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História Our Sin (EM PAUSA) - Don't look at me like that.


Escrita por: poetyeeun

Notas do Autor


Hallo!
Como vão, babes? A essa hora, venho trazer mais um capítulo de Our Sin, o primeiro do ano. E antes de tudo, quero agradecer pelo suporte com a história que tanto aprecio escrever. Sem mais delongas, vamos ao capítulo. Espero que gostem. Boa leitura. MWAH!

➡ Capítulo sem uma revisão mais profunda, perdoem-me se tiver erros.

Capítulo 3 - Don't look at me like that.


Fanfic / Fanfiction Our Sin (EM PAUSA) - Don't look at me like that.

 Não tive uma boa noite de sono. Levantei várias vezes, rolei na cama e não consegui dormir mais que algumas poucas horas. A verdade era que o rosto daquele motoqueiro não saiu da minha cabeça nem mesmo por um minuto. Após vê-lo partir em sua moto, a curiosidade para saber mais sobre ele apenas aumentou e mesmo que parte de mim gritasse para que não ousasse saber mais, outra parte queria que eu descobrisse tudo o que fosse possível.

Eu não devia querer reencontrá-lo.

Mas eu queria reencontrá-lo.

Não era difícil enxergar como nós éramos diferentes, começando por nossos mundos. Enquanto o meu mundo era simples e restrito, o dele era cheio de aventuras, perigos e velocidade. Parecia que não havia regras e isso era uma das coisas que enlouquecia pessoas como o meu pai que, em nossa cidade, detestava quaisquer ações que pudessem acabar com a paz em sua comunidade.

— Hum... Pesquisando sobre motoqueiros. — a voz aguda de Camile, rente ao meu ouvido esquerdo, me faz sobressaltar e abaixar a tela do meu notebook depressa.

— Você me assustou. —  murmuro, sentindo meu rosto e orelhas esquentarem.

— Isso é algum tipo de trabalho ou está apenas querendo investir em algum motoqueiro gostoso da cidade grande? —  ela ignora meu murmúrio e senta-se na cadeira de frente para mim, apanhando uma das minhas rosquinhas que comprei na lanchonete da universidade.

— Eu só... —  não saberia como lhe dizer que estava curiosa sobre toda essa coisa de motoqueiros e clubes, especificamente sobre Danger. — Apenas fiquei curiosa sobre algo que vi na noite passada.

Camile semicerra os olhos.

— Não me diga que se encontrou com um dos Cavaleiros? — suspira e solta o peso de seu corpo na cadeira. — Aqueles homens são pedaços apetitosos de mau caminho. Considere-se sortuda por ser nova na cidade e ter se deparado com eles.

— Porque os chamam de Cavaleiros... —  forço-me a me lembrar sobre o resto do nome dito por Annelise. — do Inferno? —  sussurro a última palavra, fazendo um rápido sinal da cruz.

Em minha casa, sempre que deixava escapar algo relacionado ao pecado ou ao ser que se esconde embaixo da terra, meu pai me fazia orar por meia hora, livrando minha boca e mente de tais pensamentos. Acostumei-me a pensar antes de dizer qualquer coisa, apenas tendo liberdade de dizê-las quando tinha alguma dúvida sobre os testamentos bíblicos ou sobre algo que ouvi em algum lugar.

Sempre fui curiosa e isso não era algo admirável para o meu pai. Quando terminei o colegial, questionei por toda a noite o fato de não ter tido a chance de ir ao baile de formatura. Eu não teria um par ou um irmão para me levar, mas eu queria ter ido e me divertido com meus colegas, ao menos explorado parte perdida da minha adolescência. Após ouvir seus gritos e súplicas para que Deus não permitisse que eu me perdesse como outros adolescentes da minha idade, ele me mandou para o meu quarto, e ao jogar-me sobre meus travesseiros, chorei por toda a noite.

Owen dizia que eu nunca iria viver se continuasse seguindo as regras do nosso pai. E, talvez, ele tivesse razão.

— Esse é apenas o nome do clube. Ninguém sabe ao certo quem deu início a ele, mas hoje em dia, Danger é quem comanda tudo, junto a outros caras... —  ela se abana, como se estivesse espantando o calor. — Tem um deles que me deixa louca. Ele já esteve em algumas festas e já trepou com algumas garotas daqui... Tão sortudas.

— Ei! Olha essa boca. — faço uma careta e Camile solta uma risada, rolando os olhos. — O que eles fazem?

— Aterrorizam a cidade. — parece pensar. — Se deseja saber se eles fazem coisas ruins, a resposta é sim, com certeza. Eu já ouvi muitas histórias sobre os Cavaleiros e metade de Londres tem medo do que eles podem fazer ou ser.

Engulo em seco.

Eu realmente não devia querer saber mais.

— Porque todo este interesse sobre eles? — ergue as sobrancelhas. — Não que eu a julgue por isso, porque eles estão no topo da minha lista de aventuras mais saborosas. Mas, você me parece uma moça tão... —  aponta para mim. — Centrada. Não me parece o tipo que se aproximaria de um motoqueiro.

Ela estava certa.

Eu não me aproximaria de um motoqueiro, nem mesmo poderia imaginar isso, um dia.

Apenas estive na garupa de um completo desconhecido, vestindo o colete de um clube e sendo um terror para a cidade.

Apenas isso.

— Não é nada. É só... Curiosidade. — digo e sinto-me aliviada por olhar no relógio ao alto da entrada da lanchonete e perceber que já estava na hora da minha aula, sendo a minha deixa para começar a pegar minhas coisas.

Fico de pé em questão de segundos, deixando para Camile mais algumas rosquinhas. Me despeço da minha colega de quarto e aceno, seguindo o meu caminho ainda com o rosto vermelho e quente por ter sido interrogada.

Apresso-me pelos corredores, pedindo licença para algumas pessoas e me desviando de outras. Desde o meu primeiro dia, os olhares voltados a mim não eram gentis ou curiosos, conseguia ouvir algumas risadas e murmúrios na sala de aula e pelos corredores também. Mas, não me importava com isso. Camile era uma boa amiga e eu não precisava de muitos amigos, a vida inteira tive apenas uma amiga além de Owen que era, além de irmão, meu melhor amigo.

Sabia que minhas roupas não se encaixava com os padrões de moda londrinos, mas não achava que era necessário mudar para agradar alguém. Eu me sentia confortável usando as roupas que minha mãe comprava e fazia para mim. No colégio, até pensei em mudar todo o meu guarda-roupa, não queria mais ser motivo de piada para meus colegas, queria tantos amigos quanto os que meu irmão tinha, todos o adoravam e eu era apenas a chacota entre os alunos. Antes, eu chorava por horas no banheiro e ouvia as meninas falarem de mim. Aquilo me machucava muito.

Devido a esses choros no banheiro, perdia muitas aulas e acabava ficando de detenção ou precisava ficar até mais tarde para copiar as matérias. Owen contou ao meu pai e lhe disse para me deixar vestir o que eu quisesse, não o que eles achavam ser o ideal para mim. Meu pai não compreendeu e disse que eu estava pecando por não ser grata pelas roupas que tinha, e que vaidade era algo que iria me afastar do Senhor. Sentia-me culpada. E para me confortar, minha mãe falou palavras doces e me permitiu ficar longe do colégio por alguns dias, mas eu tive que voltar. E quando voltei, precisei lidar com tudo novamente, mas alguém falou comigo, e não foi por pena ou para me fazer sentir ainda pior, foi com sinceridade. E por isso não há um único dia que eu não pense em como poderiam existir mais pessoas como Kristen.

— Bom dia, novata. —  ergo minhas sobrancelhas e olho para o lado, encontrando Michael.

— Bom dia. — dou um pequeno sorriso. — Acho que já lhe disse o meu nome.

— Você disse, mas como ainda não a conheço bem, é uma novata. —  diz em tom de brincadeira. — O que está achando da UCL? Era tudo o que imaginava ou já está pensando em acertar alguns colegas com uma ferramenta pesada?

Não consigo conter uma risada alta.

— Por favor, não me acerte com uma ferramenta.

Balanço a cabeça, virando o corredor que dava acesso a nossa sala.

— Estou gostando de tudo o que estou vendo. É apenas grande demais, diferente demais. —  digo, comparando mentalmente os aspectos evidentes que diferenciavam Londres de Ames.

— Logo você se acostuma. — Michael diz e aponta para a porta da nossa sala de aula.

— Obrigada. — agradeço e entro, mantendo a minha cabeça baixa, mas podendo sentir a movimentação atrás das bancadas e ouvindo as vozes que ecoavam em notas elevadas.

— Acho que nos tornamos parceiros até o fim do nosso curso. — ele se senta no banco ao meu lado, como no dia anterior.

Olho para ele e me permito sorrir.

— É, acho que sim.

Ele retribui o meu sorriso e livra-se de sua mochila, colocando-a no chão.

Não trocamos muitas palavras, apenas alguns olhares e sorrisos tímidos. Ele parecia conhecer muitas pessoas, cumprimentou algumas e pareceu se divertir com outras. Alguns de seus amigos acenaram para mim, outros pareciam que nem me viam ao seu lado. Pude perceber que a curiosidade sobre mim era apenas no momento em que percebiam o que eu costumava vestir, mas não se importavam em me conhecer, verdadeiramente.

Está tudo bem. Tudo ao seu tempo.

O professor não demorou para aparecer, e sua apresentação foi divertida, assim como sua aula. Ainda não tivemos experiências práticas, mas não deixei de anotar os segredos da mecânica, e gravei em minha memória todas as fotos que foram mostradas e também suas funções. Michael parecia estar concentrado e tão interessado quanto eu em tudo o que o professor nos explicava.

Ao fim das aulas, após muitos diálogos, o professor nos passou uma lista para um trabalho em dupla, nos dizendo que seria a nossa primeira chance de conseguir uma nota. As duplas seriam montadas entre as duas pessoas que dividiam as bancadas, sendo assim, Michael seria o meu parceiro deste e de outros trabalhos. Talvez isso não seja algo ruim.

— Como faremos este trabalho? — Michael pergunta, me acompanhando.

Preferi esperar a sala esvaziar para arrumar minhas coisas e sair.

— Eu não sei. Trabalho todos os dias após as aulas, tenho finais de semana livres e folgas apenas em feriados.

— Pode ser depois do seu trabalho, então?

Mordisco o meu lábio inferior, pensando sobre sua oferta.

Havia dias que eu era liberada mais cedo, outros fazia hora extra.

— Se não ficar muito tarde para você, por mim está tudo bem.

— Para mim está ótimo. — ele retira um celular do bolso de sua calça jeans. — Me passa o seu número para que me mande uma mensagem quando sair do trabalho.

Desvio de um grupo de alunos e paro de andar, sentindo-me constrangida.

— Eu não tenho um celular. — murmuro, sem coragem para olhá-lo.

Em casa, toda e qualquer tecnologia soavam como um ultraje para meu pai. Minha mãe me emprestava um celular antigo, de botões, apenas quando eu saia que só recebia e fazia ligações, mas meu pai não sabia disso. Quando fiz quinze anos, meu tio Lizandre me deu o seu antigo celular que também era antigo e apenas ligava e recebia ligações, mas após a perda de Owen e todos os problemas que passamos em casa, meu pai quebrou o meu celular em vários pedaços apenas porque me viu conversando com Kristen por ligação. Não pude chorar ou reclamar, já me sentia culpada o bastante. Ele tinha direito de fazer aquilo, ele estava triste pela perda de seu filho, e a culpa era minha.

Meu notebook foi um presente da minha mãe para ajudar em meus estudos. Meu pai nunca soube que ela gastou todo o dinheiro das suas vendas de bolos e suéteres para me dar esse presente. Sabia que, assim como eu, ela se sentia culpada por nunca ter ido contra as regras do meu pai, por nunca tê-lo enfrentado. Na verdade, minha mãe era apenas uma mulher que amava o seu marido, e amava ainda mais a sua família a ponto de suportar tudo para não dificultar ainda mais as coisas para nós. Ela era uma ótima mãe, eu a amava e jamais iria culpá-la por nada.

— Oh, bem... —  Michael parecia confuso, mas não perguntou nada. — Então pode anotar o meu número para me ligar, de algum modo? Assim posso buscá-la.

— Tudo bem. —  de forma desajeitada, consigo apanhar uma caneta dentro do bolso externo da minha mochila.

Michael sorri e pega a caneta da minha mão direita, em seguida, segura o meu pulso e o vira para si, subindo a manga do meu suéter. Não o repreendo, mesmo que aquele ato tenha me pegado de surpresa. Ele começa a riscar minha pele, causando-me leves cócegas enquanto anotava os números do que me parecia ser o número do seu celular.

— Ligue-me quando sair. Irei buscá-la.

— Posso pegar um ônibus. Não quero incomodar. — ele puxa a manga do meu suéter para baixo, e solta meu pulso, estendendo a caneta em minha direção.

— Apenas me ligue, novata.

Não tento arrumar mais desculpas, apenas observo seu corpo ir para longe, enquanto acena para mim, se despedindo.

Balanço a cabeça, sorrindo. Michael era mesmo um cara legal.

Volto a caminhar, fazendo meu caminho para sair do campus e correr para meu trabalho antes que me atrasasse. Leva algum tempo até um táxi aparecer, e correndo atrás dele para que não me deixasse para trás, peço para me levar até o endereço da lanchonete.

Durante a viagem, penso em como Londres era interessante e como Kristen iria adorar conhecer, principalmente as lojas de roupas, já que ela adorava assistir programas de moda e costurava algumas peça para vestir. Uma vez, ela me deu um vestido, mas nunca tive coragem de usá-lo, era muito curto e se meu pai me pegasse usando algo como aquilo, iria me trancar em casa e nunca mais me deixar sair sem sua supervisão.

— Chegamos, moça. — a voz do motorista chama minha atenção.

— Obrigada. — pago pela corrida e abro a porta do carro.

Ao entrar pelos fundos da lanchonete, observo que, como no dia anterior, a cozinha estava cheia de pessoas correndo de um lado para o outro enquanto preparavam os pedidos.

— Olá, Faith. — Anne é a única que me recebe com um sorriso. — Que bom que chegou, estamos lotados de pedidos e sinto os fios brancos começando a nascer.

Ela parecia cansada.

— Posso ajudá-la. Só preciso guardar minhas coisas.

— Então vá, depressa... —  diz e bate as mãos.

Apresso-me, indo ao mesmo quartinho, guardando minhas coisas e vestindo o meu uniforme que estava dobrado em um cabide junto ao meu avental que já tinha uma plaquinha com meu nome.

Volto para a cozinha e encontro Anne colocando alguns copos de suco na bandeja, enquanto falava com um dos cozinheiros que montava alguns hambúrgueres.

— Leva esses copos para a mesa dez. O suco de laranja é sem açúcar e a pedido da loira que se parece com a Barbie. — me instruí. — Ela é extremamente rude, então não espere por um agradecimento.

— Tudo bem.

Já do lado de fora da cozinha, passo pelo balcão e procuro pela mesa dez, não demorando para encontrá-la. Sirvo os jovens, sorrindo educadamente, mas nenhum deles pareceu prestar atenção em mim, tão pouco a loira que me olhou com um olhar pouco amigável e quase arrancou o suco da minha mão.

Retorno para o meu posto, e meu trabalho não para pelas próximas horas. Observei as idas e vindas de todas as garçonetes e fiquei tão agitada quanto elas. Eram muitos pedidos e acabei me confundindo com alguns deles, o que me causou algumas broncas de Lourine e olhares pouco satisfeitos dos clientes. Eu estava me esforçando para agradar a todos, mas não estava sendo fácil.  Meus pés já doíam e sentia que meu corpo precisava de um banho quente e uma cama macia.

Annelise me ajudou com algumas mesas e pedidos, me deu algumas dicas e foi gentil comigo a todo momento. Na hora de almoço, ela me chamou para a cozinha e comemos um delicioso e gorduroso hambúrguer feito por Jordan, o homem responsável pelos pratos mais deliciosos da lanchonete. Era um senhor gentil que tinha um bigode engraçado, ele sempre passava seus dedos por ele, deixando-o com as pontas arqueadas e levemente enroladas.

O meu turno não encerrou tão tarde quanto na noite passada, mesmo tendo sido um dia cheio, após as duas da tarde, as coisas ficaram mais calmas e foi possível trabalhar sem tanta correria. Ganhei algumas gorjetas e Annelise se sentiu satisfeita com seu dia de trabalho, mas não deixou de comemorar quando fomos liberadas. E como o dia anterior, parecendo ser um costume, ela foi para a mesma direção, se despedindo de mim, desta vez, subindo em uma bicicleta e pedalando pelas calçadas.

Pensei em esperar por um ônibus, mas lembro-me que na noite passada essa decisão me fez subir na garupa de um motoqueiro perigoso por toda a cidade. Então, atravesso a rua e avisto uma cabine telefônica. Ergo o meu suéter e agradeço por meu dia de trabalho não ter feito o número ser completamente apagado pelo suor.

Coloco uma moeda no local indicado e disco o seu número. No terceiro toque, a sua voz soa do outro lado da linha.

— Alô?

— Oi... Michael, aqui é a Faith. Sabe, sua colega de classe.

— Eu reconheço sua voz, novata. — brinca. — Posso buscá-la?

— Se não for incomodo...

— Já falamos sobre isso. — diz em tom mais sério. — Me fala o endereço e me espere. Não levarei mais que dez minutos.

Passo o endereço para ele e encerro a ligação. Coloco o telefone no gancho e olho para os números. Pego mais algumas moedas e coloco-as no mesmo lugar, desta vez, discando outro número.

— Residência Lancaster...

— Mãe, sou eu...

— Querida? Graças a Deus! — a voz da minha mãe torna-se um pouco mais animada. — Isaac, venha aqui, é a Faith!

— Como vocês estão, mãe?

— Ela está bem? — o meu pai pergunta do outro lado. — Ela ainda não falou. Tenha calma, homem. — minha mãe o repreende. — Estamos bem, filha. Como você está? Está sendo bem tratada na universidade?

— Tudo está indo bem, mãe. A universidade é grande, as pessoas são agitadas e o meu emprego é cansativo, mas estou tirando algumas boas gorjetas. — encosto-me contra a cabine. — E como estão as coisas aí?

— Fico aliviada em saber disso, minha menina. — ela diz, quase como se estivesse suspirando de alivio. — O seu pai participará do evento anual de caridade. O coral está ensaiando um novo repertório, mas falta você.

Abro um sorriso, me lembrando das vezes que participei do coral.

— Tenho certeza que todos irão impressionar.

— Me deixe falar com ela, Rachel. — a voz grave do meu pai ecoa. Ouço minha mãe bufar. — Você ouviu esse velho rabugento. Irei passar para ele, filha.

— Certo, mãe. — respondo-lhe ainda sorrindo.

— Filha, oi... Como você está? Estão te tratando bem?

— Oi, pai. Eu estou bem. — olho para fora da cabine, vendo alguns carros passar pela pista. — As pessoas daqui são muito receptivas.

 — Quando virá nos visitar? Não há algum feriado ou recesso por estes próximos dias?

— Pai, minhas aulas acabaram de começar.

— Eu sei. Mas, eu simplesmente não consigo imaginá-la tão longe por tanto tempo. Estou fingindo que está apenas de férias e que logo irá voltar. — ele suspira. — Eu não quero perdê-la também. Eu não posso.

— Vocês não irão me perder.

Vejo um carro prateado parando ao lado da calçada, de frente para a cabine.

— Agora eu tenho que ir. Tenho um trabalho em dupla para fazer.

— Essa hora da noite, Faith?

— É o único horário livre que tenho, pai. — explico, calmamente. — Iremos apenas organizar algumas ideias. Em seguida, irei para meu dormitório.

— Tome cuidado, por favor. Não confie em qualquer pessoa e não se deixe induzir por atitudes boas demais. — ele diz, exatamente como me alertou durante toda a minha vida. — Lembre-se que o Diabo foi um anjo.

Fecho meus olhos e concordo com a cabeça, mesmo sabendo que ele não podia me ver.

— Tomarei cuidado. Eu prometo. — digo e olho para fora da cabine, vendo Michael colocar sua cabeça para fora da janela. Faço um sinal com uma de minhas mãos, lhe pedindo para aguardar um momento. — Eu amo você e a mamãe.

— Eu também amo você, minha linda menina! — minha mãe fala e eu imagino que ela esteja usando a linha da cozinha para ouvir toda a conversa. — Nos ligue todos os dias.

— Eu ligarei.

— Eu te amo, filha. — meu pai diz. — Que Deus lhe proteja.

— Amém. Vocês também. — respondo-lhe. — Até mais.

Ao encerrar a ligação, esfrego a palma da minha mão esquerda em minha testa. Deixo a cabine telefônica e me aproximo do carro de Michael.

— Entre em minha carruagem, novata.

— É uma carruagem bonita, veterano. — digo e ele solta uma risada, mexendo nas golas de sua camisa vermelha.

Dou a volta e entro no carro, percebendo o quão limpo e interessante era o veiculo por dentro. Todo o estofado era de couro claro, possuía um painel bonito e iluminado, um volante com proteção de couro do mesmo tom do resto do carro. O som parecia ser de outro mundo, e os botões tinham uma iluminação colorida.

— Uau!

— Pensou que um estudante de Engenharia Mecânica não teria um carro personalizado? — pergunta, de maneira convencida. — Quando encontrei esta belezinha no ferro velho não passava de sucata prestes a ser prensada. Fiz alguns ajustes aqui, outros ali, e descobri a minha verdadeira paixão.

— Então sonha em construir carros?

— Sonho em melhorá-los. —  ele me responde, sem deixar de sorrir. — E então, está com fome?

— Não. Estou bem.

Antes que minha afirmação fosse levada em consideração, minha barriga começa a roncar tão alto que me envergonha.

— Irei ignorar suas palavras e confiar nesse monstro prestes a nos devorar aí. – ele diz e solta uma risada, girando a chave na ignição do carro.

Abaixo a minha cabeça, sentindo-me corar, fortemente.

Não consigo mais conversar com Michael durante todo o percurso. Não sabia para onde estávamos indo, mas em algum momento ele ligou o som e colocou uma música aleatória, deixando-me um pouco mais relaxada.

— Onde estamos? — questiono, curiosa por estar vendo a distância um enorme letreiro em cor neon, com vários carros parados na frente.

— Este um bar popular daqui, é um pouco afastado do centro da cidade, mas muita gente vem aqui. O lugar é simples, mas confortável e serve uma boa comida. —  explica. — O estacionamento está cheio, terei que procurar um lugar para estacionar. Quer ir na frente e pegar um lugar para nós sentarmos?

Olho para todas as fileiras de carro e para o estabelecimento.

— Tudo bem.

Deixo o carro e Michael, enquanto olho ao redor, conhecendo o lugar que se parecia com bares que Kristen lhe mostrou enquanto fazia uma pesquisa sobre os melhores lugares para se conhecer em Londres. Passando por entre alguns carros já estacionados, vejo algumas pessoas empurrando as portas dos fundos e outras dando a volta. No entanto, antes que pudesse pensar onde ficava a entrada ou saída, ouço gritos masculinos, parecendo ser de dor.

Meus olhos vagueiam por entre os carros e encontro um grupo de pessoas, mais especificamente homens, próximos a uma árvore, um pouco afastados do estabelecimento, mas eu conseguia vê-los pela iluminação do próprio letreiro do bar. Não sei como consigo deduzir o movimento, mas pelos gritos incansáveis, percebo que alguém estava enfrentando uma briga e parecia estar saindo realmente ferido.

Sendo guiada pelo meu sentimento inabalável de justiça, em passos firmes e quase confiantes demais para uma menina que veio do interior e não conhecia nada por ali, sigo em direção aquela briga.

— Parem com isso! — minha voz sai mais alta do que podia imaginar.

Várias das cabeças viram para me olhar. Engulo em seco por finalmente perceber que quase todos eles estavam vestidos como motoqueiros, usavam jaquetas com escritas e símbolos em suas costas.

Eu devia ter ignorado e seguido em frente.

— O que temos aqui? — o homem que parecia ter machucado o outro murmura e empurra dois homens que estavam em sua frente. — Você pertence ao Mouse, doçura?

— Eu não... Eu só... — balanço minha cabeça e dou dois passos para trás, vendo o homem avançar três para frente.

Ele cospe no chão e umedece seus lábios carnudos.

Mesmo com a fraca iluminação, conseguia ver que uma de suas sobrancelhas tinha três riscos grosseiros e em seu nariz havia um piercing igual ao de Kristen, no septo.

— Como sua senhora, você devia saber que não pode se meter em um acerto de contas. — o homem de sotaque imponente rosna e sorri de maneira que me arrepia inteira.

Medo. Eu estava com medo.

Por favor, não me toque.

— Não sou... E-Eu não o conheço. —  digo com a voz trêmula.

— Não acredito... — uma voz atrás do homem ganha a atenção dele. — Eu cuido dela, Hulk.

— A conhece? Porque se ela for senhora deste verme, podemos cuidar dela... Com prazer.  — ele sorri maliciosamente, olhando-me de cima a baixo. — Esses trapos não me atraem, mas ela pode ter algo para oferecer embaixo disso tudo.

Queria gritar.

Queria correr.

Mas minha voz não saia.

E meu corpo não se movia.

— Ela não pertence a ele. Na verdade, ela nem devia estar aqui. —  o rapaz que falava sai de trás do homem alto e forte e quando vejo o seu rosto, o meu coração parece falhar por alguns segundos.

Era ele.

Danger.

— Então cuida dela, porque ainda não terminei aqui.

Danger avança em minha direção, segura o meu braço direito, virando-me bruscamente e começa a me arrastar junto a ele, sem muita delicadeza. Seu aperto era firme e parecia estar queimando minha pele dentro do meu suéter, mas não tenho tempo de lhe dizer nada.

— Qual a porra do seu problema? — esbraveja, soltando meu braço. — Tem noção sobre o que acabou de fazer?

— Apenas... Eu ouvi gritos, percebi que alguém estava machucado... —  levo minha mão livre ao meu braço e massageio o lugar que ele havia segurado. — Pensei que pudesse ajudá-lo.

— O que você é? Uma mulher com peito de aço? Porque se algum daqueles homens pegassem você, não teria nem mesmo voz para gritar. —  sua feição parecia nublada e sua voz embargada de raiva.

— Me desculpe... — abaixo a minha cabeça, meus olhos começam a marejar.

 Ele solta uma risada sem humor.

— Você teve sorte por eu estar ali e ter salvado a sua vida. — ele parece respirar fundo. — Não sei de onde você veio, mas esta cidade... Este mundo, não pode ser salvo por sua bondade. Quando eu disse para não confiar em estranhos, pensei que isso a faria pensar sobre também não se aproximar de estranhos quando não é da sua conta.

Não consigo segurar as lágrimas.

Ele tinha razão.

Eu não estava em Ames. Não conhecia todas as pessoas da minha rua e nem podia sair tarde da noite sem ter medo de algo ruim acontecer.

E mais uma vez aquele motoqueiro havia me salvado.

Com as lágrimas descendo por meu rosto, meus olhos encontram os seus. Minha visão estava levemente embaçada, mas ainda conseguia vê-lo perfeitamente. Meus lábios descolam para falar a palavra que estava presa em minha garganta, mas ele me interrompe antes mesmo que eu pudesse lhe dizer.

— Não. — aponta o indicador para mim. — Não olhe para mim desse jeito!

— De que jeito?

— Com gratidão. — olha para cima e balança a cabeça, negativamemente. — Nunca direcione esse olhar para mim.

— Mas...

— Se mantenha longe de problemas, morena. Eu não costumo ser o herói. —  ele se afasta e começa a andar, voltando ao grupo de motoqueiros que estavam atacando outra pessoa que não parecia estar revidando, apenas gritando palavras sujas e algumas coisas que eu não conseguia entender.

Não sabia o que Danger queria dizer com aquelas palavras confusas. Eu era grata por ele ter me salvado duas vezes, então, porque não podia simplesmente agradecer a ele?

— Faith! — umedeço os lábios e olho para o lado, vendo Michael se aproximar de mim. — Está tudo bem?

Eu queria lhe dizer que não.

Apenas abaixo a cabeça, limpo as lágrimas e tento respirar, devagar. Precisava me acalmar.

— Está... Estou bem.

— Então vamos, antes que o seu estômago me devore por estar demorando a te alimentar. —  ele brinca, mas não consigo sorrir.

Ele coloca uma de suas mãos em minhas costas e me empurra para dentro do bar. Por cima dos ombros, olho para o lugar onde os homens assustadores estavam. E lá estava ele.

Ele estava olhando para mim. 


Notas Finais




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