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História Quid Pro Quo - Sibelium


Escrita por: cryomancer

Notas do Autor


Oi gente, trouxe mais um capítulo!
Espero não ter demorado tanto. Mais uma vez obrigada pelo feedback.
Boa leitura!

Capítulo 12 - Sibelium


Parte 9                           

 

A porta do Sasuke é como um alvo.

Eu sei que ele está lá dentro, e também sei que preciso dele.

Não gosto da palavra precisar, eu não gosto de precisar dele. Estou sentada com as costas contra a minha própria porta trancada enquanto penso em outros termos mais aceitáveis para mim.

Sasuke pode me ajudar é uma frase mais confortável. Mesmo assim, eu não consigo bater à porta dele, porque sei que não seria fácil como ‘ei, me empreste o seu celular’ e a resposta seja: ‘claro’. Não, ele pedirá explicações. E com razão, eu também pediria no lugar dele.

Abraço meus joelhos. Dentro de algumas horas vão fazer dois dias desde que aquele homem quase me matou no beco, e ainda sinto um pouco de desconforto em partes estratégicas do meu corpo. Nada significativo, nada que me impedisse de andar, ou nada que me impedisse de socar a cara do Sasuke, como fiz.

Mas acho que a posição na qual me encontro agora é a responsável por isso, estou encolhida.

Solto minhas pernas, e um de meus pés acerta de forma brusca a porta dele. Obviamente não foi de propósito, mas se ele ouvisse e viesse até a porta tirar satisfações seria maravilhoso.

Mas ele não veio, e eu não esperava que viesse.

Sasuke é um delinquente. Eu não ficaria surpresa se ele desse de ombros e dissesse ‘que azar’, fechando a porta na minha cara quando eu o contasse qual é o meu problema.

Suspirando, percebo que é a hora de tirar a prova. Preciso ir para casa, preciso comer alguma coisa, tomar uma ducha e dormir cedo. Estou cansada, fui dormir durante a madrugada ontem e não parei o dia inteiro, preciso repor as energias.

Meu punho se choca à porta dele algumas vezes, e fico sobre a ponta dos pés um pouco para observar o olho-mágico, mas não dá para ver nada muito claramente, é como se ele estivesse em seu próprio quarto, ou banheiro. Mas não está na sala.

É o que faltava.

Evitei a campainha todo este tempo porque, ao contrário dele, odeio ser um incômodo. Eu preferiria a morte a segurar o dedo na campainha como ele fizera antes, mas agora não tive opção se não apertar nela algumas vezes.

Alguns minutos se passam, e estou tão frustrada com a demora, que meus dedos se deslocam em direção à maçaneta. Percebo que a porta está aberta, mas eu jamais entraria na casa dele sem sua permissão, como ele também foi capaz de fazer comigo.

Isso não me impedia de enfiar a cabeça lá dentro e gritar o seu nome. É o que faço, fechando-a silenciosamente em seguida.

Pressiono a campainha outra vez, e ainda me custa alguns segundos até que eu perceba pela luz que atravessa a estreita fresta da porta que ele está se aproximando.

Estou preparada para receber a sua grosseria quando a porta é aberta novamente diante de mim, mas não. Sasuke não diz uma só palavra, não que fosse necessário, porque enxergo bem o aborrecimento em seus olhos escuros quando me fita em silêncio enquanto maneja uma toalha cinza sobre seus ombros, esfregando-a em seus cabelos molhados com desprimor.

A falta de esmero com a qual faz aquilo me leva a questionar se quer arrancar a própria cabeça, mas ele não para, pelo contrário, suas pálpebras se fecham por um breve momento, como se estivesse se concentrando no que fazia.

Aproveito para observar sua figura, e as roupas que está usando são diferentes agora. Não era mais um pulôver com a estampa de um cavalo rosa, e sim uma camisa escura de mangas compridas e uma calça moletom, muito à vontade.

Ele abriu os olhos sem que eu percebesse, mas ficou em silêncio enquanto eu o analisava. Percebo isso quando minha atenção retorna a seu rosto e ele já está me observando calado, repetindo a fricção da toalha em seus cabelos do lado oposto.

A situação está muito clara para mim, ele estava no banho e eu o interrompi, ou ao menos o fiz concluir mais rápido. De qualquer forma, não tem mais importância.

“Preciso de ajuda”

Nada muda em suas feições, ele parece igualmente indisposto agora como estava ao abrir a porta, “Prossiga”

“Eu estou trancada fora de casa.” É incrível. Eu assisto atenciosamente a forma como suas feições se contorcem diante de mim, o aspecto rabugento de antes dando lugar a um cinismo inconfundível, os lábios se contraindo em um sorriso insipiente.

Como se eu já não estivesse furiosa o bastante por estar nessa situação, Sasuke se torna o complemento. Eu suspiro, tentando manter a calma. Ele não disse nada, não tentou me provocar com piadinhas, mas a forma como sua aura séria foi quebrada na minha frente após ouvir o pequeno resumo do que está acontecendo foi o suficiente.

Ele não precisa dizer nada.

“Esqueceu a chave aqui?” Questiona, observando a sala de seu apartamento brevemente por cima do ombro.

“Não, eu não cheguei a sair com ela.” Seu cenho se franze em confusão, e eu não espero ele externar suas dúvidas. “Minha chave está lá dentro,” aponto com o polegar para a porta atrás das minhas costas. “eu estou literalmente trancada para fora, não posso entrar”

“Qual a serventia de uma testa tão imensa se não há um cérebro dentro dela, não é mesmo?”

Meus ombros se erguem com uma risada forçada, eu não me dou sequer o trabalho de fingir, porque ele precisa saber que o insulto não me agradou. E pareceu escolher o momento perfeito para me provocar, quando estou pedindo a sua ajuda e não é exatamente inteligente revidar com outros xingamentos.

Eu fico calada.

“A culpa não foi minha. O meu namorado trancou... Bem, meu ex-namorado a trancou quando saiu. A chave estava lá dentro.”

Anuindo perante minha explicação, ele observa sobre minha cabeça em silêncio, analisando a porta como se pensasse em uma solução.

Eu não quero que, em momento algum, pense que estou aqui a sua mercê. Que bati sua porta porque estou horrorizada com a situação e não sei o que fazer, por isso estou exigindo dele que encontre uma saída. Eu já sei o que farei, só preciso do celular dele.

“Você quer que eu arrombe a porta?”

A pergunta me tira dos trilhos por um momento, e eu o observo com as sobrancelhas arqueadas.

“Não! Você é maluco?”

Sasuke levanta os ombros, confusão brincando em seus olhos.

Eu não sei se ele pareceu empolgado com a ideia de chutar minha porta até derrubá-la, mas os ombros dele caíram ligeiramente quando o neguei veementemente. Então ele cruza os braços sobre o peito, apoiando seu ombro à porta aberta.

“E por que veio pedir a minha ajuda?”

“Na sua cabeça, arrombar a porta é a única maneira de resolver isso?”

“Sim, se você quiser dormir em casa, sim. É a única maneira”

Intrigada, eu cruzo os braços também. Alguns segundos de troca de olhares impertinentes se segue, e eu observo os fios úmidos de seus cabelos revoltos caírem sobre sua testa, e a forma como suas roupas estavam amassadas. Sem dúvidas ele se apressou para vir me atender, quem sabe até interrompeu o próprio banho. “Você correu para fora do banheiro, não é? Foi mal”

“Não, eu tomei o meu tempo. Quem quer que fosse podia esperar”

Claro. Claro. Não sei como eu estava esperando um pingo de civilidade, ao menos que mentisse para passar uma boa impressão, mas obviamente isso tudo é esperar demais.

Ele só trata os próprios problemas com urgência. Duvido que seja capaz de uma boa ação.

Mas retiro meu último pensamento no segundo seguinte. Sasuke deixou que eu descarregasse minha fúria nele hoje, sem revidar. Isso é uma forma de caridade, foi uma atitude minimamente legal da parte dele.

Suspiro, decidindo ir diretamente ao ponto. “Eu preciso fazer uma ligação. Pode me emprestar o seu celular?”

A forma como ergue suas sobrancelhas é um indicativo de surpresa. Provavelmente o meu pedido é muito mais realizável do que ele achava que seria, algo simples como uma ligação depois da possibilidade de arrombar minha porta ter surgido.

“Um momento”

Ele não me convida para entrar, pelo contrário, apenas encosta a porta e se ausenta por alguns minutos.

De uma forma ou outra Deidara iria conseguir o que queria. Algo que eu não quero, no entanto. Quando eu o ligasse para pedir que voltasse aqui com sua cópia, ele viria sem pensar duas vezes, e não iria embora sem acertar o que quer que queira acertar comigo.

Ele conseguiu o que queria, e não foi sequer de propósito. Parabéns para ele.

O rangido da porta me puxa para fora de meus pensamentos, e o peito de Sasuke quase encosta no meu rosto quando ele fecha a porta atrás de si. Eu me afasto um passo, olhando para ele com um pouco de espanto, mas ele continua inefável quando ergue a mão, me oferecendo o celular.

Com a porta de seu apartamento fechada, o ambiente está escuro. Eu sinto o vento da janela no final do corredor bater contra minhas costas, e mal posso enxergar as escadas, ou mesmo o rosto dele.

Mas eu estou sentindo ele. Figurativamente ou não.

Sasuke está cheiroso. Uma mistura de aromas frescos, sabonete, colônia, loção pós-barba – não que ele tivesse, desde que o vi pela primeira vez seu rosto está sempre liso. Mas ainda é necessário mantê-lo dessa forma – e a toalha limpa em seus ombros.

É a primeira vez que sinto inveja de alguém por poder fazer algo simples como tomar um banho.

Eu não estou tão suada quanto antes, visto que passei alguns momentos sentada no chão pensando sobre a merda que havia acabado de acontecer comigo e tentando achar outras soluções que não envolvessem ligar para o meu ex. E a primeira coisa que me veio em mente foi Teuchi.

Desci as escadas e fui até o lobby, mas o velho não estava lá. Nestas horas ele já está recolhido cozinhando o próprio jantar e fazendo seja lá o que faz durante as noites, e eu o conheço bem o bastante para saber que nós, moradores, só podemos importuná-lo com problemas quando está no lobby. Depois disso é cada um por si.

Se eu ousasse ir até sua porta, ele faria algo como ligar o som para fingir que não está ouvindo.

Então a última opção foi ligar para o Deidara, porque eu não vou pedir ao Suigetsu que saia do outro lado da cidade para vir me buscar aqui, muito menos Ino. Como meu celular está quebrado, Sasuke me ajudaria a executar meu plano.

Eu pego o celular em sua mão e pressiono uma das teclas – sim, teclas – para que haja algum foco de luz entre nós dois. Eu gostaria de ter a minha privacidade para ligar, mas quando ele apóia os quadris à parede, com os braços devidamente cruzados e os olhos fixos a mim, eu sei que não vai sair daqui nem se eu o pedir.

Suspirando, eu digito os números no celular em minhas mãos. É um daqueles Blackberrys projetados ao único propósito de fazer e receber ligações, com um teclado QWERTY, do tipo que é incomum encontrar hoje em dia.

“Esse é o seu celular?” Pergunto casualmente, com os olhos presos à tela pequena. Eu sei que não devia engajar conversações desnecessárias com ele, mas a ocasião me sufocaria se eu não o fizesse.

Como se percebesse que estou tentando ridicularizá-lo, ele suspira. “Um deles.” Eu solto um riso nasalado por não ter pensado nisso antes. “É o meu celular de negócios.” Ele retruca em tom indiferente.

Algo em minha mente se acende e mediatamente fecho a aba na qual digitava o número do meu ex, navegando em direção as mensagens. Duvido que encontrarei algo de útil no ‘celular de negócios’, mas não custa nada averiguar já que tenho a chance. “O meu pessoal é muito melhor do que o seu era,” eu não preciso olhar para o rosto dele para saber que o jogo virou em minha direção, e agora é ele que está zombando de mim “e mesmo que esse fosse, é muito melhor ter um celular como esse do que não ter nenhum... O que é meio que o seu caso agora.”

“Pode calar a boca? Estou tentando fazer uma ligação” Praguejo, enquanto deslizo entre as mensagens mais aleatórias que li na vida. Algumas delas se resumiam a nomes de fármacos e uma quantidade em gramas em seguida, outras, perguntas do tipo ‘Quando podemos nos encontrar de novo?’ e ‘Sasuke, chegou aquela hora do mês’, ‘Precisamos nos ver’, ‘Estou desesperada’, ‘Vai à merda’, ‘Você faz entregas em casa?’, ‘Consegui o seu número com Namikaze’.

Algumas delas foram respondidas por ele, a maioria não. Aliás, uma porção delas ele recebeu só hoje.

Eu me pergunto quanto em dinheiro Sasuke faz em um mês, e a mixaria que os oitenta mensais que paga a mim devem ser para ele.

‘O crime não compensa’ se torna o provérbio mais sem sentido que ouvi na vida.

Antes que ele possa ficar desconfiado, eu saio das mensagens e volto a digitar o número. Ergo o olhar algumas vezes, e Sasuke está olhando para mim com um vinco entre suas sobrancelhas. Ele se aproxima, observando a tela na qual estou colocando os números. “Por que a demora? Para quem está ligando?”

“Meu ex.” Respondo, suspirando.

“Por quê?”

“Ele tem uma cópia da minha chave.”

Sasuke funga, “Você disse que não queria falar com ele”

Levo o celular à orelha, erguendo os ombros. “Eu não quero falar com ele, mas preciso. É isso ou nada.”

As chamadas iniciam e começo a balançar a perna com impaciência. A pior parte é que ele provavelmente está dirigindo de volta agora, e é mais difícil que atenda a ligação, mesmo assim, me mantenho expectante.

Sasuke toma o celular de minhas mãos em um bote firme e antes que eu possa protestar, ele desliga a chamada. “O que?! Por que fez isso?”

“Você sabe onde o Teuchi mora?”

Eu tenho uma ideia do que ele está prestes a propor, e francamente, já estou com preguiça. “Sim,” resmungo.

“Já passou pela sua cabeça que ele pode ter uma cópia da porcaria da sua porta, já que ele é o dono daqui?”

Isso só pode ser uma forma sutil de me chamar de estúpida. “Foi a primeira coisa que pensei”

“Bem, e você foi falar com ele?”

“Não,” estou entediada. Entediada, cansada, impaciente, com fome, suada. Eu não preciso ficar aqui discutindo, perdendo um tempo precioso. “Ele não está nem aí, ele não vai me atender”

Deidara dirigiria para onde eu quisesse. Na situação em que estamos, se eu o pedisse vir ao meu encontro em Antártida, ele iria. Então não seria o mínimo esforço para ele refazer o caminho feito sob a promessa de conversar comigo.

Tudo que eu tinha que fazer é esperar, esperar e logo após ouvir o que tem a dizer. Mesmo sem querer estabelecer qualquer tipo de contato com ele qualquer momento breve, mas valeria à pena pela minha chave.

Ao invés disso, estou descendo três andares com Sasuke à tiracolo. Ele não sabe onde Teuchi mora, mas mesmo assim está mais disposto do que eu, e suas pernas longas o possibilitam descer dois degraus de uma vez.

Admiro o seu vigor, principalmente após ter sido agredido por mim. Mesmo sendo um drogado, Sasuke tem energia.

Ele salta no corredor vazio enquanto ainda desço os últimos degraus lentamente, a cabeça girando à medida que analisa o local em silêncio.

Assim como eu, ele é observador.

Durante nosso jogo em sua mesa, Sasuke soube exatamente a pergunta que eu queria fazê-lo apenas olhando para mim, e deliberadamente escolheu não respondê-la, pedindo um desafio. Eu o fiz se arrepender por isso, mas não invalida sua esperteza, de forma alguma.

Chegar a esta conclusão só vai me fazer ficar mais alerta.

“Para onde devo ir?” a voz de Sasuke irrompe através dos sons dos meus passos. Ele olha para cima, vislumbrando enquanto me agarro a um dos corrimãos, e não disfarça a própria repugnância a meu ritmo mais lento.

“O apartamento dele é o único com grades na porta.”

Em seguida, estou parada paralelamente a Sasuke. Ele enfia a mão esquerda entre as grades de ferro no meio de nós, e acerta o punho firmemente na porta.

Alguns segundos depois e um som alto vem de dentro do apartamento de Teuchi. Meu humor está uma merda, mas não o suficiente para não ver graça nisso, porque dou uma risada quando a música repleta de saxofones soa, reverberando em todo o corredor e fazendo a expressão no rosto de Sasuke se contorcer em enfaro.

Exatamente como previ.

Sem dizer nada, apenas levanto os ombros em ar de ‘eu avisei’, e ele tenta outra vez.

Nada. A música ainda está lá.

Sasuke resmunga coisas inteligíveis. Não posso ouvir claramente o que está dizendo, mas acho tragicamente cômica a forma como Teuchi conseguiu um competidor à altura, porque ele segura o dedo sobre a campainha exatamente como fez comigo.

E nenhum ser humano com sangue quente aguenta aquele barulho sem reagir. Nem mesmo Teuchi, com toda sua misantropia.

Quando a música some, o cara em minha frente cruza os braços, satisfeito com o desenrolar dos acontecimentos. “Estou ocupado!” O velho grita do outro lado.

“É um incêndio” Sasuke responde.

Tudo bem, aquilo foi engraçado.

Eu sinto o canto da minha boca tremer, mas consigo me concentrar até o momento em que ouço os ruídos de uma porção de fechaduras sendo abertas do outro lado.

Sasuke olha para mim com um semblante de diversão, mas volta a ficar sério quando os olhos assustados de Teuchi nos fitam alternadamente. “Aonde?”

 

“Apenas me deixe ligar para o meu ex!” Insisto, desta vez em um tom mais alto e estendendo a mão aberta.

Estou sentada no corredor, Sasuke me observa de cima; sua lateral apoiada à moldura da porta com a toalha ainda sobre os ombros.

A essa altura, seus cabelos estão quase secos.

Tudo deu errado. Eu não sei se Teuchi estava falando a verdade, ou se a desculpa do incêndio o irritou o suficiente a ponto de fazê-lo não colaborar, mas depois de gritar conosco ao ouvir o motivo da visita, perguntou se tínhamos algodão na cabeça, disse que era cardíaco e que esse tipo de brincadeira não era aceitável.

Então um de nós dois refez a pergunta sobre a chave, e ele gritou outra vez, perguntando se achávamos que isso aqui era um hotel. Porque ele absolutamente não guarda cópias de chaves de seus moradores, afinal, era algo socialmente mal visto, tendo em mente que ele podia violar a privacidade de qualquer pessoa e adentrar seus apartamentos quando não estivessem presentes.

Ele se virou para mim, os olhos flamejando em irritação, “Você se sentiria à vontade em sair de casa sabendo que eu posso entrar?”

“Não,” respondi.

“Exato. Você e todo mundo.”

Então, voltei à estaca zero. Sentada exatamente no mesmo local em que estive divagando anteriormente.

Sasuke não me oferece nenhuma de suas sugestões mirabolantes, apenas joga o celular em minhas mãos. Percebo que ele perdeu duas ligações do número de Deidara feitas há cinco minutos, e imediatamente retorno.

“Sabe... Você pode dormir aqui” O tom de sua voz é monótono. Monótono o bastante a ponto de atrair minha atenção a ele, porque  quero ver o aspecto em seu rosto após sugerir isso, e ele parece igualmente inexpressivo.

Apesar de a situação sugerir um convite como esses, eu não imaginei que ele o faria. Não quando minha resposta é tão previsível.

“Não.”

Sasuke levanta os ombros “Ok,” Eu não estava esperando que insistisse. “Por que não?”

Meu olhar impacientado alcança o seu, e ele permanece irredutível. Não parece disposto a abrir mão de sua pergunta.

“Eu não quero dormir aí, isso também seria ultrapassar todos os limites”

“Que limites?” Um segundo depois, e sua resposta é atirada contra mim. Ele sequer piscou.

“Você está mesmo me perguntando isso?”

“Sim,” ele coloca uma mecha de seu cabelo atrás da orelha. “Quais são os limites?”

O celular está quente contra meu ouvido quando decido desligar a ligação que sequer fora atendida, porque a discussão com ele está tomando a minha atenção. “Eu preciso narrar o que aconteceu naquela quinta-feira? Quer que eu liste os motivos porque eu abomino você e o seu amigo? Realmente quer ouvir isso?”

“Eu sei. Você não gosta de mim, você não tem motivos para gostar de mim, qual é a novidade?”

Eu o observo atentamente enquanto me apoio aos meus joelhos até estar em postura ereta diante dele, “Nenhuma”

Ele torce o lábio inferior, e eu consigo ver um pequeno corte em sua gengiva. “Não estou tentando me aproximar de você. Eu não preciso ser o seu amigo para vigiá-la, que é o que me trouxe aqui. Eu não tenho o menor interesse em ser seu amigo”

Eu não quero transformar a discussão em uma disputa de quem se importa menos, mas não consigo resistir. Estou prestes a iniciar uma discussão quando o celular vibra em minhas mãos, e não perco tempo observando o visor, porque já sei quem é.

Sasuke parece ciente de quem está ligando também, “Você me procurou, você me pediu ajuda. Eu estou tentando ajudar.”

“Não, eu só pedi o seu celular”

Quando Sasuke solta o ar pela boca, eu sei que está completamente saturado da discussão. Ele aponta para o celular em minhas mãos com o queixo, “Então vá em frente, testa, eu não tenho a noite inteira”

Com a vibração fica um pouco difícil focar em meus pensamentos, eu me sinto pressionada a tomar uma decisão até que a chamada caia, por isso, pressiono o botão vermelho do lado direito e medito sobre as possibilidades.

De um lado, eu tenho a solução fácil que se torna difícil: ligar para Deidara e esperar que ele chegue com a cópia. Então, logo em seguida, eu seria forçada a lidar com o drama de discutir com ele um relacionamento que não existe mais. E responder quaisquer perguntas que tivesse sobre o que eu vi na quinta-feira.

De outro, a solução pouco prática, mas que me faria ganhar tempo: dormir na casa do Sasuke e contatar um chaveiro durante a manhã para trocar minha fechadura. A chave que Deidara tem se tornaria inútil sem que eu precisasse falar com ele.

Olho em seus olhos. Eu sei que ele está esperando que eu me decida em silêncio.

Externar a minha decisão é difícil. Eu sou orgulhosa demais para encarar isso de forma fácil, então resfolego, apontando para seu rosto com seu próprio celular. “Qualquer coisa estranha, eu dou o fora. Se você tentar alguma coisa, eu dou o fora” Nesse momento, Sasuke sorri “Ou mesmo se eu quiser ir embora por qualquer motivo, eu vou”

Dou de ombros, demonstrando indiferença. Ele já está falando como se eu houvesse dito ‘sim’ e isso é, no mínimo, digno de pena.

Com uma mão ele toma de volta seu celular, e com a outra, abre a maçaneta atrás de si, gesticulando para dentro e me oferecendo a entrada. “O que você acha que eu vou tentar?”

Passo por ele em direção ao interior de seu apartamento, e obviamente não é uma sensação boa. Me sinto como um pássaro enjaulado, e observo-o fechar a porta atrás de si. Eu me sentiria ainda mais desconfortável se ele a trancasse, mas felizmente não o faz “Não sei.” Respondo, me acomodando em um dos assentos no qual eu estava o esganando, minutos atrás.

Quando direciono minha atenção a ele, Sasuke parece estar pensando na mesma coisa. Porque ele caminha até aqui, e se senta ao meu lado.

Não deixa um assento de distância entre nós, ele se senta ao meu lado. E eu me encolho em direção ao descanso de braço. Não posso mandá-lo sair, pois estou na casa dele.

Sasuke suspira alto quando se recosta confortavelmente, as pernas abertas e um dos braços descansando atrás da minha cabeça. Não sei se está tentando me intimidar ou simplesmente continuar me provocando, mas salto para fora do sofá no segundo seguinte, optando por ficar de pé na sala.

“Você é a primeira mulher que eu trago para dormir aqui desde que me mudei, quem diria, não?”

Meu rosto se contorce em uma careta. “Aonde vou dormir, Sasuke?”

A mudança brusca de assunto não parece atingi-lo, pelo contrário, ele simplesmente espalma o assento vazio em que estive duas vezes, indicando que o sofá será meu.

Conhecendo-o como o conheço, eu estaria mentindo se dissesse que não esperei uma mínima piada ou insinuação sobre sua cama, mas ele não disse nada. A minha resposta é tão previsível que ele provavelmente decidiu não se dar o trabalho, ou tinha consciência do quão clichê e piegas seria.

Ele massageia o pescoço, a mão esquerda pressionada sobre o desenho de sua tatuagem e os olhos fechados. Talvez ele ainda sinta minhas mãos ali, e isso esteja o incomodando “Eu a entreteria com o privilégio de uma conversa comigo sóbrio, mas tenho um resumo de Cosmologia para concluir─”

“Então Cosmologia é a minha heroína hoje?”

Minha resposta ácida extrai uma gargalhada furtiva dele, e eu confirmo a teoria de que jamais conseguirei ofendê-lo. Isso é realmente frustrante, tendo em vista a facilidade com a qual consegue afetar meus nervos.

“Parece que sim”

Em seguida, ele me deixa sozinha.

Eu olho ao redor, sem saber o que fazer. Localizo a foto de sua família no mesmo local em que estava, e sinto vontade de observá-la novamente, mas isso pareceu ser um incômodo para ele, julgando pela forma como falou comigo antes.

Eu me pergunto sobre o posicionamento da mãe dele sobre as atividades ilícitas de seu filho. Que tipo de família permitiria tal coisa deliberadamente, mas então me ocorre que nem sempre os pais estão cientes do que seus filhos fazem.

Existem muitas coisas sobre mim que meus pais não sabem, e não há problema algum nisso. Não é o caso dele, que a qualquer momento pode ser posto atrás das grades.

Sasuke é um completo mistério.

Ouço o som de seus passos e me viro em direção a ele no momento em que retorna à sala. As mangas de sua camisa estão encolhidas até os cotovelos, o antebraço coberto por um lençol branco que ele arremessa no sofá em que dormirei juntamente a um travesseiro igualmente branco.

“Obrigada” Murmuro, talvez baixo demais.

Ele cruza os braços, pendendo levemente a cabeça para um lado enquanto me observa curiosamente, “Você vai dormir agora?”

“Por que eu ficaria acordada?”

“Não sei, mas são oito horas.”

Eu não sei o que responder, e por causa disso, um longo e tenso momento de silêncio se segue sem que nenhum de nós dois diga nada.

A comunicação com ele não devia ser tão difícil, mas eu sou a única de nós dois ciente das bordas que nosso contato deve ter. Sasuke não parece preocupado com isso, tampouco dá a mínima.

Eu tenho motivos reais para odiá-lo, não o contrário.

Talvez ele me odeie por estar no lugar errado, na hora errada, mas se resume a isso. A algo que eu não podia controlar, a uma coisa que eu evitaria se pudesse.

“Você está com fome?”

A pergunta me pega de surpresa, e eu o observo tentada a responder com sinceridade, porque estou com fome. E o motivo pelo qual não jantei é o mesmo pelo qual recusei beber água, quando me ofereceu antes.

Porém, recordo o número de enlatados que vi em sua geladeira. Provavelmente são as únicas coisas que tem a oferecer, e isso faz o meu estômago embrulhar.

“Pêssego enlatado em calda deve ser a coisa menos repulsiva que eu tenho a te oferecer”

Eu perco completamente a fome.

“Por que você não tem comida normal em casa?”

“Eu tenho preguiça de fazer compras, então compro enlatados porque são mais fáceis de achar e demoram mais a expirar─”

“Porque são repletos de conservantes!”

Ele revira os olhos, “Às vezes eu esqueço que você estuda gastronomia. Essa discussão não vale à pena.”

“Eu sei do que estou falando”

“Sakura, eu só como em casa à noite, não preciso me preocupar com comida”

É uma explicação justa, e por isso, eu desisto de discutir esse assunto, ou qualquer outro assunto com ele. Apenas me deito em seu sofá, socando algumas vezes o travesseiro sob minha cabeça antes de puxar o cobertor sobre meu corpo. Eu estou cansada, com certeza dormirei rápido, tudo que preciso fazer é esvaziar a mente, tudo será resolvido amanhã, não preciso me preocupar com isso.

Fecho os olhos, tentando ignorar que ele continua ali, me observando. Empurro o rosto contra o travesseiro e a mesma fragrância que senti quando estava perto dele inunda minhas narinas.

Então me viro de barriga para cima, cobrindo meus olhos com um dos pulsos. Tudo que posso ouvir são passos. Por alguns momentos sinto que sua presença não está mais aqui, mas ele retorna após breves minutos e se acomoda no sofá.

Não demora até que se levante outra vez, e percebo que seus cabelos foram presos. Ele desliga a luz da sala e vaga pela cozinha, recolhendo alguns objetos antes de retornar ao sofá pequeno, aonde se senta.

Fecho os olhos, pois está a minha diagonal e verá que estou espiando. Ouço o farfalhar de seus movimentos sobre o estofado, e então o folhear de páginas.

Em seguida, a sala está completo silêncio. Decido espiar novamente, e Sasuke está devidamente concentrado em suas atividades. Não foi nem de perto tão ruim quanto eu imaginei que seria, e reafirmo que Cosmologia de fato é a grande heroína do meu dia, pois Sasuke seria um incômodo se estivesse desocupado.

 

 

Na situação em que me encontrava, não custou tanto até que eu dormisse. Principalmente porque antes que acontecesse, eu foquei o suficiente em meus próprios pensamentos, mas em nenhum momento me esqueci de onde estava.

Em algum momento da noite, desperto. Sinto como se houvesse dormido pouco além de dez minutos, mas meus olhos estão pesados e minha mente amortecida, como se fosse mais. Eu observo o ambiente escuro ao meu redor discretamente, percebendo que Sasuke continua exatamente no mesmo local. A atenção ainda focada ao que está fazendo, com uma única diferença desta vez. Há um cigarro aceso em sua boca, mas ele continua escrevendo. O que me surpreende, no entanto, é como parece ter dominância em ambas as mãos. Eu me lembro claramente de que estava escrevendo com a direita antes de cair no sono, e agora, essa é a mão que ele usa para manusear o cigarro, enquanto redige seu texto com a esquerda.

Suspiro, minhas pálpebras se fechando tentativamente. Preciso voltar a dormir, mas já pareço ter sido notada.

“Por que está acordada?”

Minha respiração fica presa na garganta, e abro os olhos.

A fumaça se dissipa ao redor dele, mas posso sentir seu olhar em mim da mesma forma. Por incrível que pareça, não hesito em retribuir.

Sasuke joga a apostila em seu colo para o lado, livrando-se também da caneta. Uma luz branca ilumina seu rosto quando ele começa a usar o mesmo celular que havia me emprestado, e presumo que está respondendo as mensagens acumuladas.

Me movo sobre o sofá, deitando sobre minha lateral. “Que horas são?” Pergunto, minha voz rouca pelo desuso. Eu limpo a garganta, esperando por sua resposta.

“Duas e meia” Sasuke responde naturalmente. Duas e meia da madrugada?

Ele não parece nem um pouco sonolento, e minha teoria de que é uma coruja que troca o dia pela noite parece cada vez mais real. Aposto que ele dorme durante as tardes. “Eu acordei você?”

“Não.” Bocejo discretamente, puxando o lençol para cobrir a parte inferior do meu rosto. “Por que ainda está acordado?”

Ouço-o suspirar profundamente, “Cosmologia. Um manuscrito de vinte e duas páginas”

Eu quase me sinto mal por ele, principalmente quando começa a estalar os dedos.

Observo que ainda digita deliberadamente em seu celular, e fico pensativa.

Não sei como não considerei isso antes, provavelmente porque a situação com as chaves tomou toda a minha concentração, mas estar aqui é uma chance e tanto.

O apartamento dele. Se eu decidisse contar a Teuchi que Sasuke vende fármacos, o primeiro local em que viria averiguar seria exatamente aqui, como ele mesmo me detalhou durante a manhã.

Eu não posso correr o risco de contar a Teuchi o que está acontecendo, e quando ele vir aqui, não encontrar nada. Preciso saber bem o que estou fazendo se quiser Sasuke fora daqui.

Sei que ser expulso por minha causa certamente desencadearia uma reação furiosa da parte dele, ainda mais após ter ficado por tão pouco tempo, mas preciso de uma garantia. Não importa que tenha me ajudado hoje, ele continua sendo quem é. Ameaçou a integridade dos meus amigos, está me manipulando a continuar em silêncio e como o próprio afirmou: está aqui para me vigiar.

Preciso que saia.

Sem qualquer sinal de hesitação, me sento. Minha movimentação parece chamar a atenção dele, e Sasuke me fita curiosamente.

“Posso usar o banheiro?”

“Sim. Já deve saber onde fica...”

“Sim, sei. Obrigada.”

Passo por ele em direção ao corredor. Estou tensa. É o apartamento em que minha amiga costumava morar e estive aqui dentro tantas vezes que perdi a conta, mas obviamente as circunstâncias não são mais as mesmas. Olho para trás, fiscalizando-o, e percebo que não está olhando para mim e sim distraído com o celular.

Paro diante da porta do banheiro, e sinto minha pulsação acelerar no momento em que o observo de novo, e Sasuke permanece com o olhar baixo.

É um loft simples, uma sala, uma cozinha, uma varanda, um banheiro e um quarto. Ele definitivamente está dormindo no quarto de Konan, e tão logo, suas coisas também estão lá. Só preciso entrar, revistar tudo rapidamente e sair. Usar no máximo cinco minutos, sem que ele precise se levantar de onde está para vir averiguar se desci pela descarga.

Meus olhos estão presos a ele quando abro a porta de seu quarto. Uma vez dentro, sinto vontade de desistir, mas ao invés disso uso a oportunidade para analisar a arrumação diferente que ele deu ao local. Konan costumava usar os móveis de uma forma bem pessoal, Sasuke, no entanto, se resume a uma pilha de caixas de papelão que ele sequer esvaziou ainda e uma cama de casal, com um colchão grosso e de aparência convidativa.

Ele com certeza dá valor ao próprio conforto, pois a cama é o único artigo luxuoso dentre sua mobília. O resto parece ter saído de um bazar de móveis usados.

As janelas estão abertas. As cortinas brancas de Konan permanecem lá, dançando com o vento frio da madrugada. Não liguei as luzes para não chamar a atenção dele, portanto tudo que ilumina o quarto é a luz da lua. O suficiente para que eu não me mova pelo local como uma cega.

A primeira coisa que alcanço é um grupo de três caixas ao lado da cama, felizmente estão abertas, então não preciso fazer nada além de erguer as abas para observar que não passa de um amontoado de roupas.

Eu me ajoelho, minha cabeça encostando ao chão quando observo embaixo de sua cama. Não consigo enxergar nada, então apenas uso o tato, esticando a mão para sentir o chão, e encontro outra caixa ali.

Alguns cadernos, dinheiro em espécie, um bong de vidro e enrolada em uma flanela, uma pistola. Isso me surpreende, eu a cubro com a flanela imediatamente e empurro a caixa de volta.

Os motivos que consigo imaginar para que tenha uma arma em casa são os piores possíveis, mas eu também gostaria de ter uma para defesa pessoal se ‘trabalhasse’ com o mesmo que ele.

Mas nada disso é da minha conta, eu preciso saber onde estão as pílulas. “Droga, Sasuke...”

Eu sei que nem tudo foi trazido de seu antigo local, por isso tantas caixas estão aqui, mas eu vi. Eu vi as pílulas em pequenas sacolinhas individuais. Só podem estar aqui em algum lugar.

Abro o guarda-roupa. Vazio.

As caixas no chão também têm roupas, alguns porta-retratos vazios embrulhados em jornais e só.

A única caixa que resta está sobre a cama, e acho estranho que existe uma porção de furos em todos os lados. Aproximo-me dela, puxando a primeira aba e ficando sobre a ponta dos pés para espiar dentro.

Caio sentada sobre a cama com o choque, e um pouco de pó de serra escapa pelos buraquinhos. Tem um rato dentro da caixa. Um rato grande, peludo e... branco?

Ratos me deixam arrepiada, então eu fico paralisada por alguns segundos até ter coragem de levantar. A arma, o rato e a decepção de não ter encontrado coisa alguma são mais do que o suficiente para mim, então eu dou passos curtos até a porta, abrindo-a de forma melindrosa.

Observo os dois lados do corredor e meu coração volta a bater normalmente quando noto que Sasuke continua concentrado em seu próprio celular.

Tento parecer normal ao caminhar de volta a sala. Acomodo-me sobre o sofá, colocando o lençol sobre meu colo, e Sasuke me fita de forma escrupulosa.

“Gostou do meu quarto?”

Ele parece achar graça do meu suspiro plangente, e eu me remexo sobre o assento, tentando ganhar tempo.

Antes que eu pudesse responder, ele deixa o celular de lado e cruza as duas mãos sobre a barriga, devotando sua completa atenção a mim. Oh, isso é ruim. “Se quisesse entrar no meu quarto, tudo que precisava fazer é pedir”

Com certeza isso não passa de conversa fiada. Arqueio uma de minhas sobrancelhas, e ele continua: “Foi tudo fingimento? Isso de estar trancada fora de casa, se eu for até a sua porta agora, ela vai estar aberta?”

Eu gostaria muito que fosse, ele não faz ideia. “Não. Pode ir, vai estar trancada”

“Você estava procurando pelas pílulas, querida?”

A súbita mudança de assunto me surpreende, eu não sei se devo negar e dizer que de fato fui ao banheiro, ou mentir. Mas que raios de mentira eu devo contar para justificar o que estava procurando em seu quarto?

Nenhuma boa o bastante para que acreditasse, sem dúvidas. Não com o sorriso inescrupuloso que está me lançando agora, como se ansiasse pela mentira que viria a seguir.

Eu abro a boca para responder, e Sasuke já ri como se eu houvesse dito algo engraçado. “Infelizmente se você quiser alguma coisa, vai ter que pagar”

Escandalizada, eu o observo com uma careta. “Eu não quero nada!”

Sasuke me observa com falsa compaixão, franzindo os lábios teatralmente.

“Sasuke, eu não quero nada!”

“Se você soubesse quantas vezes eu ouço isso em uma semana...”

Eu suspiro, porque negar parece completamente inútil.

Mas por um lado, é bom que acredite nisso. Se Sasuke quiser que eu seja uma cliente/viciada em potencial ao invés da pessoa que está se preparando para sabotá-lo, eu vou ser.

Então fico calada, exalando um ar de derrota realístico o suficiente para que o faça rir. “Eu não imaginava que você. Logo você ia ficar curiosa”

Não sei ainda como devo reagir a isso, mas o tom na voz dele me diz claramente que devo ficar ofendida.

“Ora, por quê?”

Sasuke levanta os ombros, “Você parece o tipo de pessoa que dá lição de moral em pessoas que usam drogas, e não o tipo que as escuta”

“Bem, você está errado”

Um pequeno sorriso surge em seus lábios, “Acho que não. Mas está curiosa, é um bom começo”

“É?”

Ele relaxa sua postura sobre o sofá e seu rosto fica sério. O assunto acabou de ficar interessante para ele, então é previsível que não exista mais uma razão para zombar de mim.

E perder uma cliente em potencial.

“Diversos motivos podem levar alguém a querer provar alguma coisa. Eu vendo para pessoas de todas as idades, raças, credos e idades. Todo tipo de gente que você pode imaginar. O velho ranzinza que olha feio para você por causa do seu cabelo? Ele provavelmente compra algumas gramas de carisoprodol comigo porque tem preguiça de ir ao médico. A mãe de família que leva aos filhos à igreja todos os domingos e adora fofocar sobre a vida dos outros? Ela também se encontra comigo duas vezes no mês para pegar o remédio e ficar chapada para suportar a convivência com o marido...” Tudo isso é bem específico. Ele narra os fatos com tanta casualidade que eu presto atenção no que está falando, pois é surpreendentemente interessante. “O que eu estou tentando dizer é que você não precisa se sentir mal por querer relaxar, todo mundo quer. E existem meios para isso, e eu posso ajudar”

Eu dou uma risada, “Oh, Sasuke, você é tão prestativo!” Eu o observo com falsa adoração, e ele estreita os olhos perante meu comportamento. “Nossa, uau, obrigada de verdade. Você é bom nisso, não parece que está tentando fazer mais uma cliente e lucrar em cima do vício de mais alguém como faz com outras pessoas, destruindo vidas.”

“Eu não destruo a vida de ninguém. Se eu não fornecer, outra pessoa vai, é assim que funciona.”

“Você fala isso com tanta calma que me dá nojo...”

“Dizer que eu destruo vidas é como dizer que colheres engordam pessoas.” De alguma forma, isso é engraçado para ele. “Eu ajudo pessoas, Sakura. Queira você ou não continuam sendo remédios.”

“Você também percebe o malabarismo que está fazendo para parecer menos horrível do que é?”

“Eu estou mostrando a você que está errada”

“Isso é totalmente subjetivo”

“Nós enxergamos o mundo de formas muito diferentes, algum dia você vai perceber que não faz a menor diferença”

“Eu acho que não” Nego com convicção, percebendo que a discussão não o atinge nem perto de como me atinge, como se ele estivesse dormente e já houvesse escutado o mesmo discurso dezenas de vezes. Eu não duvido que sim. “Você devia se sentir mal”

Sasuke não me responde imediatamente.

Aliás, ele está tão pensativo que eu não acho que serei respondida. Por um breve momento acredito que está meditando sobre o que eu disse, mas quando seus lábios se curvam em um sorriso nostálgico – e surpreendentemente puro, como uma expressão que nunca vi em seu rosto – eu o observo com atenção.

“Você não tem a mínima ideia do quanto eu gostaria que o meu maior problema agora fosse a minha própria consciência.” Seu sorriso desvanece, “Eu vou me formar em breve e não sei se o meu irmão vai poder estar lá. Então você vai ter que entender se a minha prioridade agora não seja dar uma foda para pessoas que claramente não estão nem aí para suas vidas. Eu tenho problemas piores.” Sasuke me fita com um aspecto severo nos olhos, e eu me encolho porque de uma hora para outra o assunto é um tema frágil demais para que eu consiga lidar normalmente. “Você entende?”

Seu tom é cortante, e eu o fito com pesar. Não é preciso ser um gênio para saber que ele não dá a mínima para isso, se eu entendo ou não suas prioridades; tudo que quer é me mostrar a ferida que eu mesma cutuquei.

Não que eu tivesse planos de levar a discussão até seu irmão em estado terminal, eu jamais faria isso. Mesmo com todos os motivos que tenho para sentir rancor dele, eu sei separar as coisas.

Foi ele mesmo que trouxe esse assunto à tona, não eu.

“Sim.” Suspiro, observando-o se levantar do sofá e recolher todas aquelas folhas e o celular. “Sinto muito─”

“Tente dormir. Boa noite”

Então ele parte, e eu durmo após repensar quinhentas vezes o que acabou de acontecer.

Eu devia apenas ter comprado alguma coisa e ficado calada.

 

 

No dia seguinte, eu sou a primeira a acordar.

O relógio na cozinha de Sasuke acusa que são quase dez horas da manhã, e meu coração pula por um momento antes que eu recorde que provavelmente não irei para a faculdade hoje porque não posso entrar em casa.

Por isso não há nenhuma movimentação vindo do quarto dele. Ao contrário de mim, Sasuke certamente já foi embora.

Não me sinto confortável em andar pela casa dele sozinha, depois do fim que nossa ‘amigável’ discussão teve, eu deveria ir embora o mais rápido que pudesse – e ainda tenho planos de fazer isso – mas não tenho muitas opções agora.

Caminho silenciosamente até o banheiro para lavar o rosto. Eu gostaria de tomar um banho, mas não me sentiria bem em fazer isso sem a permissão dele, então eu vou embora. Mais do que nunca ansiosa para resolver o meu problema.

Uma hora depois, e estou parada ao lado de um homem agachado diante da minha porta. Eu não sei como tive a coragem de sair de casa com os pés descalços, um short curto demais e a camisa da minha faculdade em direção a casa de um chaveiro que morava dois quarteirões depois do meu, mas acho que as situações de adversidades dão forças às pessoas.

Pessoas fazem coisas que não somos capazes quando estão com problemas, e foi o que aconteceu comigo. Fui ousada o bastante para conversar com Teuchi no jardim e fingir que não percebi todos os seus olhares feios para mim por causa da história do incêndio, mas foi ele que me passou o endereço do cara, e eu, com a cara e a coragem, fui até lá.

“Não vai ser preciso tirar a fechadura completa,” Ele tira os óculos do rosto, e quando me observa, o tamanho dos seus olhos é pelo menos dez vezes menor do que o que vi por trás das lentes. “Mas obviamente vou precisar trocar o miolo, e você precisa comprar um”

Meu sangue começa a ferver. Tudo bem ir até os próximos dois quarteirões com o que estou vestindo, mas ir mais longe é outra história. Não tenho coragem.

Então nós discutimos, pois ele é um chaveiro e devia ter os próprios miolos ao invés de me incomodar dessa forma.

Por fim, ele confessou que tinha um miolo em sua caixa de ferramentas, e usamos o dele. Obviamente precisei pagar um pouco mais, porém, todo o meu dinheiro estava dentro de casa e esse foi, mais do que nunca, o estímulo dele para solucionar o meu problema.

Quando eu o pago, ele me entrega um par de chaves douradas e vai embora. Eu inalo o ar dentro da minha casa, aliviada por estar aqui, pois senti como se houvesse sido uma eternidade.

Faço a estreia da chave, trancando a porta pela primeira vez após a troca e procedo a fazer as coisas que ansiava por fazer. Primeiramente esquento uma lasanha de microondas e a como inteira, porque fazem mais de dez horas que comi algo pela última vez.

Em seguida, um banho frio que custa mais do que meia hora, porque eu paro embaixo do chuveiro como uma idiota e lá fico por alguns momentos, repensando tudo que aconteceu comigo nos últimos dias.

Eu estou solteira. Quem diria...

Após o banho, eu simplesmente caio na cama e não custa nada até que eu apague outra vez.

Ironicamente, sonhei com o rato. Aquele rato imenso e branco, vivo – estava se movendo – e peludo. As perguntas são o porquê de Sasuke ter um rato e o motivo de eu ter sonhado com isso.

Não acordei por livre vontade, foi o som da campainha por vezes seguidas que me tirou o sono. Tão insistentemente que, enquanto caminhava em direção a porta, eu pensei ser Sasuke.

Mas não. Quando observo através do olho-mágico, é Suigetsu que vejo do outro lado. Imediatamente destranco a porta e a abro para recebê-lo, mas ao invés do sorriso e brincadeiras que usualmente faz, em seu rosto há uma expressão de angústia.

 “Sui!”

Ele empurra a porta e passa para dentro, “Onde está o seu celular? Eu te liguei mil vezes...”

“Está quebrado, você sabe disso”

Suigetsu caminha de um lado a outro, acertando a palma da mão contra sua testa continuadamente, “Eu esqueci...” Resmunga sob sua respiração acelerada, e eu começo a ficar preocupada. Sem dúvidas alguma coisa grave aconteceu.

“O que houve?” Seus olhos claros me fitam, aflitos. E eu começo a ficar nervosa por causa de todo esse suspense. “Suigetsu, o que aconteceu?”

“Tinham policiais na faculdade hoje, Sakura...” O fôlego fica preso em minha garganta, e eu sinto um comichão em meu estômago. De repente eu não tenho ideia do que pode ter acontecido mas tenho um bom palpite ao mesmo tempo, e ele confirma minhas suspeitas, “A Ino foi embora com eles.”

Engulo um nó na garganta, mas não tarda até que outro se forme em seu lugar.

Eu não sei o que falar, ou como reagir. “Ela foi... presa?” Eu tenho medo de minha própria pergunta, medo de que ele confirme a resposta.

“Não,” eu solto o fôlego preso. “Não, foi levada para depor. Como nós dois conversamos sobre na praia, como eu disse a você que aconteceria...”

Com as mãos na cintura, eu reflito sobre o cenário atual e o que posso fazer. Ou mesmo se o melhor é fazer algo. Nós conversamos, de fato, sobre isso. Apesar de um depoimento ser o menor dos males, não significa que é um bom sinal. Muito pelo contrário.

“Ela é considerada suspeita.” Afirmo, e Suigetsu anui freneticamente. “Isso é ruim. Isso é muito ruim”

Eu tenho medo de olhar nos olhos dele, pois sei exatamente o que quer que eu faça. Eu sei o que veio fazer aqui e quais são suas expectativas sobre mim. Ele quer que eu tome uma atitude.

“Sakura, eu sei que você não quer se envolver nisso. Eu sei que não é fácil, ok? Mas eles oferecem um serviço de proteção à testemunha, você vai ficar segura.”

Estou completamente arrasada quando caminho em direção ao sofá e me sento, ainda pensando no que fazer.

Eu não tenho ideia de como reagir, qual é a melhor direção, ou se posso resolver isso sem por ninguém em risco.

O que Suigetsu não sabe é justamente a pior parte. Como estou sendo pressionada a me manter quieta em troca da segurança dele, dela e do meu ex. Querendo ou não eu ainda me importo com ele e quero vê-lo seguro, eu me culparia para sempre se algo acontecesse com eles. Por isso preciso ficar calada.

Mas isso magoaria o Suigetsu, pois eu o prometi que no momento em que a situação se tornasse perigosa para Ino, eu iria interferir sem pensar duas vezes.

Mas estou pensando duas, três, quatro. Centenas de vezes. Não posso simplesmente chutar o pau da barraca e decidir que Suigetsu deve ser responsável por tentar fazer a coisa certa, eu sei que algo de mau vai acontecer não só a ele caso eu decida falar, por isso, essa situação é absolutamente sufocante para mim.

“Eu tenho certeza que com a sua ajuda eles vão chegar aos culpados! Quando todos forem para a cadeia você vai voltar a ficar segura”

“Não é tão simples”

“Sakura você me prometeu!” Ele grita, mas eu não posso deixar que seu comportamento emocionalmente descontrolado me afete de forma alguma. Alguém aqui precisa manter a calma. “Você me prometeu que se alguma coisa ruim acontecesse com a Ino você iria até lá falar. E aconteceu. Chegou a hora. Não é o momento de ficar com medo, porque eu vou estar lá com você o tempo inteiro. E depois também, eu sou seu amigo. Você não está sozinha─”

“Primeiro,” eu o interrompo. “Você precisa ficar calmo. Não vai adiantar nada a agitação. Em um momento como esses é preciso pensar com calma. A Ino depôs anteriormente por livre e espontânea vontade, ela demonstrou obediência e a história dela vai bater com os fatos, porque ela tem um álibi. Você sabe que sim. O namorado dela estava com ela naquela noite, e no momento em que contar isso aos policiais, ele vai ser o próximo a ser chamado. Não precisa entrar em pânico.”

“Sakura...”

“Você está exigindo uma atitude de mim e eu compreendo, mas não está pensando direito.” Eu me levanto e dou alguns passos na direção dele, pousando minhas duas mãos sobre seus ombros. “Por favor, respire.” Ele me obedece, e seus ombros se erguem com um suspiro tenso. “Tudo está sob controle. Nós ainda temos o namorado.”

“Mas e se ela for presa preventivamente?”

“Ninguém vai prender a Ino sem provas. Não existem fortes indícios, apenas uma aluna que saiu do laboratório meia hora antes do horário para ver o namorado.”

A forma convicta como estou falando parece ser o bastante para acalmá-lo, e ele suspira pesadamente outra vez. “O que vamos fazer?”

“Por enquanto nada, eu não vou agir até que seja extremamente preciso e você entende o porquê, não é?”

Ele parece contrariado quando balança a cabeça positivamente, e eu sorrio, abraçando-o para uma espécie de conforto mútuo. “Por favor, vamos até lá buscá-la juntos, ela precisa de nós.”

Isso eu posso fazer. “Claro,” respondo. “apenas me deixe trocar de roupa”

Eu me afasto de Suigetsu tentando engolir o meu próprio nervosismo. Não posso demonstrar nenhum sinal de fraqueza, além de tudo, eu preciso ser a rocha dele, e eventualmente dela, mas tudo isso é muito difícil para mim. Não posso prever o desenrolar dos acontecimentos e temo que existam circunstâncias cabíveis na qual o álibi do namorado não seja o suficiente e eu precise tomar atitudes extremas.

Mas não quero pensar sobre isso agora.

Caminho em direção ao meu quarto, com ele atrás de mim. Suigetsu se joga em minha cama e observa através das cortinas enquanto procuro uma roupa adequada, um “look delegacia”.

Eu não sinto mais vergonha de me trocar na frente dele, porque Suigetsu me vê de biquíni quase todos os fins de semana e a essa altura já se tornou algo normal entre nós. Uma calcinha e um sutiã não é muito diferente de um biquíni, e tendo isso em mente, eu me dispo, esquecendo por um momento que as manchas da luta corporal contra Juugo ainda estão sarando e ele não pode vê-las.

Então me apresso e agarro a primeira peça um pouco mais composta que encontro, que acaba por ser um vestido chemise de mangas compridas.

“Por que você não foi hoje?” Seu tom é claramente mais calmo quando me questiona, e eu me sinto aliviada que a racionalidade voltou a falar mais alto dentro da cabeça dele.

“Eu fiquei trancada fora de casa, acredita?”

Ele gargalha, colocando a mão sobre a barriga. Quando me olha, incrédulo, eu ainda estou abotoando os últimos botões. “Fala sério!”

“É verdade. Hoje de manhã um chaveiro resolveu o problema, mas realmente aconteceu”

“E onde você dormiu?”

“Bem...” Me viro, sentando sobre a beira do colchão para calçar minhas sapatilhas. O que eu deveria responder a isso? Contar de vez sobre o novo inquilino? Ele reagiria tão bem quanto Ino ou me encheria de perguntas? “O novo inquilino foi gentil o suficiente para me deixar dormir lá.”

“Você conseguiu? Sério?”

“Sim, ele se mudou há uma semana.”

“Uau... Que bom. É um homem?” Ele arqueia as sobrancelhas.

“Sim, eu mudei de ideia.” Preciso soar convincente, porque Suigetsu é mais esperto do que Ino, e eu não posso contar com a mesma cabeça cheia de vento dela aqui. Ele não é assim. “Na verdade eu o conhecia de vista há algum tempo, e a oportunidade apareceu, ele me pediu com jeitinho e eu disse sim.”

“Quem é?”

Eu me levanto, ficando de pé. “Preciso perguntar uma coisa.” Mudo de assunto casualmente, sem demonstrar nenhuma mudança de comportamento ou ansiedade.

“O que?”

“As festas da sua fraternidade... são legais?”

“Oh,” sua expressão acende, e ele parece deixar o assunto antigo para trás. “Sim, são. Bastante. Por quê?”

“Eu só estava curiosa.” Levanto os ombros, fechando a porta do guarda-roupa e fazendo meu caminho em direção às cortinas para fechá-las. Este também é um assunto que eu queria discutir com ele, e o momento é mais do que propício. “Dizem que a Kirigakure dá as melhores festas do campus...”

Nós dois sabemos que isso não é verdade, mas estou apenas jogando verde para que ele traga o nome que desejo ouvir sem que eu precise demonstrar muito interesse.

Tenho certeza que ele reagiria da mesma forma que Konan se eu o contasse que planejo ir a uma delas o mais rapidamente possível.

“As mais chiques, sem dúvidas. Acaba sendo sem graça. Mas as melhores festas de verdade são da Akatsuki e você sabe disso.”

Dou uma risadinha, “Verdade...”

Ele suspira, ficando em pé e se preparando para irmos embora. Provavelmente pensa que o assunto morreu, mas não se depender de mim.

“Você já foi para alguma?” Questiono.

Ele dá uma risada nostálgica, “Sim, escondido. Fiquei lá até cinco horas da manhã e depois fui embora junto com uns caras de Otogakure, sério, eu entrei no furgão do cara sem sequer conhecê-lo, se ele quisesse me jogar em uma banheira de gelo e levar os meus rins ele podia ter feito e eu não ia sentir nada, estava chapado”

Acho a história engraçada, e empurro meu cotovelo contra o braço dele enquanto caminhamos em direção a saída. “Por que escondido?” Pergunto ao fechar a porta e trancá-la com as chaves novas.

“Oh, minha Kirigakure tem uma rixa com a Akatsuki, os membros não se dão muito bem... Acho isso uma grande besteira, mas existem motivos”

“Que motivos?”

“Eu não sei se você ouviu falar dessa história, mas um cara da Kappa Akatsuki morreu durante um trote que foi longe demais há três anos. Ele se chamava Genma Shiranui, e despencou do prédio do laboratório de Informática numa noite de sexta-feira, no início do ano letivo...”

Isso me deixa perplexa, pois lembro vagamente de ter ouvido algumas histórias quando eu era apenas um caloura, inclusive diversas campanhas de iniciativa estudantil contra a realização de trotes, mas nunca dei atenção a tudo isso. Era o tipo de coisa que não me importava, pois nunca fui membro de uma irmandade.

“Então a morte dele acendeu vários debates sobre o limite dos trotes, ou mesmo se eles deveriam ser permitidos. Muitas pessoas ficaram com medo do que podia acontecer, e com razão. Então a minha fraternidade tomou a iniciativa de propor um acordo escrito para dar um fim definitivo a todos os trotes, para sempre. Todas as outras irmandades assinaram, menos eles. Os caras da Akatsuki não aceitaram, até ai nenhuma surpresa.”

Estou totalmente instigada pela história, “O que aconteceu?” Pergunto, enquanto descemos as escadas.

“Como eles se recusaram, o acordo perdeu força. Não existe nada escrito hoje em dia, mas como a morte aconteceu lá, eles sofreram muitas pressões populares a mudar, e prometeram que pegariam mais leve com os trotes, que não seria nada além de um passeio pelas instalações da faculdade, mas os boatos são que ainda existem trotes noturnos. Não tão pesados quanto antigamente, mas ainda existem”

Eu fico um pouco assustada, e ao mesmo tempo compreendo o espanto de Konan com a minha menção aos nomes dos membros. Com certeza ela também sabia muito mais dessa história do que eu sei e quer prevenir que eu me relacione com essas pessoas.

“Ninguém foi preso?”

“Houveram algumas testemunhas. Seis, na verdade. Que estavam no teto com ele.” Suigetsu me lança um olhar um tanto sombrio, e eu engulo. “Depoimentos foram colhidos, e todos contaram a mesma história. Foi um acidente. Genma estava sob influência de sabe-se lá o que, e caiu acidentalmente... Isso de acordo com as testemunhas, foi a versão que todos acreditam até hoje.”

A forma como está falando entrega sua incredulidade, e eu o observo assombrada, pois as possibilidades brotam em minha mente, e são inúmeras.

Tudo que posso fazer é conspirar, eu não tenho a menor ideia do que aconteceu.

“Você acredita nisso?”

Ele dá uma risada sem graça, “Eu acredito no que meus olhos vêem. Não tenho opinião sobre isso, e não faz diferença, o caso foi encerrado há muito tempo. Se as respostas dadas foram o bastante para convencer a família, quem sou eu para duvidar?”

Quando chegamos ao lobby, eu estou absolutamente assustada com o que acabei de ouvir. Demonstro naturalidade, na medida do possível, mas tenho certeza que isso não vai sair da minha cabeça e sem dúvidas perguntarei mais à Konan sobre o assunto quando conversamos na próxima vez.

“E as festas?”

“O que tem elas?” Ele me observa distraidamente, recolhendo as chaves de seu carro nos bolsos.

“Eu gostaria de ir para uma... Sabe, uma vez. Só para dizer que fui. Desde que cheguei aqui não fui a muitas festas, e um universitário deve aproveitá-las, não é?”

Suigetsu me analisa por alguns segundos, e tento parecer inofensiva. Não posso demonstrar minhas verdadeiras intenções a ele, pois conheço seu grande instinto de proteção.

“Tem razão. Bem, se quiser ir, me chame. Obviamente você não pode ir com o seu namorado sem que todos saibam que o professor Deidara namora uma aluna,” ele dá uma risada “Então me chame, vou tentar entrar escondido novamente. Vale a aventura, para mim, não para você. Não vá sozinha.”

“Por que não?”

Ele dá de ombros casualmente, “Ah, você sabe... Se quiser beber, alguém tem que cuidar de você.”

“Entendi.” Anuo. “Como posso ser convidada?”

Meu comentário parece agraciá-lo. “Você é mulher e bonita, não precisa de convite, basta comparecer. Dificilmente alguém vai mandar você ir embora”

“Hum...”

Isso foi mais fácil do que eu achei que seria. Se ele estiver certo literalmente tudo que preciso fazer é ir, sem arbitrariedades.

“Hoje é sexta, vai haver alguma festa lá hoje? Você sabe?” Arrisco.

O carro dele está estacionado lá fora, e nós passamos pelo jardim em direção ao meio-fio. O céu está escurecendo, provavelmente são mais de cinco horas, e eu me pergunto se teremos que esperar muito tempo na delegacia.

“Não.” A forma ríspida como responde me faz acreditar, ao menos por um momento, que está respondendo assim apenas para que eu não tente ir sozinha, e isso me chateia. “Não hoje. Amanhã a Kappa Akatsuki completa sessenta anos de sua fundação e de acordo com o que estão dizendo, o filho do fundador vai estar lá com eles.”

Filho do fundador. Sessenta anos de existência. Isso é muita coisa.

Estou surpresa que existam membros horários de fraternidades, com certeza são símbolos e respeitados entre os membros atuais, e representam conexões importantes no mercado de trabalho. Na fraternidade de Suigetsu, essas conexões são realmente comuns.

“Quem é?”

“Não sei, só que o cara é um banqueiro, cheio da grana. Como todos os honoríficos geralmente são” Ele caminha ao redor do carro para abrir a porta do motorista, e eu espero que destrave as portas.

No entanto, uma moto bem familiar vira a esquina e estaciona, bruscamente demais, na frente do carro de Suigetsu.

Eu suspiro, pois sei exatamente de quem se trata, e começo a pensar em uma boa desculpa para dar, caso pergunte.

Sasuke sequer desliga a moto, ele apenas salta para fora dela e caminha em minha direção de forma apressada, como se...

Como se estivesse procurando por mim, e imediatamente percebo o que está acontecendo.

Ele estava na faculdade, ou seja, também está ciente que a polícia esteve lá.

Engulo em seco, pois de repente as intenções dele são mais do que óbvias e eu não tenho ideia do quão mal ele vai reagir ao que aconteceu. Se eu pudesse ter um arbítrio em tudo isso, escolheria que continuasse lá, ou que sequer houvesse visto as viaturas.

Mas um arbítrio é a última coisa que tenho.

Seus olhos escuros e estreitos observam Suigetsu, e quando ele me fita, com a parte inferior do rosto ainda coberta pelo capacete vermelho, eu sei exatamente o que me espera.

Suigetsu destranca o carro e entra, mas eu permaneço em pé. Estou congelada.

Sasuke para diante de mim e tira o capacete, seus cabelos escuros emoldurando o rosto branco e contorcido em uma feição de aborrecimento. Ele não parece nada contente com o que está vendo e tenho certeza de que está com o humor péssimo.

Principalmente comigo, principalmente com a situação desconfortável que fomos dormir ontem.

“Sakura?” Suigetsu me chama, e as íris escuras observam atentamente o interior do carro antes de voltarem-se a mim.

“Onde pensa que está indo?” Sua voz soa sob o ronco do motor da moto, e eu suspiro.

Alguns segundos antes e nós teríamos saído despercebidos.

 

 


Notas Finais


Gente, vejo vocês no próximo.
Até lá!


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