O caminho não era difícil, mas o terreno acidentado chacoalhou bastante o jipe, deixando-me preocupada com Daniel do banco detrás. Porém, quando me virei para olhar, ele estava acordado. A arma em minha mão o colocou na mira rapidamente.
-Estou bem. -disse ele empurrando minha mão para o lado e se levantando para se deslocar para o banco da frente. -Seu amigo foi um pouco grosseiro, mas eu compreendo.
-Aquilo foi… -suspirei. -Me desculpe, Daniel. Ele já teve um grande preconceito com as almas. Tolerância nunca foi o forte dele.
-Eu entendo. -ele afirmou me fitando enquanto dirigia. -Onde estamos indo?
-Na caverna. Vamos ver meu tio Jebb, ele é parte da resistência e pode nos dar abrigo e segurança. -olhei-o rapidamente antes de voltar a atenção para a estrada. -Quero que feche seus olhos. Se algo acontecer, seu hospedeiro não poderá achar a saída e vai se perder na caverna.
-Isso vai colocar os humanos da resistência em risco. -olhei-o novamente pelo canto dos olhos.
-Mas vai me dar tempo para te encontrar. -afirmei observando a surpresa que tomava sua expressão.
-Não é uma alternativa muito boa. -discutiu ele desviando os olhos para a janela.
-Não, não é. Mas é a única que temos. -retruquei deixando o carro afundar em um silêncio completo por alguns minutos antes de falar de novo. -Você está bem?
-Sim.
-Você dormiu por um dia inteiro. -ele se voltou para mim surpreso.
-O que?
-Foi. Demoramos um dia para chegar á caverna e você não acordou sequer por um momento. -ele suspirou baixo, fechando as mãos no tecido da calça. -O que houve?
-Nós brigamos. Ele me levou para um tipo de vácuo da mente dele. -Daniel soltou a cabeça no banco, encarando o teto do carro enquanto eu alternava meu foco entre ele e o caminho. -Deus, pareceram somente algumas horas. Eu consegui penetrar em toda sua mente, de forma completa. -senti o olhar pesado dele sobre mim. -O que eu vi lá… -pela visão periférica pude notar ele sacudir a cabeça. -Nunca pensei que humanos pudessem ter tal nível de escuridão. Ele está completamente perdido, além de qualquer tipo de redenção.
Suspirei pesadamente.
-Uma coisa que você já deveria saber sobre os humanos Daniel, é que não há a menor possibilidade de conseguir ajudar alguém que não quer ser ajudado. -eu o fitei quando acreditei ser oportuno. Um sorriso leve ocupou meus lábios. -Mas quando a pessoa aceita ajuda, nunca é tarde demais.
-Você ainda tem esperança em sua espécie. -ele disse encarando meus olhos. Incomodada com a súbita atenção, ri sem graça e voltei a cabeça para o caminho.
-Eu deveria ter, Daniel. Uma raça que sobreviveu mais quatro mil anos, saindo resistente de desastres e tragédias deveria ter algum crédito com Deus. -dei de ombros sorrindo verdadeiramente quando ouvi a risada gostosa de meu buscador. -Estamos chegando. Eu não sei se…
-Caso se refira ao tratamento que terei quando chegar lá, não se preocupe. Seu amigo me deu uma boa ideia para o que me preparar. Não julgo os humanos da resistência de nenhum modo, estão lutando para sobreviver afinal. -quando o fitei ele tinha os olhos fechados e a cabeça voltada para o teto do carro. -Não se preocupe comigo.
-Meio impossível devido os fatos recentes. -revirando os olhos eu ri baixo. -Mas você aguenta. -pelo canto dos olhos consegui ver ele sorrir de leve.
Foi como disse. Chegamos em menos de quinze minutos e Daniel aceitou sem resistência a venda em seus olhos que não passava de um trapo que eu havia rasgado de minha blusa com um puxão. Eu o guiei em passos vacilantes até a entrada da caverna. As rochas dificultavam minha caminhada e mesmo que estivesse um pouco mais claro por causa do nascer do sol, qualquer coisa ainda podia dar errado.
E tudo isso porque eu ainda estava sendo realista.
Daniel me seguiu sem medo. Mesmo vendado sua caminhada parecia mais confiante que a minha. Me orientei por minhas lembranças dos fins de semana e feriados que passava ali com tio Jebb.
Quase podia ouvir meu riso alegre ecoando por aquelas paredes e isso me causou um puta de um arrepio.
-Porque está assustada? -a súbita voz de Daniel me vez pular. O xinguei em voz alta só para ouvir uma gargalhada divertida.
-Você me assustou, idiota! -bradei distribuindo alguns tapas onde conseguia alcançar naquele escuro. Ele ria, tentando segurar minhas mãos, até que ouvimos um ruído. Não consegui distinguir o que era, mas aparentemente parecia algo suspeito porque Daniel me puxou para si e me imprensou contra a parede, segurando meus pulsos ao lado da cabeça. -O que foi? -sussurrei baixinho.
-Uma arma.
-Seja quem for que estiver aí, é melhor se apresentar antes que eu decida fazer uma reforma no corredor. -a voz era rouca e se eu não tivesse reconhecido tom grosso, com certeza teria fugido.
Pelo que se parecia, Daniel também estava se acostumando rápido com a bizarrice e violência da minha família porque segundos após ele se afastou, me libertando.
-Você nunca gostou de reforma, Big Jebb. Acha aborrecedor. -gritei, ouvindo minha voz ecoar pelo lugar. Ouve algum outro ruído que supus ser de Jebb guardando a arma.
-Samantha? -sua voz era cética. -O que tá fazendo nessas bandas, guria? -eu ri quando uma luz se acendeu e o rosto de Jebb entrou em cena.
-Digamos que eu preciso de ajuda. -sorri amarelo indicando com a cabeça meu buscador ao em sincronia com o movimento de Daniel, que retirava a venda. Quando seus olhos de alienígena surgiram, meu tio assoviou baixinho.
-Todo mundo precisa um dia.
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