Minhas malas já estavam empilhadas uma na outra. Depois de horas tentando escolher quais roupas e sapatos levaria, finalmente pude organizá-las. É claro que tive um pouco de ajuda. Sem a nossa empregada Dina, eu não conseguiria nem começar.
- Por que a gente só percebe o tanto de roupa que tem quando viaja?- falo em quanto limpo o suor em minha testa e coloco mais malas em cima das outras.- De onde eu tirei tudo isso?
- Se você não estivesse tão distraída comprando tudo o que vê, saberia o porquê. E quando volta de suas viagens, tem sempre que arrumar um espaço no armário ou comprar outro pra colocar mais.- Dina dizia com um sorriso astuto.
- Certo. Eu tenho culpa no cartório.- levanto minhas mãos para cima para enfatizar minha rendição.- Mas eu não sou tão consumista assim…ou sou?
- Já vi piores.- foi a simples resposta dela.
- Dina!- tento mostrar indignação, mas acabo caindo na gargalhada.
Dina Clark é nossa empregada desde meus 15 anos. Na verdade, ela é mais do que isso. Eu a considero como minha segunda mãe. E Tem sido essencial em todos esses anos. Até no momento mais difícil da minha vida Dina esteve lá. Mesmo sem me conhecer no início, ela sabia como dar conselhos. Se não fosse por ela eu não saberia o que seria de mim e Daniel.
- Interrompi algo.- meu irmão diz ao abrir a porta e se depara com os risos.- Vejo que sim. Por que não me convidaram pra festa?- ele fingia estar sentido.
- Porque você estava ocupado demais olhando para alguma enfermeira com seios avantajados.
- Ei! Eu levo meu trabalho muito a sério, mocinha. - Daniel se aproxima com aquele sorriso canalha no rosto.
- Eu sei disso. Vejo seu potencial.- ironizo.
- E então, já acabou de arrumar suas coisas?
- Graças a Dina, Sim.
- Que bom, por que eu preciso falar com você.
- Eu vou ver se o ensopado já está pronto.- Dina diz se retirando do quarto.
- Algo que devo me preocupar?
- Não é nada demais. Só queria te dar uma coisa- Ele coloca a mão no bolso direito da sua calça e retira uma caixa branca detalhada com pedrinhas e aquarelas.- Encontrei isso no porão.- ele entrega a pequena caixa, e quando abro vejo um medalhão de uns 60cm circular com uma linda pedra azul parecendo o céu cheio de estrelas e era todo detalhado em ouro velho.
- É lindo, Dan.- olho para o objeto deslumbrada.
- Que bom que gostou. Mamãe lhe daria isso no seu aniversário de 15 anos, mas…
- Não precisa continuar. Eu sei o que aconteceu- falo ao recordar do empecilho disto ter sucedido.- Mas por que me dar agora?
- Não foi algo planejado. Como eu já disse, encontrei no porão. Estava procurando brinquedos pras crianças aí encontrei isso. Me fez recordar da nossa mãe falando que quando você nasceu o céu estava muito lindo. Estava completamente sem nuvens e as estrelas brilhavam como nunca em contraste com a Lua. Ela costumava te chamar de "meu pequeno céu" lembra?
- Lembro. - digo nostalgicamente.- Sabe onde ela comprou?
- É uma jóia da família. Deve ter passado de geração em geração.
- É tão lindo- repito sem parar de admirar a peça peculiar.
- Experimenta, logo.- Daniel tira o medalhão de minhas mãos e o coloca no meu pescoço. Sinto uma leve familiaridade com o objeto. Como se já o conhecesse. E tudo pára novamente…
"O mundo sucumbirá e as trevas prevalecerá. A luz não vencerá a escuridão. E o poder crescerá."
- Está tudo bem, Lu? Você ficou tão pálida de repente.- Meu irmão perguntava preocupado com meu estado.
- Só estou cansada. Essas malas pesam…fique tranquilo! Não é nada demais.- minto para não alertá-lo. Porque se eu dissesse o que acabo de ouvir estaria mais paralisado e apavorado do que eu. Aquela voz era suave, porém decidida. Nunca a tinha escutado antes e preferia que depois da primeira vez não houvesse outras. Uma angústia tomou conta do meu ser repetindo e repetindo aquelas frases em minha mente. Era como se fosse um enigma que eu deveria descobrir. Ou um aviso sobre algo que está por vir.
****************
- Já está tudo no taxi, Maninha. Pronta?- Daniel perguntava em quanto eu colocava meus desenhos em minha bolsa.
- Quase.
- Seus quadros podem até ser estranhos, mas quando se trata de rostos você capricha.- ele dizia ao perceber uma pintura de uma ruiva com olhos claros. E outra de uma mulher asiática com os cabelos acinzentados. Ambas eu nunca havia conhecido, mas suas faces sempre estiveram presentes em meus desenhos.
- Lindas, não?
- E muito! Quem dera minhas ex fossem assim…
- Continuariam sendo ex, seu bobalhão.- bato de leve em sua testa e continuo. - E não pense que deixei passar o "seus quadros são estranhos".- bato novamente só que com o punho em seu tórax com um pouco mais de força. Até demais, pois ouço um gemido vindo dele.
- Quando você aprendeu a bater com tanta força? Pensei que os pintores tinham mãos delicadas.- Ele falava acariciando o local da dor.
- Eu tenho um dom.
- E seria me bater? O que você é? O Huck?
- Muitas perguntas, maninho. E nenhuma resposta. Vou deixar você aí com suas dúvidas.- pisco para ele e me retiro do recinto.
- Pistoleira.
- Eu ouvi isso, hein! - gritei no corredor
- Eu sei!
Depois de ter chegado no aeroporto para fazer o check in, me despeço de meu irmão.
- Qualquer coisa é só me ligar. Vê se fica bem e não chore muito por mim.- falo rindo mas ao mesmo tempo com um nó na garganta.- Sabe que eu te amo, né?- me desvencilho do abraço para fitar seu rosto.
- E eu amo você. Se cuida e boa sorte no seu trabalho.- Daniel diz e beija minha testa.- Que mamãe e papai protejam você.- Joseph e Ana Kanwey morreram quando eu tinha 14 anos num acidente de carro. Era de noite e a neve encobria qualquer um, até mesmo um caminhão, o qual bateu no carro deles e capotou. Foi uma perda muito difícil, mas meu irmão sempre me dizia que eles Continuariam conosco. Na época ele ainda tinha seus 19 anos. Daniel praticamente me criou desde então, com a ajuda da Dina, é claro. Mas vi esse menino que se tornou um homem, amigo e um pai pra mim.
- Não me faça chorar, Daniel Kanwey!- o repreendo limpando os olhos cheios de lágrimas.
- Posso dizer uma última coisa?
- Claro.
- Você está parecendo uma melancia.- E aí o clima foi quebrado.
- Não fale mal da minha roupa, seu idiota!- falo aos risos olhando para o meu look. Uma blusa de listras horizontais com uma calça preta e uma bota da mesma cor. E por cima estava meu sobretudo verde folha. Em minha cabeça só continha um gorro vermelho.
- Seu. Sempre e somente seu, maninha.- ele se aproxima de novo para beijar minha bochecha esquerda.
- Eu tenho que ir.- digo já saindo de seu alcance mas dou uma volta e corro em seus braços.- Vou sentir saudades.
- Eu também, maninha. Eu também.
****************
Finalmente chego no meu hotel depois de horas no avião. Aparentemente o lugar é bem organizado e limpo como diz no site. A decoração é simples mas linda. Do jeito que eu gosto. Tiro minha roupa e vou direto para banheira relaxar meu corpo na água quente.
Após alguns minutos de relaxamento decido dar uma volta na cidade. Coloco uma roupa simples e confortável. Uma calça no tom vinho com uma blusa cinza de mangas longas, e por cima, sobretudo preto e cachecol da mesma cor. Pego minha bolsa preta transversal preferida que tem muitas manchas de tintas e cheia de bottons de pintores e suas obras. Alguns deles me inspiravam no meu dia-a-dia por isso gostava de ter-los por perto.
Ao chegar em uma pracinha não muito movimentada, tento descansar em um banquinho para admirar uma fonte e desenhá-la. Ela era tão bela com suas esculturas dramáticas jorrando água. Fico fascinada pela imagem em minha frente e começo a abrir minha bolsa para começar a obra, mas um vento forte leva minha folhas e quando corro para pegá-las, dou de cara com algo que jamais esperaria ver.
- Vocês…então vocês são mesmo reais.
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