Os olhos de minha mãe brilhavam em ansiedade. Ela andava de um lado pro outro, com passos fortes e curtos. O barulho tomava o lugar. Eram pessoas falando e criança chorando, tudo acompanhado de uma leve fumaça que saía das locomotivas. Algumas damas choravam em meio de abraços sinceros, se despedindo de seus companheiros, alguns, amantes. Outras, aguardavam impacientes o retorno dos entes queridos.
De repente se ouve o som estridente do apito. Junto vem o cheiro do carvão queimado e um tremor crescente pelos trilhos, quebrando todas as barreiras causadas pela distância.
Mamãe cessa os passos e aguarda a aproximação da máquina. Depois de visível, o letreiro anuncia com seus algarismos redondos. Locomotiva 86. Minha irmã tinha chegado.
- Ela chegou Richard! Nossa menina chegou!
Meu pai assente com a cabeça e lhe dá um beijo na testa, tirando um sorriso dela.
O trem para e logo reconhecemos a silhueta familiar de Vanessa. Minha mãe começa a acenar freneticamente com o lencinho de pano na mão. Ao nos ver, ela sai correndo ao nosso encontro, com uma das malas na mão.
- Minha mãe!! Meu pai!
Todos se abraçam felizes.
- Que saudades!! Katherine! Meu Deus! Como mudou tanto apenas em um mês?- fala me envolvendo com os braços - Trouxe tanta coisa para você! Lá tem tanta coisa bonita, tantos perfumes, tantos lenços! E os sapatos! Deus como são bonitos. Você ia adorar Kate! Paris é um encanto em forma de prazeres.
- Também estava com saudades Nessa! Tenho certeza que vai me contar cada detalhe.
- Pode contar com isso hahaha. E onde estão os meninos?
- Ambos estão em casa tendo aula de Matemática.
- Ah! Estou ansiosa pra ver os baixinhos!
- Fale isso perto de Ethan e ele te esgana. Tá se achando todo porque completou oito.
- Comprei algo que ele vai adorar!
- Só não me diga que é uma bola desse tal de Football. - disse mamãe apreensiva - aqueles muleques não param de correr por aí com bolas, chutando tudo o que vem pela frente. O Carlinhos, filho da Regina, fica se gabando pra cima do meu Diogo! Aquele mimado se acha, só porque vai no clube jogar com os janotinhas. Vê se pode!
- Fique tranquila minha mãe. Eu comprei um carrinho de brinquedo. Ele ficou encantado quando viu nas ruas o carro do Sr. Porter, quando viu o de brinquedo então...
- Menos mal.
----------------------------------------------------------
À Noite
Entrei no quarto de Vanessa e começamos a conversar empolgadas sobre as novidades e os planos para o futuro. Ela estava muito ansiosa com o noivado e com certeza, apaixonada por Edgar.
Enquanto ela se penteava em frente ao espelho e me contava as aventuras na cidade luz, eu admirava sua imagem refletida. Vanessa era tão bonita e delicada. Era o orgulho da mamãe e totalmente diferente de mim. No físico e no modo de ser. Quando menor, eu queria ser igual a ela. Minha irmã sempre foi meiga e gentil, tinha um jeito especial de tratar as pessoas e chamava a atenção por onde passava. Seus belos cabelos loiros, escorriam pelos ombros, lisos, formando uma cachoeira dourada. O nariz pequeno e arribitado, a boca pequena bem desenhada e os olhos bem grandes e castanhos. Não era de se admirar que tenha conseguido um pretendente bonito, rico e agradável como Edgar.
- E você Kate? Algum garoto misterioso na sua vida?
- Haha Os garotos tem medo de mim.
- Por que Katherine!? Você é tão bonita e inteligente.
- Talvez eles prefiram loiras como você.
- Aham sei...
- É.
- Olha se preferem, são uns bobos.Você é muito linda. Esses olhos, nem azuis, nem verdes, uma mistura de céu e mar. Quem não suspira pelos seus olhos! E essa boca cheia, suas maçãs marcadas. O seu cabelo castanho escuro é um charme, realça os olhos.
- A questão é bem maior Vanessa. Ninguém gosta de mulher que fala muito e não se submete com facilidade.
- Pois eu acho que isso não tem nada a ver. Você nem é tão falante assim. É uma menina forte, com opinião forte, mas é doce quando quer. Me lembro bem de vários rapazes vindo cortejá -la e você recusando todos. Até aquele bonitinho... como é o nome? Tyler!
- Credooo! Tyler acha que mulher só serve pra cozinhar e.. você sabe...
- Constituir uma família? Qual o problema disso Kate!? Não é pra isso que Deus nos criou?
- Não! Ele criou Eva para ser uma companheira, para Adão não se sentir sozinho. Quero que meu futuro marido confie em mim, viva junto comigo, aprenda e se aventure comigo. Quero alguém que sabe o verdadeiro significado de compania e o diferencie de submissa domesticada.
- Ai Kate... você é tão radical! Não vejo nada de errado em querer ficar em casa e cuidar da família.
- Pra quem opta por isso também não vejo, mas não sou contra a ideia de ser diferente. Sou contra a falta de opção que é nos dada, para escolher somente pela primeira forma de viver.
- Você é muito revolucionária Katherine! No entanto, torço que essas suas ideias um dia funcionem. Para o seu próprio bem.
Quando ela termina de falar, escutamos um barulho na janela.
- O que foi isso?
- Foi só o vento. Aqui venta bastante, não precisa se preocupar viu.
- Como você sabe?
- Eu... ah deixe quieto. Eu aprendi uma música nova. Quer ouvir? Eu canto ela pra você.
- Ah não, você vai me humilhar com essa voz linda que eu sei que tem.
Ignorando seu comentário, começo a cantar. Ela vai me enchotanto do seu quarto para não ouvir.
- Pode sair Kate! Eu quero dormir e de preferência sem sua voz me humilhando.
Acaba assim aquele dia.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.