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História Paredes Finas - De Beethoven à Metallica (Gilbert)


Escrita por: xNessan

Notas do Autor


Era pra eu ter atualizado antes, vocês me desculpem pela demora viu :c

Capítulo 5 - De Beethoven à Metallica (Gilbert)


Fanfic / Fanfiction Paredes Finas - De Beethoven à Metallica (Gilbert)

Roderich virou a cara pra mim.

Ele literalmente virou a cara para mim.

What the actual fuck?

Todos os dias eu tentava inocentemente lhe cumprimentar ou puxar algum assunto, ou mesmo tentar uma das brincadeiras maldosas que já estávamos acostumados. Mas Roderich ignorou todas elas. Ele estava sem falar comigo a quatro dias. Quatro fucking dias. E eu demorei esses quatros malditos dias pra finalmente me dar conta.

O jovem mestre estava bravo comigo.

Por que?

Cara eu não tinha feito nada dessa vez! Nadica de nada. Ele nunca passara tanto tempo tentando me ignorar desde a escola! E olha que naquele tempo eu me esforçava pra tirar esse tipo de reação do jovem mestre, me deleitava em vê-lo vermelho de raiva e perdendo toda a compostura. Kesesese, era bem divertido. Mas agora eu não estava vendo muita diversão nisso porque eu não tinha feito absolutamente n-a-d-a para tê-lo irritado assim, pelo contrário!

Eu suspirei enquanto escolhia qual sanduíche de micro-ondas iria comer na loja de conveniência hoje. Roderich era um mistério para mim, todos esses anos e ele sempre me aturou, e agora que eu não havia feito nada ele me ignorava. Será que era isso que eles chamavam de maturidade? Sendo ou não eu não queria. Era tão mais divertido quando eu via as bochechas e o pescoço dele ficarem coradas de raiva, ou quando ele começava a gaguejar e articular de nervosismo. O meu prazer era tanto que o Rod sempre era a primeira pessoa que eu cumprimentava ao chegar em sala de aula quando estávamos na escola. Era uma ótima forma de começar o dia! E talvez, e só talvez, era por isso que eu estava tão incomodado por ele não querer mais me cumprimentar de manhã.

(Ah, mas não é como se isso fosse importante também!)

Afinal o meu deleite em irritá-lo era porque eu o detestava. Sim, era exatamente por isso! Eu me lembro quando cheguei no ensino médio da Academia W e eu logo reconheci Elizaveta, a minha amiga de infância. Ela estava como sempre, uma tomboy de boca suja e gestos poucos femininos. Logo pensei que eu e a Liz fôssemos passar aqueles anos como nos velhos tempos, brigando e zoando! Mas então eu conheci Roderich. Fomos apresentados no primeiro dia de aula como todo mundo, mas eu só o conheci mesmo ao vê-lo tocar a Nocturne no. 6 no piano da sala de música. Foi, bem, uma visão bem impressionante, considerando que eu não gostava de músicas ao piano, principalmente peças clássicas. Ele parecia sei lá... Tão elegante, soturno e belo. Eu fiquei paralisado por alguns momentos pela imagem daquele rapaz de traços finos, dedos longos, cabelo perfeitamente repartidos, óculos e olhos de um tom de violeta frio que se destacava nas cores do pôr-do-sol. Eu sei lá o que deu em mim naquela hora, um odiador declarado de música erudita, mas eu só pude ficar lá parado assistindo a performance.

O problema é que Elizaveta se apaixonou perdidamente pelo pianista de modos educadinhos. Confesso que no começo eu não tinha nada contra ele, sinceramente, mas depois todo aquele ar perfeitinho começou a me irritar. Dava uma vontade de bagunçar, só pra ver a sua reação. E afinal, ele também era um pianista, a minha nêmesis natural! E foi justamente por ele que a Liz se apaixonou. É brincadeira, pô! Com o tempo ela só queria andar com ele, dispensava a minha companhia sempre e até passou a se vestir como uma menina e a falar educadamente! Tipo QUÊ? É claro que eu fiquei revoltado e resolvi descontar tudo no metidinho que nem tinha nada de mais e sempre olhava para mim como se tivesse medo de sujar as suas roupas perfeitamente lavadas pela mamãe! Ah, mas isso teria troco. E muito troco!

Aí vem a parte que todo mundo conhece sobre eu infernizar a vida do Rod e tentar arrancar Elizaveta do lado dele. As duas missões deram certo, mas agora que eu era um jovem adulto sem gás na cozinha, me enchendo de hambúrguer de micro-ondas e cerveja numa loja de conveniência, me perguntava qual era o objetivo disso. Eu também não sabia porque não estava feliz com o jovem mestre me ignorando tão descaradamente. Mas cara, eu não devia me preocupar com isso. Não mesmo. Ou pelo menos era isso que eu ficava repetindo para mim mesmo o tempo todo.

Voltei meio bêbado pro apartamento, afinal eu havia bebido mais do que comido o dia inteiro, culpa do meu maldito tubo de gás que havia vazado e não me deixava usar o fogão. Foi  então que eu tive a enorme coincidência de encontrar o jovem mestre subindo as escadas do prédio.

Ah, fala sério, coincidências assim só acontecem em comédias românticas americanas e livros de banca de jornal!

- Aí, jovem mestre! - gritei e para a minha sorte ele me atendeu, virando os seus violetas furiosos na minha direção, o que me deu um leve receio.

- O que é que você quer? - ele perguntou parecendo em nada satisfeito com a minha presença. Isso me deixou ainda mais bolado da vida. Como é que é cara, o que foi que eu te fiz pra ser tratado assim? Bem, mas eu não disse isso.

Cocei a cabeça, me deparando com o fato de que agora que eu havia chamado a atenção dele eu realmente não sabia como iniciar o assunto. Ainda bem que eu havia trago mais cerveja comigo, pois eu já estava prevendo que conversar com o jovem mestre me traria uma dor de cabeça indesejada. Eu suspirei, não conseguindo encontrar uma saída.

- Ahn, naquele dia eu perdi as minhas chaves no seu apartamento e... - comecei inventando uma desculpa, mas é claro que alguém tão sagaz e espertinho quanto o Rod perceberia.

- Beilschmidt - disse com o seu habitual tom falso cortês e visivelmente incomodado - Isso foi a dias, você já teria dado falta de algo assim antes e...

- Tá legal, tá legal! Eu menti! - admiti, me sentindo meio derrotado - Eu queria falar com você. Você está bravo comigo, o que foi que eu fiz dessa vez?

Os seus olhos violetas piscaram em incompreensão atrás das lentes dos óculos. Eu senti o meu rosto esquentar por um momento. Nossa, isso foi bem direto, não foi? Eu não devia ter bebido aquela vodka barata no caminho da faculdade. Bem, lá se foi por água a baixo o plano de sondar o Rod até ele me dizer porque estava tão chateadinho, e também eu sei lá porque eu havia pensado que eu manteria a minha boca quieta. E pior: eu não sabia porque me importava e incomodava tanto o fato dele estar bravo comigo, mas cara não era o meu plano deixar assim tão na cara pra ele que eu estava incomodado com isso. Bem, agora já tinha ido de qualquer forma mesmo. E o olhar totalmente espantando do aristocrata deixava ainda mais evidente que eu não deveria ter perguntado.

- Ahn? - ele respondeu debilmente.

Agora que eu já estava com o pescoço na forca...

- Você tem me ignorado nos últimos dias, não é? Bem, primeiramente eu devo parabeniza-lo por conseguir o feito de conseguir ignorar a existência de alguém tão incrível quanto eu! Mas agora será que eu poderia saber o motivo, pois por mais que eu tente descobri-lo não consigo ver o que eu tenha feito demais para deixá-lo bravo, jovem. - eu terminei, dando um sorriso triunfante para disfarçar a minha ansiedade para a sua resposta.

- Gilbert, cale a boca. - ele disse, o que me fez sorrir já que ele usara o meu primeiro nome e só isso já é um avanço!

- Calarei, jovem aristocrata, assim que ouvir uma resposta.

Ele cruzou os braços, parecendo nada satisfeito com nosso inicio de conversa. Imitei o seu movimento, porém deixando bem claro a nossa diferença de altura e fazendo uma sombra intimidadora para que ele me desse uma resposta. Eu o ouvi bufar finalmente, desviando os olhos para o chão.

- Para quê você quer saber, Beilschmidt? A nossa relação nunca foi boa, de qualquer forma.

Ouch. Acho que levei um tapa na cara com esse comentário. O sorriso que eu levava no rosto se fechou e minha postura se desfez. Eu não sabia dizer porque a resposta dele de repente me chateou tanto, mas chateou. Eu queria ter falado alguma coisa, soltado algum comentário maldoso e rido da cara dele, como normalmente eu faria. Mas eu não o fiz. Porque algo no fundo do meu incrível ser se sentiu ofendido e mesmo assim não queria levar uma briga com o jovem mestre à frente.

Por isso eu peguei a minha incrível existência e sentei no chão do corredor, ao lado do meu engradado de cerveja recém comprado e abri uma lata, tomando sem cerimônias.

- Gilbert? - ele me seguiu com os olhos, parecendo preocupado pela primeira vez na nossa conversa.

- O que foi? - eu perguntei com um tom que deve ter soado como um adolescente mimado, meh. Eu estava chateado, me da licença!

- O que você está fazendo? – ele disse se aproximando de mim, a expressão dura dele se desfazendo para uma quase preocupada.

- Nada, você mesmo disse que não temos nada para conversar. - disse lançando meu olhar rapidamente para ele, que tinha as sobrancelhas franzidas e parecia visivelmente incomodado com o rumo da conversa.

- E-Eu não disse isso. - Rod cerrou os punhos e virou-se na minha direção. - Eu só não entendo porque você se sentiria incomodado. Digo... nós nem amigos somos. Não sabemos nada um do outro e não temos uma relação amigável.

Eu suspirei, pensando no que ele havia dito. Era a mais pura verdade, pois desde a escola não tínhamos uma relação amigável que envolvesse preocupações e justificativas. Eu implicava com ele, ele não gostava e era isso. Sem mais nada envolvido.

Mas caramba eu tinha 21 anos agora, em alguma coisa eu havia evoluído desde o ensino médio. Qual o problema em querer ficar amigo com uma pessoa que eu nunca me dei bem? Eu e Rod agora éramos adultos e vizinhos, e recentemente eu havia descoberto também que ele podia ser uma boa companhia quando não estava tocando aquele piano insuportável. E verdade seja dita, por algum motivo completamente insano e injustificável eu queria ficar amigo dele, e eu sabia que ele também queria não fosse esse bloqueio pós-bullying no ensino médio e cara, eu sabia que a culpa era totalmente minha sim mas era algum crime eu querer concertar as coisas?

Suspirei e perguntei, ainda sem sair da minha posição de derrota jogada no chão.

- Tudo bem, então o que você quer saber de mim?

- Eu... Ahn... O quê? - eu vi novamente o ar incrédulo no seu rosto e soltei uma risada, achando graça e até bonitinha a sua expressão.

Bonitinha?

- Kesesese, foi você mesmo que disse, jovem mestre. Não somos amigos e não sabemos nada um do outro, pois bem, me diga o que quer saber de mim e depois é a sua vez.

O olhar de pura incredulidade ainda não deixara o seu rosto, eu estava começando e me deleitar com suas expressões mas ele finalmente relaxou, abaixando os ombros antes de voltar a falar:

- P-por que eu nunca soube que você sabia tocar piano? - apesar do leve ar inseguro ele parecia estar prendendo aquela pergunta já fazia algum tempo. Dei um sorriso de lado, já devia saber que seria algo assim.

- Não era algo que eu saía espalhando por aí, bem, principalmente para você.

A expressão dos olhos violetas dele se fecharam mais uma vez.

- Mas é claro - ele disse com um tanto um tanto duro - Afinal, não somos amigos, não é?

Eu cocei a cabeça começando a me desesperar em perder um diálogo tão bom como estávamos tendo, então me apressei em salvá-lo.

- Porque olha... É complicado. Você... Você é completamente apaixonado por essa coisa e eu não.

- Essa coisa? - ele perguntou ainda duro, mas com um tom curioso.

Tomei um gole da minha lata de cerveja, buscando a coragem para começar.

- Quando eu era pequeno, eu e meus pais descobrimos o talento que eu tinha. Eu tenho os ouvidos sensíveis, entende? Eu conseguia de brincadeira tocar qualquer coisa que ouvisse no piano do meu avô, claro que não de forma correta mas mesmo de forma bagunçada eu conseguia tocar a música. Meus pais ao perceberem isso me colocaram logo nas aulas de piano, mesmo que meu avô tenha protestado. E as aulas eram terríveis! A professora era bruxa horrenda e brigava comigo e me batia e arg! Eu era uma criança, falou? Larguei as aulas e perdi completamente o interesse em aprender, apesar de nunca ter perdido a habilidade. Os meus pais bem que tentaram insistir no meu interesse, nos mudando de Berlim pra Viena para os ares me inspirarem a voltar. Como se fosse fazer muita diferença. Eles tentaram até o fim do meu ensino médio me convencer a voltar para a música clássica, porque sabiam que se eu tentasse - se eu somente tentasse e me comprometesse a estudar - eu conseguiria entrar para o Conservatório. Por isso o meu avô me deu um carro e me aconselhou a fugir para tomar um ar. E bem, eu voltei... E também não voltei pra música.

Ao terminar o meu relato me virei novamente para o rosto do Rod e encontrei novamente a expressão incrédula, mas dessa vez parecia muito mais com incompreensão. Eu sabia que ele não iria sentir empatia pela minha história, afinal Roderich amava a música mais do que qualquer coisa, e só o pensamento de alguém nascer com um talento como esse e desprezá-lo devia ser terrível para ele. Forcei um sorriso em sua direção, esperando alguma resposta - qualquer que fosse, mesmo que ele esbravejasse comigo como os meus pais fariam.

Mas ao invés disso a pergunta soou:

- É por isso que você consegue ouvir o som do meu piano?

Desta vez que ficou surpreso fora eu, que arqueei uma sobrancelha em incompreensão dos rumos do assunto mas anuí.

- É, acho que é por causa disso.

Ele suspirou num sinal da cansaço, e eu já encarava o jovem mestre meio confuso. Até que ele finalmente disse:

- Tudo bem, acho que devemos negociar os horários, então?

Eu me vi levantando do chão para conversar em sinal de igualdade, como uma pessoa normal faria, claro, não jogado no chão derrotado. Mas ao invés de parecer decidido com os rumos da conversa eu debilmente disse:

- Ahn? Horários?

Quê?

-Uhum. - ele afirmou, se dirigindo para a porta do seu apartamento e pegando as chaves no bolso para abrir a fechadura - Acho que já entendi porque você se incomoda tanto com o barulho. - eu o vi fazendo uma pausa para soltar um suspiro - Mas eu não posso deixar de treinar então o melhor seria negociar um horário, apesar de eu não ficar muito satisfeito com isso.

De repente comecei a me sentir eufórico, e num salto bastante bêbado eu me pus de pé. O jovem mestre abriu a porta do seu apartamento e eu já estava me convidando para entrar antes de me refrear, com medo de que ele ficasse bravo comigo de novo. Mas ele simplesmente me olhou com um ar casual e perguntou enquanto segurava a porta:

- Pode entrar se quiser, eu faço algo para comermos, já jantou?

- Não. - respondi na maior velocidade possível, abrindo um sorriso animado ao pensar em comida de verdade. Quero dizer, caramba em uma só conversa eu tinha conseguido reverter o mal humor do Rod, tinha sido convidado para entrar e ainda ganharia comida? Isso parecia surreal de mais. - Mas por quê está me convidando?

- É a minha vez, não é? - ele disse deixando um fraco sorriso transparecer em seus lábios finos - De contar algo sobre mim.

Parei por um segundo e olhei para o jovem mestre, meu corpo inteiro pareceu reagir ansiosamente com a sua resposta. Eu não sei quando me tornei tão interessado em saber sobre ele, eu só sabia que queria mais, muito mais do que tínhamos agora. Eu o acompanhei porta adentro, com uma espécie de energia vibrante e diferente com o que eu conseguira. Era como se eu estivesse... Feliz. Feliz com aquele pequeno avanço.

- Gosta de Goulach húngaro?

Eu só o acompanhei em direção à cozinha me sentindo meio bobo e me sentei em um dos bancos da copa americana.

- Ah, sim!

Lembra quando eu disse que o jovem mestre era um sedutor? Pois era exatamente isso que ele era! Ele era um sedutor até se tratando de comida! Porque verdade seja dita, aquele goulach estava incrível, era uma sopa até bastante simples: um guiso de carne de boi temperada com cebolas, alho, pimentão, tomates e aipo. Normalmente era consumida no inverno mas o Rod não parecia com muita paciência para fazer um prato elaborado agora. Mas mesmo assim estava bom demais, tirando o fato o fato de que eu não comia algo caseiro fazia séculos!

Enquanto estávamos comendo que ele voltou ao assunto do corredor:

- Eu disse que te responderia, então, o que quer saber?

Terminei de engolir uma colherada, pensando seriamente em pedir mais um prato, antes de dizer:

- E você, aristocrata, como foi parar na música?

Ele abaixou a talher que usava e limpou o canto da boca com um guardanapo num gesto tão malditamente elegante que seria impossível imaginar que ele não pertencia à aristocracia. Sério, como é que ele fazia essas coisas parecer tão malditamente natural? Mas logo a minha atenção se voltou novamente para os olhos dele, que brilharam naquele tom de azul-violeta ao encarar o seu piano no canto da sala antes de se voltarem para mim.

- Música é o que eu sempre amei. – ele começou - Desde criança eu gostava de brincar no piano dos meus pais e logo eu estava fazendo aulas. Mas não me limitava só ao piano, quando eu tinha oito anos pedi um violino de presente e aos dez ganhei uma competição Junior.

- Menino prodígio, hein? – brinquei, mas me sentindo um tanto impressionado. Ok, tudo bem que eu era o gênio em negação da música mas fala sério! Um prêmio aos dez anos de idade com um instrumento que nem era a sua especialidade? Mais uma vez: da onde é que ele veio?

- Olha quem fala. - ele revirou os olhos mas o leve curvar de seus lábios denunciavam o tom de brincadeira - Enfim, eu gostava do violino e de regência mas a minha paixão sempre fora o piano. Meus pais também já sabiam disso desde o começo e me incentivaram. Nunca achei ruim as aulas práticas pois sabia que só assim eu teria um melhor resultado. Além do mais, sempre fui muito ansioso em ouvir a música completa e perfeita. Não existe algo mais belo.

 

O olhar dele se desviou do meu e então eles vagaram em seu próprio devaneio, para algum lugar distante e diferente daquele pequeno apartamento. E por um breve momento eu senti algum sentimento estranho se revirar, algo que eu não sabia se tinha a ver com inveja por não ter ser centrado em algo tão belo assim ou ciúmes, por não estar presente na visão daquele olhar.

Ok eu não acabo de falar ciúmes, ok? Ninguém me viu.

Eu sorri, e ignorando o meu estomago ainda faminto pela – verdade seja dita, deliciosa – comida do Rod me levantei e segui mais uma vez sem permissão para o seu piano. O seu olhar mais uma vez se direcionou para mim e eu me senti vitorioso, apesar de sua desconfiança. Sentei-me em frente às teclas, não me sentindo confortável mas não aterrorizado pelo passado. Lancei o meu melhor sorriso à ele que parecia preocupado e enciumado com o seu precioso piano. Kesesese, quase deu vontade de fazer alguma maldade com o seu precioso instrumento só para ver a sua reação. Mas não era aquele o caso agora, eu queria era outro tipo de reação dele.

- Gilbert, o que você pretende agora? – ele disse receoso apesar de não tentar me impedir.

- Como prova de meu relato anterior, eu vou fazê-lo tremer ao presenteá-lo com a minha habilidade! Dedico à você, que ama a música clássica como eu amo um bom trash metal! – dei uma piscada de lado e eu o vi cruzando os braços, totalmente descrente em minhas palavras.

Clareei a minha mente em busca do fundo da minha memória aquela canção. Eu podia ser um gênio, mas fazia bastante tempo que não tocava uma peça clássica. Mas então meus dedos simplesmente fluíram para a primeira música que veio à minha mente, de forma suave e natural. Era a Sonata nº8 de Beethoven, a Pathetique, mais especificamente o seu segundo movimento. Aquele movimento era incrivelmente suave e agradável, criando uma atmosfera única ao ambiente de calma e harmonia. Agora que eu parava pra pensar, esta era uma peça que combinava bastante com o jovem mestre, pela fluidez e serenidade da melodia. Mas eu gostava de tocá-la quando era menor, parecia aquietar um pouco o meu espírito. Não que eu precise disso, óbvio, heh.

Ao terminar eu virei para encará-lo com um sorriso triunfante no rosto. Há, aposto que com essa eu o tinha pegado de jeito! Eu esperava um olhar totalmente assombrado com as minhas habilidades, como da vez em que toquei A Thousand Miles, mas desta vez ele me olhava com a mesma expressão da música: sereno, sossegado e sim também impressionado, mas não embasbacado. Aquela expressão suave de alguma forma me agradou mais do que a primeira vez que eu tocara para ele. Ao invés de completamente atônito ele tinha a expressão de quem apreciava o que ouvia, e sim aquilo me deixou satisfeito. Mais do que surpresa, desta vez eu havia tirado algum tipo de emoção.

- Pensei ter dito que não gostava de música clássica. – a voz dele cortou o silêncio enquanto nos encarávamos e o seu comentário me pegou um tanto desprevenido.

- Ahn... eu normalmente não gosto, essa é meio que especial. – acabei confessando enquanto coçava a cabeça me sentindo um pouco encabulado.

Eu o vi me cercando com o olhar. Aquele olhar azul-violeta que parecia me perseguir pelos corredores da antiga escola, arg! Que efeito era esse que eles tinham? Eu percebi pela forma que me encarava que ele queria saber o motivo pela qual eu e considerava especial, apesar de não perguntar. Ele era fino demais para fazer perguntas de cunho pessoal, eu presumi. E me sentindo totalmente seduzido a falar, eu continuei:

- Foi uma das primeiras músicas que aprendi a tocar. – respondi, abrindo um sorriso ao relembrar a minha infância - O meu avô sempre gostou de Beethoven, então um dia quando ele ouvia essa música eu tentei tocá-la no piano dele e consegui. Cara, o velho tomou um susto! Foi bem engraçado, kesesese.

Ele tentou disfarçar o riso, mas eu o ouvi, tão suave quanto um sino.

- Presumo que deve ter sido um susto. Eu mesmo não conseguiria tocar uma peça inteira só de ouvi-la. – comentou, levantando-se para sentar no sofá.

- Enfim, eu não gosto de música clássica mas não quer dizer que eu não saiba tocar, ok? – eu dei a língua em sinal de brincadeira.

- É uma pena. Foi bastante agradável, apesar de ligeiramente errado.

- Ohh! Ligeiramente errado? – me senti levemente ofendido pela crítica apesar de saber que ele tinha razão, aliás quem melhor para me avaliar do que um pianista?

- Óbvio, afinal deve fazer séculos que você não lê as partituras, não é? Aliás, quando foi a última vez que você a tocou?

- Anos. – respondi, minha mente subitamente fugindo do meu corpo ao pensar na ultima vez que toquei assim para agradar alguém. Aquela vez que toquei A Thousand Miles para a Lizzie nem contava, ela odiou e morreu de vergonha. Eu estava pensando em quando tocava para o meu avô e meu irmão na sala de estar, em Berlim. Lembro-me de seus sorrisos e lembro-me de quando somente tocar me fazia tão bem.

Eu não percebi que Roderich estava tão perto até ele encostar a mão em meu ombro, sorrindo de forma educada. E caramba, o Rod sempre foi assim tão cheiroso?

- Com sua licença?

Só me dei conta que ele queria se sentar ao piano depois de ficar vários segundos encarando como um idiota enquanto sentia o seu perfume tão próximo. Um cara podia usar um perfume doce assim sem parecer inadequado e ao mesmo tempo tão sedutor?]

Caraca, Gilbert. Foco!

 - Ahn, claro. Afinal, é seu, não é jovem mestre? Kesesese. Ou será que ficou tão assombrado com as minhas habilidades que desistiu dele?

Ele revirou os olhos, eu logo presumi que ele estava de bom humor para não puxar uma discussão acalorada com a minha provocação. Eu também decidi parar com a graça por aí mesmo e me levantei do assento do piano num salto ágil e dei lugar para ele, que logo se aprumou em frente ao piano, arrumando as lentes dos óculos e uma mexa saliente do cabelo antes de começar a se movimentar para tocar.

Então que me dei conta, era a primeira vez em anos que eu realmente o assistia tocando. Porque ouvi-lo treinar do meu apartamento não contava, mas vê-lo fazendo isso era completamente diferente. Roderich tinha algo, algum maldito hipnotismo que quando ele se sentava ao piano eu simplesmente não conseguia desviar os olhos dele. Era tão elegante, tão sedutor, tão belo que me fazia esquecer completamente que eu odiava peças clássicas e...

Aquela não era uma peça clássica.

Conforme a música avançava eu a reconheci claramente. Aquela era Nothing Else Matters, Metallica! CARAMBA, quando que eu se quer imaginaria Roderich Edelstein, o aristocrata da Academia W tocando METALLICA no piano? Quero dizer, wow! Isso foi bem inesperado. Dessa vez era a minha vez ficando completamente atônito. Nem percebi quando eu estava jogado no sofá com completa cara de bobo.

Quando ele finalmente parou de tocar, virou-se para mim com um sorriso triunfante que era assinatura minha!

- Apreciou?

- Metallica? – eu disse ainda me sentindo impressionado – Você acaba de tocar Metallica? Não, não, você conhece Metallica?

Ouvi novamente barulho de sinos com a sua risada. Eu já havia dito que o Rod descontraído era uma pessoa completamente diferente?

- Você me julga de mais. – o jovem mestre ainda sorria e eu descobri que gostava daquela visão.

- Nós nos julgamos de mais.

Por algum motivo ele ficou em silêncio e eu me perguntei se havia feito algo errado, foi então que eu reparei: Roderich estava ruborizado, afinal ele havia mesmo aceitado o meu elogio. Me sentindo vitorioso por ver o adorável vermelho tomar o seu rosto, eu disse no intuito de provocar mas acabou soando totalmente sincero:

- Foi lindo.

O jovem mestre pareceu se tornar ainda mais vermelho conforme o meu sorriso aumentava. E por alguns segundos eu tive o ímpeto de tocá-lo, mas mantive a distância e permaneci só a observar as suas feições delicadas e elegantes se constrangerem diante de meus olhos. Parecendo notar o clima estranho que se instaurou, o jovem mestre se levantou do assento do piano e arrumou os óculos na ponte do nariz, gesto que eu estava começando a reparar que ele fazia quando estava constrangido, desconfortável ou concentrado.

- Obrigado, mas acho melhor terminamos por hoje.

Eu me levantei também, percebendo que já dera a minha hora. Antes que eu saísse porta a fora, segurei em seu pulso para lhe chamar a atenção. O movimento causou um breve arrepio na minha espinha.

- Espere.

- Sim? - ajeitou os óculos no rosto novamente, pensei que fosse ficar bravo pelo meu movimento mas ele pareceu não notar.

Eu sorri, estendendo a mão direita.

- E então, amigos?

Rod pareceu ponderar um pouco antes de apertar a minha mão e balançá-la.

- Bons vizinhos. - ele concluiu e eu não contra argumentei.

Aquilo me soou como um desafio e quer saber? Eu adoro desafios.


Notas Finais


Confesso que tirei a música Pathetique TOTALMENTE de Nodame Cantabile! Eu amo essa música, seria bom se vocês ouvissem também. Não vão se arrepender, ela é muito gostosa de ouvir :3

Quanto ao Rod, bem, eu não sabia muito bem como ele poderia surpreender o Gil mas suponho que todo mundo conheça Nothing Else Matters do Metallica, sim? Também é uma música bem bonita, sugiro que ouçam :D Em breve vou colocar todos os links, acho importante atualizar agora antes que a minha internet caia de novo.

Roubei a ideia dos cenários da CamieRoux, hahahah. Desculpa amiga, copiei na cara dura mesmo!

Eu particularmente adoro o próximo capítulo então até lá ;)


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