Pego minha bolsa que levaria comigo no colo durante a viagem, verifico se está tudo desligado em meu quarto, e saio do ambiente. Vejo Harry sair de seu quarto no fim do corredor com sua mala e o espero para que desçamos juntos. Harry me encara e sorri. Retribuo gentilmente.
— Bom dia. — profere assim que se aproxima.
— Bom dia. — respondo e o sigo, descendo calmamente as escadas.
— Como dormiu? — indaga, colocando sua mala próxima a minha assim que chegamos à sala.
— Bem, e você? — termino de descer as escadas e deixo minha bolsa no sofá, sigo para cozinha sendo acompanhada de Harry.
— Bem. Como está o bebê? — ele questiona assim que entramos na cozinha. Paro de andar no mesmo instante e me viro para ele surpresa. Harry nunca pergunta sobre o bebê. Harry franze o cenho.
— Ele está com fome. — digo ainda desconfiada, e me aproximo da mesa posta com o café da manhã, sentando-me.
— Se alimente bem, pois teremos uma longa viagem. — profere Harry, sentando-se também. Harry se serve e eu faço o mesmo, começando a alimentar o ser dentro de mim. — Escute, eu vi o endereço que me mandou. Eu já estive lá perto, em um evento. Na mesma rua, inclusive. — comenta, sorrindo, após alguns minutos de puro silêncio. — Alguém cuida da fazenda? — ele questiona, e eu confirmo.
— Sim. Quer dizer, quando meu pai era vivo, ele deixava pessoas trabalhando lá. — respondo-o, lembrando-me da minha infância. — Os únicos animais que me lembro de que tínhamos eram vacas e cavalos. Cavalos porque meu pai adorava-os. E vaca porque nos arredores da fazenda tem algumas famílias bem pobres, então papai doava leite já pasteurizado, óbvio e derivados. — dou de ombros. — Ah! E tínhamos um cachorro que não tenho certeza que ainda esteja vivo. — comento, terminando de tomar meu café. Harry analisa-me e franzo o cenho com seu ato.
— Seu pai devia ser um grande homem... — comenta, sorrindo. — Há quanto tempo ele morreu? — indaga, parecendo estar interessado.
— Alguns meses. — respondo e suspiro. — Ele morreu de câncer de pele. — digo baixo. Harry arregala os olhos, e tosse, se recompondo aos poucos.
— Sinto muito por ele. — pede, parecendo realmente sentir muito. Assinto brevemente.
×××
— Harry, pare o carro, preciso vomitar! — profiro alto, para que Harry me escute e faça imediatamente ou vomitarei em todo seu carro.
— De novo, Brooke? — indaga, jogando levemente o carro para o acostamento. — Já é a quinta vez, e nem chegamos à metade do caminho, ainda! — reclama, enquanto desacelera o carro e liga o alerta por estarmos em uma via movimentada.
— Não reclame comigo, reclame com seu filho que não gosta de viajar! — profiro raivosa. Abro a porta do carro com rapidez e abaixo-me deixando que o bebê expulse tudo o que ele quiser, já que não tenho mais controle sobre meu corpo.
Após alguns segundos de vômito, consigo me recuperar e endireito-me no banco do carro, fechando a porta e encostando minha cabeça no estofado. Toda vez que vomito, parece que perco parte das minhas forças.
— Está bem? — Harry pergunta. Limpo minha boca, e concordo com a cabeça.
— Sim, vamos logo. — digo, e pego uma garrafa de água que deixei no painel. Harry dá partida novamente seguindo nosso caminho. Agora, com o estômago completamente vazio, posso ter certeza que a viagem seguirá normalmente.
— Então... — Harry chama minha atenção, fazendo com que eu o encare. — Onde quer passar a lua de mel? — indaga meu noivo. Posso senti-lo hesitante, portanto, rio com sua pergunta.
— Não estou com ânimo para viajar. Se algumas horas em um carro já passo mal, imagine horas e horas em um avião? — Harry olha-me rapidamente, e assente, voltando a encarar a estrada.
Seu semblante transparece tristeza, e aceitação obrigatória, como se não pudesse questionar minha decisão. Talvez Harry queira mesmo tirar férias, e talvez até mesmo necessite de férias, já que vive trabalhando. E se Harry quisesse usar a lua de mel para descansar de todo esse auê que tem sido sua vida? Que tem sida as nossas vida? E se eu estraguei todos os seus planos por conta de alguns enjôos? Harry será meu marido de qualquer jeito, e em um casamento algumas vezes precisamos ceder nossas vontades.
— Mas... Para onde pensa em ir? — pergunto ao moreno de cachos, que olha-me surpreso, e abre um mísero sorriso.
— Bom, Louis quando se casou com Ivy, sua esposa, viajou para Grécia, ambos disseram que lá é lindo, e um ótimo lugar para descansar. Mas estive pensando em Maldivas, o que acha? Pode ser uma opção. — sugere meu noivo. Sorrio com sua animação, e concordo com a cabeça.
— Maldivas parece uma ótima opção.
×××
— Brooke. Brooke, acorde, estamos perto. Vamos lá, Brooke, eu não sei qual propriedade é. — posso identificar Harry chamando-me, mas a preguiça não deixa que eu abra os olhos, então apenas resmungo, tentado avisar a Harry que estou acordada. — Está acordada? — solto outro resmungo, ainda de olhos fechados. — Ótimo, agora levante para que me mostre qual dessas fazendas é a sua. — outro resmungo alto, e um suspiro, e finalmente abro meus olhos.
A visão que tenho, eu poderia ter todas as manhãs sem reclamar. Meu banco está inclinado para que pudesse dormir com um pouco de conforto, e tenho uma visão limitada de Harry. Seus cabelos, ainda longos – que prometera que cortará para o casamento –, está preso a um elástico preto no topo de sua cabeça, sua expressão é de uma criança que acabara de chegar em seu lugar favorito no mundo, e seu sorriso é, sem dúvidas, o mais contagiante. Absolutamente uma visão e tanto.
Lentamente, espreguiço-me, e me sento no banco ainda inclinado. Ainda zonza, encaro o lugar que estamos, e é extremamente familiar. Sinto um aperto no peito ao lembrar que era o lugar preferido no mundo do meu pai, mas sorrio ao ver que entramos na rua onde está localizado a entrada da fazenda Thompson. Harry encara-me e espera que eu diga alguma coisa.
— Pode seguir até o final da estrada, é a ultima. — aponto para a longa estrada, onde no final da mesma está localizada minha fazenda.
— Brooke... Qual o nome do seu pai? — Harry pergunta claramente confuso enquanto dirige até o portão que tem grafado na madeira uma enorme letra T no meio. O grande portão de ferro está trancado com cadeado.
— John Thompson, por quê? — indago, soltando o cinto de segurança. Pego minha bolsa e vasculho-a, procurando a chave que Harry me deu.
— John Deere Thompson? — Harry pergunta de novo, quando para a frente do portão. Pego a chave e olho confusa para Harry.
— Como sabe o nome do meu pai? — encaro Harry. Deere não é um nome muito comum, e meu pai pouco o citava. Descobri que meu pai tinha esse nome quando fiz minha carteira de identidade aos 10 anos, antes disso, eu nem fazia ideia da existência de Deere.
— Quando me formei na faculdade, apenas uma pessoa me ajudou: John Deere Thompson. Se não fosse por ele, eu com certeza não teria nada do que conquistei. — Harry profere, e me encara finalmente. — O mesmo John que fez uma puta festa de fim de ano para todos os funcionários de sua empresa nessa fazenda, e chamou todos seus amigos empresários. Cacete, Brooke, eu vou me casar com a filha da pessoa a quem devo tudo! — Harry diz com excitação. Posso sentir seu nervosismo de longe. Sorrio para Harry, para evitar o desconforto.
— Eu vou abrir o portão... — digo, e abro a porta do carro, seguindo em direção ao portão.
Um turbilhão de pensamentos se passa em minha mente, e me questiono o que meu pai acharia se soubesse de toda essa história. Lembro-me quando Harry precisou de ajuda. Lembro-me do meu pai gabando-se por ajudá-lo, e dizendo que ele seria uma grande homem. Eu só não lembro do Harry propriamente dito.
Desencadeio o portão, e abro as duas partes do mesmo. Espero Harry passar com o carro e fecho o mesmo, indo em direção ao carro e entrando no mesmo novamente.
— Agora é só subir esse morrinho... — digo a Harry, que está com um expressão indecifrável, mas segue o caminho.
— Você não vai falar nada? — Harry indaga, acelerando o carro.
— Eu não sei o que falar. — respondo. Olho rapidamente para Harry que assente, e segue o caminho subindo o pequeno morro, e passando por outro portão de ferro já aberto.
Tenho a melhor visão que já tive em anos quando Harry chega ao topo. Minha fazenda continua a mesma que sempre fora, e continua muito bem cuidada. Olho aos arredores sorrindo. O enorme campo de futebol, em um patamar abaixo de onde se encontrava a casa, estava com a grama cortada e bem verde. E o estacionamento ao lado da casa, só continha as caminhonetes que os funcionários usavam para ir a cidade se precisassem. Peço a Harry para estacionar ao lado da caminhonete, e assim ele o faz. Sem esperar que Harry desligue o carro, saio do mesmo, inspirando profundamente e sentindo o ar fresco entrar em meus pulmões. Eu definitivamente amo esse lugar.
— Nossa... — ouço Harry falar assim que sai do carro. O encaro. — Parece maior sem ninguém. — diz, e eu sorrio, concordando.
— Vem, vamos ver se tem alguém na casa. — impulsivamente, pego Harry pela mão, e caminho até a casa o segurando.
Assim que pisamos na varanda, vejo Eleanora sair de dentro da casa e apertar os olhos para enxergar melhor, e assim que me reconhece, abre um enorme sorriso. Eleanora é governanta desde que eu posso me lembrar.
— Brooke, querida! — Lea se aproxima abrindo os braços para mim. Solto-me de Harry e abraço a mulher que não vejo há alguns meses. Me separo e continuo segurando sua mão. — Senti sua falta, querida. Não nos vemos desde... bom, você sabe. — a ultima vez que nos vimos foi no enterro do meu pai, e isso deixou todos da fazenda abalados.
— Senti sua falta também, Lea. — sorrio.
— E esse rapaz, quem é? — pergunta. Quase havia me esquecido de Harry. Olho para o mesmo que nos encara com um sorriso adorável no rosto. Solto-me de Lea e pego a mão de Harry, novamente.
— Bom, Lea... Este é Harry, meu noivo. — abro um sorriso para Lea.
— É um prazer, senhora. — Harry diz educadamente, esticando sua mão livre da minha para Lea. A mesma sorri e aperta.
— O prazer é todo meu! Não acredito que irá casar, Broo! Seu pai seria o homem mais feliz do mundo. — comenta, enquanto analisa Harry.
— Tenho certeza que sim.
— Agora vamos, entrem! O almoço está quase pronto!
Seguimos com Eleanora para dentro da casa. Harry se mantém quieto, e isso me incomoda. Sei que deveria ter falado algo, mas é tão confuso para mim quanto para ele. Lea continua a falar coisas, e como estão todos da fazenda. Meu olhar está preso em Harry, que ainda segura minha mão com firmeza e sorri para cada coisa que Eleanora fala, mesmo que seja algo sem sentido.
— Então, me contem... — Eleanora começa depois de algum tempo de silêncio. — O que vieram fazer tão longe de Los Angeles? — pergunta, colocando uma travessa em cima da mesa e nos encarando.
— Vamos nos casar... E queríamos fazer o casamento aqui. — digo, sem rodeios. Lea abre um sorriso, e vejo seus olhos encherem de lágrimas.
— Querida! Seu pai ia amar que isso acontecesse. Estou tão feliz. Meu Deus. — ela profere animada. — O lugar está em perfeitas condições, vocês podem fazer na área de lazer, seria uma ótima opção. — Lea começa a falar sem interrupções, mas paro de prestar atenção quando Harry se levanta da mesa, pedindo um “licença” baixo, fazendo Lea parar de falar e olhar-me confusa. — Eu disse algo errado? — pergunta preocupada. Nego com a cabeça.
— Eu disse algo errado. — afirmo, levantando-me, e indo atrás de Harry.
Sigo para sala na esperança de vê-lo, e não o encontro, então saio da casa. Na varanda, também não está. Pergunto-me como pode caminhar tão rápido assim. Vou até o estacionamento e não encontro-o no carro e nem próximo. Então desço o pequeno morro grameado em direção a área de lazer, onde tem um enorme campo de futebol em um canto separado e com grade, sigo pela grama onde é apenas um lugar vazio e enorme. Sigo em direção a sala de jogos que meu pai criara e a mesma está trancada. Andando mais um pouco, sigo em direção a piscina da fazenda, e posso avistá-lo de longe, sentando em uma espreguiçadeira.
— Harry! — chamo-o me aproximando. O sol escaldante em minha cabeça faz eu me arrepender de estar de calça. Harry olha para trás e logo olha para frente de novo, encarando suas mãos. — O que aconteceu? — pergunto ao estar próxima o suficiente e paro a sua frente. Harry levanta o olhar para mim.
— Eu só estou cansado. Eu não sei... Não sei o que eu estou sentindo agora. — ele diz e engole a seco. Aponto para o espaço vazio e Harry assente, então me sento ao seu lado. — Eu estou confuso. Quero me casar com você, pois sei que vai ser o melhor para nós três. Mas ainda sim, sinto como se estivesse prendendo você a mim. — ele diz baixo.
— Você quer desistir? — pergunto baixo. Estou pronta para ouvir um “sim” vindo dele, mesmo que meu coração implore por um “não”.
— Não! De jeito algum. — Harry profere, me aliviando. — Só tenho medo que não seja o suficiente para você. — encaro-o confuso. — Estamos presos um ao outro pelo próximo ano, Brooke. — ele comenta e olha para mim. — Entende o que quero dizer. Não nos relacionaremos com mais ninguém pelo próximo ano. A não ser nós mesmos.
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