Depois de eu quase me afogar umas 15 vezes e ficar em cima do pescoço de Gabriel por um tempo, nós saímos do rio. Nem percebemos que a correnteza havia nos deixado longe da moto.
- Vamos ter que andar alguns metros. - ele riu.
- Estou morta de cansaço. - falei.
Ele sorriu e ficou na minha frente, de costas para mim. Fez um sinal e eu pulei em cima dele, que segurou minhas pernas imediatamente para eu não cair. Me levou de cavalinho até a moto.
- Pronto, madame, pode descer.
Eu ri e desci das suas costas, me perguntando como eu iria me secar.
- Trouxe umas toalhas - ele falou, como se tivesse lido meu pensamento. - Estão na bolsa.
Fui até a mesma e a abri. Tirei de lá duas toalhas, e joguei uma para ele, que a pegou no ar.
- Pode virar para lá. - falei.
- De novo?
- Sim.
- Tá, então espera aí.
Ele se enxugou, pegou suas roupas e se trocou bem ali na minha frente. Passou a toalha mais uma vez pelos cabelos loiros úmidos, que agora estavam castanhos, os bagunçou e jogou a toalha em cima da moto. Na mosca.
- Ainda defendo a ideia de que poderia ter trazido um balde para você. - disse.
- Ah, cale a boca. - rolei os olhos e esperei ele me virar para que eu pudesse me trocar.
Quando coloquei a lingerie, falei que ele poderia virar, já que eu não tinha vergonha de estar perto dele só com a roupa debaixo.
Ele me analisou com o olhar enquanto eu desdobrava minha blusa e a colocava. Deu um sorrisinho ao ver minha careta quando desfiz o coque do cabelo molhado e veio até mim.
- Vamos embora agora? - perguntei. Apesar de querer ficar o dia todo com ele, a matéria da prova de amanhã pesava na minha cabeça. Eu precisava estudar.
- Não estava nos meus planos - ele sorriu - Juro que te ajudo para a prova amanhã.
- Tudo bem - rolei os olhos sorrindo. Não era todo dia que passávamos juntos em um lugar como esse - Tem mais?
- Tem, sim, baixinha. - bagunçou meu cabelo - Vem comigo.
Enquanto andávamos, eu ia deixando o vento colocar meus cabelos no lugar. Estávamos no pôr-do-sol, e eu não fazia ideia de onde ele iria me lavar.
Ele entrelaçou seus dedos nos meus e meu coração amoleceu. Era um gesto simples, mas era uma das melhores sensações que existiam no mundo.
Depois de uns 10 minutos andando pela grama e entre algumas árvores, chegamos até trilhos de trem. Eles não funcionavam mais, mas estavam em bom estado e eu estava me perguntando o porquê de Gabriel ter me trazido aqui.
Ele me levou até o meio dos trilhos e se sentou. Eu o olhei e ele fez um sinal para eu me sentar ao seu lado. O fiz, e ele deitou no meu colo.
Os últimos raios de sol brilhavam em nossa direção, eu prendi meu cabelo já quase seco em um coque. Queria saber o que ele queria fazer aqui, mas não queria interromper essa paz que estava nos rodeando. Ele brincava com seus dedos e eu olhei seus cabelos mexendo com o vento.
- Aqui é o melhor lugar perto da cidade que dá para ver o céu sem as nuvens de poeira - ele disse por fim - Quando anoitece, toda as estrelas aparecem.
Ele sabia o quanto eu amava astrologia e astronomia. Por isso havia me trazido até aqui.
Abri um sorriso e me abaixei para beijá-lo.
- Isso foi um agradecimento? - ele riu
- Pode considerar como um - me inclinei para trás, apoiando o peso nos braços. Gabriel ficou fazendo carinho na minha perna até a noite cair. E quando isso aconteceu, meu deitei ao seu lado e ele foi me mostrando as constelações que eram possíveis de ver. Um tempo depois, começamos a falar sobre buracos negros, de como não conseguimos vê-los se eles estiverem bem na nossa frente, mas conseguimos ver atrás deles. E de como o tempo fica infinitamente lento dependendo da distância que você está do buraco negro. Em outras palavras, o tempo para. E você passa a não existir mesmo existindo.
Depois de mais de um hora dessa conversa, nos sentamos e ele me beija. Suas mãos passeiam por minhas costas e ele começa a levantar minha blusa, roçando os dedos em minha pele. Solto um suspiro e ele olha para baixo. Mesmo no escuro, pude ver que sua pupila diminuiu de tamanho. Ele ficou tenso e eu percebi para onde ele estava olhando.
Minha barriga.
Abaixei a blusa num movimento rápido e olhei para o lado.
Gabriel respirava pesado na minha frente. Não era possível que ele tenha notado tanta diferença.
Sim, era possível, e eu sabia disso. Gabriel conhecia cada milímetro do meu corpo, cada medida. Ele saberia na hora se houvesse alguma medida errada, algum centímetro fora do lugar. E isso me dava medo agora.
- Vamos embora - ele falou e se levantou.
- Por quê?
- Você tem que estudar. E eu não tô mais a fim de ficar aqui. - ele disse simplesmente.
Um aperto no meu peito surgiu de repente. Ele não vai voltar com as suas 5 personalidades diferentes, vai?
Me levantei e fui atrás dele, que já estava em cima da moto quando o alcancei. Ele me entregou o capacete e eu o olhei.
- Vamos logo. - falou.
- O que você está fazendo? Por que quer ir?
- Já falei que é porque não quero mais ficar. Podemos ir?
Eu arregalei os olhos com sua rispidez, mas subi na moto. Caso contrário, ele poderia me deixar para ir embora a pé sozinha. Com esse humor, eu não duvido que ele faça isso.
Quando chegamos em casa, eu desci, ouvi um "tchau" seco dele e me encontrei, segundos depois, parada na calçada tentando processar o que havia acabado de acontecer.
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