História Procura-se - Reflexo (Capítulo Único)

Pois foi o que eu lhe disse, Augusto. Sente-se aí. Ao jogar a camisinha usada no lixo, parei na frente da pia de plástico daquele banheiro fétido e me olhei no espelho sujo. O bigode estava grande e meus cabelos já batiam na nuca. Bom, eu nunca realmente os cortei, você sabe. No entanto, devo confessar que o tempo passou rápido desde que tirei meu bigode. Ela me conheceu de cara limpa e me beijava com prazer nos nossos primeiros encontros, eu lhe contei isso há algum tempo. Gostava do bigode, mas a cerveja o molhava e o cheiro ficava forte. Ela não bebia ainda... Estou me desviando do assunto, perdão...

Não tenho me concentrado bem nos últimos dias, e é exatamente sobre isso que quero falar! Quando me olhei naquele espelho do motel, senti uma angústia, um aperto no peito que não sentia desde oitenta, amigo! Desde oitenta naquele baile na casa de show, quando aquela casa de show ainda funcionava. Não sei se lembra, mas, bem... pronto! Ficava perto do bar, homem! Aquele bar onde o Alencar...! Bem, onde o Alencar foi baleado... A família ainda procura o corpo dele? O defunto sumiu, se lembra?... Calma, amigo, não chore. Tome um lenço, aqui. Não quer? Tudo bem... Perdão se me desviei novamente do assunto, vamos esquecer isso...

Como eu ia dizendo, no banheiro do motel eu me vi velho, ainda que jovem, e senti essa agonia inexplicável, me comendo de dentro pra fora! Ia desabafar com a Inês, mas já havia adormecido. Eu só me deitei na cama, ao seu lado e passei o resto da madrugada olhando pro teto, pelas duas horas restantes, até as seis da manhã! Não consegui dormir, aquela sensação tinha me tomado a paz por completo! Pode acreditar, Augusto? Quando a luz bateu no meu rosto e os cachorros começaram a latir na rua, eu levantei e ela me perguntou como eu havia dormido. Menti e disse que dormi bem e sonhei com a casa dela, aquela com a laje. Eu, na verdade, não sei o porquê de ainda tentar agradá-la fora da cama. Aquela mulher é louca, mas meu peito esquenta quando a vejo de bar em bar pela cidade, sendo cortejada e se fazendo de difícil, ou até mesmo fumando na janela, tarde da noite. Dia desses tentei me aproximar! Vê se pode isso, meu amigo?! Ela, claro, apagou o cigarro ainda pela metade, teve a ousadia de jogar na minha direção e bateu a janela no meu nariz... Para que não digas que sou exagerado, vê aqui essa mancha cinza no ombro, das cinzas do cigarro! Mas eu acabei me distraindo novamente, ora! Mas, voltando ao assunto principal...

Eu não espero que acredite em mim, mas, hoje de manhã, em casa, não consegui me ver no espelho. Sério, Augusto, eu simplesmente desapareci. Digo, não completamente. Foi engraçado, até! Meu bigode estava pairando no ar como uma pena, negra e grossa. Isso pode ter sido um sonho, não acha? Era muito cedo, eu ainda estava despertando, mas o que me interessa é o significado disso tudo... Cá entre nós, ainda sou um rapaz, Augusto. Não tenho idade para ficar caduco, loucura também não é, e eu tenho me alimentado bem nos últimos dias, e inclusive, no domingo, fui almoçar na casa dela... Eu não diria isso para qualquer um, não me abriria assim para alguém que não fosse de minha confiança, Augusto, por isso digo para você: Inês está me fazendo isso. Eu tenho certeza, você sabe que eu sou louco por aquela mulher.

Num dia nos amamos, noutro ela me ignora completamente.

Num dia, bate à minha porta só para me dar um beijo e sair. Noutro, sai por aí espalhando boatos sobre mim pelos bares.

Ela me faz de gato e sapato, amigo...

É como se ela estivesse me controlando, e ela quer que eu desapareça! Quer que eu deixe de ser esse metido à mulherengo que sou e me dedique à ela. É isso o que ela quer, mas ela não vai conseguir. Você sabe que ninguém me muda, não é, Augusto?... Augusto? Está me ouvindo, Augusto? Ei, onde você vai?! Sente-se aqui, rapaz!... Ora essa! Matias, coloque essa na conta!... Matias, está me ouvindo? Matias, pelo amor de Deus, me responda!