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História O que não foi dito - Heróis


Escrita por: Cookiezin

Capítulo 4 - Heróis



A porta abriu-se com um leve rangido e o homem alto entrou na sala. Estava exatamente igual desde que ele se conhecia por gente: as paredes amarelas, o chão quadriculado, as macas dispostas ao longo do recinto e cortinas para privacidade. De fato, talvez a única coisa que mudara fosse seus habitantes.
    Neville viu ao decorrer dos anos pessoas irem e saírem, algumas mais rápido que outras, nenhuma realmente curada. Aquela não era uma sala de esperança, longe disso. E o moreno tinha aprendido isso com os anos, toda vez que ia visitar os pacientes mais velhos dali: seus pais. 
    Coçou uma cicatriz na lateral da cabeça, parado ao pé da primeira cama. As cortinas das últimas estavam fechadas, como de costume. Era só ele dar alguns passos até lá e veria o rosto deles. Não expressariam nada com seus olhos desfocados, estariam sérios, com roupas azuis iguais. 
    Não se lembrariam dele. 
    "Ah, Neville! Que boa surpresa" disse a sempre gentil enfermeira que cuidava de seus pais. "Não recebi notícias de sua avó, estive imaginando se..." e parou, de repente. 
    "Eu estou bem, Mel" sorriu, olhando-a. Agora ele era muito mais alta que moça, que beirava seus cinquenta anos. "Algumas cicatrizes e nada mais."
    Sorrindo fraco, Melissa assentiu com a cabeça. 
    "Meu irmão perdeu a filha. Ela... ela estava lá, talvez até a conhecesse."
    Neville assentiu com a cabeça, tristemente. 
    A guerra tinha acabado, mas deixara muitas marcas. Uma semana foi o que se passou desde o último conflito. Até então estivera na casa da avó, por vezes indo até a Toca, onde os tristonhos Weasley viviam. Seu amigo, Harry, e sua amiga, Hermione, também faziam visitas. A amiga fora atrás de seus pais, enquanto que Harry estava no Caldeirão Furado. Molly tinha insistido para que ficasse com eles, mas Neville sabia e entendia que Harry queria lhes dar um espaço. Perderam Fred. Ele faria o mesmo. 
    E, desde aquele dia em que bravamente lutara em Hogwarts, ainda não tinha tido coragem de ir ver os pais. Sua avó mandou que fosse contar a eles como tinha sido corajoso. Dissera que seria bom para eles. 
    Entretanto, Neville não saberia dizer se eles escutavam ou compreendiam alguma coisa do que ele falava. 
    "Não precisa ter medo" sussurrou Mel "eles vão te ouvir" e deu um aperto carinhoso em sua mão. Depois se afastou para a cama em que seu antigo professor de Defesa Contra as Artes das Trevas estava. 
    Suspirou, tomando coragem, e andou até eles. Abriu o cortinado com cuidado, fechando-o logo em seguida. Observou-os olharem para ele, as faces inexpressivas. 
    Os cabelos de sua mãe precisavam urgentemente de um corte. O pai tinha rugas a mais nos cantos dos olhos. Os dois ainda usavam suas alianças. 
    "Oi mãe. Pai" cumprimentou, hesitante. "É um... dia muito bonito"
   Sua mãe se levantou devagar e ficou de pé, parada, encarando-o. Ignorando aquela sensação estranha que sempre tinha quando seus pais ficavam olhando para ele em silêncio, sorriu para a mulher e foi se sentar na cadeira ao lado da cama de seu pai, que o seguiu com os olhos.
    Suspirou, trêmulo. 
    Estava cansado. Não dormia bem fazia, talvez, quase um ano. Imaginava se eles dormiam direito ou se não percebiam nem isso. Talvez nem mesmo fizessem distinção de estar dormindo ou acordado. 
    "Vovó disse que seria bom se eu viesse falar com vocês. Vocês sabem... bom, provavelmente não sabem, mas... teve uma guerra. Foi... foi horrível, mãe. Perdi... perdi alguns amigos..."
    Parou, se sentindo tolo. Era como se ele estivesse falando com uma parede. Sentiu raiva; para quê exatamente falaria para eles que tinha sido corajoso? Não sentiriam nada, nem o menor sinal de orgulho!
    "Eu sou idiota" riu amargo "vir até aqui só porque a vovó pediu para que eu o fizesse; dizer a vocês coisas que não entendem só para que vovó fique feliz. Eu sou uma idiota"
    Coçou a cicatriz novamente, erguendo os olhos que abaixara para o tapete. Os dois ainda o olhavam, sem expressão. Suspirou alto, sorrindo amarelo. 
    Por vezes imaginou que um dia eles estariam curados. Acordariam numa segunda-feira, se levantariam espantados de suas camas e abririam as cortinas; ao olhar para a enfermeira, surpresa, perguntariam onde estavam. E depois iriam atrás dele, para abraçá-lo e dizer o quanto o amavam. 
    Por outras imaginou que seria muito mais fácil se morressem. Afinal, era como já estavam. Eles estava mortos, mas continuavam respirando, o coração batendo, o sangue circulando quentes pelas veias. 
    Quando, uma vez, disse em voz alta seus pensamentos a sua avó, ficou de castigo as férias inteira. "Onde já se viu! Um menino falar uma coisa dessas! Seus pais estão vivos, menino, eles estão!"
    Nunca mais tornou a comentar o ocorrido. Sua avó sofria demais por causa do filho. Ela não mostrava, não dizia; mas Neville sabia bem. Toda noite antes de se deitar a velha folheava um velho álbum e derramava umas poucas lágrimas.
    "Eu lutei bravamente, sabem. Por vocês e meus amigos. Matei a cobra, com a espada da grifinória. Ela apareceu para mim, no chapéu seletor. Como um verdadeiro grifinório" continuou o moreno. Sua voz foi abaixando até se extinguir. Os pais ainda o encaravam. Não havia nada. 
    "Machuquei feio a cabeça" riu, apontando para a cicatriz "mas foi só isso. Eu... não matei ninguém além da cobra, entendem. Eu não acho que teria..." parou de novo, os olhos marejados. 
    Suspirou profundamente e se levantou da cadeira, pronto para mais uma vez ir embora.
    "Eu espero que estejam bem" caminhou até a pai, lhe dando rápido abraço, não obtendo reação; foi até a mãe, repetindo o ato. Observou os dois. Eram um casal muito bonito. 
    Sorriu de novo e depois fechou a cortina. Saiu depressa da sala, desceu as escadas e saiu do St. Mungus, o ar quente batendo em seu rosto. 
    Observou os trouxas. Duas mulheres próximas a ele olharam-o com cobiça. Depois seguiram seus caminhos, soltando risadinhas abafadas. 
    Encostou num poste, imaginando que devia estar feliz por ser olhado finalmente, após tantos anos de feiura. Tornara-se, afinal, um homem bonito. Estava muito parecido com o pai. Sua avó vivia dizendo em como se assemelhava a ele quando o pai tinha sua idade. 
    O sol já se punha. Fechando os olhos com o incomodo da luz, decidiu visitar Rony e sua família. Harry devia estar lá, Molly avisara que ia fazer almôndegas. 
    Caminhou lentamente pela calçada, sentindo-se menos herói do que sentira no começo do dia. Não era um herói como sua avó costumava dizer. Harry o era. Rony o era. Hermione era.
    Tirou esses pensamentos da cabeça e olhou para trás antes de virar a esquina. Ali eles estavam, os seus heróis. E eles viviam ali porque foram heróis de verdade. 
    Imaginou, por um segundo, ao finalmente virar sua cabeça para andar direito até o beco de onde aparataria, o que aconteceria se agora eles acordassem. Eles iam olhar um para o outro, finalmente alguma coisa naqueles olhos, e perguntariam o que estava acontecendo. E então, ao regressar para casa, imensamente tristes, chamariam-no de herói. E finalmente Neville poderia o ser. 
 



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