História O Pacto - O resgate

Enquanto isso, na casa do Xaveco, ele andava de um lado para outro sacudindo os braços e ralhando com Melina sem se importar se sua mãe ia ou não ouvir.

- Caramba, eu não acredito que você fez aquilo com as minhas amigas! Fala sério!

- Eu só estava te protegendo...

- Me protegendo do quê?

- Elas querem roubar sua felicidade. Todos querem!

- Bah, que paranóia! Elas nem sabe do nosso segredo pra começo de conversa!

- Mas querem saber! É por isso que estão em volta de você o tempo inteiro!

- Mesmo que seja verdade, isso não é motivo pra mandar aquele bando de malucos tentar linchar as duas!

- Eu tenho que fazer o que for preciso para te proteger, querido!

- Você tá me sufocando! Poxa, me deixa respirar um pouco, respeita meu espaço!

Ela tentou argumentar, mas ele não deu tempo.

- Eu tô ficando de saco cheio desse monte de gente atrás de mim. Nem mijar sossegado eu posso mais que tem um espreitando a porta do banheiro! O Moreira vive enchendo minha agenda de compromissos e eu não posso fazer mais nada!

- Por outro lado, você é amado por milhões de pessoas, é famoso, tem o mundo aos seus pés e poderá ter tudo aquilo com que sempre sonhou.

- Sei lá, eu acho que isso tá me custando caro demais! – ele falou exasperado e sentindo saudades do tempo em que podia andar na rua livremente sem ser perseguido por uma multidão alucinada.

- É um preço pequeno em comparação a tudo o que você recebe. Como pode ser tão ingrato?

- Ingrato? Eu? Melina, eu sempre te agradeci por tudo de bom o que tem acontecido na minha vida, só que ultimamente minha vida tá virando uma loucura! Nem aproveitar mais eu tô podendo! É só trabalho, correr de fãs, tirar fotos, gravar clipes, correr de fãs, fazer entrevistas, shows, correr de fãs...

- Qualquer um mataria para estar no seu lugar.

- É porque não sabem como isso me sacrifica! Poxa, será que não tem como me dar uma folguinha? Sei lá, minha vida não precisa ser tão perfeita assim não! Eu quero poder ser como um garoto normal também!

- Não se pode ter tudo. Ou um, ou outro.

- Isso não é justo! Nem sair com meus amigos eu posso mais, tô ficando cansado disso!

Melina deu um sorriso sarcástico e o desafiou.

- Bem, e o que pretende fazer então? Essa é sua vida agora e não há mais nada que você possa fazer. Eu te darei sonhos e felicidade quer você queira ou não!

- Quer saber? Eu posso fazer uma coisa sim, olha só!

Ele pegou a moeda e ameaçou puxá-la do pescoço. A entidade só acompanhava tudo sem se alterar.

- Vá em frente então. Tire a moeda!

- Olha que eu tiro mesmo!

- O que está esperando? Basta um puxão e tudo estará acabado, inclusive sua carreira!

O rapaz apertou os lábios com força.

- Tire essa moeda e você perderá tudo aquilo que conseguiu até agora. É isso que você quer?

- ...

- Você quer voltar a ser o Zé ninguém que era antes? Quer voltar a ser o invisível que não era notado por ninguém?

- Ora, sua...

- Admita, Xaveco! Sem mim, você não é ninguém! Eu fiz de você aquilo que é agora, eu te coloquei no topo! E se você quiser permanecer no topo, vai precisar de mim!

A mão dele afrouxou e ele largou a moeda. Seu corpo tremia de raiva e impotência. Ela estava certa. Se abrisse mão daquela moeda, sua vida ia voltar a mesma mediocridade de antes. Se bem que pelo menos ele teria mais sossego. Não, ele voltaria a ser um anônimo, um perdedor... sua cabeça ficou confusa e ele não sabia para qual lado seguir porque nenhum parecia realmente bom. Nenhuma das duas vidas parecia ser boa opção para ele.

Então ele decidiu ficar com a moeda. Se era para ser infeliz, então ele preferia ser infeliz famoso, badalado e amado por milhões de pessoas do que ser infeliz sozinho, ignorado e mal amado.

- Eu sabia não teria coragem. Não se preocupe, querido! Eu farei valer a pena, juro! Sua vida será a mais perfeita de todas! Eu te darei toda felicidade que você quiser.

- Humpt!

O celular tocou, chamando a atenção dos dois. Ele quis ignorar e Melina alertou.

- É o Moreira, seu empresário. Certamente deve ter conseguido algum contrato milionário para você. Vamos, atenda! Quando a felicidade bate a nossa porta, não podemos ignorá-la!

Ainda de má vontade, Xaveco atendeu o celular.

- Que foi, Moreira? Hã? Uma entrevista ao lado da Lady Gagá? Tá falando sério?

Melina deu um sorriso vitorioso. Há alguns dias que Moreira vinha tentando entrar em contato com a cantora sem sucesso. Então ele tinha conseguido? Excelente notícia!

- Rapaz, que doido! – ele tentava mostrar alguma empolgação sendo que não conseguia sentir nada. Que ironia... tanta coisa boa acontecendo em sua vida e ele já não tinha mais ânimo para aproveitar. – Tá bom, vou esperar na porta de casa, valeu.

- Viu, querido? Por que jogar fora toda essa felicidade que está aos seus pés? Continue comigo e sua vida será sempre assim. Agora vá se arrumar. Você não pode deixar que uma cantora tão famosa te veja mal vestido desse jeito.

Como não tinha mais forças para discutir, Xaveco trocou de roupa rapidamente, arrumou os cabelos e foi esperar pelo empresário na porta da sua casa. Surpreendentemente, os fãs o deixaram passar sem causar nenhum problema. Eles mantiveram certa distância e apenas gritavam para ele, fazendo declarações de amor e dizendo palavras de incentivo. 

O carro que seu empresário mandava para buscá-lo não demorou a chegar, estacionando em frente a sua casa. Melina logo se pôs em alerta ao ver que alguma coisa ali estava errada. Geralmente o chofer descia do carro para abrir a porta para ele, o que não tinha acontecido. De repente, a porta do lado do passageiro abriu e Xaveco viu ali Mônica e Cebola.

- O que vocês estão fazendo aí... eiiii! – sem dizer nada, Mônica agarrou sua camisa e o puxou com força para dentro do carro e Cebola fechou a porta.

(Cebola) – Pé na tábua, Ivan!

Melina deu um grito furioso ao reconhecer seu inimigo no banco do motorista. Sem se fazer de rogado, Ivan pisou no acelerador e saiu dali chiando os pneus e sem dar tempo para que a multidão reagisse.

- Vocês ficaram doidos? Estão me seqüestrando por acaso?

(Mônica) – Não, seu bobo! A gente tá querendo te ajudar a se livrar dessa coisa!

(Xaveco) – A Melina não é coisa...

(Ivan) – É sim, garoto! Ela não passa de um monstro e nós vamos te ajudar a ficar livre dela!

(Xaveco) – E quem disse que eu quero ficar livre dela? Me deixem em paz, eu tô numa boa! Pare o carro que eu quero descer!

Antes que ele pulasse do carro em movimento, Mônica o segurou com força e Ivan deu um jeito de levá-los a um local ermo, perto da periferia do bairro. Cascão, Maria e Magali esperava por eles.

Pelo menos daquela vez o plano do Cebola tinha dado Certo, apesar do trabalho que Ivan teve para alugar um carro parecido com aquele que Xaveco usava e eles também tiveram que recorrer ao Franja para conseguir clonar o número do Celular de Moreira e assim poder ligar para o Xaveco sem levantar suas suspeitas. Ivan tinha conseguido imitar razoavelmente bem a voz de Moreira e tudo acabou dando certo.

- Vem, rapaz. Nós queremos te ajudar. – Ivan falou puxando Xaveco pelo braço, que se debatia feito louco.

- Vocês querem tirar minha felicidade, querem tirar tudo de mim! – um forte tapa voou em sua direção, fazendo com que ele caísse.

(Mônica) – Seu tosco, ninguém aqui quer tirar nada de você! A gente quer é salvar a sua vida, entendeu? Salvar sua vida!

- Como é que é?

Ivan fez com que ele se levantasse falou.

- Escuta o que eu tenho a te falar e escute bem. Depois disso, poderá fazer o que quiser da sua vida.

Ele contou a história da sua irmã e de várias outras pessoas que também foram vítimas de Melina enquanto Xaveco ouvia tudo entre o assombro e a incredulidade.

- É mentira! Melina não pode ter feito tudo isso! Ela é um anjo, não tá vendo?

- Um anjo? Essa coisa aí? Você está sendo iludido, rapaz! Essa forma que ela usa é uma ilusão que eu vou desfazer agora mesmo!

Melina encolheu-se e soltou um rosnado grave que assustou o Xaveco.

- Seu maldito! Você não vai tirar ele de mim!

- Cala a boca, aberração! E mostre sua verdadeira forma para ele e para todo mundo! – Ivan pegou um pequeno frasco contendo um liquido avermelhado dentro, recitou um mantra em língua desconhecida e jogou o liquido em cima dela.

A entidade deu um grito, se contorceu de dor e aos poucos foi se tornando visível para todos ao mesmo tempo em que sua verdadeira forma ia se restaurando. Quando seu verdadeiro eu foi revelado, Xaveco deu um grito de pavor, sendo imitado pelos demais. Cascão faltou pouco sujar as calças, Magali e Maria se esconderam atrás da Mônica e Cebola logo correu para pegar um pedaço de pau caso fosse necessário brigar com aquela coisa e defender a Mônica.

Aquela era a criatura mais feia que eles tinham visto em suas vidas.