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História O Paraíso que Espere - Preparativos


Escrita por: vixen

Notas do Autor


Boa leitura!

Capítulo 2 - Preparativos


Fanfic / Fanfiction O Paraíso que Espere - Preparativos

Naquele mesmo dia.

Kirk sabia que o dia de hoje seria longo. Estava preparado. Ia receber a noiva e os convidados para a arrumação do casamento – e principalmente aquele rebelde sem causa. Não parecia animado, só pronto. Isso era tudo que o Padre Joseph queria ver dele.

Lembrou-se que saiu da cama cedo, com o padre vindo lhe encher sobre um possível casamento. Foi até o banheiro e fez sua higiene completa, parando por um instante para fitar a sua cara em frente pro espelho. Abatido. Suas noites de insônia haviam se prolongado e nem ele entendia o porque. Queria tomar os velhos remédios de ansiedade que sempre lhe acompanhavam, mas se o Padre Joseph visse-o consumindo qualquer tipo de droga, seria excomungado sem aviso prévio. Isso era algo que evitava com todo o coração. Não queria largar a única família que lhe estendeu a mão após sair de casa. Imaginou como seria a sua vida se continuasse a viver daquela forma, e a primeira coisa que lhe veio à cabeça foi a imagem bruta daquele loiro do dia passado. Por que Kirk pensou nele em primeira instancia? Não entendia, só sabia que a imagem daquele homem era o melhor exemplo do que não ser na vida.

Trocou de roupa. Evitou vestir aquela batina preta, ia se vestir como uma pessoa normal – mesmo no convento. Pôs uma camisa social preta e uma calça qualquer, além de sapatos limpos, que nunca foram descuidados. Desceu as escadas e, para a sua surpresa, o local estava cheio. Nunca havia visto tanta gente naquela igreja, nem mesmo nos dias de missa. Procurou pelo Padre Joseph, mas o velho não se encontrava ali dentro.

 

- Me ajude aqui, garoto! – disse alguém segurando um dos bancos pesados da igreja.

 

Kirk correu até a sua direção, ajudando-o. Puseram o banco de mais de dois metros de cumprimento do outro lado, perto dos santos de mármore. O garoto pode finalmente olhar nos olhos de quem havia ajudado e percebeu que se tratava do mesmo loiro pecador que “conheceu” no dia passado. Desta vez o loiro estava um pouco arrumado - e desleixado, como sempre. Vestia a mesma jaqueta de couro, uma camisa que devia ser preta, mas aparentava ser cinza, e uma calça jeans, sem nenhum rasgo. Fitou o homem por um bom tempo.

 

- Ajude-me com essa decoração. – disse o loiro, apontando para a entrada da igreja.

 

Kirk concordou em ajudar, anotando mentalmente que precisava melhorar o seu físico, pois não aguentava levantar tantos bancos em um dia só. No começo, era acostumado a ter que arrumar a missa de domingo, mas isso acabou mudando quando ele feriu gravemente suas costas, fazendo com que o Padre Joseph tivesse piedade sobre o seu estado e parasse de explora-lo – até então.

Saíram para fora da capela e viram que havia muita coisa para decorar a parte de dentro. Começaram a arrumar tudo com graça, mesmo não próximos. O loiro dizia que não precisavam de tantos bancos como os que a igreja disponibilizava, afinal, poucas pessoas comparecerão à cerimonia, e muitas comparecerão à festa.

 

- Onde vai ser a festa? – perguntou Kirk, quebrando a barreira do silencio formada entre os dois.

- Aqui. – respondeu o loiro, segurando um dos bancos.

- Aqui?

- Atrás da igreja, ora. Vocês tem um enorme campo e um grande galpão que dá para fazer a festa.

- O nosso galpão não é tão luxuoso assim.

- Por isso estamos decorando-o.

 

Essa resposta fez Kirk concordar. Sabia que o enorme galpão atrás da igreja era sujo, fedido e deselegante. Como alguém irá transforma-lo em um salão de festas era uma boa pergunta; Principalmente porque a participação virá dele.

Ajudou o loiro a decorar os bancos com fitas brancas no tapete vermelho, que haviam depositado ali, próximo do altar. Arrumaram as cadeiras onde os padrinhos irão se sentar, além de organizar o altar que o padre daria a benção. Aquele serviço parecia ser interessante e frustrante para alguém que nunca tinha visto como um casamento era feito. Kirk sentiu que a pior parte foi ter que arrastar algumas estatuas de santo para o canto da janela, onde ninguém os veria,

 

- Porque querem esconder os santos? – perguntou ele.

- Nada religioso.

 

“Como assim ‘nada religioso’? Vocês estão casando numa igreja”, indagou.

A cada momento ao lado daquele loiro suspeito, percebia algo novo em sua aparência. Ele era bem alto, mas não o suficiente. Tinha o cabelo proporcional ao seu tamanho, além de combinar com a sua pele bronzeada. Havia trocado de roupas. Usava roupas estranhas e parecia usar aquela mesma jaqueta há anos. Imaginou se tratar de um motoqueiro, ou aqueles punks de rua. Aqueles mesmos punks que atacam a igreja sempre que passam por perto. Já houve casos de atirarem pedras nas janelas durante as épocas festivas. Sem causa.

O que faz o loiro querer se casar em uma igreja era uma pergunta bruta a se fazer.

Ele deve estar sendo arrastado pela mulher, que aparenta ser muito religiosa. Com certeza estava aceitando isso por ela. Como disse para o moreno agora pouco, havia se esquivado da igreja e não frequentado mais. Então, não há outro motivo para estar em um lugar como este sem ser por ela. Também indagou como um homem estranho como ele havia encontrado uma mulher tão meiga e animada com aquela. Os opostos realmente se atraem? Ou isso não passa de uma conspiração física sobre o positivo e o negativo? Kirk não conseguia responder; Odiava física mais que tudo.

Ao terminarem de arrumar a igreja, descansaram por um momento rápido, bebendo água.

 

- Vocês tem vinho aqui, certo? – perguntou o loiro, com uma expressão ridícula.

- Temos.

- Pode me dar um pouco?

- Eu não sei onde o Padre Joseph guarda.

- Ele esconde de vocês?

- Acho que sim...

 

Enfim, Kirk consegui compreender o que aquele loiro havia dito. Achou aquilo ofensivo, além de estupido para perguntar.

Saíram de lá pela parte de trás, visando passar pelo enorme terreno da igreja e irem para o galpão, do outro lado. O velho galpão, que por muito tempo foi esquecido pela paróquia, havia ganhado vida pela primeira vez no ano, quando ambos abriram suas quatro enormes janelas, dando um ar diferente para o lugar. Estava todo empoeirado. Kirk ouvia boatos de que muitas pessoas moraram lá antes de construírem a igreja, e isso era algo que ele não queria imaginar. Quem moraria num mausoléu como aquele?.

 

- Já usaram esse lugar como salão de festa antes? – perguntou o loiro.

- Não. Na verdade, nunca usamos pra nada.

 

O homem deu os ombros. Não parecia estar preocupado com o tanto de coisas que teriam que limpar, o chão que teria que varrer, nem as teias de aranha que teriam que aspirar. Na verdade, estava no seu humor mais pleno, irradiando confiança; Algo que Kirk invejava a cada instante.

O loiro começou arrastando os bancos velhos e algumas estatuetas que encontravam-se no caminho, junto ao moreno, que tratou de achar uma vassoura. Ao voltar, viu o homem de costas para a enorme porta do galpão, agachado, como se procurasse por algo. Kirk deu alguns passos para ver o que havia acontecido e viu-o levantar-se rapidamente, voltando-se e falando:

 

- É seu? – perguntou, apontando para um anel velho e sujo que encontrou no chão.

- Não... – respondeu Kirk, chegando perto do objeto. Ele era tão brilhante e bonito, e mesmo depois de tanto tempo sem alguém vê-lo, parecia novo. – Mas eu posso achar o dono. – disse, pegando-o e pondo no seu bolso.

 

Poderia ser um anel importante de um padre antigo. Ou poderia ser do Padre Joseph – o que era impossível. O Padre Joseph condenava o uso desses objetos. Dizia que o único que podia usar eram os cardeais do papa, além dos supremos. A única coisa que podia usar naquele convento era o velho crucifixo no pescoço, simbolizando sua devoção completa. Kirk evitava usa-lo em publico. De alguma forma, sentia vergonha de falar o que era. As pessoas costumavam concilia-los como fanáticos religiosos, e isso era algo que ele batalhava para mudar.

Com a vassoura em mãos, Kirk começou a varrer toda a poeira do chão, espirrando feito doido, dada as condições de sua rinite, chamando a atenção do loiro.

 

- Hey, garoto, - disse ele. – não precisa fazer isso se não puder.

- Não se preocupe, eu consigo. – afirmou o moreno, levantando seu polegar.

 

Em dez minutos o filipino conseguiu varrer toda a poeira do chão para fora daquele salão, sentindo um alivio momentâneo. Ao voltar, viu que faltava tirar toda aquela teia de aranha do teto e dos poucos moveis que ali estavam.

 

- Tem certeza que se decorarmos vai ficar bom? – perguntou o moreno, desacreditado.

- Se não ficar legal, eu processo os decoradores.

- Que decoradores? Nós somos os decoradores.

- Não. Eles são os decoradores. - O loiro apontou para fora do galpão, onde quatro carros estavam estacionados do outro lado do campo. Próximo do carro estavam muitas pessoas. Na maioria, mulheres que aparentavam ser de classe alta. Decoradores profissionais. Os melhores decoradores profissionais. - O trabalho deles é decorar e o nosso é limpar, por enquanto.

 

Kirk deu os ombros. Não podia imaginar que alguém como ele fosse rico. Na verdade, acreditava que aquele cara poderia ser, no máximo, filhinho-de-papai que herdou uma enorme herança e não sabe como gastar a própria grana – pois não imaginava alguém como ele trabalhando duro, como a maioria dos milionários faziam.

Mas onde estaria a esposa dele que o moreno não viu-a em nenhum lugar? Por que só o loiro estaria aqui ajudando na limpeza sem sua presença? Estaria ela ajudando em outra coisa?. Kirk chegou a conclusão que isso não era de sua conta, e que o trabalho sairia de melhor forma se não questionasse nada.

A verdade é que ficava difícil não questionar algo com um cara diferente como aquele arrastando moveis e planejando transformar um galpão nojento em um salão de festas. Ele parecia ser exagerado e perfeccionista, afinal, é rico. Quanto será que deve ser o patrimônio deste homem? Altíssimo. Por que ele não procurou um lugar mais bonito e aconchegante do que uma igreja rural, certo? Ou ele é humilde e a esposa dele gosta de um lugar assim?

Ao terminarem de limpar todo o salão, ambos saíram para fora e fizeram um sinal para que os decoradores entrassem para arrumar o lugar do jeito certo. O loiro e o moreno tiveram um tempo de descanso, esperando não voltarem para aquele lugar até estar do jeito que esperavam. Sentaram-se na escadaria da igreja, na entrada principal, onde a noiva iria entrar no dia combinado e passar pelo tapete vermelho. O lugar não estava mais tão cheio. O foco foi totalmente direcionado ao galpão do outro lado do campo.

 

- Por que escolheram este lugar? – pergunta Kirk, enfim.

- Deanna gosta do campo. Ela disse que sempre quis fazer uma festa num lugar tranquilo como este e nunca imaginamos fazer isso no casamento.

- Gosta do campo?

- É melhor que o palácio que ela tinha escolhido por primeiro.

 

“Palácio. Quem trocaria um palácio por uma fazenda?”, pensou.

 

- Escolha arriscada. – comentou o moreno.

- Com certeza.

 

Quando Kirk achou que essa situação não poderia ser mais estranha, o loiro tira uma garrafa pequena de whisky do bolso da jaqueta, bebendo-a em seguida.

 

- Você bebe? – perguntou.

- Não.

- Por que padres só bebem vinho?

- Por que o vinho simboliza o sangue de...

- Eu sei o que simboliza, só perguntei brincando.

 

O moreno ficou quieto, era muita coisa para digerir. Um homem bebendo em frente a uma igreja já era o suficiente. E que mal havia, afinal? Podia apostar que aquele casamento seria regado a bebidas e qualquer outra coisa que não tivesse envolvimento com o convento. Podia sentir que aquele homem tinha o dom de mudar qualquer ar santo em um lugar impuro.

Seus pensamento sobre o casamento  modificaram-se, ao ver que aquele loiro, mesmo do seu lado, lançava olhares misteriosos em sua direção. Era algo que não compreendia, e tinha medo de compreender. Kirk sentia-se orgulhoso por ter se livrado de certos desejos da carne, desejos que não havia conhecimento. Sabia que tinha vícios e vontades, o que ignorava constantemente.

 

- O que você faz além de ficar aqui dentro? – pergunta o loiro, bebendo de sua garrafa minúscula.

 

Essa pergunta soou dificultosa. Nem Kirk sabia o que fazia sem estar ali dentro. Mais de 70% do seu dia era dedicado à igreja. E o que fazia com os outros 30%?

 

- Acho que eu fico estudando... – respondeu o moreno, tímido.

- Estudando? Você não tem cara de estar na escola.

- Não estudo na escola. Estudo aqui.

- Entendi. Você fica aqui na igreja estudando coisas sobre a igreja.

- Basicamente isso.

 

Kirk não sentiu-se ofendido com isso. Ele sabia que era verdade. Dedicava tanto tempo para o convento que esquecia de si próprio. Se lembra de como era dedicar sua vida 100% para o seu deleite, e foi um desses motivos que o fez largar essa vida.

 

- Quantos anos você tem mesmo, garoto? – perguntou o loiro.

- Dezessete.

- Ah, sim. Já deve ter largado o ensino médio.

 

Kirk confirmou e o loiro se voltou para a sua direção, encostando-se no pilar que sustentava a entrada da igreja.

 

- Eu fico te chamado de ‘garoto’ sem motivo. – disse ele. – Nem sei o seu nome.

- Kirk... me chame de Kirk.

- Certo, Kirk. Sou o James.

- James? – perguntou o filipino, desacreditado. – Seu nome não é Andrew?

- Não. Andrew é aquele cara ali. – disse, apontando para um ruivo do outro lado do campo, próximo ao galpão.

- Você não vai se casar com a Deanna?

- Me casar com quem? Deanna é minha irmã.

 

Kirk entendeu quem era aquele loiro estranho. Não se tratava do noivo, e sim o irmão esquisito daquela mulher simpática.

 

- Achei que vocês iam se casar.

- Acredite, eu não casaria com a Deanna nem pintada de ouro. – comentou, ironicamente.

- E quantos anos você tem?

- Vinte e quatro.

 

“Sete anos mais velho. Não parece”. Kirk não riu por pouco ao imaginar que aquele homem parecia ser mais criança do que ele próprio.

 

- Você vai ao casamento, certo? – pergunta o homem.

- Eu? Bem...

- Vai ser legal. Deanna gosta de conhecer pessoas novas, e você parece ser um cara interessante.

 

“Um cara interessante” isso ecoou na mente do moreno. Nunca ouvira isso de alguém, nem mesmo de seus pais. Não achava-se uma pessoa legal ou agradável, e acabou concordando com esta afirmação, sorrindo simpaticamente e corando lentamente.

O moreno enfim entendeu que aquele cara não era uma ameaça, muito menos alguém que estragaria a festa. Era alguém agradável, interessante e, deveras, misterioso. Kirk refletiu que julgou o loiro de má forma.

 

- Acho que eu te julguei mal. – comentou o moreno.

- Todos fazem isso, garoto. – respondeu James, o loiro. - Você não é o primeiro a me julgar mal.

 

Aquilo foi o suficiente para Kirk calar-se e aproveitar o momento de descanso. Viu que ele ainda bebia daquela garrafa minúscula de whisky e pensou em pedir um gole, mas tais pensamentos foram cortados por um chamado irritante.

 

- KIRK, CORRA AQUI! – gritou o Padre Joseph, assustando o garoto.

- Acho que estão te chamando. – diz James, apontando para dentro.

- Também acho. – disse Kirk.

- Eu espero você chegar.

 

O comentário foi inocente, partindo de alguém tão rude. Kirk imaginou que talvez tivesse um duplo sentido, afinal, porque ele esperaria?. Deu os ombros e entrou na igreja, completamente mudada com as decorações delicadas em branco e vermelho. Passou pelo tapete no meio do salão e foi até o altar, afim de encontrar o padre superior que exclamava o seu nome a cada instante.

 

- Padre Joseph?

- Venha aqui, garoto. – disse o padre, próximo da escadaria que dava para o segundo andar da igreja.

- Aconteceu alguma coisa?

- Os decoradores disseram que a decoração não é o suficiente para a parte de fora. – respondeu o padre superior, apontando para o pouco de flores que havia próximo da saída. – Vá até a loja e compre mais.

- Onde fica a loja?

- No centro.

- No centro?

- Sim, no centro.

 

“Droga”, pensou o garoto.

 

- Como vou chegar ao centro se não sei dirigir?

- Arranje alguém que saiba. Estamos com pressa.

 

Kirk ficou decepcionado. Além de não estar com vontade de sair, estava questionando mentalmente o motivo do padre ter lhe chamado justamente para fazer tal serviço. O garoto não estava sendo pago para ajuda-los, na verdade, fazia tudo de graça para a alegria de pessoas que nunca viu na vida. Acabou tendo que dar os ombros para essa convocação. Saiu da igreja e viu o loiro sentado na escadaria, lembrando-se da última coisa que ele disse.

 

- Você sabe dirigir? – perguntou o filipino, inocentemente.

- Sei. – respondeu o homem, se levantando e indo na direção do garoto.

- Os seus decoradores falaram que está faltando algumas coisas, a gente tem que ir buscar.

- Acho que eu sei o que está faltando. – comentou James, pondo as mãos no bolso. – Vamos lá.

 

“Vamos?” pensou, “então vamos”. Primeira vez que saíra da igreja sem a companhia do padre superior. Sentia-se emancipado, livre e, ao mesmo tempo, abandonado. Só não estava completamente abandonado pois teria a companhia daquele homem engraçado.

Atravessaram a rua estreita da pequena igreja e foram em direção ao carro azul-marinho estacionado. Era um Ford Mustang Mach 1970, Kirk identificou com facilidade, afinal, este era o sonho de consumo de seu pai, quando morava em casa. Sentou-se no banco do carona, ao lado do motorista, em seguida, pondo os cintos de segurança. Havia anos que não saia com alguém em um carro. A sua última viagem foi feita em um ônibus e não durou muito tempo.

James se sentou, ligando o motor rapidamente. Kirk percebeu que o loiro não pôs o cinto de segurança, ficando surpreso. Não indagou, sabia que alguém como ele era totalmente imune à trágicos incidentes. Saíram de lá em alta velocidade. Há tempos não experimentava estar apreensivo e com medo de alguma tragédia. Aquele homem realmente não tinha a cabeça no lugar.

 

- Você sabe onde ir? – perguntou, se segurando no banco.

- Sei. Não é muito longe.

 

Deixaram a área rural da cidade e penetraram rapidamente pela cidade de San Francisco, onde teriam que cumprir a missão para o casamento ocorrer sem problemas. Passaram a ponte Golden Gate, e o loiro não diminuiu a velocidade um momento sequer. Kirk queria entender onde ele tirava tanta confiança das mãos. Não demonstrava nenhum resquício de medo ou receio do que estava fazendo, e aquilo preocupava o filipino.

No meio da viagem, seu medo não tornou-se constante. Kirk tirou aqueles poucos momentos para observar como a cidade havia mudado. Não sentia o cheiro do motor dos carros ou do asfalto quente há muito tempo. Aquela sensação lhe trazia a velha nostalgia – uma nostalgia maldita. Tentava esquecer e, ao automaticamente, relembrar, pelo fato de existir boas lembranças.

Chegando ao destino combinado, James estacionou o carro com maestria, calando a boca do filipino medroso que amaldiçoou-o em toda a viagem. Desceu do veículo e respirou fundo, aliviado por não estar mais ali. Atravessaram a rua e entraram na loja de decorações do outro lado. Passando pela porta de vidro com detalhes de madeira, seus olhos foram invadidos pela visão mais pura que já havia visto na vida. Era uma loja muito detalhada e bonita, além de fina. Não tinha nada que não fosse branco naquele local, além das atendentes e dos móveis. Flores brancas, tapetes brancos bordados, lembranças em branco e até vestidos de noiva enfeitavam absolutamente tudo. Nem a igreja de sua paróquia era tão fina e delicada.

 

- Boa tarde, Sr. Hetfield. – disse uma das moças, vindo em sua direção com um enorme sorriso, como se estivesse vendo um magnata ou alguém realmente importante.

- Boa tarde, Jill. – respondeu o loiro, correspondendo o sorriso. Aquele foi um dos poucos momentos onde Kirk pode ver aquele homem sorrindo.

- Aconteceu alguma coisa?

- Aquilo que combinamos. Os almofadinhas dos decoradores querem mais materiais.

- Ah, sim, conversamos sobre isso. Deixamos algumas peças separadas caso vocês precisem.

 

A mulher deu meia volta, indo até a outra parte da loja, entrando em uma porta, fazendo ambos esperarem.

 

- Onde carregaremos os materiais? – pergunta Kirk.

- Tem bastante espaço nos bancos de trás.

 

Kirk deu os ombros. Sentia-se incomodado com a acomodação dele para com coisas importantes. Se o moreno estivesse no lugar do loiro, muito provavel as coisas seriam diferentes. Não seria tão desleixado, nem desinteressado em um momento tão importante quanto o casamento de sua irmã.

A moça ruiva voltou com um carrinho de compras cheio de objetos de mármore, coisa realmente fina – coisas finas demais para serem carregadas em um carrinho de compras. Kirk observou cada objeto e chegou a conclusão de que não poderiam carregar tudo aquilo no banco de trás do carro. Era necessário mais um uma viagem para tudo aquilo ser levado para a igreja.

As peças eram uma mistura de estatuas gregas e fontes de mármore que a mulher explicava para ambos como funcionava. “Uma fonte de chocolate, coisa de rico” pensou. Uma das fontes era de água e coberta de flores lilás. Kirk estava apaixonado pela decoração minimalista daquela peça.

 

- Me ajude a carregar. – disse James, dando uma cotovelada em sua costela.

 

Kirk sentiu a pontada, e correu para ajudar o homem a levar aquele carrinho até o carro. Mal podia imaginar que o carrinho era muito pesado, do tipo que carregava pelo menos 150kg só de mármore com porcelana. Atravessaram a rua com dificuldade, enquanto James ia na frente, abrindo o porta-malas do carro para colocarem as peças mais leves. Depositaram todas enroladas em uma toalha grossa, para que não quebrassem no meio do caminho. Fecharam o porta-malas e partiram para os bancos de trás, depositando delicadamente as peças maiores com cuidado.

Ao terminarem, Kirk pode finalmente respirar aliviado pelas decorações terem acabados, pois pareciam intermináveis. Este dia havia sido o de maior peso para o garoto. James aparentava estar satisfeito e irradiava confiança ao pegar a estrada novamente, fazendo Kirk tremer ao se sentar no banco do carona para mais uma viagem tortuosa ao seu lar. Desta vez foi um pouco diferente, James havia posto o cinto de segurança e não corria tanto. Parece que a responsabilidade bateu na porta daquela cabeça oca.

Enquanto dirigia lentamente pela rodovia, James arrancou outra pequena garrafa de whisky do bolso, abriu-a e bebeu. Mais uma infração. Kirk preferia ver aquele homem sem cinto de segurança do que bebendo no volante. Quando achou que poderia ser alguém responsável, foi pego de surpresa.

Chegaram na área rural com segurança, sem medo. James virou à esquerda da rodovia e entrou em uma pequena estrada de asfalto velho, que dava para a parte da igreja. Conseguiram chegar aos campos gerais da pequena fazenda que o Padre Joseph administrava com os líderes da paróquia, além da pequena população caipira da região.

Em um momento rápido, ouviram um enorme estouro vindo da parte de trás do carro.

 

- O QUE FOI ISSO? – exclamou Kirk, assustado.

- Droga... – disse o loiro, desacelerando o carro.

 

Ao parar no acostamento da pequena rua, James desligou o motor e desceu do veículo, seguido por Kirk, que não sabia o que estava acontecendo. viram o pneu esquerdo dilacerado. Aquilo foi o suficiente para fazer o loiro se irritar por completo, chutando a roda com força, demonstrando nervosismo. Kirk olhou para trás e viu uma pedra pontiaguda no meio da estrada – o motivo para estarem ali, parados.

 

- E agora? – perguntou o moreno.

- Eu não tenho nenhum outro pneu aqui.

- A igreja fica à uns 15km daqui.

 

James estava inconsolável, parecia indignado com a situação. Sabia muito bem como era seu psicológico quando não tinha o controle de tudo, e isso incomodava-o demais. Kirk, observando suas atitudes, preocupava-se com a situação do ‘novo colega’. Não sabia o que fazer, então, teve que se arriscar ao dizer:

 

- Quer que eu vá na igreja e buscar algum pneu?

- Não, não precisa. – respondeu o loiro. – Vou estragar a minha roda, mas não vou me render à uma merda dessa.

 

James entrou rapidamente no carro, ligando-o em seguida. Kirk, desacreditado, se sentou no banco do carona, duvidando do que aquele homem ia fazer. O loiro acelerou, fazendo um enorme barulho na parte de traz do automóvel, sentindo sua roda sendo raspada pelo asfalto mal feito na estrada. Continuou a acelerar, querendo chegar o mais rápido possível, enquanto Kirk torcia para o pior não acontecer. “Esse cara é louco!” pensou. Quem, afinal, acelera o carro com a uma dos pneus traseiras em falta? James Hetfield, o nome do maluco.

Chegando em menos de dez minutos na igreja, foram ovacionados pelos olhares de todos no lugar. O Padre Joseph mal pode acreditar que Kirk no carro barulhento ao lado daquele herege que atendia como James. Ambos desceram do veículo juntos, indo até a porta da frente da igreja, passando pela pequena escadaria.

 

- O que houve? – perguntou o padre superior.

- Um erro mal calculado, eu diria. – respondeu James, irônico. – As decorações estão lá. Peça para os mauricinhos dos decoradores irem buscar.

 

Neste momento, Kirk pode entender o temperamento daquele homem, sentindo não ser o suficiente.


Notas Finais


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