História Pesadelo em Série - Prólogo

"Dizem que o universo tem um grande senso de humor. E quando sonhos se realizam, parecem um pesadelo. Porque ter o que deseja sempre vem com condições."

- Gossip Girl.

                              ...

- Parabéns pra você, nesta data querida, muitas felicidades, muitos anos de vida!

A mulher vestida com o uniforme da cafeteria Sous, depositou um bolo de caneca com uma vela acessa na frente de Laura, que apoiava as pontas de seus cotovelos na mesa. Ela sorriu, beijando o rosto da menina.- Tenho que trabalhar agora. Não se atrasem! - Virou-se segurando as lágrimas em seus olhos. Não suportava a ideia de não poder comemorar o aniversário de sua única filha, mas precisa trabalhar.

- Tchau, mãe. - Despediu-se sem olhar para a mulher, pensativa, encarava um ponto vazio na parede da cafeteria.

- Faz um pedido! - A garota ruiva sentada ao lado da aniversariante, disse tentando animá-la. Não sabia exatamente o que ela estava sentindo, mas tinha uma ideia.

Laura encarou a vela por alguns segundos, e fechando os olhos, desejou ir para longe dali, talvez para um lugar onde pudesse viver uma aventura, ou simplesmente sumir. Abriu os olhos, assoprando a chama da vela, que se apagou facilmente. Ela não acreditava que seus desejos fossem realizados, mas sentia-se desesperada o suficiente para tentar.

Aquela data não era a preferida dela, na verdade lhe trazia péssimos pensamentos sobre sua vida, e a fazia se sentir extremamente infeliz. 

- Você não vai comer? - A amiga a sua frente perguntou, encarando o bolo colorido.

- Não estou com fome. - Pegando a mochila, levantou-se da cadeira, saindo da cafeteria. Colocou os fones no ouvido, e se pôs a caminhar pela larga calçada da Avenida Alvorada.

- Está tudo bem?

A ruiva a seguira, deixando a outra na cafeteria. Preocupada, fitou os olhos de Laura, ficando de frente para ela, segurou seu ombro tentando lhe passar confiança.

- Está... - Ela desviou o olhar e encarou o asfalto da rua. Não gostava quando olhavam em seus olhos, pois sentia que assim poderiam ver seu interior e descobrir seus segredos mais profundos. - É melhor irmos, estamos atrasadas. E a Heloisa?

- Deve ter ficado lá para comer o bolo.

Permaneceram em um silêncio que incomodava ambas. Laura ajeitou uma mecha de seu cabelo, enquanto a outra tentava reunir coragem para contar algo. Enviara uma mensagem, dizendo que tinha algo para confessar, e esperava que ela perguntasse, porém, se a garota a sua frente recordava-se disso, não fez nenhuma menção em dizer.

- Marcelly!

Uma garota loira aproximou-se correndo e com um enorme sorriso em seu rosto, abraçou a ruiva. Tratava-se de Sara, alguém muito inconveniente que Laura e Heloisa odiavam. E foi assim que a amizade das duas surgiu, do ódio em comum, afinal, como diz o provérbio "o inimigo do meu inimigo é meu amigo".

- Laura, feliz aniversário, querida! - Sara se aproximou para abraçá-la, mas a garota apenas forçou um sorriso e se afastou, voltando para a cafeteria.

- Você voltou! - Heloisa disse concentrada no bolo.

- A ridícula da Sara apareceu e eu tive que fugir de lá. - Respondeu, sentando-se na cadeira em que estava minutos atrás.

- Ainda estão aqui? Já estão atrasadas! - A mãe de Laura disse se aproximando com um bandeja cheia de xícaras, e o cheiro do café espalhou-se pelo ar, tornando o lugar ainda mais aconchegante.

- Vamos, Heloisa. Ela tem razão.

- Mas eu ainda não acabei! - Ela reclamou.

- Andem, meninas! Tenham cuidado, boa aula! - Despediu-se, já servindo a mesa ao lado.

Laura segurou o braço da garota que tentava colocar sua mochila no ombro e a puxou até a calçada.

As duas fizeram o caminho mais longo até a escola para evitar um encontro com Sara, enquanto alternavam a conversa sobre falar mal dela e comentar algo sobre as séries que assistiam.

- O Carl de The Walking Dead é muito lindo! - Heloisa dizia distraída, enquanto Laura desviava de um grupo de pessoas. - Você precisa ver, ele... - Ao olhar para frente, deparou-se com um zumbi prestes a atacá-la, assustada, gritou.

- Tudo bem, mocinha? - Um homem de cabelos brancos e olhos que aparentavam bastante cansaço, tocou o ombro da jovem.

- Acho que sim. - Respondeu, correndo em direção a Laura que gargalhava.- Nojenta!

- Eu não acredito que você se assustou com aquilo!

- Parecem ser bem reais, tá? Eu fiquei nervosa.

Naquela semana, um grupo de teatro vagava pelas ruas fantasiados, a fim de divulgar um evento na cidade. As garotas combinaram de ir juntas, pois aquele evento sempre atraia muitos turistas e era sempre muito comentado entre as pessoas.

Ao chegar na escola, foram em direção a velha biblioteca que ficava no fundo do terreno. Era um lugar escuro e empoeirado, do qual inventavam as mais inúmeras histórias, desde que foi construído em cima de um cemitério até de que antes de ser uma biblioteca era uma sala de tortura para alunos malcriados.

- Você vai entrar no Portal de Hades? - Heloisa contestou.

- Portal de Hades? Esse nome é novo.

Sem prestar atenção na história que Heloisa contava, adentrou a biblioteca, procurando nas prateleiras algum livro que considerasse interessante.

A biblioteca era grande, seus corredores eram lotados de estantes onde livros antigos dividiam o espaço com livros novos. As paredes tinham uma cor suja, e eram cheias de rachaduras, já o chão exibia o concreto. As lâmpadas em sua maioria estavam queimadas e a única janela dava para um jardim malcuidado, com o que antes talvez tivessem sido flores, agora eram galhos e folhas secas, e em alguns pontos haviam poças de lama, e talvez tivesse um ou dois focos de dengue.

Distraída com uma doce melodia que cantarolava, Laura passava os dedos delicadamente pelos livros da estante numerada como 2-36, ao sentir uma mão lhe tocar, virou-se bruscamente, derrubando um livro.

- Você queria me matar de susto? - Perguntou pegando o livro do chão.

- Poxa, eu não sou a rainha da beleza mas também não sou tão feia. E afinal, é possível morrer de susto? Eu sempre me perguntei isso e... - Marcelly disse em resposta, observando a garota.

- Cala a boca, por favor? - Pediu observando a capa do livro. Tinha o acabamento em couro, com desenhos tribais e um título talhado no que parecia ser uma linha de cor dourada

.- Por que você é tão chata comigo? Eu nunca te fiz nada, sou tão legal e você me trata tão mal, sério...

- Boa tarde, doces meninas. O que fazem aqui sozinhas? - A voz soou altamente, chamando a atenção das meninas. Seu olhar era distante e sombrio, a senhora já idosa sorriu gentilmente. - Espero não ter assustado as senhoritas.

- Não assustou, senhora. - Laura disse se escondendo atrás de Marcelly.

- Em que posso ajudá-las? - Abriu ainda mais seu sorriso, fitou Heloisa que tinha entrado na biblioteca, mas ao avistar a idosa, se afastou, indo até um canto afastado da biblioteca.

- Eu queria levar esse livro... emprestado. - Laura murmurou após sair de trás de Marcelly.

- É uma ótima escolha! - A senhora sorriu novamente pegando o livro de sua mão.- É o meu livro preferido. - Disse por fim.

Caminharam até a mesa da bibliotecária, onde a idosa fez alguma anotação no que parecia ser um livro pesado e gasto.

A senhora sorriu novamente, caminhou até o último corredor, onde a última lâmpada se apagou. As garotas saíram apressadamente da biblioteca, encontrando Heloisa e Sara do lado de fora, que olhavam curiosamente para dentro.

- Nós vimos a Morte, ou seja lá qual for o nome. - Marcelly disse assustada, recostando-se em Sara.

- Eu vi, ela é assustadora! Tenho certeza que ela vai jogar a sua alma no Rio das Almas Perdidas. - Heloisa disse para Laura, que agora encarava o livro que segurava com as duas mãos.

- Ouvi dizer que depois que ela atravessa a alma pelo rio, as arrasta até o inferno, mesmo que sejam boas. - Sara comentou.

- Vocês acreditam nisso?

- Sim! - Responderam em conjunto.

- Vai me dizer que não se assustou com a Dona Morte? - Marcelly perguntou.

- Eu tenho medo dos vivos. - Um galho prendeu em sua calça, fazendo com que Laura se assustasse. O sinal soou e as garotas seguiram para a sala de aula.

Sentaram-se em seus lugares, onde Heloisa, Marcelly e Sara entraram em uma discussão pacífica sobre o "Portal de Hades". O professor daquela aula não tinha chegado e parecia que mais nenhum aluno chegaria. Laura pegou o livro que tinha deixado em sua mochila e ao abri-lo, deparou-se com páginas vazias.

- Mas o quê...

- Será que é para você escrever a história? - A voz sussurrou no ouvido da garota, o que fez com que ela se assustasse.

- Será que você poderia parar de fazer isso, Marcelly? - Laura perguntou estressada.

- Tem alguma coisa aqui! - Heloisa disse, enquanto tentava enxergar a escrita minúscula. - Parece ser algum aviso... Es gehört zu Ihrem Wunsch, Göttin der Welt, das unreine Blut ihrer Menschen wird mit diesen kleinen Seelen, die im nächsten Plan gefangen werden gereinigt werden. - Tentou ler, o que arrancou gargalhadas das outras.

- Será que isso é uma maldição e nós estamos rindo? - Marcelly perguntou.

Elas se entreolharam em silêncio por alguns segundos, até que as gargalhadas iniciaram-se novamente.

E as luzes se apagaram...