1. Spirit Fanfics >
  2. Ponte até Você >
  3. Capítulo 2

História Ponte até Você - Capítulo 2


Escrita por: AkazawaSG

Capítulo 2 - Capítulo 2


Hinata estava nervosa.

Numa tentativa de se controlar, respirou fundo, deixando-se ouvir o som da agua corrente ao cair sobre a pia, antes de encher as mãos e jogar um pouco sobre o rosto, mas a ansiedade não dava trégua.

Ajeitou a gola alta da sua blusa, de modo que escondesse bem o adesivo de nicotina colado ao seu pescoço, lamentando por não ter mais seu cabelo cumprido para ajudar a escondê-lo.

Particularmente, não queria ter que usar essa tarja branca tão chamativa, preferindo seus chicletes discretos, mas, em uma reunião de trabalho como a que teria daqui a poucos minutos, estar com uma goma na boca não transpassaria profissionalismo.

Também não queria anunciar ao mundo sobre seus problemas, mas, dependendo da roupa que usasse, sempre que o adesivo ficava a amostra, Hinata sentia as pessoas olhando-a e julgando-a, como se soubessem de tudo que vinha passando a tantos anos. Odiava essa sensação de exposição e, por isso, usava a elegante blusa de gola, mesmo estando calor.

Olhou o reflexo do espelho a sua frente e, novamente suspirando, decidiu que era hora de vestir sua mascara de mulher corajosa e independente e sair daquele banheiro como se tudo estivesse bem.

 

O clima no escritório estava mais agitado aquelas ultimas semanas e Hinata não sabia bem o porque, mas também não se importava muito, decidida a manter-se focada apenas em seu trabalho e nos futuros projetos que ganharia se continuasse com seu bom rendimento, não costumava prestar a atenção em fofocas pelo corredor.

Parou em sua sala, arrumou alguns objetos em sua bolsa e juntou papeis em uma pasta de couro, então partiu em direção ao elevador mais próximo, entrou e selecionou o ultimo andar e deixou-se suspirar enquanto as portas se fechavam.

Impaciente com a demora, meditou sobre os trabalhos que adquiriu na empresa e que conseguiu concluir com excelência em tempo record assim como algumas propostas para outra disputa de uma obra publica que foram muito bem avaliadas.

Ela sentia que estava no caminho certo e que logo sua grande chance surgiria. Poderia ser o decisivo passo para algo que ela esperava a muito tempo, um respiro de alivio após anos submersa no desespero.

Nos últimos quatro anos de reabilitação, crescer em sua carreira e recuperar sua antiga vida foram os objetivos que a fizeram superar as perdas do passado e por isso estava tão nervosa quanto a reunião que teria com Danzou.

 

As portas do elevador se abriram e logo Hinata avistou Shikamaru conversando com um dos executivos de forma descontraída no corredor. A presença daquele especifico mestre de obras ali poderia significar que Naruto não apareceria hoje, o que a deixou mais tranquila.

 

A Hyuuga não vira o loiro desde que terminou os projetos da ponte a que estavam relacionados, a aproximadamente um mês atrás, entretanto, após algumas semanas sem notícia, o engenheiro passara a frequentar religiosamente a empresa. E muitas vezes, como se fosse mera coincidência, eles acabavam se esbarrando pelos corredores, o que criava uma situação, no mínimo, constrangedora.

No inicio Hinata pensara que ele estivesse inventando desculpas para aproximar-se dela, mas logo notou as tensas reuniões a portas fechadas que ele participava junto com um ou outro funcionário e percebeu que algo realmente não estava certo no andamento de seus trabalhos.

Ela já havia concluído sua parte do projeto e, para seu próprio bem, decidiu se desligar completamente da sequencia de etapas que se seguiria, confiando que Naruto teria também o bom senso de não procura-la, ao menos que fosse estritamente necessário.

Talvez fosse algum problema burocrático referente a construção da ponte, ou mesmo uma falha de execução ou falta de verba. Quem sabe? A morena não foi chamada para discutir o assunto, logo, não era um problema que lhe dizia respeito.

 

A secretaria de Danzou anunciou sua chegada e teve que esperar apenas um minuto ate que fosse chamada. Assim que entrou, o homem fez sinal para que ela se sentasse e Hinata, após fechar a porta atrás de si, ajeitou-se timidamente vendo-o a sua frente.

 

– Obrigado por vir, senhorita.

– Eu trouxe alguns dos esboços daquilo que foi combinado na ultima reunião.

– Assim tão rápido? – Danzou riu baixo. – Bem que seu pai me avisou de sua eficiência.

– Esteve falando com meu pai?

– Claro, nós sempre fomos bons amigos antes de qualquer outra coisa. E como é um homem influente e respeitado sempre peço recomendações. Na verdade, por isso a chamei aqui hoje.

– Como assim?

 

Danzou se levantou e foi ate a estante ao lado de sua mesa, servindo-se de uma das bebidas que estavam lá. Sendo o chefe e dono de toda a empresa, beber em horário comercial era uma das regalias que poderia desfrutar.

Hinata tentou observar a cena com algum desdém, porem ao ouvir a garrafa sendo aberta, direcionou-se em sua direção e o cheiro forte da bebida alcóolica a atingiu de surpresa e, de repente, sentiu a garganta seca.

 

– Seu pai me perguntou como você estava se adaptando.

 

Hinata acenou com a cabeça concordando, porem pouco ouvia do que estava sendo falado. Observava o movimento sereno do liquido pelo copo que era enchido, fixando o olhar na dança que as bolhas de ar faziam através do vidro.

 

– Garanti a ele que a senhorita era uma funcionaria de destaque, ambiciosa e impecável. Então ele me pediu para te colocar a prova e... 

 

Danzou voltara a se sentar, trazendo para a mesa, a garrafa e seu copo cheio, mas percebeu a falta de concentração estampada no rosto da mulher.

 

– Algum problema? – Perguntou.

– Não, nenhum. – Ela tentou disfarçar o incomodo.

– Que distração a minha. Aceita uma bebida? – Ele ofereceu já bebendo.

 

Antes de pensar no que responder, por um milésimo de segundo, Hinata analisou como a bebida se esvaia do copo para passar pela garganta do chefe, o movimento que os músculos que seu pescoço faziam com o ato e, ate mesmo, o som do liquido sendo engolido.

Tudo era corriqueiro, algo que passaria despercebido para qualquer outro, mas que para a Hyuuga era uma torturante imagem da tentação oculta, alimentada por seus males passados.

 

– Não, senhor. Eu não bebo em serviço! – Hinata disparou a desculpa ensaiada.

– Não vou contar para o seu chefe.

 

Ele deu os ombros, sorrindo como se tivesse contado uma boa piada, a arquiteta, porem, sem esboçar qualquer expressão, negou firmemente com a cabeça, tentando não traspassar seus impulsos e a luta interna que travava consigo mesma.

Danzou fez uma careta como se não a entendesse, então encheu outro copo e lhe serviu com um olhar severo.

 

– Eu insisto. Não quero me sentir mal por beber sozinho.

 

Hinata observou o liquido transparente de tom amarronzado e, depois de uma breve relutância, decidiu que não poderia simplesmente fazer essa desfeita com seu chefe. Pegou o copo com as duas mãos, tentando disfarçar a tremedeira que o nervosismo da situação lhe causava, ciente de que ele provavelmente não repararia se ela bebesse ou não. Aceitou a bebida, mas nem por um instante pensou em levar o copo a boca.

 

– O senhor disse que meu pai queria me colocar a prova? – Ela perguntou.

 

Não queria acreditar que seu pai pedira a seu chefe testa-la com sua pior tentação. Era impensável que o velho Hyuuga confiaria o bastante no senhor Shimura a ponto de revelar os segredos sórdidos que rondavam o passado de sua família.

 

– Sim, tenho um serviço extraoficial para você. Um pedido do cliente mais exigente da empresa... Minha esposa. – Danzou novamente riu da própria piada.

 

Hinata acenou esforçando-se para parecer minimamente simpática, decidida a ouvir antes de tomar conclusões. Talvez ter Danzou falando de provações com uma garrafa de uísque nas mãos seja apenas uma mera coincidência promovida pelo destino.

 

– Enfim, te chamei aqui por que quero que ajude minha esposa. – Danzou endureceu a expressão de seu rosto, tendo em vista que a mulher não apreciara o seu bom humor.

 

Entregou-lhe um envelope pardo que, ao abrir, Hinata encontrou algumas fotos de um terreno em alguma área rural das montanhas.

 

– Ela vem me cobrando uma casa na serra, um local tranquilo para viagens nos fins de semana. Você sabe, uma lareira, boa vista, isolamento do trabalho... O básico.

– Entendo.

– Ela adorou a vista desse local ai da foto. – Ele sinalizou a imagem referente. – Mas esse terreno... É problemático, não sei se vai da pra construir o que ela imaginou.

– Ela não quer mudar de ideia? Procurar outro lugar?

– Não. Ela realmente quer esse e eu preciso inventar uma forma de fazer funcionar. Provavelmente vai precisar de algum reforço e tomar cuidado com a estrutura, mas ela não quer abrir mão de algumas “regalias”...

 

Hinata concordava com a cabeça, tentando manter a atenção  nas imagens, mas o cheiro da bebida alcóolica atrapalhava sua concentração. Apesar de se esforçar, não conseguia pensar em nada além do copo que tinha em mãos.

 

– Acho que conseguiria conciliar o que ela quer com o que é possível... – Hinata lhe falou, disfarçando. – Mas precisarei de tempo para analisar e...

 

A porta abrira com violência atrás de si.

Tão logo ela se virou para ver o que acontecia, reconheceu Naruto entrando na sala. Não pareceu vir para uma reunião formal, estava de blusa larga estampada com o emblema e slogan da empreiteira, calça e botas de trabalho sujas de terra, também havia uma mochila em suas costas. Seu olhar era duro e frio, seu corpo enrijecido e seus passos audíveis por uma notável fúria interior.

Hinata assustou-se como uma criança que fora pega fazendo bagunça pelos pais. Levantou-se de supetão deixando a bebida cair de mal jeito contra a mesa de Danzou, se derramando completamente.

Ela ficara sem fala e Naruto a olhou de cima abaixo antes de encarar o chefe que também se levantara e não parecia nada contente com a invasão.

 

– Me desculpe, senhor. Ele simplesmente foi entrando. – A secretaria apareceu, desesperada por se explicar.

– O que significa isso, Naruto?! – Danzou questionou.

– Eu queria conversar! – O loiro respondeu. – Mas o senhor tem me evitado.

– Eu estou ocupado! – Ele sinalizou para Hinata que ainda estava paralisada no canto sem saber o que acontecia.

– Hinata, pode nos dar licença, por favor? O senhor Shimura e eu temos assuntos a tratar.

– De maneira alguma. Fique onde está, Hinata, estamos tratando de um assunto importante. – Danzou contrariou. – Quem deve nos dar licença é o senhor, Uzumaki. Já mandei minha secretaria marcar uma hora adequada para nos falarmos.

– Daqui a duas semanas? – Naruto suspirou com raiva. – Isso é importante! Não pode esperar tanto tempo! Você soube o que aconteceu hoje mais cedo??

– Sim, um acidente! Como você mesmo explicou aos jornalistas, certo? E você nos defendeu bem, Naruto.

– Deveria ter jogado a merda no ventilador! Talvez assim me ouvisse.

– Eu realmente deveria ir. – Hinata falou esperando uma brecha para se retirar da sala.

– Fique! Naruto e eu já acabamos! – Danzou insistiu.

 

O loiro, que agora pareceu mais irritado do que nunca, travou um dente com força e tirou a mochila das costas, pegando algo de dentro dela de maneira afobada. Eram duas caixas de medicamentos que dispôs sobre a mesa molhada, logo após, caminhou para as estantes onde pegou três livros de arquitetura, grossos e pesados.

 

– O que você pensa que está fazendo? – Danzou perguntou impaciente.

– Se não entende a gravidade da situação com minhas palavras. Então vou demonstrar pra você.

 

Hinata observava atônica, não conhecia o nome descrito naquela caixa de remédios, era complicado e incomum, o que a fez pensar que Naruto evoluíra e estava em uma nova etapa de seu tratamento, por isso uma nova medicação. Ou poderia ser ao contrario? Ele regredira e agora tratava de algo diferente do que era no passado?

Ela estava com medo por ele. Já a muito tempo não o via se alterar assim e aquilo a deixava apreensiva sobre uma de suas possíveis crises.

 

– Imagine que isso é a estrutura base que a ultima gestão deixou para trás! – Naruto sinalizou para as caixas de medicamentos que estavam posicionadas como pilares. – Agora isso é o que temos que construir em cima dessa estrutura! – O engenheiro colocou um dos livros pesados sobre as caixas que se amassaram um pouco. – O que aconteceu hoje cedo foi só a ponta do iceberg, senhor. Por que com o tempo...  – Então o loiro colocou mais um livro por cima e as caixas que sustentavam de deformaram completamente. – E quanto mais demorarmos para tomar uma atitude, pior as coisas ficarão... – Quando ele colocou o terceiro livro, as caixas praticamente desapareceram, destruídas por baixo te tanto peso. – E a merda toda vai cair.

– Naruto, por favor... – Danzou pediu, tentando livrar-se da impaciência.

– Eu preciso de mais tempo e mais estudo, recursos para avaliar nossas opções. Porque a porcaria que foi deixada pela ultima empreiteira foi mal feita e não serve pra nada!

– Tempo e estudo demanda dinheiro, Naruto. E o nosso orçamento...

– Pessoas podem se machucar de verdade se não tomarmos providencias. – Naruto o interrompeu batendo com as mãos contra a mesa.

 

Ele parecia bem fisicamente, mas sua expressão cansada e sua respiração ofegante alarmaram Hinata de modo que, inconscientemente, se aproximara. Ela conhecia muito bem o caminho para onde aquelas reações levavam e tinha medo de vê-lo mal novamente.

 

– Isso não está em minhas mãos. Existem pessoas envolvidas e um acordo a seguir! – Danzou tentou se justificar.

– Então eu vou convocar uma reunião com todos os sócios, políticos, governo! Ou o caralho que for!

– Naruto!

– Acalme-se! – Hinata pediu para o loiro, tocando seu ombro.

 

Naruto se afastou em um primeiro momento, mas olhou-a nos olhos e então respirou fundo, esforçando-se para se controlar. Como se pudesse conversar naquela troca de olhares, ele soube que estava passando dos limites e que ela temia por seu estado de saúde.

 

– Eu quero uma nova reunião para discutirmos os andamentos da obra e os recursos que precisamos para um bom trabalho. – O engenheiro falou baixo com o homem a sua frente, aparentando uma calma forçada e nada confiável. – Faça isso, por favor, chefe.

Ele disse e saiu.

 

Hinata ficara indecisa sobre ir atrás de Naruto e ver se ele estava bem ou permanecer com Danzou e terminar a reunião interrompida. Perdera vários minutos preciosos enquanto a secretaria arrumava a bagunça causada pela invasão e seu chefe finalmente se pronunciasse avisando que deveriam concluir a conversa em outro dia.

A morena, ignorando alguns trabalhos pendentes e mesmo sem saber onde estava, mas, conhecendo-o o bastante, reuniu algumas boas ideias e saiu disposta a ir procura-lo.


 

Naruto falava cercado de jornalistas, microfones, câmeras, celulares e flash podiam ser vistos ao seu redor. Todos tentando capturar, não apenas as suas palavras, como também suas expressões, aguardando a menor falha para questionar suas bases e ate mesmo seu caráter.

– Eu peço a calma e paciência a todos, por favor. Não posso revelar muito do que aconteceu sem uma pericia detalhada, mas vou tentar sanar a duvida de todos. – Naruto falava mantendo uma voz firme, dois policiais garantiam sua segurança e impediam uma aproximação mais ousada dos repórteres.

– Senhor, o que aconteceu exatamente? – Um jornalista perguntou.

– Um pequeno desmoronamento. Todos sabem que esse terreno é acidentado e difícil de se trabalhar. Algo imprevisto aconteceu.

– Como imprevisto? A Raiz não está apta a este tipo de obra? – Outro disparou sem receio.

– Nossa empreiteira tem tradição no mercado e a capacidade de seus empregados é inquestionável. Todos nós somos muitos qualificados e sérios em nossos deveres, mas, as vezes, acidentes simplesmente acontecem. Tanto aqui como em qualquer outra profissão.

– Soubemos de feridos graves e mortos. O senhor confirma isso?

– De maneira alguma. Tirando alguns que tiveram escoriações leves, apenas dois de meus companheiros se feriram, mas sem gravidade. Irão para o hospital para exames de rotina, o que é o certo a se fazer nesse tipo de caso. Garanto que ninguém corre risco de vida.

– E o acidente foi causado por uma falha na obra? – Outro jornalista questionou afiado.

 

Naruto hesitou por um milésimo de segundo, então respondeu firmemente:

 

–Teremos que aguardar o resultado da pericia antes de afirmar qualquer coisa, mas, como engenheiro, eu garanto que qualidade dos nossos serviços e as rígidas normas de segurança que seguimos. Isso foi uma mera fatalidade que poderia acontecer a qualquer hora e com qualquer um... Demos azar por ocorrer, justamente, conosco...

 

 

Naruto desligara seu celular de onde via a entrevista que ele próprio concedeu mais cedo, aquela que quase se tornou viral na internet por motivo do recente acidente na ponte. Ainda bufava como um animal selvagem, embora tentasse se controlar, sem saber outra forma de agir depois de tudo que aconteceu.

Se ouvir defendendo cegamente a empreiteira o fazia se sentir tão hipócrita.

Danzou não ligava para os problemas que estavam enfrentando, não ofereceu qualquer assistência, nem demonstrou interesse. Era um homem ambicioso que só via números, custos e prejuízos... Provavelmente não entendia que o maior dano só poderia ser causado por sua total negligencia.

 

Coçou a cabeça nervosamente e guardou o aparelho no bolso continuando por sua caminhada por entre as lapides ate encontrar aquela que carregava o nome “Neji Hyuuga”.

Ali jazia um de seus melhores amigos, o conselheiro, responsável e chato. Companheiro de faculdade incomparável e com quem poderia contar pra qualquer hora e em qualquer lugar.

O mesmo que ficara furioso pelo amigo se interessar por sua irmã, uma certa arquiteta, mas que depois acabara se fazendo de cupido, juntando-os em um trabalho para que se conhecem melhor.

Naruto tinha ciência de que devia muitas de suas experiências a amizade com Neji, desde apostas malucas e bebedeiras insanas, seguidas de castigos rigorosos de sua mãe neurótica, ate o grande amor de sua vida, que ele ajudara a conquistar... 

Porem, nos últimos 6 anos, o loiro passara a dever ao seu amigo sua própria vida também...

 

– De alguma forma, eu sabia que te encontraria aqui.

 

Ao ouvir a voz dela, seu coração acelerou, mas não era de um jeito ruim. Era uma surpresa boa, uma sensação a muito adormecida em si, mas que despertara com o retorno da arquiteta a sua vida. Agora, mais do que nunca, seu coração voltava a ritmar uma canção apaixonada.

 

– E encontrou...  – Ele virou-se, Hinata estava a poucos metros de distância.

– Vim aqui outro dia e encontrei flores. Foi você também?

– É, eu sempre venho quando preciso pensar, ou quando quero um conselho. – Ele sorriu sem graça. – Parece loucura, mas quando tenho que tomar uma decisão difícil, ficou imaginando o que ele me diria.

– As vezes, também penso assim. – Ela sorriu fracamente e aproximou-se ficando lado a lado. – Eu procurei saber mais sobre o acidente de hoje. Você está bem?

– Não precisa se preocupar. Eu nem estava perto na hora, quando dei por mim, já tinha acontecido. Não sofri nenhum arranhão... – O homem tentou sorrir para demonstrar que estava bem.

– Não me referia ao seu físico, Naruto.

 

Os olhos do loiro escureceram ao ouvi-la e seu sorriso forçado murchou perante o verdadeiro alvo de preocupação dela. Virou-se de costas fugindo de seu olhar e cruzou os braços, não parecia carregar raiva ou outro sentimento negativo, porem saber que o alarde da mulher era voltado, exclusivamente, aos seus males passados o incomodava.

 

– Desculpe, acho que me expressei mal. – Hinata falou como se pudesse ler sua mente.

– Não, sou eu que esqueci como era lidar com isso... – Ele se virara novamente para ela, mas ainda não erguera o olhar para encara-la. – Digo... Ter você aqui, por perto... Sempre foi mais fácil quando tinha seu apoio, mas já faz tanto tempo que, não sei, acho que me desacostumei.

 

Hinata não sabia ao certo porque viera atrás de Naruto, mas agora, estando em frente a lapide de quem um dia no passado os salvou, algo começava a fazer sentido. Eles nunca conversaram abertamente sobre o que ocorrera, pelo contrario, se distanciaram um do outro tentando amenizar a culpa, mas tudo que conseguiam era alimentar o sentimento de dor e desespero que se escondia em seus corações.

Nunca foi um assunto agradável, nem uma história bonita e o fim se tornara ainda mais lamentável. Tocar naqueles sentimentos ocultos poderia abrir mais as feridas ao invés de cicatriza-las, mas, às vezes, a necessidade de falar ultrapassa o que é bom ou mau...

Naquele momento, naquele lugar, Hinata e Naruto mutuamente sentiam o mesmo.

 

– Quer conversar? – Hinata sinalizou para um pequeno banquinho ali perto.

– Eu nunca gostei dessa ideia de concluir a obra de outra empreiteira... – Naruto seguiu-a e se sentou ao seu lado. – Para mim seria mais fácil derrubar tudo e começar do zero.

– Seria bem mais caro também. Danzou não permitiria.

– Ele tem que permitir agora, porque a gestão passada era um bando de incompetentes. Vai sair muito mais caro consertar aquela merda do que seria se fizéssemos tudo de novo. Mas não importa o quanto eu fale, nosso “chefe” não quer mudar de ideia.

– Notei quão “persuasivo” você se tornou.

– Eu não queria ter me exaltado com Danzou...  Não na sua frente...

– O jeito de Danzou tira qualquer um do sério. Eu mesma já estava...

– Eu vi a bebida. – Naruto deu um sorriso sem graça.

– Aceitei por educação, eu não ia beber.

– Não, eu sei que não. – Naruto se apressou em se explicar. – Mas é o Danzou. Ele gosta de testar os limites das pessoas.

– Ele faz isso com todo mundo?

– Quando me contratou, decidiu me levar em um prédio de construção mal acabado para “testar meus conhecimentos”. Sabe aqueles elevadores precários de obras baratas, todo aberto e mal armado. Subimos 15 andares um desses, só pro chefe ver se eu aguentaria o estresse.

– E você aguentou...

– Ainda estou trabalhando com ele, não é?!

– Se Danzou não tomar previdências sobre a ponte, eu...

– Esse é um problema de execução, Hinata. Não a nada que uma arquiteta possa fazer.

– Mas a filha do deputado pode pedir um favor ao pai.

– Como assim?

– Eles são amigos e essa obra é, indiretamente, uma jogada política. Se alguém pode mudar a postura do nosso chefe, esse alguém é o meu pai. Se ele aconselhar Danzou a fazer uma nova reunião, não vejo como ele recusaria.

– Então agora você está envolvida com essas politicagens também, uh?

– Não, mas se quisermos que as coisas avancem da maneira certa é nessa tecla que precisaremos bater durante as reuniões. Se a obra fracassar de algum modo, pessoas importantes serão atingidas e o prejuízo seria inevitável.

– É... parece que é assim que funciona hoje em dia, infelizmente. – Naruto coçou a cabeça. –Acho que vou providenciar logo um advogado, só por precaução.

 

Ficaram em silencio por um segundo, a sensação desperta por estarem juntos era incomoda. Como ter uma conversa aparentemente normal depois de anos acreditando que um convívio civilizado seria impossível?! O clima entre eles era pesado, quase inóspito, apesar de também ser intrigante e, de alguma forma, atraente.

 

– Sobre hoje... – Naruto começou. – Eu não quero que pense que sou o mesmo do passado.

– Ninguém é o mesmo depois de tantos anos... Vi como se portou em sua entrevista com os jornalistas. Agir daquela maneira na época era impensável, não é?! – Ela lhe falou e o loiro conteve um sorriso de contentamento. – Você fez grandes avanços, Naruto. Está muito melhor do que me lembrava.

– Assim como você também, eu suponho.

– Um pouco melhor do que era ontem, porem não tanto quanto ficarei amanhã...

– Parece uma das frases do AA...

 

O comentário saiu inconsciente e soou natural, mas o negar de cabeça da mulher o fez se arrepender de tê-lo feito, logo reparou que ela ficara tensa – talvez com alguma lembrança – e também apertara o pulso que detinha aquela antiga cicatriz de corte...

Então o homem concluiu que aquela deveria ser uma das frases que ela aprendera no grupo de apoio que deve ter frequentando no exterior.

 

– O corte do seu pulso... – Naruto hesitou, não sabendo o quão longe poderiam chegar naquela conversa. – Não foi só aquela vez com os meus remédios, não é?!

– Eu estava desesperada e não conseguia enxergar outra saída, na época... – Hinata respondeu, puxando a manga de sua blusa para mostrando sua cicatriz.

– Então precisou de duas tentativas de suicídio para o seu pai entender que te mandar para longe e encher sua cabeça com trabalho não curaria sua depressão magicamente?!

– Ele só não queria um escândalo, precisava me manter longe durante as eleições daquele ano.

– Foi por isso que ele não deixou você ser internada na primeira vez...

 

As lembranças viera a mente de Naruto agora, a imagem que nunca se esqueceria de quando encontrou Hinata caída, inconsciente, em sua casa... Dopada com seus poderosos medicamentos controlados.

 

– Meu pai achou que me mudar para outro país resolveria tudo, mas era o meu jeito de ver o mundo que precisava ser mudado, não o meu endereço... Ele aprendeu isso da pior maneira.

– Por isso se arrependeu e decidiu nos juntar no trabalho?

 

Naruto quase esboçou um sorriso com esse pensamento mirabolante. Se fosse verdade, o que Hiashi fizera agora seria quase o mesmo que Neji no passado.

 

– Naruto, eu não sabia de nada disso, ok?! Se eu soubesse...

– Não teria voltado. Eu sei.

– Não foi o que eu quis dizer.

– Mas é a verdade... E tudo bem, eu entendo porque terminamos e não tiro suas razões... Ninguém iria querer ficar com um covarde. Um homem que hesita e fraqueja na menor das dificuldades, que se esquiva dos problemas e nunca conseguia tomar decisões por conta própria...

– E quem iria querer estar com uma mulher que fedia a cigarro e álcool o tempo todo?! Em quem você não confia? Que tem que ficar vigiando 24 hora por medo de cometer uma loucura?

– Você sabe que eu nunca te vi dessa maneira. Era difícil, sim, era... Mas eu sempre acreditei que conseguiríamos passar por tudo juntos! Então você foi embora...

 

Naruto se levantou, deu alguns passos a frente, ficando de costas para Hinata que continuava sentada. Ele não queria que ela percebesse a umidade se apoderando dos seus olhos, era mais fácil esconder as lagrimas fugindo do olhar dela.

 

– Você ainda me culpa pelo que houve? – Ele perguntou.

– Eu nunca te culpei por nada.

– Hinata, se não fosse por mim, nós nunca teríamos batido de carro e o seu irmão ainda estaria vivo... E o nosso filho também...

– Naruto para, por favor.

– Eu ainda me pego pensando nisso. Cada passo daquele dia, cada erro que cometi... desejando fazer diferente, imaginando como as coisas seriam se nada tivesse acontecido e me perguntando se nós três teríamos uma vida feliz.  – Naruto bufou. – Que idade que ele teria agora?! 6 anos? Estaria aprendendo a andar de bicicleta? Já estaria na escola, talvez?

– Eu disse para parar!  – Ela o interrompeu severa. – Chega, Naruto. Não importa mais, ok?! É passado e nós seguimos em frente.

 

Hinata se levantara, segurou-o firme pelo braço, agarrando-se no tecido da roupa, e o fez se virar em sua direção. Naruto esperou que ela continuasse gritando, mas nenhuma palavra foi dita, a morena apenas o encarou repreensivamente, não com julgamento, mas com pesar e tristeza, uma dor que só o loiro partilhava.

 

 

– Desculpe, acho passei do limite...

 

Hinata respirou fundo uma única fez e soltou o braço de Naruto, então deu um passo para trás tomando uma distancia respeitável. Ambos tinham o olhar brilhante por lagrimas que nenhum dos dois se dispôs a derramar perante o outro.

A mulher amenizou sua expressão e esboçando um, quase inaudível, “com licença” virou-se de costas, caminhando para longe, em direção à saída.

 

– Eu posso fazer uma ultima pergunta? Por favor? – Hinata parou ao ouvi-lo e seu silencio foi a única resposta que ele precisou para prosseguir. – Se é verdade que não me culpava pelo acidente... Por que recusou meu pedido de casamento?!

– Depois de tudo... Depois de perdê-lo... Qual era o ponto? – Hinata falava ainda de costas para o loiro.

– Ficarmos juntos, fazer dar certo. Tentar formar uma família novamente...

– Um filho não pode ser substituído por outro! A vida não é como uma de suas obras, Naruto... Não da só pra derrubar o que está ruim, se esquecer do passado e começar tudo do zero... – Ela bufou, segurando o choro. – Um casamento no estado em que estávamos?! Seria como rebocar uma parede que estava ruindo, disfarçaria um mal sem solução...

 

Naruto fora pego de surpresa por aquele ponto de vista de Hinata. Nunca a ouvira falando por aquele lado, mas agora, pensando pela analise dela, realmente entendia todas as recusas que recebeu. Preocupando-se somente com a culpa e o luto, esquecera de se colocar no lugar dela e pensar na própria confusão de seus sentimentos e nas consequências de suas propostas.

 

– Eu nunca quis passar essa ideia... Desculpe se eu...

– E ele teria 5 anos... Só completaria 6 anos daqui a 8 meses.

 

Naruto, sem ter o que falar, apenas acenou concordando com a cabeça e permitiu que Hinata fosse embora, sustentou-se por mais alguns segundos, observando-a longe, então desmoronou de volta ao banquinho. Levou a mão ao peito, reconhecendo a dor que apertara seu coração, assim como a dificuldade de respirar que era tão conhecida.

Quanto tempo duraria ou se, de fato, morreria dessa vez era um mistério, mas Naruto tinha certeza de que, independente do que acontecesse, não veria Hinata novamente.

 



Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...