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História One me two hearts - Você está na Irlanda


Escrita por: unkn0w

Capítulo 31 - Você está na Irlanda


Fanfic / Fanfiction One me two hearts - Você está na Irlanda

WILL

            Naquele dia, as coisas estavam estranhas. Por algum motivo, tudo estava distante, como se visse por refração, as ondas eletromagnéticas da luz chegando mais lentas do que deveriam. Ele não tocava em nada e nada o tocava.  Era a cópia da cópia da cópia. Ele não estava lá e, ao mesmo tempo, não poderia estar em outro lugar.

            — Will, se concentre — sussurrou o seu pai.

            A manhã fora tirada para que conhecessem Radio City. O almoço durara quarenta minutos. A tarde era de ensaios. Nico não havia falado com ele mais do que três palavras o dia todo.

            E era tarde.

            Adele era adorável. Seu sorriso era adorável. Sua voz era adorável. Ela estava conhecendo melhor o grupo que ensaiaria com ela por alguns dias e que depois participaria da sua apresentação de natal. Estavam sentados em uma roda no chão, cada um se apresentava com palavras breves. Seu nome, sua idade, local de origem, o que espera dessa experiência. São quinze pessoas, tic-tac, tic-tac. Agora era a vez de Will. Bem, a vez estava sendo dele há aproximadamente trinta segundos, ele que não percebera.

            — Ah, desculpe — murmurou com um sorriso desajeitado. — Meu nome é William Solace. Tenho dezesseis anos, nasci em Alfa. Estou ansioso para trabalhar nessa apresentação, obrigado pela oportunidade.

            O discurso clichê, que todo mundo repetia.

            A cópia da cópia da cópia.                                

            — Meu nome é Tomás Dousseau, sou da França. Tenho dezessete. Espero que seja divertido.

            — Sou Jason Grace, tenho dezesseis anos... Ah, sou de Washington. O que eu espero dessa experiência...? Bons momentos e algo para acrescentar no currículo.

            — Nicolas di Angelo — Will virou para ele como se sua voz fosse um imã. — Quinze. Não tenho certeza sobre o local onde nasci.

            Adele sorriu.

            — Então você é o Nico.

            — E você é a Adele.

            — É um prazer te conhecer, ouvi muito a seu respeito.

            — Obrigado. Digo o mesmo.

            A cópia da cópia da cópia.

            Algo estava incomodando Will. Algo relacionado a Nico, mas não sobre ele. Algo.

            — Bom, — Apolo falou se aproximando — acabei de conversar com o produtor e vocês têm até seis horas pra ensaiar e colocar em prática o que vêm preparando nesse final de ano. Vocês têm três dias de ensaio, não fiquem de bobeira. Ah, pessoal de artes plásticas e de letras, vocês podem vir comigo?

            Tomás deu uma piscadela cúmplice de “boa sorte” pra Nico antes de se levantar e sair. Will viu.

            Você não atinge nada e nada te atinge.

            — Pessoal, vamos começar?

            A cópia da cópia da cópia.

 

NICO

            Não estou aqui.

            Não estou aqui.

            Não estou aqui.

            Não estou aqui.

            Não estou aqui.

            Não estou aqui.

            Não estou aqui.

            Não estou aqui.

            Não estou aqui.

            Não estou aqui.

            Ele continuava mantendo aquilo em mente. Talvez ela fosse embora. Talvez assim não tivesse nenhum pensamento para ela se agarrar e explorar, um muro de “não estou aqui” que ela não poderia ultrapassar.

            Não estou aqui.

            Era noite, eles estavam jantando. Ela esperava na porta do restaurante do hotel. Nico continuava tentando comer.

            Will sentou ao seu lado, o rosto dele não estava nada bom. Mas Nico tinha medo de perguntar, e se fosse rejeitado?

            Não estou aqui.

            Nico era inteligente. Ele acabou percebendo. Ela estava de volta porque ele estava sendo fraco, porque ele estava abrindo uma brecha, porque ele estava duvidando de si mesmo. Mas não é fácil assim. Você não começa a acreditar nas coisas do dia para a noite, muito menos de um momento para o outro.

            Will não o amava. Ele tinha que se conformar e tampar aquela rachadura.

            Ou então...

            Não estou aqui.

            Simplesmente permitir que ela entrasse. Desistir. Como sempre fazia.

            — Você foi incrível no ensaio — Jason comentou ainda mastigando o frango. — Não é à toa que Adele já te conhecia.

            — Sim! Você estava perfeito — Cath reforçou.

            Nico deu um sorriso em agradecimento.

            Olhou para baixo e tentou pegar seu garfo, mas a ideia de mastigar aquela carne e engolir aquele molho lhe deu asco. Nico agradeceu pela refeição e se levantou.

            — Nico — Tomás chamou. — Você está se sentindo bem?

            Era um clichê ridículo aquele. Você está passando pela sua batalha diária, que toda vez parece um nível mais difícil. Está destruído por dentro, acabado. Sua postura curvada diz isso, seus olhos baixos dizem isso, sua falta de apetite diz isso. Mas o mundo espera que você seja forte. Que por pior que seja sua dor, você deve continuar sorrindo e dizendo que está bem. Ah, que nobre. Ah, que bonito. Ah, que força. Todo mundo se emociona com isso, todo mundo diz que é lindo e é quebrado. Faça o que tem de fazer, minta. A mentira é bela.

            E o que você responde?

            — Estou bem.

            Nico passou por entre as mesas imaginando que deve ser bem divertido ser assim, jovem e despreocupado. Deve ser bom jantar sem a certeza de que sua irmã morta está assombrando a sua vida e planejando levar com ela mais alguém que você ama.

            Apolo estava de pé, perto da porta que dava para a recepção.

            — Alguns alunos estão planejando sair essa noite, sabe, dar uma volta na cidade. Vai se juntar a eles?

            Nico negou, se esforçando pra manter a expressão neutra e gentil.

            — Não sou muito fã de Nova York.

            — Nem eu — Apolo sussurrou em tom de confissão. — Escute, eu sei que é pedir demais, mas você pode conversar com Will? Ele parece não estar muito bem, estou preocupado.

            Will?

            — Claro. Quando ele for para o quarto converso com ele.

            Apolo deu um sorriso de gratidão.

            — Ele já está lá.

            Nico saiu pela porta, para a recepção.

            Estava frio.

            Com certeza você estava tão concentrado nos seus problemas que nem imaginava que o Solace estava passando por dificuldades também, não é?

            Não estou aqui.

            Deve ser pelo que você disse ontem de noite. “Eu te amo”. Até parece. Ele deve estar pensando numa maneira de te dispensar.

            Não estou aqui.

            Funciona pra você continuar fugindo na sua própria mente desse jeito? É como a droga de uma meditação num grupo de recuperação para câncer. Você está numa colina verde na Irlanda, perto de um castelo antigo onde turistas tiram fotos. Você está chegando perto do castelo...

            O elevador fazia barulho e a luz dentro dele estava piscando. Nico não sabia dizer o motivo. Olhou no espelho e ela estava dentro dele, então deu às costas. Quinze andares acima, as portar abriram com um “plim”.

            Acontece que não, você não está na Irlanda. Você tem câncer e está morrendo. Sabe, esse garoto já começou a te machucar. Ele vai te machucar ainda mais. Se você não se apressar e se afastar dele primeiro, talvez não consiga dizer adeus quando ele destruir a sua vida.

            Não estou aqui.

            O corredor era escuro. As luzes eram por sensor e acendiam uma a uma quando ele passava, de forma que todo o corredor a sua frente se tornava escuro e, depois de cinco segundos, atrás dele também. Por que o quarto 1503 ficava tão longe? Não era pra ser no início?

            Se ele está te causando tanta dor, acho que vai ser o que vou levar primeiro. Até ele tem suas rachaduras.

            Estou aqui.

            Nico parou. Olhou para trás, para o breu do início do corredor. As luzes estavam se apagando, ela estava se aproximando. Um.

            — Ele não está me causando dor — dois.

            E mesmo assim você está com dúvida?

            Três.

            — Ele só está confuso. Não é que não me ame.

            Quatro.

            Não me faça rir.

            Escuro.

            Escuro total.

            Não estou aqui.

            O hálito acre dela batia em seu rosto. Ela estava tão próxima que o seus pulmões se enchiam de ar gelado e fétido. Seus cabelos compridos e negros encostavam nas bochechas de Nico, suas mãos apodrecidas estavam em seu rosto.

            Ela não estava como sempre. Bianca estava mudando.

            Hazel ou Hades, Will ou Apolo. Quem você quer que vá primeiro?

            — Você já ouviu falar em descanso eterno? Por que não se manda logo para o paraíso?

            O paraíso aos suicidas não pertence.

            Ela foi seca e cortante, Nico notou. Esse assunto a irritava?

            — Então vá para o inferno — ele sorriu um sorriso macabro.

            Paraíso ou Hades, Céu ou Inferno, eles são feitos sob medida. Este é o meu.

            — Destruir as pessoas que você amou? — a voz de Nico tremeu. — Arrastar contigo tudo que você mais amou em vida?! Esse é o seu inferno, Bianca?! Esse é a porra do seu inferno?

            Não. Estar com você pra sempre. Esse é o meu inferno. Porque eu te odeio desde que você nasceu.

 

Will estava na sacada, a luz pálida da noite deixava uma auréola prata ao redor do seu cabelo. Seus olhos estavam fechados, a boca entreaberta, as mãos agarradas ao parapeito como se a qualquer segundo pudesse tomar impulso para pular na noite fria. E apesar de a temperatura estar quase negativa, ele estava com apenas uma blusa fina se expondo ao vento da noite.

            Nico foi até a sacada e abriu a porta. Estremeceu.

            — Will, entre agora. O que você vai fazer se pegar um resfriado?

            De início, foi como se ele não tivesse o escutado. Mas depois do tempo de uma respiração profunda e lenta, Will o olhou e assentiu.

            O que estava acontecendo com ele?

            Você sabe a resposta.

            Não estou aqui.

            Nico fechou a porta e ligou o aquecedor. O braço esquerdo de Will encostou no seu e ele estava congelando. De perto, notou os lábios suavemente roxos e a pele avermelhada.

            Will então o envolveu e apoiou a cabeça em seu ombro, num pedido mudo de “me ajude”. No mesmo instante, Nico retribuiu o abraço, tentando doar calor para ele. Estou aqui, vou te ajudar.

            Porque independente do que Will dissesse — talvez ele o odiasse, talvez ele estivesse com medo — Nico o amaria. Foi quando ele percebeu isso.

            E Nico uniu as sobrancelhas e fechou os olhos, com dor. Pôde sentir as mãos de Will se agarrando às suas costas, apertando-o contra ele como se fosse a cura para sua agonia eterna.

            Nico queria pedir para ele dizer. São apenas três palavras, não importa se for mentira. Apenas diga. Ficará tudo bem, eu não vou mais duvidar, prometo. Ela vai parar de te influenciar, ela vai me deixar em paz.

            Mas seria a mesma coisa que pedir o seu amor, e amor não se pede de ninguém.

            Por cima do ombro de Will, ele pôde ver Bianca o encarando com seriedade. Nico apenas fechou os olhos e repetiu para si mesmo:

            Você está na Irlanda correndo por uma campina verde com a brisa fresca no seu rosto. Will está te esperando no castelo logo ali e você está indo até ele. As flores têm um cheiro agradável e, o mais importante:

            Você não está morrendo de câncer.

            Sua irmã não está tentando te matar.

            Você não está aqui.


Notas Finais


meu heart está destruído


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