História Questão de Escolha - Um Flerte Mal Resolvido

Depois de toda a agitação eu ainda não havia me recuperado totalmente, então pedi para que fossemos logo tentar dormir ao invés de prolongar a festa do pijama. 

Minha tia nos ajudou a levar o colchão pra cima e ajeitar tudo no meu quarto. Logo depois decidiu ir se deitar novamente, ainda não se sentia muito bem. 

-Vão ficar bem? -Perguntou. 

-Vamos. -Sorri tentando acalma-la. -Pode ir, descanse. Nunca vi você tão cansada. 

-Sinto muito por isso, espero estar melhor amanhã de manhã. -Me beijou no rosto. -Até amanhã, meu amor. 

-Até amanhã. -Segurei sua mão rapidamente e conforme ela se afastou soltamos. -Boa noite. 

-Boa noite. 

Quando ela fechou a porta Claire estava subindo as escadas, comendo uma barra de chocolate inteira. 

-Quer uma carreira? -Ofereceu. 

-Só dois pedaços, açúcar vai me fazer ficar mais agitada. -Peguei um pouco e entramos no quarto. -Cadê a Melanie? 

-Ela foi buscar a cesta, mas o pai dela ligou. -Revirou os olhos. 

-Você não gosta mesmo do pai dela, não é? 

-Não é isso, só que ele liga demais. -Se sentou no colchão. -Logo ela vem, senta. 

Sorri e me sentei. Busquei meu celular e ofereci um dos lados do fone pra ela. 

Começamos a ouvir um pouco de música lenta, pra poder me ajudar. 

-Sempre ouve esse tipo de música? -Perguntou. 

-Na maioria das vezes. -Balancei os ombros. -Ajuda a me manter mais calma. 

-Entendo. -Sorriu. -Ei, sei que talvez você não queira falar. Mas o que te assustou lá embaixo? Por que gritou tanto? 

Senti um aperto no peito ao mesmo tempo que um enjoo me embrulhou o estomago. 

-Não sei bem o que foi. -Comecei. -Era como eu mesma, mas vestida como o cisne negro. 

Ela ergueu as sobrancelhas. 

-Que bizarro. -Comentou. -Aconteceu mais alguma coisa? 

-Não. -Menti. Puxei uma mecha do meu cabelo para trás. -Você sabe que eu sou medrosa, grito por qualquer coisa. 

-Isso é verdade. -Riu. -Está melhor agora? 

-Sim, não completamente. -Abaixei a cabeça. -Mas estou melhorando. 

-Que bom. -Segurou minha mão. -Pode contar comigo pro que você precisar. 

-Obrigada. -Sorri. 

Ficamos caladas por um momento. 

-Posso fazer uma coisa? -Perguntou sorrindo. 

-O que é?  

-Feche seus olhos. 

Desconfiei, mas obedeci. 

-E agora? 

Ela não respondeu. 

Logo senti um calor nos lábios. 

Claire estava me beijando? 

Abri os olhos e comprovei o que estava acontecendo. Ela inclinou a cabeça para o lado, logo começou a abrir a boca como se pedisse que eu fizesse o mesmo. 

Meu coração disparou. Senti um arrepio gelado correndo pelas minhas costas. 

Afastei-me rapidamente. Colocando a mão sobre meus lábios. 

-O que foi? -Ela perguntou. -Fiz alguma coisa? 

-Sim, você me beijou. -Ainda não acreditava no que havia acontecido. -Claire, me diga que está brincando. 

-Não estou. -Arqueou uma das sobrancelhas. -Acha que brincaria com uma coisa dessas? 

A olhei sem reação por algum momento. 

-Isso não deveria ter acontecido. -Falei. -Somos amigas, pelo menos achei que éramos. 

-É errado eu gostar de você? -Debochou. -É homofóbica, por acaso? 

-Sabe que não foi isso que eu disse. -Cruzei meus braços. -Você nunca demonstrou nada, nunca mandou-me indiretas. Não pode me beijar assim do nada. 

-Ah entendi, você é romântica. -Pareceu mais irônica do que nunca. 

-Talvez eu seja. -Me irritei. -Você nem considerou o fato que estou em um pós-surto? Sabe como minha mente está cheia e confusa? 

-Não eu não sei. -Abaixou o tom. -Me desculpa. Mas porra, me sinto aliviada em ter te beijado. 

Fiquei em silêncio apenas olhando para ela. 

Eu não queria machucar ela com palavras cruéis, mas também não podia dar a entender que eu gostei e queria mais, até mesmo por eu mesma não saber o que pensar. 

-Não podia ter feito isso sem meu consentimento. -Suspirei. -Não quero perder nossa amizade. 

-Eu não quero ser só a sua amiga. -Retrucou. 

-Não complica as coisas. 

-Olha pra mim! Eu já sou complicada caralho. -Revirou os olhos. -Se você não gostou sinto muito, eu gostei sim. -Se levantou.  

-Claire, me desculpa. 

-Não quero suas desculpas. -Bateu a porta ao sair. 

Fiquei ali sentada pensando no beijo. 

Foi estranhamente bom. 

Talvez minha falta de experiência tivesse feito parecer melhor. 

Mesmo assim ainda continuava brava com Claire, não completamente furiosa, mas sim não estávamos bem depois do que aconteceu. E provavelmente não iriamos ficar. 

Melanie entrou no quarto carregando a cesta e mais três garrafas d'agua. 

-Me ajuda, socorro!  

Corri para pegar a cesta.  

-Por que não coloco as garrafas na cesta? -Perguntei. 

-Iam amassar os chocolates, ué. -Se sentou no colchão. -Cadê a estranha? 

-Acho que foi no banheiro. -Tentei disfarçar. Peguei uma das garrafas e tomei um gole. -Seu pai te ligou? 

-Sim, falando que as regras de sempre. -Suspirou. -Ele tá ficando muito irritante, deve ser aquele chefe dele provocando com milhares de trabalhos. 

-No que seu pai trabalha? 

-Ele é empreendedor. -Falou rapidamente. -O chefe dele tem um negócio em aqui em Gotham, meu pai achou uma boa ideia investir. 

-Entendi. -Investir em algum negócio em Gotham parecia maluquice. Talvez o chefe do pai dela fosse um sonhador, novato e jovem.  

-Posso te fazer um convite? 

-Depende, para o quê?  

-Eu fui convidada pra uma festa da Lexcorp. -Sorriu. -Mas eu não tenho ninguém pra ir comigo, e eu não quero ficar sozinha lá. Quer ir comigo? 

-Lexcorp? Não é a empresa do bilionário Lex Luthor? 

-Sim obviamente, ele mesmo. -Arrumou o cabelo em um coque alto. -Eu tenho que ir, meu pai vai estar lá também, parece que o Luthor quer fazer negócios com o chefe do meu pai. 

-Vai ser uma festa de gala, não sei se tenho roupa pra isso. 

-Eu estou te convidando, eu pago um vestido pra você. -Piscou. -Meu pai nem liga se eu gasto o dinheiro dele desde que eu me mantenha na escola. 

Pensei por um momento. Um evento sempre era um coisa complicada, na verdade, qualquer coisa que exigisse uma postura minha mais séria e cautelosa minha fazia eu sentir medo de ter uma crise no meio desses eventos. 

-Não sei, pode ser um problema. -Respondi. -Minha ansiedade lembra? 

-Toma seus remédios. -Revirou os olhos. -Eu vou estar lá, se você ter uma crise eu bato na sua cara e pronto. 

Soltei um riso. 

-Queria que fosse simples assim. -Olhei para ela. Não desistiria tão fácil. -Tudo bem, eu vou. Quando vai ser? 

-Sexta-feira. -Sorriu. -Vamos procurar os vestidos na segunda, quero que esteja tudo resolvido.  

-Tudo bem.  

Claire entrou pela porta e se sentou ao lado de Melanie, me olhando furiosa. 

-Onde você estava estranha? 

-Fui no banheiro, não posso? 

-Não vem descontar sua raiva em mim não. -Bateu de leve no ombro dela. -Sem graça. 

O clima entre nós estava estranho durante a noite toda. Claire raramente se dirigiu a mim, não tenho certeza se Melanie notou isso. 

 

 

~Manhã de Segunda-Feira~ 

Melanie já estava a horas procurando por algum vestido. A tarde toda praticamente.  

Passamos por quase todas as lojas disponíveis em Gotham, e ela já pensava em ir para procurar por mais lojas. 

Felizmente encontramos uma onde ela havia achado algumas opções. 

Como eu já esperava ela preferiu o mais curto e sexy dos que pegou. Em um tom de vermelho brilhante, com mangas curtas com vários detalhes na gola. Ficou muito bonito nela, enquanto se olhava no espelho pedia minha opinião sobre que sapato combinaria, mas eu repetia diversas vezes que não entendia de moda. 

Quando ela voltou ao provador para colocar sua roupa novamente eu pensei no que Claire havia feito na noite passada. Não parecia mais tão estranho, mais também não havia me decidido se era uma boa coisa, nossa amizade agora se tornou um flerte mal resolvido e isso era terrível. 

Não tive muito tempo para decidir se mandava uma mensagem ou não, Melanie retornou rapidamente exigindo que eu provasse o que ela havia escolhido pra mim. 

Era inteiro branco, com um pequeno laço na cintura. A parte de cima era aveludada enquanto a de baixo era feita de camadas de tule.  

Ela havia escolhido um preto idêntico a esse, mas depois da noite de sábado não queria mais saber de preto, não por agora. Não queria ter nada igual com aquela alucinação do cisne negro. 

-Não consigo fechar o zíper. -Comecei a rir no provatório. 

-Como assim? -Melanie abriu as cortinas. -Ah, o zíper é atrás. Deixa que eu te ajudo. 

-Tem certeza que esse está bom? -Me olhei no espelho enquanto ela terminava de fechar o zíper. -Meus ombros são largos. 

-Os meus são bem mais largos que o seu, meu amor. -Levantou meu cabelo para ver melhor. -Está ótimo, continua mantendo sua pose de boa garota. 

-Minha marca registrada. -Revirei meus olhos. 

-Nossa.  

-O que foi? 

-Nunca havia notado. -Começou me olhando de frente e bem perto. -Mas o seu olho direito é verde. 

-Não verde. -Retruquei. -É um pouco mais esverdeado, continua sendo azul. 

-Mas é maneiro. -Riu. -Enfim, vamos indo. Vai ficar com este, temos que passar no salão de cabelereiro para marcar uma hora para nós duas. 

-Tudo bem. -Suspirei cansada. -Vamos depois comer alguma coisa, não é? Estou morta de fome. 

-Eu ia te perguntar isso. -Brincou. -Vamos sim, ande logo. Vou ir pagando os vestidos enquanto isso. 

-Tá bom. 

Tirei o vestido e entreguei para ela. 

Quando ela saiu comecei a vestir minhas roupas.  

Antes de sair me olhei no espelho novamente. 

Por um momento um borrão preto foi refletido logo atrás de mim. 

-Agora não. -Pensei fechando meus olhos. -Chega disso, para com isso Lucy. 

Abri os olhos, não havia nada nem ninguém. 

Respirei fundo, peguei minha mochila e saí antes que acontecesse mais alguma coisa. 

Encontrei Melanie no caixa. Ela olhava algumas pequenas joias enquanto esperava a atendente colocar os vestidos em caixas com o logo da loja em dourado. 

-Oi. -Toquei seu ombro. -Vamos? 

-Só estou esperando a moça me entregar os vestidos. -Fez uma cara de impaciente. -Por isso não gosto dessa loja, as funcionárias são lentas. 

-Não seja tão cruel. -Brinquei. -Ela deve estar tomando cuidado pra não amassar os vestidos. 

-Que seja. -Jogou o cabelo para trás. 

Alguns instantes depois a moça voltou com as caixas. 

-Pronto meninas. -Sorriu colocando tudo no balcão. -Obrigada pela preferencia. 

Pegamos as caixas e quando nos afastamos Melanie colocou os óculos escuros. 

-Ela acha que foi a primeira loja que pensamos. -Bufou. -Coitada. 

Revirei os olhos sorrindo. 

Algumas quadras dali ficava a mesma cafeteria aonde eu havia ido com a minha tia depois da primeira consulta. 

E pensar que logo eu teria que voltar. 

Entramos e nos sentamos mais pro fundo. 

Melanie pediu um Smothie de morango, eu preferi pegar a torta de maçã com sorvete. 

-Me dá um pouco? -Pediu assim que meu prato chegou. 

A olhei por alguns instantes. 

-Por que não pediu um também? 

-Estou de dieta. -Pegou meu garfo. -Mas um pedaço não faz mal. 

Cruzei meus braços enquanto ela pegava um generoso pedaço. 

-Desde quando está de dieta? -Peguei o garfo novamente. -Sexta e Sábado você se afundou em doces. 

-Por isso mesmo comecei uma dieta. -Sorriu. -Preciso perder alguma coisa até a festa. 

-Boa sorte com isso. -Peguei um pedaço da torta para provoca-la. 

-Eu vou tacar essa torta na sua cara. -Se irritou. 

Comecei a rir e abaixei a cabeça tentando abafar o som alto. 

Melanie riu logo depois. 

 

 

~Naquela noite~ 

Eu estava pesquisando no computador um bom tempo por alguma loja de decoração em Gotham. E praticamente não havia nenhum site, isso significava que teria que bater perna se quisesse deixar meu novo quarto do meu jeito.  

Uma mensagem fez meu celular vibrar.  

Era Melanie. 

"Fique preparada, vou te chamar por vídeo" 

Abri o aplicativo. Instantes depois o contato de Melanie apareceu ligando. 

-Oi. -Sorri. 

-Ei, eu só queria perguntar se você sabe o que vai acontecer amanhã na escola. 

-Não estou sabendo de nada. 

Ela bateu com a mão na testa. 

-Novatos. -Suspirou. -Amanhã tem aula de educação física. 

-O que tem isso? -Estranhei. 

-Tá brincando comigo? O professor vai fazer uma roda pra apalpar todo mundo! 

-É sério? -Desconfiei. 

-Obviamente que não. -Sorriu. -Só queria um motivo pra começar uma conversa com você. 

-Podia ser qualquer outro. -Soltei um riso. -Até uma simples pergunta se eu acredito em alienígenas. 

-Bom o Superman já está por aí, provando que sim.  

-Isso é verdade. -Brinquei. -Ei, sabe de alguma loja de decoração aqui na cidade? 

-Em Gotham? -Pensou um pouco. -Eu conheço uma só, mas tem um problema. 

-Qual? 

-Fica na área do Coringa. -Mordeu o lábio. 

-É perigoso demais? 

-Bom digamos que é o Coringa, então tudo relacionado a ele é perigoso. -Suspirou. -Quando quer que eu te leve? 

Comecei a rir. 

-Você é uma péssima amiga.  

-Qualquer coisa a gente corre. -Piscou. -Você vai lá para quê? 

-Quero decorar meu quarto. -Sorri. -Vou a tarde. 

-Eu vou junto. -Se animou. -Aproveito e compro algumas coisas também. 

-Ótimo.  

Conversamos por algumas horas. 

Dividindo os assuntos entre importantes e completamente inútil. 

Melanie se mostrou mais carinhosa e gentil do que aparentava, surpreendo-me na verdade