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História O Serviço de Entregas do Baekhyun - Cuidado: bruxo em treinamento


Escrita por: YOUGOT7JAMS

Notas do Autor


OLÁAAAAAAAAA 💜
Quem é vivo sempre aparece, certo?
Resolvi participar e escrever uma fanfic para esse Halloween, então acabei misturando duas paixões num só plot: chanbaek e Studio Ghibli. Para quem não conhece o filme no qual essa fanfic é inspirada (O Serviço de Entregas da Kiki), é uma animação japonesa muito fofinha, do mesmo cara maravilhoso que fez A Viagem de Chihiro.
Queria agradecer também a Nat, a pessoa maravilhosa que betou essa fic e me deu ótimas dicas. Muito obrigada mesmo, gatinha 💕
Espero que esse amontoado de palavras possa arrancar alguns sorrisos de vocês :)
Boa leitura!

Capítulo 1 - Cuidado: bruxo em treinamento


Fanfic / Fanfiction O Serviço de Entregas do Baekhyun - Cuidado: bruxo em treinamento

Eu odeio telhados.

E quando um garoto normal diz que odeia telhados, provavelmente deve ter caído de um alguma vez na vida. Ou talvez não se trate de um garoto normal, e sim de um bruxo – com direito a vassoura voadora, gato preto e tudo mais – ainda em pleno desenvolvimento de suas habilidades mágicas. O que significa que há uma grande probabilidade de que eu tenha alguns traumas relacionados a telhados, torres elétricas e aves silvestres, justamente por não saber voar como deveria.

A grande verdade é que não sou nenhum Harry Potter. Nem sequer tenho uma capa e uma varinha, fato que já não me categoriza como um dos bruxos mais queridinhos da galáxia. Pessoas como eu jamais apareceriam no especial de Halloween da revista Rolling Stone. No máximo, estourando, numa matéria sobre objetos voadores não identificados no jornal da tarde.

Quando eu tinha apenas seis anos, vi o meu balde vermelho começar a flutuar no meio do parquinho. Saí correndo como toda criança que se preze, sem saber que estava com medo de mim mesmo. Só percebi que havia algo realmente esquisito quando, no meu primeiro dia do fundamental fiz meus materiais escolares levitarem por acidente, e acabei sendo repreendido por “fazer magia negra”.

Mas que bando de poser. Magia nem cor tem, cara.

A primeira coisa que fiz quando descobri toda a verdade foi perguntar à minha mãe se era possível colar na prova de matemática sem ser descoberto. A coitada acabou estragando a poção na qual trabalhava com tanto afinco, e isso lhe rendeu um cabelo chamuscado por quase duas semanas.

— Baekhyun — ela dissera, inflexível, mexendo a colher em seu caldeirão mesmo depois do troço ter explodido em chamas. — Se você não estudar para a prova, não tem magia que dê jeito.

Ela estava certa. Mesmo tendo algumas habilidades especiais, eu não era nenhum Super-Homem com visão de raio laser, mas minhas notas ficaram tão vermelhas quanto a cuequinha ridícula do sujeito.

A minha lista de habilidades crescia cada vez mais, embora eu achasse que podia muito bem ser uma baita vergonha para as minhas queridas ancestrais de Salem. A maioria delas era bastante... inútil, posso assim dizer.

 

- Voar numa vassoura (90% de risco de acabar colidindo com um pássaro ou um telhado);

- Preparar poções medicinais de nível intermediário;

- Calar a matraca alheia (útil, muito útil);

- Levitar objetos com peso inferior a 2kg;

- Aumentar ou diminuir a temperatura de substâncias líquidas;

- Fazer as pessoas tropeçarem (nada útil, porém divertido);

 

Caminhando sobre um telhado quebradiço da minha nova cidade, eu carregava uma vassoura quebrada enquanto buscava, com a ajuda do meu fiel companheiro felino, o endereço anotado no meu bloquinho. Era a terceira vassoura destruída naquela semana, e meu sexto cliente em quase um mês de trabalho.

Como manda a boa tradição, fui praticamente enxotado da casa dos meus pais quando completei dezessete anos, para viajar até uma cidade desconhecida e aperfeiçoar a minha magia. Precisei fazer um acordo com a dona de uma padaria, para que me deixasse morar temporariamente em um sótão em troca de realizar um serviço de entregas, além de ajudar os correios da região a fim de ganhar alguns trocados. Apesar de ter partido de casa apenas com uma vassoura, um gatinho endiabrado e uma mochila pequena, não fui nenhum idiota de me arriscar nos ares de Seul. Vim de metrô mesmo, parceiro.

E naquela noite, vasculhando todos os telhados à procura de um bendito endereço desconhecido, acabei por me sentar na beirada de uma casinha modesta, repondo as energias que gastei naquela busca exaustiva.

— Acha que sou tão ruim assim? — perguntei a Kyungsoo, que lambia as patinhas de um modo indiferente, erguendo os olhos felinos em minha direção.

Olha, ele disse num falso tom compreensivo. Ruim é eufemismo, Baek.

Coloquei a encomenda da AliExpress nas telhas ao meu lado, largando os braços ao redor do corpo. Eu me sentia um fracassado.

— Estou mais para um Sirius Black ou Ronald Weasley?

Apoiei as costas numa parede de tijolos, sentindo certo alívio por ter um tempinho para descansar. O felino se espreguiçou de um jeito exagerado, arqueando o corpo e fazendo seus pelos negros se eriçarem no processo.

Tá mais para bruxinha Sabrina, resmungou, dando voltas ao redor de si mesmo antes de se deitar no parapeito de uma janela.

— Número 614, Kyungsoo — reclamei, suspirando de um jeito cansado. — Por que é tão difícil encontrar os endereços nessa cidade?

Era uma cidadezinha simplória a apenas algumas vassouradas da capital. As pessoas, no entanto, jamais viram ou ouviram falar de bruxos. Mal sabiam que estamos em todos os lugares, desde o zelador do prédio em que eles moram até os atores mais cotados do cinema. Os garis responsáveis pela limpeza das ruas são sempre os mais suspeitos. Quase todos eles são bruxos disfarçados.

Meu gato preto sempre diz que devo ser cuidadoso e jamais voar ou caminhar sobre os telhados durante o dia. “As pessoas daqui não estão acostumadas a ver garotos voando em vassouras”, ele vive repetindo. Assim, combinamos que as encomendas seriam entregues durante a noite. De preferência, na janela dos clientes.

Enquanto o pequeno gatinho ronronava durante seu sono, coisa que fazia 80% do tempo (os outros 20% ele gastava reclamando da vida), me peguei admirando aquela vizinhança tão pacata. Foi quando, quase num pulo, acordei Kyungsoo e apontei para um sobrado próximo dali.

— Olha só, Sr. Pulguento! O número 614.

Pulguento uma ova, rebateu, lançando-me aquele olhar que dizia “estou prestes a assassinar você”.

Ergueu-se ainda preguiçoso, logo tratando de me seguir enquanto eu caminhava sobre as telhas, tentando não fazer barulho. De pulinho em pulinho, consegui chegar até a sacada da casa de dois andares, carregando aquela caixa cuidadosamente embalada comigo.

Já era tarde, o que deveria ter feito com que eu desistisse de realizar a entrega àquela hora, mas percebi que estava tudo bem assim que vi as luzes acesas em um dos cômodos do andar de cima. Espiei pela janela, constatando que era melhor dar meia volta e me escafeder dali.

Era o quarto de um garoto. Numa prateleira, havia uma coleção de histórias em quadrinhos, action figures, rilakkumas de pelúcia e mais centenas de pôsteres e cards de jogos ou animes. Mas o pior estava por vir. O cara de quase dois metros de altura, sentado sobre o tapete jogando videogame, parecia ser o fã número um de Harry Potter. Ele tinha uma réplica quase perfeita de todas as varinhas, almofadas com nomes de feitiços, um pomo de ouro e até mesmo um edredom da Grifinória. Sobre o boneco do Dumbledore em tamanho real: prefiro nem comentar.

Ainda meio indeciso e sob o olhar reprovador de Kyungsoo, bati com o punho contra o vidro da janela algumas vezes, esperando por uma resposta. Aquele potterhead de carteirinha demorou quase oitenta e quatro anos para perceber que Opa! Tem um garoto na minha janela e finalmente vir receber a encomenda.

— O que você tá fazendo aí? — ele praticamente gritou, subindo a janela o mais rápido que pôde e travando-a nas laterais. — Tá doido, cara?

A expressão dele era um misto de espanto e indignação, exatamente como um “Caramba, tem mesmo um cara na minha janela!”.

Dei de ombros, achando aquela reação muito natural. Não era o primeiro a ficar incrivelmente surpreso de receber um bruxinho tão bem apessoado em sua janela no meio da noite, nem seria o último. Então, estendi para ele sua encomenda, logo buscando o bloquinho no bolso do meu casaco para recolher sua assinatura.

— Pode assinar aqui, senhor... Park Chanyeol? — pedi de modo educado, estendendo-lhe uma caneta.

O tal do Chanyeol pegou o objeto ainda meio abobado, não sabendo lidar com aquela visita tão repentina. Seu nome saiu um garrancho quase ilegível, mas balancei a cabeça mesmo assim num gesto de agradecimento.

Queria dar no pé o mais rápido possível, mas era bem óbvio que não demoraria muito até...

— Espera! — ele chamou, olhando ora para mim, ora para Kyungsoo e ora para a vassoura quebrada no andar de baixo. — Vo-você é mesmo um bruxo?

Não sabia como o rapaz havia chegado nessa conclusão tão rápido, mas só me restava discordar e tentar ser o mais convincente possível.

— Escuta aqui, cara — falei, sentando no parapeito da janela e cutucando seu peito de modo corajoso, mesmo que o garoto fosse muito mais alto do que eu. — Você tem as maiores orelhas que eu já vi, e nem por isso saí perguntando se você é o Dumbo ou o Spock.

Fiquei ali, sentado em sua janela de braços cruzados e balançando as pernas de um jeito infantil. O sujeito continuou a me observar, incrédulo e meio admirado. Começou a me analisar como se eu fosse de outro mundo. Em seguida, fez o mesmo com o felino.

— Seu gatinho é bem arisco — ele comentou, após receber uma mordida em sua mão.

Arisco vai ser minha pata na tua fuça, parceiro, Kyungsoo rosnou.

Para a sorte de Chanyeol, ele não podia ouvi-lo. Infelizmente ou felizmente, eu era o único com a capacidade de escutar aquele gatinho endiabrado. Quem precisa de inimigos quando se tem um animal de estimação – a propósito, Kyungsoo odeia esse nome – mais do que disposto a jogar algumas verdades na sua cara?

Assim que o Spock de um metro e oitenta e cinco assinou meu bloquinho de entregas, dei um aceno e fiz questão de me afastar pelo mesmo caminho que vim, puxando o felino comigo. Apanhei a vassoura quebrada ao meio e saí pisando duro, tropeçando numa das telhas soltas no meu caminho de volta.

— Eles entregam de vassoura — ouvi o grandalhão murmurar para si mesmo, pouco antes de resolver fechar a janela. — Então é por isso que a AliExpress demora tanto para entregar...

Como se não bastasse, tropecei outra vez.

Eu, definitivamente, odeio telhados.

 

 

Kyungsoo parecia um gato incrivelmente comum e adorável ao beber o seu precioso leitinho matinal. Adorável, sim, exceto pela carranca que fazia toda vez que o líquido morno acabava. Ele até se contentava com os restos do meu café da manhã e por vezes exterminava uma fatia de presunto em apenas uma bocada, mas aquela expressão de “Nem mesmo para me comprar uma ração decente” sempre estava lá.

Nem mesmo para me comprar uma ração decente, ele reclamou num tom de falsa indignação. Seu molequinho seboso...

Viu só? Já posso quase adicionar “ler mentes” na minha lista de habilidades.

Mas, infelizmente, não havia nada que eu pusesse fazer por meu amigo-barra-gato-das-trevas. O dinheirinho suado do meu trabalho de meio período como vassoura boy (um trocadilho horroroso que envolve motoboys e vassouras, me perdoem) só eram suficientes para manter meus vícios por salgadinhos de milho e alguns ingredientes para uma refeição decente. Meu emprego como entregador, no entanto, acabou me rendendo um bom lugar para morar e a oportunidade de treinar meu voo de vassoura.

Com “um bom lugar para morar” quero dizer “um sótão caindo aos pedaços cheinho de teias de aranha e pó para todo canto”. Eu me sentia a própria reencarnação da Bruxa Malvada do Oeste. Só faltavam os sapos para completar, mas Kyungsoo disse que eles dão muito trabalho.

E aí, moleque?

Ergui o olhar para o gatinho endiabrado todo largado em cima do meu travesseiro.

— Que é? — respondi de um jeito brusco, já irritado pelo que teria de enfrentar naquela tarde. Seria meu primeiro dia numa escola normal depois de muito tempo, e Kyungsoo parecia ter tirado a manhã para me atazanar a vida.

Ansioso pra se juntar aos remelentos do Ensino Médio?, perguntou, afiando as unhas compridas no meu colchão antes de se levantar, todo preguiçoso. Ouvi dizer que podemos faturar uma grana vendendo cosméticos para espinhas nesse lugar, e ainda é um curso intensivo para se aprender a lidar com idiotas.

Revirei os olhos, irritado.

— Nem sei porque ainda perco meu tempo te pagando vacina antirrábica.

Apanhei alguns livros e coloquei na minha mochila. Eram os únicos materiais necessários dos quais eu me lembrava. Não frequentava uma escola “normal” desde que descobri ser um bruxo em ascensão.

— O que mais as pessoas levam para a escola mesmo? — questionei, olhando para todos os lados para ver se eu tinha esquecido algo.

Caldeirões? Um béquer para armazenar poções?, o felino sugeriu. Talvez alguns extratos de venenos de aranha ou pés de salamandra frita?

— As pessoas não levam essas coisas para a escola, Kyungsoo.

Não? Ele desceu da cama, erguendo a cabeça em minha direção, curioso. Então como é que os alunos se divertem?

— Aí é que tá, cara. — Suspirei. — Eles não se divertem.

 

 

Por todos os boatos terríveis que eu já ouvira sobre o Ensino Médio, achei que não sobreviveria àquele dia. Achei que não estaria vivo hoje para contar essa história esquisita ou registrar meus anseios de bruxo adolescente. Porque, definitivamente, eu não estava pronto para enfrentar um bando de jovens com a puberdade prestes a transbordar. Não estava pronto para ver casais se beijando – beijando de verdade, e em público! – ou presenciar um contrabando de bebidas alcóolicas em caixinhas de Toddynho, fora alguns idiotas caçoando de seus colegas de classe por motivo nenhum. Nem de longe.

Mas, veja bem... Vivo eu estou. Pelo menos por enquanto.

Não tinha nenhum gato preto para me dizer o que eu podia ou não fazer, então foi quase por instinto que ergui meu indicador discretamente, puxando a mochila daqueles valentões para trás. Ao contrário do que as pessoas pensam, não preciso de uma varinha mágica ou de encantamentos a serem ditos em voz alta. Para fazer o famoso shazam acontecer e dar um jeito naqueles fedelhos metidos a marmanjos, bastava um gesto ou um pensamento forte o suficiente para que a magia desse as caras.

Os rapazes desconhecidos acabaram caindo para trás, e o garoto miúdo, que antes era o alvo das piadinhas maldosas, agora recebia gritos e palmas em comemoração por sua bravura.

Não há de quê, cara.

Como cheguei até a sala de aula sem ser descoberto, ah, isso é realmente um mistério. Não bastasse ajudar os pobres alunos indefesos, ainda tive o prazer de congelar a sobremesa de um dos professores quando me vi perdido no refeitório. Mas que ousado, Byun Baekhyun. Muito ousado.

Na minha antiga escola, viam-se centenas de avisos como “É terminantemente proibido o uso de magia nos corredores” ou “É sério, rapaziada. Não. Usem. Magia”. Aqui, porém, tudo que temos são murais com umas fotos horrorosas com os formandos do ano passado.

Quando finalmente me sentei numa carteira vazia, já dentro da sala, repassei todas as regras e instruções que Kyungsoo tinha me dado antes de sair de casa. Ele morria de medo de me deixar fazer as coisas sozinho, mas eu tive que explicar mil vezes que: não, senhor, as pessoas não costumam levar animais de estimação para o colégio. (Agora insira aqui um gatinho furioso e completamente fora de si, preparadíssimo para arranhar todos os móveis da casa).

Tentei formular uma pequena lista de advertências em minha cabeça, enquanto distraidamente tirava os materiais da mochila.

Evite ao máximo usar magia.

Puta merda.

Tente parecer normal.

E lá se vai toda a minha esperança de me misturar com todos aqueles remelentos do Ensino Médio.

Francamente, sei que não é nada comum ver um garoto carregando uma vassoura de palha pelo colégio, mas eis que o queridíssimo Do Sabichão Kyungsoo, no auge de sua sabedoria felina, não me lembrou que um troço desse não é nem um pouco normal. Foram tantos anos estudando em pequenas escolas especiais, que levá-la comigo parecia a coisa mais natural do mundo. E foram tantos anos sem usar um caderno, que me esqueci de levar um lápis ou uma caneta.

Assim, tive que cutucar a perna do grandalhão que dormia na mesa ao lado com a ponta do meu tênis, simplesmente porque gosto de ser um pé no saco. Quando ele despertou de seu sono profundo, coçando os olhos por baixo dos óculos redondos e com a cabeleira castanha apontando para todos os lados, tive a certeza de que não podia ficar pior. Ainda confuso, ele olhou de mim até a vassoura encostada à minha mesa, chegando a conclusão mais óbvia do planeta.

— Você... — afirmou, ainda meio sonolento, tentando ao máximo manter os olhos abertos. — Você é o garoto que veio entregar o kit Grifinória que eu comprei pela internet! Você é o bru...

Com apenas um estalar de dedos, colei seus lábios um no outro, impedindo que ele contasse a todos os desinteressados da aula de geografia sobre o meu segredo.

— Tá doido, cara? — reclamei, franzindo a testa para demonstrar toda a minha irritação. — Se você contar para essa galera, vai dar ruim. Fica quieto aí na sua e não me enche o saco, tá legal?

Mesmo com a matraca calada por uma magia de nível simples, Chanyeol sorria como se tivesse acabado de presenciar um expecto patronum bem diante de seus olhos. O garoto alto – e bota alto nisso – parecia inofensivo, erguendo os polegares em um sinal de que havia entendido o recado. Mesmo com a cara meio amassada por ter adormecido sobre a própria mochila e com o cabelo todo desgrenhado, preciso admitir que o danado até que era bonito.

Quando ele finalmente ficou livre para falar outra vez, sua voz era mais baixa, como se compartilhasse comigo os seus segredos mais preciosos.

— Você é o cara da minha janela...

Era estranho como seus olhos brilhavam de uma alegria quase explosiva, mas eu até que podia me acostumar com isso.

— Você é um trouxa mesmo, Chanyeol.

E agora só faltava o tal do Park explodir de verdade, sem precisar de qualquer feitiço.

— Sim... Sim!... Você tem toda razão — ele disse, soltando a gargalhada mais escandalosamente bonita que eu já vira em toda a minha vida. — Eu sou mesmo um trouxa.

Tive a certeza de que ele estava se referindo a alguma coisa relacionada a sua existência patética de potterhead fanático, mas não dei ouvidos a isso.

Quis seriamente perguntar “Qual é o teu problema, meu irmão?” e dar-lhe um peteleco na testa, no entanto, resolvi tentar ser amigável. Dei só o peteleco.

— Tá, tá bom, cara. Agora me empresta aí uma caneta.

Parecendo a pessoa mais feliz do mundo, o orelhudo enfim me entregou seu estojo inteirinho, esperando que alguma coisa de estranha acontecesse ou que uma nova magia o castigasse. Mas o peteleco, dessa vez, era realmente só um peteleco.

Ficamos naquele bate-volta infantil durante toda a aula de geografia. Virou quase um costume. Primeiro, era Chanyeol quem se animava todinho e se inclinava sobre a minha mesa como um gigante atrapalhado, fazendo questão de dizer o quanto ser bruxo (coisa que dizia sempre numa voz baixinha, roçando sem querer os lábios cheinhos no meu ouvido, aquele ridículo) era algo incrível. Depois, era a minha vez de atirar nele uma borracha ou outro material qualquer. Jogava assim mesmo, sem magia nem nada, mas a coisa parecia enfeitiçada para atingir suas costas ou sua cabeça quando ele tentava fugir como a criança de 1,85m que era.

Isso se prolongou por mais ou menos uma semana e meia, quando evoluí de “Eu detesto esse Spock coreano” para um “Eu detesto esse Spock coreano, mas a boca é tão rosinha e bonita. Que tremendo filho da mãe”. Foi também mais ou menos à essa altura que comecei a bolar teorias para explicar por que Park Chanyeol fazia com que eu me sentisse tão fraco. Cheguei a conclusões mirabolantes de que talvez o garoto fosse um bruxo, assim como eu, mas essa era uma teoria sem fundamento algum.

Kyungsoo uma vez me disse que paixão é uma fraqueza. A-há, ainda bem que não é o meu caso. Claro que não, certo? Definitivamente não é o meu caso.

O fato era que, droga, minhas pernas sempre ficavam meio molengas quando ele bagunçava meus cabelos ou ficava com o rosto desnecessariamente perto do meu, prejudicando até mesmo meus voos de vassoura. Chanyeol era desnecessário. E o modo como isso me afetava de um jeito tão esquisito começou a ficar óbvio quando, numa manhã de sexta-feira, atirei o estojo na peste orelhuda com menos força do que o habitual.

— O que é que tá havendo, Byun? — ele perguntou, criando coragem para se aproximar após aquela agressão inofensiva. — Você está tão... sei lá, gentil ultimamente.

Byun? Mas o cabra é abusado mesmo, hein.

— Gentileza, para mim, só faço questão de usar com alguém que já passou vergonha no karaokê ou caiu no meio de uma praça lotada. — Deitei a cabeça em meus braços sobre a mesa, fingindo desinteresse. — Se você ainda não passou por isso, sinto muito, mas não podemos ser amigos. Só falo com pessoas que já perderam a dignidade de verdade.

Chanyeol arrastou a mesa para perto da minha, até que as duas ficassem lado a lado, sem qualquer distância as separando.

— No ônibus também conta?

— Caramba, cara. Você já cantou karaokê no ônibus?

O garoto me olhou como se dissesse “Tu é burro, Baekhyun?”.

— Já caí no ônibus — esclareceu. — Na frente de um monte de pessoas. O piso estava escorregadio por causa da chuva, aí acabei caindo feio.

Ergui a cabeça, encarando-o com curiosidade.

— De cara no chão?

— De costas — respondeu, se aproximando daquele jeito bem desnecessário que faz minhas bochechas esquentarem por alguma razão misteriosa, e então eu o acompanhei na careta exagerada que fazia para demonstrar sua vergonha. — Acho que isso quer dizer que podemos ser amigos.

A gente dá a mão, e Park Chanyeol já vai querendo o braço.

— N-não é assim que funciona — gaguejei sim, droga, mas foi por um bom motivo, beleza?

O sujeito resolveu que era uma boa ideia jogar os braços em cima de mim. Assim, de uma hora para a outra. Esticou aquela mão enorme e – rufem os tambores! – começou a acariciar os meus cabelos como se fosse a coisa mais natural do mundo. Instintivamente, peguei a borracha em cima da mesa, pronto para tacá-la naquele orelhudo metido a besta. O problema é que, vejam bem, o cafuné estava tão gostoso que tive que abortar a missão. Quando ele afastou a mão, também por instinto, fui obrigado a puxá-la de volta.

— Agora termina o que começou, Park — sussurrei, fechando meus olhos para apreciar aquele carinho assim que o rapaz deitou a cabeça de volta na mesa, o rosto ficando a alguns centímetros do meu.

As aulas já haviam acabado naquele dia, o que significa que eu era o único a sentir sua respiração se confundindo com a minha.

— Se eu beijar você e parar no meio do caminho — ele disse baixinho —, também terei que terminar o que comecei?

E lá estava de volta a minha maior fraqueza. Com ela, aquela tremedeira inesperada e todo aquele negócio de bochechas coradas que eu tanto detestava. Mas nem mesmo aquele nervosismo me impediu de esticar meu braço também, tateando às cegas em busca de seu rosto, até que eu estivesse retribuindo o carinho naqueles fios castanhos e macios.

Sorri, de repente sentindo que estava mais do que acostumado às suas esquisitices.

— Você é um sem vergonha, Park Chanyeol.

 

 

Kyungsoo estava mais furioso do que nunca. Era a primeira vez que eu o via assim, os olhos caídos em desprezo e as patinhas cutucando minhas pernas de um modo ansioso.

Não vai mesmo me levar com vocês?, perguntou, talvez pela milésima vez naquele sábado à tarde. Você está descartando seu melhor piloto de bordo para dar um passeio com esse cara? Isso é o cúmulo do absurdo, Baekhyun.

Que esse segredo jamais saia daqui: o gatinho endiabrado sempre foi muito temperamental.

Quando concordei em levar Chanyeol na garupa da minha vassoura, não pensei que o felino fosse ficar tão irritado. Mas o caso é que era impossível dizer não ao orelhudo quando ele estava ali, segurando minha mão como um desesperado e me olhando com aqueles olhos pidões, dignos de um filhotinho de cachorro. Seus pedidos histéricos de “Baaekieeeeeee! Me leva para voar com você, por favorzinhooooo!” eram a coisa mais irritante desse mundo. Então, para unir o útil ao agradável, eu o fiz prometer que me ensinaria a usar um GPS. Adeus, atraso nas entregas!

Levantei da cama e fui dar uma última penteada estratégica no meu cabelo, mesmo sabendo o quanto ele ficaria desarrumado depois. Kyungsoo não desistiu, e logo estava arranhando minhas calças jeans.

 Sabe quantas vezes já te salvei de bater de cara numa árvore?, ele continuou, deixando à mostra suas presinhas.

— Pega leve, Kyungsoo — falei, apanhando a vassoura nova que eu comprara na vendinha da esquina. — Vou deixar você na casa do Chanyeol. Ele tem uma gatinha chamada Nini, lembra? Vocês se deram bem na última vez que estivemos lá.

Será que dá para alguém avisar pra esse cara que o Nini é macho? E o nome dele é Jongin, reclamou. Dessa vez, no entanto, ouvir sobre seu novo amigo felino parecia tê-lo deixado mais animado. Tá legal, então eu vou deixar para lá o passeio de vassoura. Nem queria mesmo.

Foi assim que acabei me livrando – temporariamente, é claro – do gatinho irritado. Quando dei por mim, eu já estava esperando por Chanyeol perto de uma embarcação colorida, sentado à beira da praia. Ele apareceu usando aqueles óculos redondos e o moletom já surrado do Harry Potter. O famoso “It’s LeviOsa, not LeviosA” estampado no tecido negro. Não vou nem comentar sobre o sorrisinho bobo dele, ou provavelmente vou me prolongar falando o quanto ele parece radiante quando sorri e...

Voar não era o maior dos nossos problemas. O problema mesmo era convencer a vassoura a aceitar um peso extra como carona. Depois que consegui lidar com isso, nossos pés finalmente deixaram o chão, e logo estávamos flutuando sobre aquela cidadezinha portuária tão bonita. O garoto agarrou o cabo da vassoura com força e fechou os olhos, desesperado. Demorou cerca de meia hora para que ele se adaptasse, finalmente parando para desfrutar da vista.

— Então... — começou, nervoso, ajeitando os óculos no rosto com apenas uma mão e fazendo menção de pegar o celular. — GPS, certo? Tenho que... ensinar você... a usar GPS.

A grande verdade é que ele estava apavorado. Se não conseguia sequer ficar sobre uma vassoura tranquilamente, como é que sonhava em ser um jogador de quadribol?

— Você não precisa me ensinar agora — disse, tentando acalmá-lo. — Eu não me importo de esperar até que você supere essa sua vontade de fazer xixi nas calças.

Quem é que quer fazer xixi nas calças aqui? Eu é que não. Não mesmo!

Quando ele fez menção de erguer os braços, numa tentativa engraçada de parecer corajoso, a vassoura virou de ponta cabeça. Os olhos de Chanyeol ficaram ainda mais esbugalhados quando ele se agarrou ao cabo de madeira com todo o seu amor à vida, os cabelos apontando para o mar abaixo de nós. Ficamos ali, de cabeça para baixo, trocando alguns sorrisos de divertimento e alívio. Ficar pendurado daquele jeito não era ruim, se fosse para compartilhar algumas risadas com Chanyeol.

— Foi divertido, certo? — perguntei, após finalmente conseguirmos endireitar o corpo e estabilizar a vassoura no ar. Peguei o pacote de balinhas de gelatina no bolso do meu casaco, oferecendo a ele. Era uma edição limitada de Halloween. — Mas eu prefiro não arriscar nossas vidas a esse ponto.

O garoto caçou uma bala em formato de abóbora dentro do pacote, mastigando-a de um jeito estranhamente fofo para um gigante de quase dois metros de altura.

— Esse com certeza é o melhor e o pior encontro que eu já tive — ele garantiu, animado, pegando uma de minhas mãos para depositar ali um pequeno chapéu pontudo de gelatina.

Em vez de rebater com alguma frase irônica, como sempre fazia, acabei engolindo o doce de uma só vez, tossindo com o que acabara de ouvir. Meu rosto ficou tão quente, mas tão quente, que acabei levando as mãos até minhas bochechas, sentindo a temperatura.

— A-acho que não estou p-passando muito bem.

Bem, pelo menos era o que eu dizia. No fundo, eu sabia que era culpa de todos aqueles sentimentos por Chanyeol que eu mantinha trancafiados em algum lugar. Kyungsoo uma vez disse que tudo aquilo era porque eu estava apaixonado, e não sabia lidar com aquelas sensações estranhas pela primeira vez.

Quando Chanyeol decidiu colocar as mãos sobre as minhas, num gesto muito bem calculado, quase desmaiei ali mesmo.

— Você está com febre? — perguntou, preocupado, apoiando a testa na minha para verificar a temperatura. Ele parecia ter se esquecido do medo de altura, e ver aqueles olhos tão atentos ao meu rosto só fez com que eu ficasse meio abobado. — Se você não está com febre, será que...?

Ele não completou sua frase com palavras, mas me presenteou com a resposta que eu mais buscava. Diante de todas as incertezas de um bruxinho adolescente, Chanyeol me beijou. As mãos que seguravam meu rosto acabaram se perdendo nos fios de cabelos, segurando em minha nuca para cruzar aquela distância tão incômoda.

Era um beijo com gosto de balas de gelatina, sentimentos recém-descobertos e Park Chanyeol. Eram apenas toques mornos, sempre interrompidos por sorrisos ou por uma sequência de selinhos desajeitados. Era, mais do que nunca, a resposta da qual eu mais precisava.

E eu precisava que Chanyeol me mostrasse o que é estar apaixonado.

Nosso primeiro beijo acabou em alguns tapas inofensivos que dei em seu braço, tentando extravasar a minha vergonha.

— Eu não acredito que você me beijou! — acusei, fingindo uma indignação obviamente falsa.

E, então, ele rebateu com aquele sorriso de orelha a orelha que eu gosto tanto.

— Eu não acredito que você deixou eu te beijar!

Mesmo iniciando aquela brincadeira infantil, a urgência de sentir novamente aqueles lábios tão macios me fez suspirar em ansiedade. Agora com uma de suas mãos apoiada em minha coxa e outra na cintura, puxando meu corpo para mais perto, ficava mais do que claro que eu não era o único.

— Não acredito que quero te beijar de novo — devolvi as palavras, dessa vez num sussurro quase inaudível.

E contrariando todas as bobagens que eu já disse nessa vida, inclinei meu tronco para que pudéssemos nos beijar outra vez, enfiando minhas mãos nos bolsos do seu moletom.

No fim, não aprendi a usar o tal do GPS naquele dia, e Chanyeol passou a ser meu copiloto durante minhas entregas noturnas, brigando por um espaço naquela vassoura com Kyungsoo. Era comum que passássemos uma madrugada juntos, nos aventurando naqueles telhados que eu tanto odeio ou roubando beijos um do outro quando o gatinho estava distraído. Afinal, precisávamos terminar o que começávamos.

Se nunca sequer imaginei estar estupidamente apaixonado por um garoto como Chanyeol, também não imaginei que um dia teria que voar tão alto, só para que aquele Spock esquisito me ensinasse uma lição muito importante.

Só para que ele me ensinasse que, de todas as magias do mundo, o amor é a mais poderosa.


Notas Finais


Muito, muito, muito obrigada a todos que conseguiram chegar até aqui embaixo :)
Pra quem acompanha "Eu, você e os bilhetes de amor", saiba que o último capítulo já está prontinho, e que vou postar assim que tiver algum tempo. Já que comecei a trabalhar, meus horários livres estão ficando apertados, mas eu sempre dou um jeitinho de escrever alguma coisa, hehe.
Até uma próxima vez ~ 💜


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