História Read - Get your colors

Interpretação.

Substantivo feminino. Ação de interpretar; explicação. Tradução, comentário crítico. Ação de tornar sensível a um ouvinte o conteúdo de uma partitura. Modo como uma obra dramática, musical, coreográfica é representada ou dançada. Interpretação fotográfica, indicação, em uma cópia, das informações descobertas numa fotografia aérea, para exploração da área; fotointerpretação.

A arte de interpretar. Como não admirar algo tão belo? Como não admirar a possibilidade de, além de tudo, fugir da sua realidade e se tornar outra pessoa? Viver outra vida?

A arte de interpretar. Tão peculiar e tão individual. Como poderei exigir que você interprete como eu? Que você compreenda e analise como eu? Eu sei, eu sei, é loucura. É loucura exigir que um cérebro trabalhe como outro, é loucura exigir que um corpo funcione como o outro e é loucura exigir que responda como os outros. Que responda às situações como os outros, como deveria ser. 

Deveria.

Se você possuísse uma pergunta, apenas essa pergunta e nada mais, para interpretar da maneira mais correta e imparcial qualquer coisa que deseja, o que perguntaria? Como elaboraria algo que respondesse por isso? Que respondesse pela interpretação perfeita?

A maioria de nós pensaria por horas e não seria capaz de desenvolver a pergunta. Como poderíamos julgar que a nossa forma de elaborar será a mais sensata? Como poderemos classificar nossa maneira de pensar como a correta quando, em todo o mundo, existem outros bilhões de pessoas que julgam o mesmo para si? Nós não poderíamos.

Mas não ela. Não a garota pronta para virar o mundo de ponta cabeça sem se preocupar com as impressões. A garota pronta para entrar em uma tempestade sem medo de não sair dela com vida. Não a garota que desejava saber, e não prever.

Não ela.

O escritório fora transformado em um improvisado estúdio. Algumas fontes de luz mais fortes, câmera posicionada diante ao sofá de dois lugares, logo a frente do fundo verde solicitado por sua equipe. 

Tiffany cruzou as pernas, respirando fundo e abaixando seu rosto pelo incômodo causado em seus olhos pelas luzes. Ela estava cumprindo sua agenda, por isso estava ali para gravar um pequeno vídeo de perguntas e respostas sobre seu último livro. Perguntas enviadas pelos leitores através das redes sociais oficiais da escritora.

Jessica terminava de dar algumas instruções ao rapaz que ficaria encarregado de manusear os equipamentos. A empresária aparecia no vídeo com Tiffany e seria a encarregada por ler as perguntas enviadas, selecionando-as na hora.

Sentou-se, por fim, ao lado de Tiffany e tomou em suas mãos o aparelho celular da amiga, arrumando seus cabelos e coçando a garganta.

— Podemos começar? — o jovem se dirigiu às mulheres e esperou pelo sinal positivo vindo de Jessica, que assentiu com a cabeça e sorriu em agradecimento. — Gravando em 3... 2... 1...

Silêncio.

A empresária olhou para a sua direita com o cenho franzido, era a deixa para que Tiffany fizesse a introdução e elas pudessem começar. No entanto, a jovem escritora mantinha seus olhos baixos e bem abertos, fixos em um ponto qualquer que não fosse nada realmente importante. 

Tiffany estava com medo. Ela estava com medo pelo que tivera feito noite passada, aceitando um pedido camuflado de Taeyeon. Tiffany estava com medo do que poderia vir a acontecer em sua vida. Ela estava com medo de ser bagunçada, de ter sua vida bagunçada. Estava com medo de gostar do inesperado, de se apaixonar pelo imprevisível e de se encantar pelas vírgulas e reticências. Ela estava com medo.

— Tiffany? — a voz suave de sua amiga a fez inclinar o rosto em sua direção, mantendo a expressão quieta e contida. — Você está bem? — a escritora assentiu com a cabeça e ergueu seu tronco, rodando a cabeça e respirando fundo. — Tem certeza? — assentiu novamente e Jessica bufou. — Verbalize, Tiffany, Verbalize! — bateu com as mãos nos joelhos da escritora que a encarou incrédula.

— Não seja agressiva. — reclamou enquanto empurrava as mãos ainda espalmadas. — Eu estou bem. — confirmou e encarou o rapaz confuso atrás da câmera. — Podemos começar novamente? — dirigiu-se a ele que assentiu. — Obrigada. 

E novamente fora feita a contagem, mas, dessa vez, Tiffany fez a introdução conforme o combinado, respondendo vagamente algumas das questões feitas por Jessica. 

— Estou um pouco intrigada. — disse a empresária. — Algumas das perguntas que chegaram vieram acompanhadas de uma hastag que eu não compreendo a finalidade. — deu de ombros e encarou a câmera. — Deixem nos comentários a explicação para a hastag 'get your colors'.

A menção do conteúdo da hastag fez com que Tiffany deixasse sua mente vagar, mais uma vez, para a jornalista atrevida. Tiffany sabia de onde aquela frase havia sido tirada, ela sabia qual havia sido a mente responsável por aquilo. E ela se sentia orgulhosa, em partes.

Orgulhosa por ainda haver pessoas como Taeyeon no mundo, mas ainda mais orgulhosa por existirem tantas outras dispostas a levarem a diante. Dispostas a mudar um pouquinho do mundo, como a jornalista havia proposto. Orgulhosa de ter se deixado participar, mesmo que o medo do inesperado lhe incomode muito. Mesmo que, para ser sincera, Tiffany não compreendesse porque havia sido a pessoa selecionada por Taeyeon.

Mas Taeyeon sabia. Taeyeon sabia como ninguém o motivo pelo qual deveria ser Tiffany. A história de vida, o tempo perdido, as emoções deixadas de lado, mas acima de tudo, o desafio de devolver a alguém algo tão valioso, o desafio de se engajar em trazer a felicidade do outro. O desafio de deixar o egoísmo de lado e pensar além. O desafio de abarcar o mundo com o coração e aperta-lo carinhosamente.

A gravação já havia acabado, Jessica tratava com o rapaz os últimos detalhes, deixando-o sozinho no escritório para que juntasse o equipamento.

— Tiffany Hwang! — exclamou ao chegar ao início do corredor e ver sua amiga preparando-se para sair do apartamento. — Aonde pensa que está indo? — cruzou os braços e pôde ver a confusão no rosto da escritora.

— Vou tomar um café. — arrumou o sobretudo preto em seu corpo e voltou a andar até a porta.

— Não vai não. — contrariou. — Você pode ir a qualquer lugar, mas depois de me contar exatamente o que está acontecendo.— Tiffany bufou, encostando a testa contra a madeira da porta. — Para o sofá, anda! — ordenou e a escritora assentiu. Não que Tiffany fosse um pau mandado, ela precisava daquela conversa também. 

— Depois eu posso ir tomar meu café? — a empresária assentiu e Tiffany retirou o sobretudo, sentando-se no sofá.

— O que está acontecendo com você? — seus olhos preocupados alertavam a escritora para que ela não escondesse, para que não a deixasse angustiada. — Desde ontem você está fora de órbita, isso não é comum. — suspirou e Tiffany assentiu, compreendendo.

— Estou um pouco assustada. — confessou.

— Ainda com a descoberta de Taeyeon?

— Não com a descoberta em si, eu no fundo sabia que viria a acontecer em algum momento. — explicou a negativa. — Mas com ela. Jessica, ela me deixa tão intrigada. — apoiou as mãos em seu próprio rosto e suspirou. — Get your colors é o nome do mais novo projeto de Taeyeon, é o projeto mais adorável do mundo. — a empresária ergueu as sobrancelhas e coçou a nuca. 

— Do que se trata? — perguntou. Em resposta, Tiffany tirou seu celular do bolso e deu alguns toques, estendendo o aparelho para Jessica.

Na tela, o texto que Taeyeon havia escrito na noite passada com o pedido silencioso. A empresária leu tudo com atenção e, se posso arriscar, admiração para com o que Taeyeon estava tentando construir. Ao terminar a leitura, Tiffany não deixou que ela falasse nada, tomando o aparelho de suas mãos e abrindo uma nova página.

Get your colors and go!

Change The World.

O título no topo da página brilhava em letras garrafais e coloridas. Rolando para baixo podia-se notar que aquela página havia sido configurada para exibir todas as postagens, das mais várias das redes sociais, que possuíssem a hastag do nome do projeto. 

Jessica observava cada postagem, detectando algumas das perguntas que leu minutos atrás. Agora ela poderia compreender sua amiga. Agora Jessica poderia compreender o espanto. Mas, acima de tudo, ela poderia compreender a forma como Tiffany estava sendo puxada para perto de Taeyeon.

— No fim do texto. — começou baixinho, atraindo a atenção da amiga. — No fim do texto ela pede para ser deixada colorir a vida de alguém, mas não se trata de uma frase com a intenção de convidar a todos a participar. Se trata de um pedido. — ela não precisaria terminar de explicar, Jessica era perceptiva o bastante para entender do que se tratava. 

— Ela pediu a você. — concluiu pela escritora.

— Ela pediu a mim. — concordou e pegou seu celular de volta.

— Tiffany... — fez uma pausa, totalmente compreensiva. — O que você disse? — Tiffany encarou a grande televisão a sua frente. Sua mente vagando para o pequeno diálogo por mensagens que tivera com a jornalista.

"Vamos voltar no tempo juntas."

"Por que eu?"

"Por que não você?"

"É uma boa pergunta."

"Não se trata de uma pergunta, no fim das contas. Amanhã nós seremos verde, Tiffany, seremos verde." 

— Eu permiti.