História Ya Ma Da - Você baba enquanto dorme

-Parabéns Yumi-tan - falei num tom sarcástico pra Yumi.

-Eu disse que estávamos saindo, quem disse que estamos namorando foi você - mais uma vez ela transferiu a culpa pra mim - eu só concordei.

-Eu só fiz isso porque outra hora você tinha concordado falar que não me conhecia lá na sala.

-Tsc. Eu fiz isso pra ME ajudar também, você que cagou com as coisas agora Yamada.

-Tá, tá, de qualquer forma amanhã vamos ter que contar pra ela. Vamos dormir logo.

-Dormir? - Yumi ficou verde dos pés à cabeça.

-Eu pego um colchão pra mim, pode  ficar com a cama. - minha mãe sempre me ensinou a ser um cavalheiro, de vez em quando eu dou dessas.

-Não precisa. Eu fico com o colchão.

    Ela disse, mas eu ignorei. Sabia que ela estava apenas falando por educação, aquela garota não aguentava dormir no chão nem quando fazíamos acampadentros.

     Levei o colchão pra dentro do quarto enquanto Yumi ia ao banheiro.

    Ela saiu e chegou minha vez de usar, escovei os dentes e me encarei no espelho: eu estava muito diferente desde a última vez.
  
     Fazia meses, anos que eu não tinha tempo para parar e olhar minha aparência. Meu cabelo mudara de cor mais uma vez e meu rosto tomava uma forma mais robusta.

     Estamos no fim do ano, daqui a pouco eu faço dezessete anos. Parei para pensar em quanto tempo eu passei atrás de Yumi: dois anos. Essa anã de jardim mal pintada desaparecera quando eu tinha quatorze anos, quando eu ainda era um garotinho perdido.

-Eu definitivamente estou ficando mais velho.- murmurei para mim mesmo.

    Fui para o quarto, a luz já estava apagada e Yumi estava deitada na cama. Fiz o mesmo e apaguei a luminária.

-Sabe Yamada?

-Hum?

-A partir de amanhã nossas vidas serão tudo menos normais.

-Eu sei.

-Tem certeza que quer fazer isso? Foge bastante do seu ideal.

-O resultado é o que importa.

   Yumi ficou em silêncio por alguns segundos até que percebi que ela dormiu. Estalei a língua e me virei para o lado esquerdo do colchão.

     Demorei alguns minutos para dormir. Sonhei com minha mãe, fazia tempo que isso não acontecia.

    No sonho ela aparecia com meu pai, Megumi e Haruhi num piquenique. Todos me chamando para vir com eles enquanto se divertiam. Até que Yumi apareceu nas minhas costas e me abraçou, todos sorriam até que uma mancha verde escura começou a aparecer. Ela apagava todas as formas e sombras de qualquer felicidade.

    Meu pai, mamãe, Megumi e Haruhi já não existiam mais. Apenas Yumi permanecia lá.

   Acordei quando a imagem do sonho se tornou apenas uma mancha verde.

   Abri os olhos bruscamente e dei de cara com um ser humano em cima de mim. Yumi.

    Ela estava com os olhos fechados, babando. Seria fofo se não tivesse bem na minha cara.

-Éhhh... Yumi?

-Hum? - Yumi continuava com os olhos fechados.

-Yumi, você baba enquanto dorme.

     Falei e comecei a tirá-la de cima de mim. Até que ela abriu os olhos, não, ela arregalou os olhos e colocou os braços no chão, ainda em cima de mim.

    Ela ficou apoiada no chão com as duas mãos, cara a cara comigo enquanto assimilava minha frase.

-Eu O QUÊ?

-Baba enquanto dorme. - falei, me segurando pra não rir.

-Você por acaso estava me observando dormir?

-Não, eu acordei e você estava em cima de mim.

-Ahhh...Éhhhh eu esqueci de te explicar o porquê de eu ter pedido pra ficar com o colchão, eu me mexo enquanto durmo. Eu já imaginava que isso ia acontecer.

   Ela começou a ficar verde quando percebeu a situação em que estávamos e...nossa posição.

   Ela estava começando a se levantar para sair de cima de mim quando Megumi apareceu na porta.

-Ora, ora... Esperem até o casamento! Yumi sua safada! Pelo menos fechem a porta!

     Ela deu uma risadinha e fechou a porta, nos deixando perplexos. Yumi se levantou e começou a andar em círculos.

-Não era pra isso acontecer.

-Com a Megumi na nossa cola é capaz de ela achar que vamos pra lua de mel em vez de caçar Taiwan.

-DEFINITIVAMENTE NÃO ERA PRA ISSO ACONTECER! EU TE AMO MEG...

      Tapo a boca dela com a minha mão, ela iria estragar o disfarce.

-Depois você declara seu amor pra Megumi, agora, a gente tem que ir pra Taiwan, depois da escola.

-Niahhh - Yumi começou a miar e se jogou no colchão de novo.

-Vai logo - chuto o colchão e ela fica de joelhos.

-Me deixaaaa

-Ok, eu vou pro banheiro primeiro.

-Vai lá, vá criança.

     Entrei no banheiro e me encarei mais uma vez. Agora eu me lembro dos meus traços faciais.

    Escovei o cabelo e passei um pouco de base para esconder um corte na bochecha, causado pelo Gorila.

     Passei desodorante e tirei a camiseta. Meus braços ganharam músculos e estou com a barriga cortada. Aquele Gorila custou mais do que deveria.

     Parei para pensar: eu estava lutando com um, Yumi lutou com dois...

   Sem fazer mais nada voltei para o quarto e levantei a blusa da Yumi, e como eu esperava ela estava com hematomas roxos e cortes por todo o corpo.

    Tudo bem que nós nos recuperamos rápido, mas nem tanto. Comecei a erguer mais ainda sua blusa, ela estava de costas: quanto mais eu subia, mais machucados eu via.

-E-EI! O-O O QUÊ VOCÊ TÁ FAZENDO?

    Bufei. Pela aparência deles, ela não cuidou de nenhum desde a luta. Fui até o armário sem responder Yumi e comecei a procurar caixa de primeiros socorros em meio as minhas roupas.

-Você é muito irresponsável Srta Yamamoto.

    Eu disse enquanto tirava da caixa pomadas, band-aids, remédios e gaze. Podíamos ter quase a mesma idade, mas eu sou milhares de vezes mais responsável que a Yumi.

      Peguei um paninho e coloquei um pouco de remédio. Mandei Yumi ficar sentada e ergui sua blusa: estava horrível.

     Demorei uns quinze minutos para cuidar de todos os ferimentos, bom, pelo menos a maioria. A outra parte ficava em áreas não tão acessíveis. Se é que me entende.

-Yamada?

-Hum?

-Obrigada. - ela estava verde, envergonhada.

-Tsc. Você é um caso perdido Yumi Yamamoto.

-Ha! Esse caso perdido sobreviveu a um árduo treinamento dia e noite! - ela fez uma careta enquanto fechou o pulso na tentativa de fazer uma pose heróica.

-Tá, tá. Vamos logo. Independente do que aconteceu ontem...-  me referi a Kuronuma, um nome que não falava há um tempo - Puxa tudo isso aconteceu ontem? Uau. Continuando... Independente do que aconteceu ontem, temos que ir pra escola de qualquer jeito.

-Ok, ok. Mas só vou por causa da Megumi-senpai.

-Ingrata.

      Nos despedimos de Megumi e Haruhi, pois papai não estava em casa e saímos.

    Botei meu fone de ouvido. Normalmente as Filhas da Floresta não usam celular, mas eu uso. Elas preferem usar telecinese, mas eu já disse que eu quero ser normal então...

    Comecei a ouvir a música, sempre procuro colocar as mais animadas antes de ir pra escola.

-Hummm

-Que foi?

-Não sei que música escolher.

-Posso te mostrar uma?

-....Pode...mas...

-YAAY!

      Ela pegou o celular da minha mão e virou frente pra mim para eu não ver o celular. Começou a tocar uma música que começava com uma voz "blackpink in your area"

-O que diabos é isso?

-Continua ouvindo!

    Ela pegou um dos fones e colocou no seu ouvido. Era uma música bem animada, o ritmo era parecido com asiático.

-YAH, YAH YAH, YAH YAH YAH YAH, BOOM BOOM BAH BOOMBAYAH!

-Yumi...

-LETS GO UHUU LETS GO UHUU!

-Yumi...

  Comecei a chacoalhar seu braço, ela cantava alto, já estávamos chegando na escola enquanto todos olhavam para nós. Até que ela parou de cantar.

     Olhou para mim, depois para a multidão de alunos que a observava.

-Quando foi que chegamos aqui?

-Pff. Você é muito avoada.

-Ah me deixa.

     Entramos na sala e Sana pulou em cima de mim, e para minha surpresa, Aoki também estava lá.

-Estávamos preocupados com vocês! Nem avisam onde vão!- Sana gritou, quase me dando uma surra e me abraçando ao mesmo tempo.

-C-Como assim onde vamos?

-Eu vi vocês saíndo ontem a noite. - Aoki deu um sorriso malicioso, enquanto entrava na conversa.

-Conheci um cara que diz que pode me ajudar a ser normal.

-SÉRIO?- Sana pulou nas minhas costas e Aoki estreitou os olhos.

-Sim, mas pra isso acontecer eu preciso ir pra uma ilha do outro lado do mundo.

-Putz cara...- Aoki suspirou.

-É, mas primeiro vamos pra Taiwan, o cara tem uma amiga lá.

-Como assim? Você vai mesmo com ele?- Sana aumentou a voz.

-Eu e Yumi.

-Por que não me disse?

-É que isso vai durar muito tempo - eu disse, com medo de que Sana me batesse ou algo do tipo - Não sabia como te contar.

-Me leva junto!

-Desculpa mais eu não posso.

-Por que?

-É perigoso demais e eu preciso que alguém cuide do Haruhi e da Megumi pra mim enquanto eu estiver fora.

-Mas e se.. e se você não voltar?

     Congelei. Não tinha pensando nessa possibilidade, estive mais preocupado em como será o caminho, mas nunca pensei no ato. Se levei uma surra de um gorila problemático imagina o que um maníaco que muda de sangue pode fazer?

-Eu não...

-Ele vai voltar. - Yumi se apressou enquanto tirava os fones de ouvido, que por sinal, ela tomara de mim - Nós vamos.

-De você diz... Mas ainda estou preocupado com vocês. Megumi não desconfiou de vocês saíndo no meio da noite?

-Desconfiar? Ela praticamente nos esganou com os olhos.

-Como fugiram dela?

-Digamos que... -Yumi estava pensando em uma desculpa.

-Agora ela acha que estamos namorando.

-QUÊ?

-Pois é, tivemos que inventar essa história.

-Na verdade, - Yumi começou- EU disse que estávamos SAINDO. Aiii o Yamada cagou tudo e disse pra ela que estamos namorando.

-Eu não caguei tudo. Eu só queria ajudar, e você concordou no fim das contas.

-Só por que ela me chamou de Yumi-TAN!! Ai ai Megumi-senpai...

    Sana ficou nos encarando e depois sorriu mostrando os dentes.

-Vocês deviam mesmo namorar.

   Ignoramos seu comentário e voltamos a brigar até o sinal bater. A aula foi um saco. Todos me encaravam e cochichavam, olhares atravessados e gritinhos eu conseguia até sentir na pele.

    E o pior é que eu sabia o verdadeiro motivo de tudo isso: eu e Yumi sermos Filhas da Floresta.

    Mesmo sendo poucas, nós ainda sofremos muito preconceito, e pensar que nós os salvamos dos renascentistas mesmo eles fazendo isso.

   Já disse que a raça humana é repulsiva e repugnante? Se não, a raça humana é repulsiva e repugnante.

     Depois da aula fui com Yumi até em casa e fomos até o quarto de Megumi, estava na hora de contar.

- Megumi-senpai...

-Hum, ah, oi POMBINHOS.

-Na verdade Megumi... - eu comecei a explicar mas Yumi me deteve.

-Nós não estamos namorando.

-NÃO?

-Não.

-Terminaram assim tão rápido?

-Nunca namoramos, era mentira.

-Por que mentiram pra mim?- Megumi agora carregava uma voz pesada e seca.

-É que eu...Eu achei um cara que diz que pode me ajudar a ser normal.

-Normal? - Megumi sempre brigou comigo e viveu dizendo que eu era normal e que não tinha nada de errado comigo.

-Sangue vermelho.- Yumi respondeu

-Ele diz que tem um cara que manipula o sangue e, se acharmos ele podemos ter seu poder e ter o sangue normal.

-Onde esse cara está?

-Do outro lado do mundo.- encarei Megumi com a melhor expressão de seriedade que consegui.

-De jeito nenhum.

-Mas Megumi! Esse é meu sonho!

-Sozinho você não vai. E eu não vou com você.

-A Yumi vai comigo e com o Ken.

-Ken?

-Hikasaki Ken, é um... É o cara que vai me ajudar.

-É um?

-Renascentista.

-AH NÃO. DE JEITO NENHUM VOCÊ VAI!

-Mas ele é pacífico! E em salvou uma vez!

-Yamada...

-MEGUMI! EU VOU, VOCÊ QUERENDO OU NÃO.

    Comecei a ficar bravo, saí do quarto da Megumi e bati a porta enquanto pisava duro.

      Me joguei na minha cama. Afundei a cabeça no travesseiro e passei alguns minutos lá. Até que percebi que era tarde, eu e Ken havíamos combinado às cinco no aeroporto internacional de Tokyo.

    Comecei a fazer as malas quando Yumi entrou no quarto.

-Não devia ter falado daquele jeito com a Megumi-senpai.

-Me deixa em paz e vai fazer sua mala.

-Ela acabou concordando depois de conversar um pouco comigo.

-AH ENTÃO COMIGO QUE SOU IRMÃO DELA ELA NÃO CEDE MAIS COM A GAROTINHA APAIXONADA ELA SE DERRETE!

-Yamada...

-VAI FAZER A SUA MALA YUMI.

     Ela saiu do quarto em silêncio e eu levantei a cabeça, me olhei no espelho. Eu estava verde de novo, como eu odeio ser uma Filha da Floresta!

    Comecei a me acalmar para perder essa cor verde nojenta do meu corpo e terminei de fazer as malas.

    Fui até o quarto de Megumi buscar Yumi e a puxei pelo braço enquanto se despedia da minha irmã.

- Megumi-senpai!!!

-Tchau Yumi. Tchau Yamada!

-Humpf.

   Grunhi para ela enquanto continuava puxando Yumi pela porta da frente.

     Podia estar bravo mais ainda estava triste: aquela podia ser a última vez que vejo minha irmã mais velha.