História O florista - Seus traços

    A cada dia eu pegava mais seus traços. O formato de seus lábios quando sorria; as veias de suas mãos quando segurava fortemente o guidão e as pernas bonitas que pareciam pedalar sem nenhum esforço. Ele era como um furacão que devastava meu coração a cada vez que virava aquela esquina na bicicleta azul cheia de flores. Percebi que estava mais do que fascinado; ele me encantava de todas as maneiras possíveis, desde seu tom de voz doce quando cumprimentava as pessoas, até o olhar alegre que era direcionado ao caminho.

    Fazia cerca de duas semanas que eu mantinha aquela rotina: esperá-lo passar, desenhar todos os traços e detalhes que eu poderia perceber e lembrar, voltar para dentro de casa e seguir meu dia dentro do quarto, mas naquela manhã foi diferente.

    Acordei no mesmo horário de sempre e me pus a tomar café. Minha avó comentou sobre eu parecer mais feliz que o normal, além de estar passando aquele tempo do lado de fora. Ela insinuou que eu estivesse querendo ver algo depois dos limites do portão e por mais que eu não quisesse contar, não pude negar. Ela riu e disse que jamais entenderia os jovens e seus prazeres e eu só pude pensar que nem eu mesmo entendia o prazer que sentia ao vê-lo. E quando eu sentei naquele banquinho, sendo banhado pelo sol, o vi virando a esquina. Os óculos redondos o deixavam tão lindo e aquela camiseta laranja o deixava com ar feliz. Ele pedalava devagar, como se além de não ter pressa, quisesse captar toda a paisagem. Dona Carmen estava na janela de sua casa e acenou para ele. “Eu fiz biscoitos, Hoseok” Ela gritou e ele parou ali na frente. Eu me sentia um pouco estranho quando ele parava muito perto, era como se dali eu me tornasse mais perceptível do que realmente queria. Enquanto ele se perdia dentro daquela casa bonita, pintada de azul piscina, virei a página de minha caderneta e me vi desenhando algo novo. No cantinho daquela cesta, uma flor me chamou a atenção. Eu não sabia o nome dela e nem porque pétalas branquinhas me chamavam mais atenção do que as diversas outras coloridas, mas aquela me pareceu a mais bonita de todas e em pequenos traços tomou forma naquela folha. Eu nem ao menos percebi quando o rapaz bonito de cabelos negros saiu da casa de dona Carmen e se aproximou de mim. Eu apenas ouvi um “Oi” feliz, porque feliz era a forma que ele falava. Ergui meu olhar acanhado e notei o quão perto ele estava, com os dentes branquinhos a mostra. Uma das mãos segurava um grande biscoito com gotinhas de chocolate e na outra, um saquinho aberto. Ele olhou para minhas mãos e seus olhos pareciam brilhar ao ver o pequeno rascunho.

    “Uau, você desenha muito bem” disse ainda sorrindo, posteriormente mordeu o biscoito.

    “O-obrigado” minha voz saiu baixinha e tímida, eu sentia que poderia ter explodido ou simplesmente ficado mudo.

    “Quer um biscoito” me ofereceu, aproximando o saquinho de mim. Os meus olhos se desviaram por vergonha.

    “Não, obrigado” Mas ele não se deu por vencido.

    “Ah, pegue! Está tão gostoso”

    E estava tão bom quando a sensação em meu peito de tê-lo tão perto.