Seus olhos se abriram lentamente, tentando se acostumar com a luz das lâmpadas. Ao sentir o gosto amargo na boca, fez uma careta de desagrado. O cheiro de limpeza a acordou e a fez perceber que não estava no seu quarto, afinal, seu quarto com certeza não tem esse cheiro.
Olhou para si mesma e ficou surpresa ao ver um gesso na sua perna. Olhou pra cima e viu um aparelho que media seus batimentos cardíacos. Se perguntou o que diabos fazia ali e então lembrou.
Revirou os olhos irritada. Não acreditava que conseguiu ser atropelada.
Se sentou e foi só então que reparou o loiro dormindo ao seu lado, segurando sua mão. Seus batimentos cardíacos se aceleraram enquanto suas bochechas se avermelhavam suavemente. Sua mente ficou confusa, embaralhada, sem focar em algo especifico.
O que estava acontecendo? O que ele fazia ali?
Com a mão livre, coçou os olhos. Percebeu então que havia alguns hematomas e revirou os olhos, vai levar dias para sua pele voltar a palidez normal. Bocejou querendo voltar a dormir, mas percebeu que tinha que ir pra casa. Foi um dia longo (pelo menos esperava que havia só passado meio dia) e tudo o que queria era ir pra casa.
Soltou sua mão da do loiro e se levantou – com muita dificuldade – e deu a volta pela cama. Pela sua sorte, não haviam enfiado uma roupa de hospital nela, então, tudo o que teve que fazer era vestir o casaco ao lado da sua cama e ir até a recepção do andar em que estava, para tirar tudo a limpo e ir embora o mais rápido possível.
Conversou com a recepcionista, que insistiu que a ruiva deveria falar com a doutora antes de partir – e Kagura não conseguiu continuar negando -, e logo depois conversou com a doutora, que passou todos os detalhes de como deveria se cuidar e de quando deveria voltar para tirar o gesso.
Com um aperto de mãos, a ruiva se despediu da doutora. Enquanto caminhava para fora, a doutora a chamou e a jovem levantou o olhar pra ela – parando no elevador.
- Seu namorado já foi embora? – Perguntou com um sorriso doce. Vendo a ruiva não iria responder, continuou: - Ele estava bem preocupado. Dava pra ver em seus olhos como você é importante pra ele. – Manteve seu sorriso doce e a ruiva pôde ver em seus olhos que ela sabia muito mais do que poderia imaginar.
A jovem assentiu, sem mudar a falta de expressão, e entrou no elevador, apertando o botão do térreo enquanto via a doutora dar as costas para atender uma criança com o pulso torto.
Quando chegou ao térreo, se apressou a sair desse prédio se perguntando como iria pra casa agora. Deveria ligar para Gin-chan? Procurou pelo celular em seus bolsos e só então se tocou que havia o deixado em casa.
Puta que pariu.
Suspirou cansada e se encostou em um dos pilares que sustentavam o prédio, do lado de fora. Olhou para o céu escuro e tremeu ao sentir o vento gelado em seu corpo. Ao menos o gesso esquentava o seu pé; um, mas esquentava mesmo assim. Se sentia cansada. Exausta. Até mesmo sem forças; e não sabia direito que forças precisava, mas precisava.
Respirou fundo e juntou forças se retirar da área hospitalar. Iria a pé para casa até encontrar outra solução (além de pedir ajuda pro loiro).
Na verdade, não sabia porque estava fugindo dele. Sim, ela sabia que estava fugindo e isso era óbvio até para ela. Kagura sabia que não era a pessoa mais honesta consigo mesma no mundo, mas havia coisas que ela tinha que admitir, para o próprio bem.
Só não sabia qual o motivo te ter fugido. Medo de se envolver mais? De demonstrar mais lados seus e de descobrir mais lados dele? Medo de se entregar a essa... amizade? Relação? Nem tinha idéia do que era isso.
Começou a caminhar – com dificuldade – para fora daquela área. Seu tornozelo ainda doía e podia senti-lo pulsando de dor, mas teria que agüentar firme. Não deveria estar muito longe do seu bairro, ou do prédio em que trabalha. Caminhou lentamente, e a poucos metros da calçada em si, sentiu duas mãos segurar sua cintura, a impedindo de dar mais um passo.
Fechou os olhos esperando que não fosse um assassino, seqüestrador, estuprador ou o loiro. Os abriu lentamente e olhou para trás.
Era o loiro.
Seu olhar estava irritado e ela podia sentir a pressão das suas mãos em sua cintura. Okita tinha o rosto de quem havia acabado de acordar e reparou que sua respiração estava um pouco alterada – só um pouco. Perguntou pra si mesma o que deveria dizer mas resolveu esperar ele dizer algo.
Passou-se alguns segundos e nenhum dos dois disseram nada.
Na mente da ruiva, imagens do dia anterior passava em sua mente lentamente – cada segundo, sorriso, letra da musica, o toque no seu pulso, o abraço antes de dormir, o conforto que sentiu perto dele. E se lembrou de quando acordou e não o viu mais em sua cama. Ele havia deixado sua casa sem dizer nada.
E então, a ruiva entendeu o que havia sentido ao deixar sua casa de manhã.
Solidão. O loiro passou um dia na sua casa e ela havia se esquecido o que era esse sentimento, e quando ele partiu, ela sentiu em dobro. Sentiu vontade de rir de si mesma. Quem poderia imaginar que não sentiria algo assim com o ele? Quem poderia imaginar que ele (inconscientemente) a faria sair de casa para buscar refugio na rua?
Se perguntou se ele sentia o mesmo em relação a ela.
- Por que? – Perguntou irritado, apertando mais a cintura da ruiva. A mesma estava sentindo uma leve dor nesse local, e concluiu que devia haver mais um hematoma ali.
Ela sabia o que ele estava perguntando, mas não queria responder. Mal havia descoberto o motivo, dizer algo assim tão rápido seria embaraçoso.
Deu de ombros. Queria que ele a soltasse, para que pudesse fugir para debaixo da suas cobertas. Quem sabe arrumar suas coisas, aproveitar os últimos dias com o Sadaharu, comer um bolo com Kaori-chan... Havia tantas coisas que queria fazer no momento...
Respirou fundo e disse: - Me solta, sádico, preciso voltar pra minha casa.
O loiro revirou os olhos.
- Assim? A pé? – Deu uma risada irônica.
- Sim, algo contra?
- Sim. – Respondeu suavizando a expressão. A ruiva ficou confusa e só entendeu quando ele – magicamente – a colocou em suas costas. Okita segurou as pernas da mais jovem firmemente, enquanto a mesma tentava manter o equilíbrio.
- Oe, sádico, o que você pensa que está fazendo? – Perguntou irritada, sentindo suas bochechas se esquentarem. Constrangedor. Era uma situação muito constrangedora.
- Aproveita enquanto estou legal. Amanhã você não terá mais a oportunidade de ficar em cima de mim. – Respondeu sem expressão, mas com malicia no tom. Se possível, Kagura sentiu das suas bochechas até a ponta das suas orelhas se esquentarem.
Não sabia o que responder.
- Só por hoje, então. – Respondeu emburrada, enfim. Passou os braços em volta do pescoço do mais velho e deitou sua cabeça no ombro do mesmo, sentindo o mesmo cheiro do dia anterior. Ouviu uma leve risada e sentiu o corpo abaixo de si vibrar levemente.
Não tinha mais tanta pressa pra chegar em casa.
Quando chegou em casa (nas costas do loiro) esperou encontrar a casa como havia deixado. Ao invés disso, encontrou a casa toda bagunçada, cheirando a bebida e leite de morango. Ao contrário de manhã, não se sentia mais tão incomodada com isso. Respirou fundo imaginando o trabalho que teria no outro dia.
Pediu (mais mandou mesmo) para o mais velho levá-la ao seu quarto, porque iria pegar suas roupas para tomar banho e dormir.
- Quer que eu ajude você a tomar banho? – Perguntou Okita, com malicia na voz.
A ruiva ficou envergonhada e logo tratou de dar um tapa em sua testa, fazendo o mesmo resmungar algo como “só queria ajudar”.
A ruiva deu risada de leve, que interrompeu imediatamente quando chegou na porta do seu quarto.
Em sua cama estava Gin-chan, Megane e Sadaharu dormindo, enquanto havia um espaço no meio – que a ruiva imaginou que fosse pra ela. Sorriu nostálgica.
- Oe, sádico, me deixe aqui e vá embora. – Sussurrou.
O mais velho a olhou confuso.
- Que?
- Isso mesmo. Tchau. – Disse enquanto descia das suas costas, logo o empurrando pra fora do seu quarto.
- Não que eu me importe, mas você vai ficar bem? – Perguntou o loiro enquanto saía. A ruiva assentiu. – Te ligo amanhã, então. – Finalizou e saiu pelo corredor, mas sem antes dizer: - E vê se emagrece!
Kagura o olhou irritada e apontou o dedo do meio para o mesmo, que logo retribuiu. Fechou a porta e tratou de trancar tudo.
Com um pouco de dificuldade – estava se acostumando ao gesso – tomou seu banho bem quente. Se trocou no banheiro mesmo e foi ao seu quarto lentamente. Enquanto gatinhava para se enfiar no meio dos dois amigos, pegou o Sadaharu no colo. Se enrolou na coberta e o colocou do seu lado, entre si e Gin-chan.
Dormiu enquanto ouvia o ronco de Gin-chan e os sussurros do Megane sobre Otsuu.
Dia 26 de Dezembro de 2014.
O loiro nunca pensou que o motivo para ela ter voltado era esse. Ás vezes as piores coisas acontece quando se menos espera.
*FlashBack*
Suspirou cansado. Era manhã de um pós-feriado, a cidade estava um caos de tanto vagabundo bêbado que pegou o carro e fez merda e a ultima coisa que o policial queria no momento é lidar com a antiga... amiga?
- Fala logo o que você quer, ainda tenho que matar o Hijikata com uma nova pistola que nos entregaram hoje. – Disse o loiro entediado. No pequeno escritório do delegado Isao Kondo estava o próprio, Okita, Hijikata e ninguém menos que Nobume.
- Sougo, deixa ela falar. – O delegado respondeu sério, deixando o loiro mais tenso.
- Ao que me parece, você não está sabendo da recente morte do Isaburo – informou a azulada – e de que ele, mesmo tendo sido assassinado, está sendo acusado de corrupção.
O loiro queria demonstrar algo além de choque e pena, entretanto, nem isso conseguia. Assentiu, esperando o resto.
- Preciso da sua ajuda para inocentá-lo.
E agora o loiro não tinha idéia de por onde começar. Não, na verdade, não sabia se deveria ao menos ajudá-la. Tudo bem que ela sempre foi... uma irmã mais nova (?) pra ele, mas isso não justificava colocar sua vida em risco por causa de alguém já morto.
Caralho, o que diabos ele estava pensando? Claro que ele iria ajudá-la, como sempre fazia (mesmo não querendo). E iria fazer isso sem morrer, como sempre fez também.
Enquanto tomava um café com a azulada em uma lanchonete perto da estação de policia, o loiro se perguntava o que diabos ele fazia ali e porque diabos Nobume ainda não havia ido embora.
Os dois nunca foram de muito papo, e esse silencio entre os dois nunca tinha sido algo muito incomodo, porem, hoje, de todos os dias, logo hoje Okita não queria saber de silencio nenhum e de muito menos saber dela. Sim, ele sabia que não estava sendo um bom “irmão mais velho”, afinal, o “pai” da azulada havia acabado de morrer e ele não tinha vontade nenhuma de ficar a consolando. Talvez seja porque, até o presente momento, ela não tinha derrubado nenhuma lagrima ou se lamentado. Deve ser por isso que ele estava sem paciência pra ficar ao seu lado.
- Se quiser chorar, chore. Não tem problema chorar.
A azulada se assustou com a sentença e piscou algumas vezes antes das lagrimas transbordarem de seus olhos carmesins escuros.
O loiro suspirou e se levantou lentamente, tirou sua jaqueta e colocou em cima da cabeça da azulada. Ficou em silencio, porque não existia palavras ou atitude que a tiraria dessa dor.
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