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História Quid Pro Quo - Noctal


Escrita por: cryomancer

Notas do Autor


Olá pessoal.
Quero agradecer muito pelo feedback e favoritos, tipo, de verdade. Obrigada.
Esse capítulo estava quase pronto e eu resolvi terminar e postar logo, espero que gostem. Para quem acompanha Ekusas, vai ser atualizada logo.

Boa leitura.

Capítulo 6 - Noctal


Parte 5          

 

Fazendo seu caminho ao redor das minhas pernas esticadas, Suigetsu se senta sobre a espreguiçadeira e me entrega uma das latinhas em sua mão. Ele solta um longo gemido aliviado ao se deitar, e eu não consigo conter uma risada ao ver o bigode de espuma acima de seus lábios.

“Eu achei que fosse funcionar...” Ele passa a língua pelo buço, “Não estou desapontado.”

“O que está falando?” Questiono, puxando o lacre da lata sonoramente.

Ele me observa atentamente sob a aba da viseira “Você anda séria ultimamente, parece preocupada o tempo inteiro,” suspiro, voltando a atenção a Ino, que está fritando sob o sol, deitada em uma boia rosa no meio da piscina. “devo me preocupar, Sakura?”

Suspiro, colocando a latinha no chão.

Os fins de semana na praia deviam ser um oásis, algo que me tranquilizaria das semanas caóticas na faculdade, e funcionou por muito tempo.

Mas agora não mais, os assuntos de casa me perseguiram até aqui. Algumas horas antes, eu vi um homem loiro fazendo caminhada no calçadão e pisquei algumas vezes, pensando ter visto Naruto.

Sasuke sabia até mesmo que minha primeira tentativa de visitar Gaara foi falha, obviamente eles me seguiram sem que eu percebesse, então não me surpreenderia se estivessem aqui. Eu só não quero me tornar paranóica e viver em função disso.

“Sakura!” Ele chama minha atenção, e eu o observo. Está sentado na espreguiçadeira, os cotovelos sobre os joelhos enquanto me fita intentamente.  “Depois disso...” ele aponta para mim, “o que quer que isso seja, não vou aceitar uma resposta negativa.”

Seus olhos claros estão cheios de coragem, ele está me estimulando a cuspir toda a verdade para fora, mas estou com medo de colocá-lo em risco caso eu o faça. Nunca me vi diante desta situação cinemática, tampouco imagino o Sui como Sherlock Holmes, me dizendo ‘Isso seria tremendamente ambicioso da sua parte’ após eu o informar que poderia contá-lo, mas então, claro, teria que matá-lo.

Ou mesmo algo tão medíocre como: “não o falarei prezando por sua segurança”, mas é exatamente o que está acontecendo.

 Suigetsu é inconsequente, intuitivo, ele pensa antes de agir, mas muito pouco – não o bastante. Eu o conheci primeiro; três anos atrás, minhas amigas eram duas moças da mesma turma que eu, e elas sequer pareciam se lembrar de mim. O único objetivo em suas cabeças eram ser recrutadas para se juntar às Valkirias, uma outra sociedade secreta da faculdade, para variar.

Eu ainda tinha o espírito de uma caloura querendo me entrosar na época, então tomei este como o meu norte também, e me humilhei junto a elas, entrando em festas que não fui convidada, forçando simpatia por pessoas que eu claramente não queria conversar, para no final ouvir que: se você tem que pedir, não é boa o bastante para entrar.

Nenhuma de nós pediu com palavras, mas estava óbvio com nossas incansáveis investidas, só que um dia conseguimos. Uma pequena carta dentro de nossas mochilas, e o mundo parecia cor de rosa.

Mas não foi nada disso, testes de iniciação esperavam por nós – incluindo roubar coisas das fraternidades masculinas, e foi quando eu coloquei um ponto final em tudo isso. Jamais me submeteria a tais atividades. Elas tinham desafetos com as fraternidades masculinas que fugiam da minha compreensão, e eu não entendia o porquê disso.

Foi quando eu conheci Suigetsu, em um clube noturno, enquanto eu marchava para o lado de fora, meio bêbada e com raiva de Guren e Matsuri por dizerem na minha cara que continuariam com aquela vexação. Eu tropecei no litro de cerveja que ele deixou no chão e tenho certeza que os sapatos de todo mundo ao redor ficaram com aquele cheiro para sempre. Ofereci-me para pagar, nós fomos para o bar, conversamos, eu descobri que ele tinha uma namorada – na época, Konan. Conhecemos-nos por intermédio dele, e eu conheci Ino por intermédio de Konan – e nos tornamos amigos. Nós quatro.

Depois disso, muita coisa aconteceu. Konan e eu nos identificamos mais; ela também não dava a mínima para o sistema grego, e estava procurando imóveis baratos para alugar. Quando os dois romperam, foi uma época em que me afastei um pouco de Suigetsu em detrimento dela, mas eu sempre tive um laço mais forte de confiança nele, como tenho nela em comparação à Ino.

Mas ela está longe, eu não posso contar com ela. Se eu o revelasse tudo, não duvido que procuraria Sasuke ou Naruto no dia seguinte para tirar satisfações, sem mesmo se importar com a própria segurança, e ele é alguém que eu não quero me dar o luxo de machucar, mesmo indiretamente.

“Oi, Sakura. Está me vendo aqui?”

Pisco algumas vezes, sorrindo para atenuar a balbúrdia em minha cabeça. “Eu não vou negar, algo aconteceu.”

A feição em seu rosto é uma mistura de alívio e subversão. Ao mesmo tempo em que se sente bem por eu não ter mentido, saber que algo ruim o bastante ao ponto de me deixar inquieta por dias está acontecendo o aflige.

“Desembucha,” ele pula para fora de seu assento e começa a empurrar meus quadris para o lado com os seus, e eu arranjo espaço para que se sente ao meu lado. “Eu sabia, eu sabia. Desde o dia em que a polícia esteve na faculdade. O que aconteceu?”

Talvez uma meia-verdade funcione. Talvez ele não precise saber da história toda.

“Sui, eu preciso que─”

“Foi você?” Ele me interrompe, seus olhos flutuam para os meus, os lábios apertados. “Se foi, você pode me falar. Nós podemos─”

“Não, caramba.” Estico o pescoço, observando a piscina para ver se Ino continua lá “Eu não fiz nada. Eu... eu vi.”

Ouço sua respiração entrecortar, e ele me observa assombrado. “Quem foi?”

As mentiras começam exatamente aqui.

“Não sei. Foram dois caras, eu não consegui ver direito, era noite, eu estava com medo e me escondendo. Aconteceu lá, naquelas escadas, exatamente onde o corpo foi encontrado. Eles literalmente espancaram o Gaara, eu fiquei tão...” à medida em que as memórias açoitam minha mente, as palavras me faltam. Sui continua me observando mesmerizado, tal como eu estivesse abrindo a Caixa de Pandora em sua frente. “Tão chocada que parava de ver às vezes, eu não conseguia, era muito violento.”

Ele comprime os lábios, um aspecto triste em seus olhos quando os desvia para longe dos meus, “Eu sinto muito que você precisou testemunhar algo assim.”

Não se parecia em nada com o cara que agiu de forma tão insensível antes, embora eu acredite que ele continue não dando a mínima para Gaara, e suas preocupações fossem apenas relacionadas a mim, “Como você está?” sua pergunta é uma confirmação e tanto.

Suigetsu lamenta mais o fato e a minha participação nele, do que a vítima.

“Eu estou bem, obrigada.”

“E o que aconteceu depois?”

“Bem, eles saíram por alguns minutos, e eu corri em direção a ele.”

Seus olhos se arregalam, “O Gaara ainda estava são?”

“O bastante para recusar minha ajuda e me pedir para não chamar a polícia.” Seu rosto, estampado em preocupação, se torna  confuso em segundos, mais precisamente após ouvir a última frase.

Suigetsu aperta o olho esquerdo, as sobrancelhas agora unidas. “Como é?”

Suspiro profundamente, fechando os olhos por alguns segundos, como se esse ato pudesse me proporcionar um pouco de alívio. “Sakura, como assim?” ele repete a pergunta, mas eu permaneço calada.

“É o que você ouviu” dou de ombros, procedendo a tomar alguns goles da minha bebida.

Suigetsu solta uma risada afetada, “Aquele maldito punk... Eu já sabia que ele era louco, mas você não pode possivelmente comprar esse pedido dele como algo sagrado só porque o cara está à beira da morte. Essas foram as palavras de uma pessoa que cansou de apanhar e estava agonizando, não existe raciocínio nisso, ele não estava pensando direito.”

Fico em silêncio, pois realmente é um bom ponto de vista. Gaara não se encontrava em um estado minimamente agradável quando o encontrei, e talvez eu esteja levando o pedido de alguém em um momento de baixa credibilidade à sério demais.

Sui permanece de boca aberta, a forma como ele parece ter esquecido a cerveja em suas mãos me leva a crer que a história realmente teve um grande impacto nele.

“Talvez você tenha razão...” Reflito.

“É claro que eu tenho razão!”

Lembro-me do momento exato em que eu sugeri a polícia e os olhos de Gaara ficaram imensos; sua reação a mera possibilidade de um envolvimento policial foi pior do que o próprio fato de estar sendo agredido, e isso diz muito sobre a situação.

Sasuke e Naruto entraram em minha vida a partir do dia seguinte pelo mesmo motivo, preocupação. Em um momento era um pátio vazio, e no outro, havia uma garota agachada ao lado de Gaara. Uma testemunha, alguém que eles não esperavam. A decaída de um plano aparentemente perfeito.

A mesma inconstância que eu estou sentindo. Em um momento Suigetsu parece ser um lampejo de razão na minha vida, no outro, apenas a opinião de alguém com um ponto de vista superficial e simplista, que não sabe metade das coisas que estou passando.

De alguém que não sabe que a própria estabilidade física está sendo usada como garantia do meu silêncio.

“Sakura, por favor me diga que você não foi estúpida o bastante para obedecer àquele cara e já procurou a polícia, porque se não, nós vamos embora agora e é exatamente o que vai fazer.”

Talvez contar para ele tenha sido a pior ideia que tive em meses.

“Não!” Esbravejo, “Eu já fiz isso, três dias atrás...” A expressão em seu rosto fica mais leve, e eu penso sobre como posso tranquilizá-lo e tirar a ideia nefasta de me levar até a polícia de sua mente. “Conversei com o delegado, contei tudo que sei, mas o escrivão não estava lá para redigir o meu depoimento, ou seja, eu não assinei nada. Não é prova cabível, por enquanto. Legalmente eu ainda não sou uma testemunha.”

Eu o ofereço a mesma mentira que contei ao meu namorado com a mesma apreensão para que funcione.

Estar ciente de que ambos foram educados com a mesma mentira não me deixaria apreensiva e com medo de que se encontrassem.

“Certo, então tudo que você precisa fazer é voltar para lá em outro momento, quando o escrivão estiver presente.”

“Sim.”

Ele parece aliviado. “É a coisa certa a fazer.”

Não consigo conter uma risada amarga, e por sorte ele parece não notar, já que seus olhos se desviaram até Ino. “Ela vai ficar aliviada por haver uma testemunha,” Sui me observa novamente “principalmente por ser você.”

Minhas sobrancelhas se enrugam juntas. “O que? Por quê?”

“Ino está nervosa com tudo isso, muito nervosa.”

Eu tenho motivos para ficar nervosa, Ino continua vivendo sua vida tranquilamente, não entendo a razão para isso, que eu saiba ela não era próxima de Gaara, ou mesmo sabia de sua existência até o acontecido.

“Ela não tem motivos para estar.”

Ele balança a cabeça e ri, “Você não sabe de tudo...”

Suspiro, meu corpo subitamente parece mais pesado e meus olhos se estreitam. Eu não posso lidar com mais problemas agora além dos meus. “O que eu não sei?”

A curiosidade é uma mácula.

Breves segundos de análises mútuas se seguem, Suigetsu suspira, incerto, e passa as mãos pelos cabelos descoloridos. “Droga, eu não sei se é certo falar isso... Ela disse que você ficaria zangada se soubesse, e me pediu segredo.”

Minha cabeça dá voltas enquanto especulo em silêncio o que pode ser. Aparentemente existem mais segredos entre nós três do que eu jamais poderia imaginar, não que seja algo ruim. Segredos estão em todo lugar, e eu acabei de compartilhar um com Suigetsu do qual ela não pode saber. Não é como se eu pudesse reclamar disso.

“Se você não quisesse me contar sequer traria o assunto à tona, em primeiro lugar.”

Ele ri, e verga o corpo para trás, apoiando-se às suas palmas. Observo sua barriga magra e a bermuda de tactel, tentando ignorar os pensamentos que me direcionaram diretamente a ele e Konan fazendo sexo. Não quero pensar nos meus dois melhores amigos transando, realmente não.

Sua risada interrompe minhas divagações, “Eu estou me sentindo uma criança, mas preciso perguntar... Você pode me prometer que não vai ficar com raiva?”

“Não. Não, eu não prometo nada.”

Ele umedece os lábios, “Desse jeito você só vai conseguir dificultar as coisas para mim.”

“Não é você que gosta de correr riscos?” Eu dou de ombros.

Sei que estou o colocando em uma situação difícil, mas a essa altura, eu realmente não posso prometer algo assim.

Contrariado, ele fica em pé e volta a se sentar em sua espreguiçadeira, ficando frente a frente comigo.

Ele observa Ino por cima do ombro, “Ino está conhecendo alguém...”

Isso me alegra. Uma boa notícia no meio de toda essa poça de merda na qual me encontro. “Quem é?”

A tensão parece emanar para fora de seus poros; ele suspira. “Um cara de Artes Liberais chamado Sai.”

Não tento recordar se conheço alguém com esse nome, ou mesmo se conheço alguém das turmas de Artes Liberais. Tantos anos de curso e mesmo assim todos os dias eu vejo alguém que não havia visto antes.

Eu certamente não o conheço ainda.

“E por que isso seria um problema, Suigetsu?”

Ele massageia as próprias têmporas e dá de ombros, “Você vem sendo a principal, como posso dizer, patrocinadora dos encontros deles.”

As informações se unem em minha cabeça como peças de um quebra-cabeça. Eu entendo o que ele quer dizer, mas peço para que disserte, e assim, exista uma remota chance de eu estar redondamente errada.

Eu espero estar. Eu quero estar.

“Sakura... o cara é quebrado. Eu não sei de toda a história, mas ele foi deserdado da família, não recebe um centavo dos pais, não consegue arranjar emprego por causa da faculdade e recebe um auxílio. Ele não pode pagar por encontros, viagens, motéis e esse tipo de coisa.”

É uma das raras vezes em que detesto estar certa.

Cerro os punhos, raiva percorrendo o meu sangue. Impetuosamente eu fico de pé, observando-a de longe a se bronzear, louca para derramar bronzeador em seus olhos e torcer para que ardam como o inferno.

Suigetsu segura o meu pulso e eu faço com que seja necessário que use um pouco de sua força para me conter, pois estou decidida a caminhar na direção dela e tirar satisfações, mas ele me mantém aqui como se sua vida dependesse disso, “Sakura, por favor.” E por consideração a ele, unicamente a ele, eu volto a me sentar.

Meu corpo está rígido como pedra, um nervo está latejando entre minhas sobrancelhas enquanto tomo longas porções de ar para tentar conter minhas próprias emoções. “Há quanto tempo isso vem acontecendo?” Questiono, cuidadosamente.

Ouço um grunhido frustrado, e logo em seguida as mãos de Suigetsu estão cobrindo o seu rosto. Ele parece sobrecarregado, mas eu não sinto um pingo de compaixão, pois me encontro da mesma forma. “As pesquisas experimentais continuam acontecendo, mas ela tem respondido a chamada e ido embora ao menos trinta minutos antes de todos largarem para vê-lo, ela tem mentido para você. Os dois têm se encontrado ao lado do refeitório, e então em seguida ele a leva para o quarto na fraternidade e o resto você já deve imaginar...”

“Meu Deus.”

Isso explica os atrasos constantes dela. Porque eu precisava sempre deixar recados, e ela nunca me atendia.

“Ela está o ajudando financeiramente. Ao menos uma grande parte de todo o dinheiro que recebeu da pesquisa foi dado a ele, e ela nem mesmo parece ter intenções de cobrá-lo.”

Sinceramente, se eu soubesse que vir para a praia no final de semana implicaria em ouvir isso, eu teria ficado em casa.

Há um aspecto triste em seus olhos, mas a maneira como suspira após desviar a atenção dos meus me mostra que está aliviado. Provavelmente estava sendo complicado para ele esconder de mim algo que me envolve diretamente, principalmente a como fui enganada.

Eu sinto raiva dele por não ter me contado a verdade e ao mesmo tempo admiro sua disposição a guardar segredos – mesmo que tenha cedido no fim.

Não estou apenas com raiva, estou triste também. Entendo que ela queira ajudar financeiramente alguém por quem sente afeição, mas há uma linha tênue entre esse tipo de ajuda financeira e exploração. É muito conveniente para ele ter alguém que o sustente cegamente, sem contestações.

Os olhos de Suigetsu encontram os meus, estampados com descontentamento mútuo. “Sinto muito,” ele diz.

“Obrigada por me deixar saber disso.” Eu coloco minha mão sobre seu pulso, forçando um sorriso amigável enquanto o afago.

Preciso deixá-lo tranquilo consigo mesmo, tenho plena consciência de que não é culpa dele, e se não fosse por sua atitude, eu continuaria sendo enganada.

“Sakura, você não pode surtar. Não pode fazer nada repentino demais, ou ela vai saber.”

Infelizmente esse é um pedido ao qual não poderei atender, principalmente porque algumas horas após Naruto e Sasuke irem embora, dias antes, ela ligou para mim e pediu que eu a levasse até a faculdade, e eu não me senti confortável para voltar lá durante a noite depois do que passei naquele lugar, então inventei uma história sobre Deidara ter deixado os documentos do carro em casa e neguei seu pedido, pela primeira vez.

Porra, é como se eu soubesse o que estava acontecendo antes mesmo de Suigetsu me contar.

Suspiro, “Isso eu realmente não posso prometer. Só não entendo o porquê do nervosismo sobre isso, fora, claro, a possibilidade de que eu descubra.”

“Porque todas as pessoas que estavam no laboratório na noite daquela quinta-feira sabem que ela saiu bons minutos antes, e no momento em que um policial decidir colher depoimentos deles, a Ino será a única pessoa a estar no campus aquela noite, mas que não estava na sala. Isso é tão ruim que ela certamente irá para o quadro de suspeitos e será chamada para depor no mesmo minuto.”

Isso me desestabiliza mais do que eu gostaria.

Uma risada miserável salta para fora da minha garganta, e eu preciso me concentrar muito para não começar a perder o controle agora. Apoio meus cotovelos aos joelhos e cubro meu rosto com as mãos.

As coisas nunca podem ser ‘ruins o bastante’, sempre há espaço para mais e mais desgraças, algo sempre tem que ficar pior.

Por isso ela se ofereceu para dar um depoimento informal a Ibiki, pois está com medo do que pode vir a acontecer. Eu não entendia isso antes mas entendo agora.

Eu prometi a mim mesma que só me envolveria caso Ino corresse perigo, e recebo a notícia de que é exatamente o que pode acontecer. Obviamente foi uma conclusão que cheguei quando ainda tinha o controle de minhas próprias decisões e não havia dois homens segurando coleiras ao redor do meu pescoço, mas a regra ainda se aplica mesmo agora.

É loucura achar que posso proteger três pessoas, mas eu não posso deixar Ino passar pelo transtorno de ser presa por algo que não fez, mesmo que evidências apontem para ela. Policiais querem fechar casos o mais rápido possível, e isso me assusta.

Minha cabeça está funcionando como uma pilha de engrenagens, eu poderia jurar que há fumaça saindo por meus ouvidos, tamanha é minha aflição.

Suspiro, deixando que o ar saia por minha boca quando uma pequena luz se acende no fim do túnel. “Mas ela teria o Sai como álibi, certo?”

Sui dá de ombros, minha pergunta parece tranquilizá-lo. “Sim, Sakura, mas exames podem constatar facilmente que não foi só uma pessoa a espancar o Gaara. Ele era um cara alto, forte, alguém como a Ino não podia lidar com ele sozinha e ainda fugir ilesa. Se o Sai for o único álibi, sim, pode funcionar, mas precisamos considerar todas as opções; a polícia pode tranquilamente suspeitar que ele foi a pessoa a ajudar Ino e o álibi não ser nada além de uma tentativa de protegê-los, eu posso estar enlouquecendo, mas nunca se sabe... Pessoas são presas injustamente o tempo inteiro.”

Ele está certo. “Mas alguém na fraternidade pode ter visto eles dois por lá, não é? Essa pessoa pode representar judicialmente, caso─”

“Por que você está conspirando tanto? Por que parece tão devota a achar meios para livrar Ino caso a situação amargue para ela ao invés de focar em como prevenir que isso sequer aconteça? Nós temos você. Você viu o que aconteceu, você é uma testemunha. Você viu que foram dois homens, a sua palavra basta para dar um molde às investigações, algo que eles não têm no momento.”

Eu temia que a discussão fosse chegar a este ponto. As cobranças. As perguntas óbvias que eu tanto odeio, mas não posso responder.

“Eu não posso fazer isso, Suigetsu.”

Ele me fita abismado, suas sobrancelhas se erguem aguardando por uma explicação, mas eu estou muito focada em articular uma maneira convincente de caminhar pelas beiradas com ele, em como falar a verdade sem ser toda a verdade.

“Por que não?” Isso parece irritá-lo, e sinto o arrependimento por ter o contado outra vez. Atordoado e insatisfeito, ele fica em pé;  esse é o ponto de partida para uma eminente discussão acalorada, e eu prefiro morrer agora à ter que brigar com ele. “Você não pode fazer isso, não pode colocar a Ino em risco assim!”

“Fala baixo!” Fico em pé também, pronta para fazer o que não quero até que ele esteja no mesmo barco do que eu e disposto a se manter calado.

Se ele soubesse...

Se ele tivesse uma mínima ideia de que eu estarei colocando Ino em risco não importa o caminho que eu decida tomar. De que eu estarei colocando ele próprio e o meu namorado em risco se tomar a decisão que, agora, me parece a errada.

E ele sequer pode saber disso.

“Vamos,” ele está sem camisa, então não posso puxá-lo por nada além do colar que está usando, e é o que faço. O levo em direção a um local menos ‘perigoso’ e distante dos ouvidos de Ino. Eu quero poder gritar com ele se for necessário.

“Porra, Sakura, isso dói” ele reclama, mas isso não faz a menor diferença para mim agora.

Eu paro ao lado de um dos coqueiros, e só o solto quando suas costas batem de encontro ao caule. Ele me observa com irritação.

“A Ino não está em risco. Ela está bem, e vai continuar bem. Ela tem um álibi, e eu vou assumir as rédeas da situação caso seja necessário, mas apenas aí. Nem antes, nem depois disso. Nada vai acontecer com ela, a Ino é frágil, nenhum policial vai considerá-la suspeita pela agressão de um cara com duas vezes o porte físico dela sem o uso de nenhum tipo de arma, então você precisa ficar calmo, ok? Nada vai acontecer.”

Sua feição ainda é agravada, eu pareço tê-lo convencido, mas não totalmente. Ele ainda está confuso sobre o porquê de ser tão importante que eu não me manifeste, que eu queira me manter longe das investigações.

“Eu só não consigo entender os seus motivos. Por que você está focada em como solucionar o problema ao invés de evitá-lo, em primeiro lugar?”

“Porque essa história está fedendo!” não consigo conter o tom da minha própria voz, e deus me ajude, eu não quero descontar nele toda a minha instabilidade emocional. “Você não percebe isso? Um cara que preferiu definhar no concreto frio da faculdade ao invés de ir comigo procurar um hospital, um cara que usou o último fôlego para me pedir que não fosse procurar a polícia! Eu fui perseguida, alguém correu atrás de mim, e eu não sei se estaria aqui com você agora se ele houvesse conseguido me alcançar, então você precisa entender que eu quero me proteger! Eu quero me manter o mais longe disso possível, eu não quero me expor, me envolver, me transformar no alvo de alguém porque dei com a língua nos dentes quando não era necessário!”

“Você está com medo?”

“Sim. Sim, é claro que eu estou com medo.”

Meu desabafo parece atingi-lo, mas vejo um pouco de  insatisfação em seus olhos. Ele ainda está contrariado, mas agora, ao menos parece disposto a ouvir e entende um mínimo do que estou sentindo. “E quando vai ser necessário, Sakura?” questiona, o tom baixo e surpreendentemente calmo, tendo em vista nosso recente desentendimento.

“Se a Ino ficar em perigo.” Arquejo, minhas feições desmoronando quando o ofereço um sorriso fraco. “Não vou deixar nada de mal acontecer com ela, ok? Eu prometo.”

Ele olha para longe de mim por um momento, mas logo em seguida me puxa para um abraço, e o aperto entre meus braços com força.

Fecho os olhos, sorrindo com certo alívio.

“Eu ainda não compreendo, mas... Vai ficar tudo bem, Sakura.”

“Obrigada por entender.”

“Obrigado por confiar em mim. Eu vou ajudar.
 

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Eu fiquei inconsolável por precisar voltar. Após um fim de semana incrível na praia, o que eu menos precisava era retornar para minha vida conturbada.

No entanto, estou aqui. Em pé diante da minha porta, procurando pelas chaves dentro de uma bolsa transversal enquanto sinto meus ombros latejarem pelo peso da mochila em minhas costas e minha pele irritada e quente pelo excesso de exposição solar.

Estou tentando fingir que minha vida continua a mesma e a porta atrás de mim continua sendo a entrada para um imóvel vazio, mesmo que não seja a realidade. Sasuke avisou que faria a mudança no final de semana, e foi por esse motivo que eu quis tão desesperadamente estar na praia. Não quero estar na companhia dele e tampouco assisti-lo acabar de uma vez com o que resta da minha liberdade e ainda precisar parecer normal.

Porém, não parece haver ninguém aqui, e isso me alivia. Olho para trás, vendo a porta fechada e desfrutando do silêncio do andar, antes de observar o fim do corredor, tudo muito pacífico; isso realmente me faz acreditar que, de certo, Sasuke não está em casa.

Isso é muito bom.

Volto a me concentrar na ausência da chave e fico de joelhos, deixando uma garrafa de água no chão juntamente com o meu celular. Minhas mãos investigam os compartimentos da bolsa, e eu jogo para fora dela embalagens vazias de pirulitos que eu estava comendo na viagem de volta e outros objetos aleatórios.

A conversa que tive com Sui não sai da minha cabeça, e tudo que posso pensar em fazer é procurar o novo caso de Ino nas redes sociais com as duas únicas informações que sei sobre ele: nome e instituição onde estuda. Provavelmente não terei muita sorte, mas posso sempre correr para o skype e pedir ajuda à Konan, que sempre teve um leque social muito maior que o meu.

Ela provavelmente o conhece, estou contando com isso.

Com a chave em mãos, destranco a porta. E é exatamente aí que ouço a repetição do mesmo ruído na tranca, e minha fantasia de Sasuke estar passando a tarde de domingo em qualquer outro lugar no mundo é destroçada em minha frente. Ele está aqui.

Sentir a sua presença atrás de mim, mas sem emitir uma só palavra faz com que meu corpo instintivamente fique em estado de alerta, e eu não perco tempo; piso adiante até estar dentro do meu apartamento, e quando me viro em direção à porta para fechá-la, é o momento em que o vejo.

Não sei o porquê de estar decepcionada com a feição em seu rosto, mas ele não me parece minimamente zangado com algo, como eu achei que estaria por minha ausência no fim de semana. 

Vagarosamente, ele pende a cabeça para o lado enquanto me analisa em silêncio, seus olhos escuros vagam pela minha figura, e o aspecto de escárnio em seu olhar é uma prova de que minhas roupas folgadas, meus ombros rosados e o lixo em minhas mãos o causam descontração, e isso só alimenta o sentimento de insegurança dentro de mim.

Seus lábios partem, e no momento em que sinto que está prestes a dizer alguma coisa, eu fecho a porta.

Percebo que estou rindo quando ouço o ruído da minha testa batendo contra a madeira. Fechar a porta na cara dele tem se tornado uma sensação surpreendentemente agradável, e é apenas a segunda vez que o faço.

Isso tem um efeito positivo no meu humor, e eu ainda estou rindo um pouco quando passo a alça da bolsa sobre minha cabeça, jogando-a no sofá e pronta para fazer o mesmo com o meu corpo em seguida, mas a porta do meu apartamento é subitamente aberta, e eu sinto minha própria pulsação acelerar em meus ouvidos.

Seus olhos serenos permanecem atentos a mim enquanto ele posiciona um de seus ombros contra a moldura da porta, cruzando os braços sobre o peito e apoiando parte de seu peso ali.

Permaneço parada onde estou, o assistindo em completo silêncio mesmo quando seus olhos se desvirtuam dos meus em direção ao interior do meu apartamento. Ele observa tudo; parece analisar cada móvel muito cuidadosamente, mas seu corpo não se move, ele permanece fincado ali como se fosse um vampiro esperando ser convidado para dentro.

“Oi, Sakura.” O seu tom de voz é perigosamente inofensivo. “Como foi o seu fim de semana?”

Meus ombros relaxam e eu sinto meus músculos ficarem menos tensos. Novamente, não posso demonstrar medo, mesmo que ele tenha deliberadamente aberto a porta da minha casa e permaneça parado ali, fingindo curiosidade sobre o meu final de semana quando tudo que deseja é uma mera introdução para o real motivo de sua atitude invasiva, o ponto central da discussão que ele insiste em caminhar ao redor.

Suspiro, deixando que meu corpo caia sobre o sofá. Liberto meus pés das sandálias, apoiando os calcanhares sobre a mesinha de centro. Ter minhas pernas esticadas quase me arranca um gemido de satisfação.

Eu finalmente me permito observá-lo totalmente. Tenho plena consciência de que a única coisa que Sasuke está vestindo agora são calças jeans; mesmo seus pés estão descalços, mas estive me censurando de analisar o seu porte físico e olhar para qualquer ponto abaixo de seu pescoço até agora.

Sasuke não é exageradamente forte. Ele não tem o físico de alguém que é devoto à academias, no entanto, as mangas compridas das jaquetas que usava regularmente não faziam justiça aos bíceps robustos; seus músculos abdominais também são definidos, e ele tem ombros largos.

Então, recordo o quão ínfima é a sua existência e recobro o controle da situação. Volto minha atenção até um ponto fixo na parede, e meu peito sobe com uma inspiração profunda, “Bom.” respondo, sem intenções em perguntá-lo de volta.

No entanto, ele não está esperando que eu o faça. “Legal...” dá de ombros. “O meu foi cansativo.”

“Não quero saber disso.”

Ele ignora minha insubordinação, “Boas anfitriãs também têm obrigações. Você pegou o dinheiro e deu o fora.”

Cheque,” o corrijo.

“O mínimo que podia fazer, Sakura, é avisar ao Teuchi que a relocação foi bem sucedida e me poupar do trabalho de explicá-lo que você parou com toda a frescura e finalmente entregou as chaves a alguém.”

90% do que faço é de propósito, ir embora ao fim de semana e deixar que se virasse sozinho certamente não foi uma parte da exceção.

Eu podia simplesmente fazer o possível para tornar a vida dele um inferno, como ele tornou a minha.

“Uma boa anfitriã teria me recebido aqui no sábado, me ajudado com a mudança. Porra, uma boa anfitriã teria assado uma torta para mim em comemoração à minha chegada.”

“Não há coisa alguma para comemorar em sua chegada.”

Isso arranca uma breve risada dele, “Adultos devem saber lidar com contratempos. Você acha que eu quero estar aqui?”

Decido não pensar sobre sentidos ocultos atrelados a esta frase. Não quero ter absoluta certeza de que ele acabou de questionar a minha maturidade, pois isso só faria o momento pior.

Eu suspiro, “Você está esperando demais de mim.”

Com alguns passos adiante, ele entra na minha casa, e imediatamente fico em estado de alerta. Assumo uma postura completamente defensiva quando pressiono meus dedos ao redor do celular e o vejo caminhar por minha casa com uma tranquilidade perturbadora.

Eu estou tão indignada que sequer consigo mandá-lo sair, embora eu queira; mas tudo que posso fazer é observá-lo em completo silêncio.

Sasuke para diante da meia-parede que divide a cozinha dos outros cômodos, uma das mãos nos bolsos enquanto a outra segura um cubo mágico sortido, este sendo uma da porção de porcarias e objetos avulsos que mantenho sobre aquele lugar, juntamente com contas para pagar, pequenas esculturas de vidro e canetas.

Com a visão perfilada dele, percebo que seu cabelo está preso em um pequeno rabo de cavalo baixo, suas madeixas sendo tão curtas que algumas mechas saltam para fora. A tatuagem em seu pescoço é mais visível agora, visto que não está usando camisa alguma, mas eu não posso vê-la claramente por causa da distância que nos separa.

Francamente, estou bem com isso.

“Se me der vinte minutos, eu posso resolver ele para você” A tentativa de mudar de assunto me surpreende, mas não me detém em momento algum.

“Vá embora. Agora”

Sasuke me encara, e sei que está medindo o grau de sinceridade em minha ordem. Seu rosto permanece estóico, mas ao invés de me obedecer, ele tira a outra mão do bolso e começa a resolver o cubo em silêncio.

Isso bagunça o meu humor completamente, pois é a primeira vez em que lidamos um com o outro a sós e eu já não posso suportar o seu comportamento.

Ele encosta o cotovelo direito à meia-parede e apóia o peso de seu corpo ali, os olhos ainda atentos aos movimentos rápidos de suas mãos. “Eu não espero coisa alguma de você, Sakura...” Ele volta ao tópico anterior, as investidas ágeis de suas mãos fazendo uma breve pausa para que observe o agrupamento das cores em todas as faces do cubo, e então ele retoma o ritmo acelerado de antes.

Permaneço em silêncio.

“Você é uma mulher desprezível,” a forma como me acusa faz com que meus olhos se arregalem durante alguns segundos de descontrole. “É mentirosa. Mentiu para mim.”

Espero que ele não tenha tido intenções de que isso fizesse eu me sentir remotamente mal. Mesmo assim, eu fico quieta.

“A pior parte é que a nossa convivência não precisava ser ruim, Sakura, realmente não precisava. Eu tinha esperanças em você até chegar aqui na manhã do sábado e perceber que várias coisas simplesmente sumiram do meu apartamento. E eu lembro de todas elas estarem lá quando estive aqui, algumas noites antes. Então eu fiquei sem televisão por toda a noite de sábado até agora, entediado todo esse tempo por sua causa.”

Ainda não me sinto mal. Nenhuma mísera parte de mim se arrepende.

“Porque você mentiu sobre ter uma cópia da chave,”

“A televisão e alguns dos objetos de menor valor que tirei de lá pertencem à minha amiga. Eu só fiz o que estava orientada a fazer desde que ela foi embora.”

“Você não me avisou nada disso. Eu não teria aceitado”

“O problema, Sasuke, é que você não precisa aceitar absolutamente nada. Estes são os termos,” eu repito exatamente o que me disse na delegacia, e noto pela maneira como ele levanta os olhos do cubo para mim que sabe disso. “você saberia que alguns dos eletrodomésticos estariam sujeitos a remoção se houvesse lido todas as linhas que eu escrevi na porcaria do papel que deixei no mural. Eles estavam lá por um motivo, para serem lidos.”

Eu o observo, e tudo que ele faz é balançar a cabeça. “Apenas me responda isso: você vai me deixar sem televisão?”

Eu teria dado uma risada se não estivesse tão agravada pelo fato de que ele realmente está tentando colocar a culpa de tudo isso em mim.

“Eu não estou impedindo você de comprar uma e trazer para o seu apartamento.”

Ele dá de ombros, “Não foi isso que eu perguntei.”

Suspiro, tentando não ceder a meus próprios pensamentos. Eu realmente não gosto do comportamento dele, de como se porta, de como ressalta que não é a pergunta que fez implicando que eu sou forçada a respondê-lo, isso está me tirando de sério.

Talvez eu esteja certa, talvez seja implicância somente por Sasuke ser quem é, por fazer o que fez, está fazendo, comigo.

“O lugar onde você morava antes de vir para cá... não tinha televisão lá?”

“Você vai devolver a televisão?” Ele redargua. A maneira como suspira após me questionar é uma denúncia de que ele sabe a resposta de sua própria pergunta e já está conformado com ela.

Suspirei.

“Não. Não vou.”

Um sorriso presunçoso surge em seus lábios, exatamente o oposto do que eu estava esperando. “Certo, querida. Sem problemas.”

Obviamente não está sendo sincero.

Ele caminha em direção à porta com uma tranquilidade invejável, e eu reflito sobre ele.

Não o conheço direito, mas eu o definiria com uma só palavra se pudesse. Oblíquo. Sasuke é oblíquo. Eu não sei o que estou vendo quando olho para ele, ou talvez eu esteja vendo mais do que o suficiente. Traiçoeiro, dedicado apenas à suas próprias causas, uma pessoa desprezível sem qualquer traço de altruísmo. Alguém que não posso confiar, tampouco desvendar.

Ele fecha a porta atrás de si, mas meu grito reverbera de forma alta o bastante para fazê-lo parar no meio do caminho. Quando corro até a porta e a abro, percebo que ele sequer esticara a mão para abrir a própria maçaneta quando foi detido por meu chamado por seu nome.

Ele se vira em minha direção, “O que? Mudou de ideia?”

“Não,” empurro a franja para longe dos meus cílios.

Nesse momento, tudo treme. Ele olha para o teto, parecendo ter sido pego com a guarda baixa mesmo após minha clara instrução sobre os metrôs.

Já estou habituada, então apenas cruzo os braços enquanto espero que o barulho passe.

Os olhos escuros dele se desvirtuam do teto em direção aos meus, calejados, e tenho certeza de que está surpreso com a naturalidade em minhas feições. “Essa merda é alta,” ele comenta, e percebo que não está satisfeito por atestar que sim. “para em algum momento da madrugada? Eu preciso dormir.”

Eu, pelo contrário, não podia me sentir melhor. Minha risada atrai sua atenção, e dou de ombros, “Você fez questão de vir, então, seja bem vindo.”

A forma como sua mandíbula aperta após a minha forte dose de cinismo faz com que eu me lembre da tatuagem. Meus olhos a procuram imediatamente, mas pouco após isso,ele muda de ângulo e fica de frente para mim.

“O que você quer?”

Felizmente, perto o bastante. Eu consigo ver os desenhos claramente agora, e eles não fazem o menor sentido. Duas criaturas, uma em forma de lobo, outra em forma de serpente, e no meio delas, uma mulher em vestes escuras, cujo vestido se estendia como labaredas até o centro do pescoço dele, sobre seu pomo de adão.

O metrô passa, então nós nos observamos durante alguns segundos em completo silêncio, enquanto eu ainda penso se a pergunta que desejo fazer é adequada, mas infelizmente sou curiosa demais para desistir.

Minhas pernas oscilam um pouco, e inalo um suspiro trêmulo, fitando-o com cautela enquanto permanece estoico, lendo minhas reações. “Eu preciso saber...”

“Precisa saber o que?”

Muita coisa. Realmente, eu preciso saber de muitas coisas que só ele ou Naruto podem responder, mas não é como se a minha curiosidade fosse o bastante para fazê-lo simplesmente falar.

Preciso manter o realismo, perguntar algo cuja resposta é possível.

Algo que, mesmo não sendo tão importante, está no topo das minhas prioridades.

“Na quinta-feira...” E apenas isso, apenas a mera menção à fatídica noite o faz suspirar. Seus ombros caem e ele recua um passo, parecendo bem indisposto a falar sobre isso, e eu perco a calma. “Na quinta-feira, Sasuke, eu sei que foi você que correu atrás de mim,” meu tom se acresce umas oitavas, como se falar mais alto fosse o impedir de ir embora se assim o quisesse.

“Alguma outra descoberta contundente?” Ele ironiza, “Talvez alguma que eu realmente deseje esconder de você ao invés de algo tão óbvio? Torne isso interessante.”

“Eu preciso saber o que aconteceria comigo se você houvesse conseguido,” eu respiro fundo, notando que algo muda em seu rosto à medida que moldo minhas indagações. “Se houvesse me alcançado, o que teria feito?”

Ele franze os lábios, “Isso é completamente irrelevante.”

“Eu quero saber.”

Sasuke arqueja impacientemente, parecendo muito entediado. Ele abre a boca, e por um momento tenho a impressão de que falará algo, mas ele volta a se calar, e eu sofro com a antecipação. “O que você quer ouvir? Que eu levaria você para casa e a torturaria com uma faca cega até desejar estar morta? Isso iria a satisfazer?”

“Eu só quero a verdade...”

Ele umedece os lábios furtivamente, ainda parecendo indisposto a desenvolver o assunto.

“Sabe... Eu teria a levado até um lugar escuro e drogado você em seguida, até o ponto de estar desacordada” ele cruza os braços sobre o peito, sem parecer minimamente pensativo ou desgostoso por suas próprias palavras. Pelo contrário, aparenta estar aproveitando a descrição. O caminho pelo qual meus pensamentos me levam ante suas palavras me assusta como o inferno, mas é impossível pensar em qualquer outra coisa, quando sua narrativa é tão familiar a outro tipo de crime. À esta altura do campeonato eu estou enojada, e não quero que continue falando, mas ele não para. “então quando estivesse dormindo, eu iria machucar um pouco os seus punhos, apenas o bastante, e logo em seguida quebrar o seu celular.”

“Canalha”

“Eu a levaria em meus braços até a escadaria, e pediria a Naruto que finalizasse Gaara sozinho, exatamente como o finalizamos. Eu usaria as mãos dele para arranharem você um pouco, apenas o bastante para que resquícios de pele fossem encontrados abaixo das unhas, e colocaria um pouco de sangue dele nos seus punhos.”

Olho dentro de seus olhos, incrédula do que estou ouvindo. O sorriso remotamente sádico em seus lábios dando a impressão de que gostaria de ter experimentado o destino que narra me adoece, e o nariz dele se torna tentador; eu gostaria de entortá-lo com um só soco, e mostrar a Sasuke que posso ter sangue nos punhos mesmo agora, só não o de Gaara.

Jamais teria imaginado que fabricar uma cena de crime para isentá-los e culpar a mim seria sua primeira atitude. No entanto, parando para pensar, é algo muito óbvio. Ele não estava contando com testemunhas, mas se havia uma, que tivesse alguma serventia para algo.

Eu me sinto quase furiosa comigo mesma por manter o costume de sempre esperar coisas boas das pessoas, mesmo de uma que não demonstra qualquer sinal de ter um caráter.

Ele continua esperando pacientemente por uma reação minha, mas não quero falar mais nada. Eu já tive o suficiente.

“Uma pena que você sabe correr bem de saltos, Sakura.” Ele dá de ombros teatralmente, “Nós dois podíamos estar livres um do outro.”

E eu na cadeia, pagando por algo que não cometi enquanto ele continua livre.

O bastardo fala como se ser pega por ele fosse remotamente melhor do que o que realmente aconteceu.

“Não, obrigada.”

“De nada.” Ele me entrega o cubo, e parte em seguida.

Suspiro, olhando para minhas mãos e percebendo que a face branca diante de mim está completa. Rapidamente checo as outras, e fico assombrada durante os próximos segundos, pois ele resolveu o cubo inteiro em alguns minutos de conversa.

Meus olhos o procuram outra vez, mas Sasuke fecha a porta atrás de si, e eu continuo parada onde estou.

Ele está definitivamente acima da média se consegue fazer isso.

 

___________________________________________________________________________

 

Amanhã, sem dúvidas, procurarei o meu professor para acertar os detalhes da segunda chamada.

Atrasar a prova não pareceu uma boa ideia antes. Ninguém quer pagar por algo que se pode ter de graça, mas não havia uma só partícula de estudo no meu cérebro.

Embora eu reflita sobre ele algumas vezes por dia, Gaara não ocupa mais cem por cento de todos os meus pensamentos agora, e isso abre espaço para que eu possa me concentrar nos estudos. Estou voltando à normalidade pouco a pouco, e com isso, retornam os meus compromissos acadêmicos.

De acordo com minhas contas, o barulho vindo da porta da frente começou às dez horas. Começou baixo, tudo que eu conseguia ouvir era uma música baixa, constantes riffs abafados de guitarra e vocais guturais e afeminados, típicos das bandas ocidentais de rock do fim dos anos oitenta. Isso não me incomodou, mas lembro de desviar rapidamente os olhos das linhas da apostila em direção ao relógio e ver o ponteiro posicionado pouco antes do dez.

Antes disso, eu estava ouvindo ASMR em fones e focada demais na leitura para prestar atenção no que estava acontecendo, mas uma movimentação atípica no corredor, passos constantes e múltiplos também me causaram estranhamento.

Eu tentei ignorar. E ignorei até o metrô passar; em decorrência disso, uma dezena de risadas e vozes distintas chamaram minha atenção.

Estou refletindo agora, repassando todas as circunstâncias e tentando me convencer de que o melhor é ficar quieta. Ele tem todo o direito de convidar os amigos que desejar, ele pode fazer o que quiser contanto que não me envolva em problemas, porém, todo o barulho deve parar à meia-noite, e eu não acredito que ele saiba disso.

Não posso simplesmente enfiar um bilhete pela fresta da porta o avisando sobre a regra da meia-noite. Ou talvez eu possa. Qualquer coisa, exceto precisar bater à porta dele para dar tal recado.

Obviamente não posso contar com seu bom senso, ele não parece ter.

Então, fico sentada sobre o sofá, mordendo a caneta por um instante enquanto arranco um pedaço limpo de papel dos cantos da página da apostila. Ali, escrevo um sucinto e claro: “O som deve acabar à meia-noite.

Faço meu caminho em direção a saída, e a cada novo passo, o barulho parece ficar mais alto, embora ainda abafado.

Eu abro a porta, e a primeira coisa que chama minha atenção é a garota estranha no corredor. Seu braço esquerdo está apoiado à parede e ela está de costas para mim, conversando com alguém ao celular. Imediatamente olho para a porta, que está vibrando com a batida de um dubstep, e me ajoelho.

A garota parece notar minha presença, ela olha para trás, mas não fala nada, apenas caminha alguns passos para longe, buscando por mais privacidade.

O breve momento em que vejo seu rosto é o bastante. Ela e seus cabelos vermelhos me parecem familiares.

Tento enfiar o papel pela fresta de baixo, mas há alguma coisa ali obstruindo o caminho. Não importa o quanto eu empurre, tudo que estou conseguindo é amassar o papel cada vez mais, e isso me arranca um grunhido frustrado à medida que fico em pé outra vez.

A visão do lado de fora do olho-mágico é horrível, então eu nem mesmo tento.

Acho impossível que tenham tampado a fresta de cima, então estico o papel e o enfio por lá, dando tapinhas até que o bilhete entre por inteiro e caia do outro lado.

É a minha deixa, eu rapidamente dou meia volta e retorno até a minha casa.

Estou um pouco tensa, não pelo o que fiz, mas como ele pode interpretar.

Pensando bem, foi uma péssima ideia. Imagino agora ele recolhendo o bilhete e lendo em voz alta para seus amigos enquanto zombam de mim, mas ao menos eu não testemunharia.

Leva cerca de dez minutos até que ouço batidas em minha porta, na verdade acho que sequer chega a tanto. É a primeira vez desde que me mudei para cá em que vou atender a porta sabendo exatamente quem é.

Estou usando das camisas do meu namorado, ela é três números acima do tamanho dele, então o seu comprimento alcança os meus joelhos e cobre totalmente meus shorts de algodão. Sendo assim, é composta o bastante, então eu apenas abro a porta e minhas expectativas são concedidas.

Eu olho dentro dos olhos dele e tenho certeza que só veria um grau maior de degeneração moral se entrasse em seu loft. Suas escleras estão rosadas, e tenho certeza que está sob influência de substâncias, ou talvez apenas bêbado. Pupilas dilatadas seriam uma boa confirmação, mas os olhos dele são tão escuros que sequer posso vê-las.

O seu cotovelo está apoiado à moldura da minha porta, sendo assim, seu tronco está inclinado em minha direção e o rosto dele ao menos dois palmos de distância do meu. Seus cabelos estão soltos agora, e ele não está usando uma jaqueta como sempre, parece mais à vontade com uma regata cinza e jeans folgados, cuja braguilha está deliberadamente aberta.

Ele limpa a garganta, e sei que me flagrou olhando.

Surpreendentemente, não estou com vergonha. Ele deveria estar.

“Já terminou?” Faço que sim com a cabeça, e o canto esquerdo de seus lábios se ergue em um sorriso ignóbil. “Quer que eu me vire  para você ver atrás?”

“Não,” Eu engulo “o que você quer?”

A mão dele se abre na frente do meu rosto, me oferecendo o papel completamente amassado. Minha mandíbula aperta. “O que!?”

“Colocaram esse papel na minha porta...” Ele funga, “Eu estou chapado, mas não desaprendi a ler. Só que isso parece ter sido escrito por um babuíno. Não entendi nada. Será que você pode...”

Eu acerto uma tapa forte na mão dele para tirá-la da frente do meu rosto, e isso parece pegá-lo de surpresa, já que arregala os olhos. Ele abaixa a cabeça para observar o papel cair no chão, mas minha atenção não se desvirtua dele nem por um segundo.

Logo em seguida, me olha entediado. Os lábios partidos, o ritmo mais rápido com o qual pisca os olhos. Ele realmente está muito longe de sóbrio. “Por que fazer isso?”

“O bilhete dizia para desligar a porcaria do som da sua casa à meia-noite.”

Ele me observa em silêncio enquanto processa a informação lentamente. “Foi você que escreveu?”

Não respondo, porque a este ponto já é muito óbvio que sim.

“São as regras do prédio?” Pergunta.

Suspiro.

Teuchi literalmente não delimitava regras para seus moradores. A única regra existente era a de não colocá-lo em problemas, uma que ele seguia à risca e sequer estava anotada em algum lugar, era subjetiva, mas todos nós no prédio sabíamos disso.

Fora isso, havia, sim, normas de convivência definidas entre os moradores em seus respectivos andares.

A cláusula sobre música alta era muito simplista: eu poderia ouvir o que quisesse na minha casa, contanto que não incomodasse outras pessoas. Se o som fosse alto o bastante para atrapalhar moradores de outros andares, eles provavelmente viriam até aqui tirar satisfações, e o meu principal problema agora é o fato de que a música vinda do loft dele não é alta o suficiente para causar incômodo nos outros andares, apenas neste.

E só nós dois ocupamos este andar.

Então eu tenho que tomar uma atitude. Sozinha.

“São as regras do andar.” Respondo.

Ele anui, “E quem define as regras do andar?”

Eu.

Penso em outras respostas, mas qualquer outra coisa seria mentira, e mesmo que eu não tivesse um problema em mentir para ele, eu queria que Sasuke soubesse quem manda.

“Eu.”

Ele levanta as sobrancelhas, “Eu acho que você quis dizer os moradores, que são nós.”

“Tecnicamente seria, mas eu moro aqui há mais tempo, as regras já foram estabelecidas pelas moradoras. Você acabou de chegar”

“Então simplesmente vou ficar obedecendo a normas que você e sua amiga intercambista que sequer está aqui inventaram? Eu não tenho nenhuma participação nelas?”

Franzo as sobrancelhas, “Como você sabe que a Konan está fazendo intercâmbio?”

Ele dá de ombros. “Fiz o meu dever de casa.”

Eu estou pronta para gritar alguma coisa de volta quando a porta atrás dele se abre, e Naruto sai. Por deus do céu, eu não vou aguentar os dois juntos.

Ele olha para mim e sorri de olhos arregalados, como se fôssemos amigos. O copo em suas mãos está suado, e dele sai uma pequena fumaça, como se estivesse tomando uma bebida quente, tipo café. "Olha quem está aqui...”

“Eu moro aqui”

Ele me ignora. “Justamente quem Sasuke e eu estávamos procurando.”

Ao contrário de Sasuke, os olhos dele estão normais. Eu observo sobre o ombro dele, aproveitando a porta aberta atrás deles para ver o que está acontecendo lá dentro, e percebo que há pelo menos dez pessoas no lugar. Ao menos cinco delas pareciam disputar espaço em um sofá pequeno, uma garota segurando um violão girava próxima a parede e havia um casal no chão. A mesa de centro parecia pequena demais para a quantidade de itens sobre ela, garrafas, algumas caixas de pizza empilhadas, cervejas, um pote com nebulosa caseira, fora os pequenos pacotes transparentes que pareciam ser dominantes. Havia, no mínimo, uma centena deles e estou apenas chutando. O conteúdo são pequenas bolinhas, coloridas e pequenas, se parecem com m&m’s.

Embora eu saiba que serem de fato m&m’s seria bom demais para a minha sorte.

Os dois me observam enquanto sacio minha curiosidade sobre o que diabos acontece lá dentro, até que recobro a consciência e volto a prestar atenção neles. O braço esquerdo de Naruto está envolto sobre os ombros de Sasuke, que me fita com olhos convidativos demais “Por acaso quer ir para a minha festa de boas-vindas também? Eu convido você. Todos são bem-vindos.” Seus dedos entrelaçam os fios escuros, jogando uma porção de cabelo para trás, enquanto ele me observa atentamente, pairando perto de mim, e eu encaro esta atitude como pressão por uma resposta, embora não pareça proposital, já que ele parece completamente absorto do mundo ao seu redor.

“Não, claro que não” Eu respondo, e uma riso escapa por suas narinas quase que imediatamente.

“Sakura, nós queríamos falar com você, fazer uma proposta...” Naruto entra no assunto.

“Não quero ouvir.”

Puxo a porta pela maçaneta, mas a palma de Sasuke se choca contra a madeira, e esse mísero ato pelo qual ele sequer parece ter se esforçado demonstra uma força bem maior que a minha.

Se um dia fosse necessário ir para as vias de fato com ele, eu precisaria de rapidez, pois em termos de força eu perderia com facilidade.

“Escuta,” ele sussurra, soando levemente rouco.

 “Nós dois temos um fetiche de dividir a mesma mulher na cama, você sabe... Por incrível que pareça...”

Obviamente os limites estão começando a ficar tênues.

Eu não percebo a princípio que prendi a respiração, e Naruto ri um pouco, enquanto Sasuke parece tentar miseravelmente se conter.

Não sei como está meu rosto agora, mas tomando como partido as reações de ambos, nada bem.

“Que porcaria você está falando?” Eu falo, quase sem fôlego.

“Sim, é só a verdade.” Ele solta Sasuke e se aproxima de mim também, apoiando um de seus ombros ao outro lado da moldura da minha porta, e quando o ar quente acerta o meu rosto, olho para baixo, percebendo que ele está segurando o copo abaixo do meu queixo.

E há a porra de um cogumelo ali dentro.

“Você quer chá?” Ele me oferece, e desvirtuo meu olhar dele em direção a Sasuke completamente transtornada.

“Não.”

“Ok, como eu estava dizendo... Você é forte, tem atitude, se impõe, não leva desaforo para casa, isso é sexy demais.” Fecho os olhos, com medo de ouvir o resto do que tem a dizer. “Então nós estávamos pensando se você não queria ser o terceiro membro da nossa suruba a três”

“Meu deus do céu...” eu me sinto totalmente fora de mim, como se estivesse tão dopada quanto eles. “Caralho...”

“Exatamente. Dois. Você aguenta?”

“Eu tenho namorado!” Grito, escandalizada.

“Você pode chamá-lo. Ele gosta de cuckold?” Sasuke pergunta rindo, e é quando eu percebo que estou servindo de chacota para eles. “Não estou julgando...” Ele levanta as mãos em rendição.

Eu respiro fundo, “Vocês dois são gays...”

Os dois trocam olhares. Naruto franze a testa e comprime os lábios, o escárnio explícito em seu rosto, mesmo que tente contê-lo. “Oh, querida...” é tudo que diz; a voz condolente, quase como... Quase como se estivesse com pena de mim.

Olhando para Sasuke, ele dá uma risadinha. “Bem, de qualquer forma, nós estamos brincando com você. Por enquanto não há suruba alguma, foi só algo que inventamos para falar com você e ver como reagiria. Você é divertida, nós apostamos se você levaria a sério ou não” Naruto explica, e enquanto isso, eu olho para Sasuke, que está com os olhos fincados no meu rosto. “Você levou, foi legal.”

“Legal?”

“Sim.”

Tento parecer contida, mas a raiva que está borbulhando dentro de mim é maior do que qualquer outra coisa.

“Uau,” Sasuke exclama, e volto minha atenção a ele. “a sua testa é imensa, Sakura. Porra isso é assustador.”

Eu não vou aguentar.

Coloco o dedo na cara dele, toda a minha paciência esgotada. “À meia-noite você desliga o som. Eu juro por deus, não estou brincando.”

Não dou tempo para que retruquem, eu fecho a porta com força, produzindo um barulho alto.

Em seguida, coloco a mão sobre minha testa fria. Ela não é tão grande, e consigo fazer com que pareça menor usando a franja, mas agora todo o meu cabelo está puxado para trás em um rabo de cavalo.

Talvez por isso ele tenha achado a minha testa imensa, mas ela não é tão grande assim.

Depois do show de horrores ao qual fui submetida, eu rastejo de volta ao sofá, sabendo que não vou conseguir retomar a leitura. Então, o que faço é me sentar ali; uma parte de mim torcendo que ele não desligue o som à meia-noite e eu tenha a desculpa para desligar a energia do apartamento dele no contador no final do corredor.


 

Deidara acabou de me desejar boa noite. Ele está indo dormir agora. Nós conversamos um pouco e tudo fluiu bem, apesar da nossa discussão quando outrora esteve aqui. O clima não ficou muito bom depois dela, e nós dormimos cedo. Sem sexo algum.

Porém, estamos melhores agora. Ele me convidou para jantar na casa dele amanhã e eu disse sim, porque estamos precisando disso.

Meu humor está tão leve que esqueci o quão ansiosamente estive esperando pela meia-noite. Meus olhos procuram o horário no visor do celular. Meia-noite e doze. O barulho lá fora continua, agora uma música lenta com vocais horríveis. A pior coisa que ouvi na minha vida.

Se isso não for uma provocação nítida, eu não sei mais o que pode ser.

Escancaro a porta e passo por ela pisando duro. Vou dar mais uma chance antes de ir até o contador e desligar as chaves de energia dele.

Eu acerto meu antebraço na porta fechada duas vezes, usei tanta força que, por um momento, a música horrível parou antes de retomar sua melodia esdrúxula.

É Sasuke quem abre a porta. A principio, há uma expressão  insatisfeita em seu rosto quando me observa, mas logo em seguida, suas feições se aliviam minimamente. “O que é?”

“Eu falei. Eu fui muito clara. Se passaram doze minutos, você precisa desligar o som. Agora.”

“O som está desligado.”

“Não, seu desgraçado, não está─”

Ele cruza os braços e abre espaço atrás de si para que eu veja a sala. Eu estava certa quanto ao número de pessoas, só que agora todas elas estão esparramadas no chão. E, para minha negativa surpresa, Naruto é o único sentado. Há um violão em seu colo e a voz horrível vem dele.

Confirmo minhas suspeitas, e a moça de antes realmente é uma das garçonetes da cafeteria da faculdade ao qual Suigetsu vive azarando. A pobre coitada que escreveu ‘solteiro’ em seu copo de café, porque ele não tem um só pingo de vergonha.

Minha mandíbula aperta, e eu olho para Sasuke, que dá de ombros; um meio-sorriso triunfante em seus lábios. “Como pode ver... Som desligado.”

“Não, você precisa desligar o seu namorado também. Agora.”

Ele umedece os lábios furtivamente, seus olhos viciosos me averiguando por completo. “Eu gosto de obedecer, mas em momentos bem específicos. Este não é um deles.”

“Você é pior do que lixo.”

Isso faz o sorriso aumentar. "Tudo isso por causa de uma televisão ruim..." E isso faz com que eu deseje ter entrado na delegacia e colocado esses dois homens na cadeia, foda-se as consequências.

Com o meu silêncio, ele dá um passo adiante e lentamente vai fechando a porta atrás de si.

“Todo mundo já me desejou boas-vindas... Menos você. Eu queria ouvir de você.” Ele fala em tom baixo, o cinismo ardendo em suas feições.

Pressiono os lábios, em péssimos termos com meu auto-controle.

“Vá para a porra do inferno” Praguejo, caminhando de volta a meu apartamento.

Tudo isso por causa de uma televisão ruim. 


 


Notas Finais


Espero que tenham gostado, até a próxima =)


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