História Questão de Escolha - Gotham Incorreta

Olhando meu reflexo no espelho respirei fundo. Meu primeiro dia de aula na escola nova, não havia sido fácil e não alimentava a ideia de que o segundo seria melhor. O que havia de errado com essas pessoas? Era tão difícil assim se enturmar com alguém novo? O problema não é comigo, era?
Terminei de pentear meu cabelo e desci as escadas devagar enquanto puxei a toca da blusa para cobrir minha cabeça. Não estava frio, mas eu tremia com arrepios congelados.
Minha tia Tara, corria de um lado para o outro na pequena cozinha tentando pegar uma caneca de café enquanto simultaneamente falava ao celular e colocava cereal em uma tigela.
-Me escuta, você não está pronta pra isso e ela também não está! —Se virando pra mim ela abaixou a voz. –Tente o que eu lhe disse e então pensamos nisso. Agora tenho que ir, se cuida.—Desligou o celular e se colocou a caixa de leite sobre a mesa. –Dormiu bem, Lucy?
-Tenho inveja de quem está em coma. –Tentei soar calma e finalizei com um sorriso.
-Com quem estava falando?
-Ninguém importante, assuntos do trabalho. –Minha tia trabalhava em uma pequena cafeteria no centro de Gotham. Foi o que ela conseguiu desde que nos mudamos. Eu sempre considerei uma decadência agradável, ela tinha mais tempo pra mim porém, ganhava muito menos do que como secretária. –Estava olhando as notícias até um pouco antes de você descer, não vai ter aula na sua escola hoje.
Parei de comer o cereal e olhei para ela com um sorriso de lado.
-Que péssima notícia. –Comentei sendo irônica. –O que aconteceu?
-Parece que aquela área da cidade está sendo ameaçada pelo Pinguim, não querem que os moradores saiam de casa então está tudo parado naquela região. –Ela bufou. –Estou reconsiderando morar aqui novamente.
-Deve durar só uns dois dias, calma. –Olhei para o relógio. Eu deveria estar prestes a sair agora, mas felizmente não teria que ir a lugar nenhum. Nada para fazer. –Vai trabalhar até tarde?
-Provavelmente. –Ela me viu abaixando a cabeça então segurou minha mão. –Ei, quando eu voltar podemos pedir pizza e ver algum filme, tudo
-Tudo bem. –Dei um pequeno sorriso.
Depois do café da manhã minha tia seguiu para o trabalho.
Me sentei no sofá e liguei a televisão procurando alguma coisa para me distrair, mas não havia nada além de noticiários. Com o tédio me consumindo deixei em um canal qualquer enquanto mexia no celular.
-Na noite passada, por mais uma vez o Coringa e sua gangue assaltaram um dos bancos de Gotham levando uma quantia que não foi divulgada.
Olhei para a tela, me lembrando do nome que a apresentadora. Quando eu tinha dez anos, no dia de Halloween toda a imprensa estava enlouquecida mostrando ao vivo o Coringa e o Batman em uma perseguição longa que deixou vários feridos. Não seria grande coisa, se não houvesse uma explosão no Parque Robinson onde estava acontecendo uma festa ao ar livre. Me lembro de que quando tudo acabou com a prisão do Coringa a GCN mostrou os dois vídeos que o palhaço havia divulgado para todos alguns anos atrás. Esses vídeos simplesmente eram perturbadores, mas o que mais me assustou com toda a certeza foram as risadas no final de cada um.
-Não temos muitas informações sobre o ataque de ontem, porém fontes dizem que o sinal do herói de Gotham, O Batman, foi ligado mas o Morcego de Gotham não apareceu para lutar contra o Coringa, e o palhaço escapou imune.
O Batman não havia respondido ao sinal? Ele sempre respondia enquanto eu morava aqui quando mais nova. Isso fez com que eu assim como várias crianças da minha idade virassem fãs dele. Perdi alguma coisa.
Enquanto pensei em algum motivo para o morcego não ter aparecido o noticiário mostrou a gravação das câmeras de segurança do banco.
-O auto intitulado Palhaço do Crime estava acompanhado de sua parceira no crime também auto intitulada Arlequina, antes conhecida como a Diretora de Pessoal e psiquiatra no Asilo Arkham Dra. Harleen Quinzel. Eis o que as câmeras capturaram.
Na filmagem Coringa aparecia andando sem se preocupar ao lado de Arlequina e três caras, dois deles usando capuz. Eles começaram um tiroteio contra os poucos seguranças que cuidavam do turno noturno e inesperadamente no meio das balas Coringa e Arlequina se beijaram e quando tudo terminou os dois saíram do alcance das câmeras.
-Não se tem notícia do casal ou de algum dos integrantes da gangue desde então.
Um frio arrepio correu pela minha espinha. Como sempre previ o pior cedo demais e isso fez com que o medo tomasse conta de mim. Se Batman não havia respondido, talvez tivesse desistido de Gotham e assim o Coringa estaria cada vez mais forte. Se a cidade fosse governada pelo Palhaço tudo viraria caos e violência, pensando nisso não consegui conter pensamentos terríveis.
Eu como sempre estava tirando conclusões cedo demais. Mas quando se morava em Gotham, isso era questão de sobrevivência.
Respirei fundo, tentando me acalmar. No fundo eu sabia que nada iria acontecer e que provavelmente Batman só estivesse ocupado na hora do ataque com alguma outra coisa, ele voltaria, sempre voltava. Mas de alguma forma, nem essa hipótese funcionou como calmante.
Passei a tarde vendo os noticiários em busca de algum sinal de um novo ataque do Coringa, com esperança também de conseguir algo sobre o paradeiro do herói de Gotham. Mas nada mais sobre os dois foi dito.
Deveria começar a me preocupar? Sempre havia um silêncio antes da explosão de uma bomba.