como seu avô. Olhe o que fez a este universo. Devia trazer o equilíbrio, não o jogar nas trevas!

                Os olhos de dragão de Rasdrag fechavam-se lentamente. Tudo ao seu redor começou a ficar desfocado e distante...

                Assim que o Celestial fechou o que era o punho, esmagou o coração de Rasdrag. No mesmo momento, o corpo do Dragão Alado estatelou-se no chão, sem vida.



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