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História Realidade Paralela - Celestial.


Escrita por: _Mag

Capítulo 8 - Celestial.


Foi estranho acordar e me deparar com a poltrona velha ocupada, mas não era uma surpresa ruim.

Observei os olhos curiosos, o sorriso travesso típico da infância, a pele morena e os lábios fartos, características únicas do meu amigo barulhento que pela primeira vez estava calado. Acho que o silêncio era uma forma de respeito, como se ele entendesse tudo que eu estava passando depois que acordei, não disse nada e apenas sorri para sua imagem bonita contrastando com o tecido gasto da poltrona. Relaxei diante do seu companheirismo mudo, realmente feliz por sua visita.

Minha boca estava com um gosto amargo e me sentia enjoado, talvez fosse uma maneira irônica do meu corpo relembrar os minutos sufocantes que passei antes de mais uma vez apagar. Estava se tornando comum desmaiar do nada e acordar desnorteado e preso naquela cama, porém apesar de comum nada fazia sentido desde que cheguei ali.

- Hyung, tudo bem? – A voz levemente curiosa chamou minha atenção.

- Acho que sim. – Respondi incerto, vendo Kai se aproximar lentamente até sentar-se na beirada da cama. – Como estão todos?

- Está perguntando dos nossos amigos? – Indagou e eu assenti. – Estão bem, SeHun disse que viria te visitar, mas até agora nada, acho que ficou treinando alguma posição nova com o LuHan. – Disse, mas sem maldade.

- Ele só deve estar atrasado. – Expliquei, Kai não tinha jeito mesmo. – E o Suho?

Claro, precisava ter certeza de que minha mente havia pregado uma peça. Era impossível a imagem dissolvida de seu rosto ser real, ele usava o uniforme e o crachá dos enfermeiros em minha última lembrança. SuHo não era enfermeiro, era advogado e meu melhor amigo, dividíamos uma sala no centro de Seul, com janelas enormes em que eu gostava de observar a cidade e talvez fosse padrinho de seus filhos no futuro.

- Acho que ele vem te visitar também. – Respondeu, mas achei que ele estava mais distante que o normal. – E o cara da boate, veio te visitar?

Meu coração disparou, ele estava falando sobre BaekHyun e era o primeiro a tratar do assunto naturalmente, Kai parecia indiferente a todos que evitavam tocar naquele nome. Fiquei aliviado, talvez o menor pudesse esclarecer algumas dúvidas, porque o veto de silêncio não tinha chegado até ele.

- Não, mas você sabe alguma coisa sobre ele? – Arrisquei, me sentando na cama, já que não aguentava mais ficar deitado.

- Ouvi dizer que ele viajou, pelo menos foi o que o SuHo hyung me contou. – Explicou, brincando com a barra da camiseta. – O hyung nunca me conta nada direito. – Reclamou, cruzando os braços como se estivesse bravo.

Viajou? Como assim, viajou? Ele não poderia me deixar, ainda mais depois de tudo que passamos juntos, de cada toque e de cada beijo. Os pais dele deveriam ter tomado alguma atitude impensada, não era possível ele sumir justo depois do acidente. Era como se todos quisessem arrancar sua memória de mim, para quem sabe assim não fizesse mais perguntas sobre BaekHyun.  

Porém, ninguém obteria sucesso.                

- Hyung, como estou? – Kai perguntou de repente, se levantando e dando uma volta para mostrar a roupa que vestia.

Estava simples, mas se tratando de Kai é claro que estava bonito. Usava um jeans rasgado nos joelhos, uma camisa preta com as mangas dobradas até o cotovelo e nos pés um modelo de tênis mais casual. Eu só achava que bonito mesmo era seu sorriso, gostava da naturalidade com que ele falava alguns assuntos, do seu lado espontâneo e divertido, se tivesse morrido naquele acidente teria perdido um amigo muito querido.

- Está bonito, tenho que admitir. – Disse e ele só faltou pular de alegria. – Tudo isso é por minha causa?

- Ah, o hyung sabe que se quiser estou disponível. – Brincou rindo exageradamente. – Mas dessa vez é porque o KyungSoo vai me levar para passear. – Respondeu como se fosse uma garotinha em seu primeiro encontro.

Ri, sentindo falta de ouvir minha risada.

- E você está feliz por causa disso? – Provoquei.

- Claro! – Ditou sorridente. – Faz tanto tempo que não saio, mas como estou melhor os médicos autorizaram.

Médicos? Do que ele estava falando? Por que tudo parecia tão confuso? Encarei a face sorridente e aparentemente era o mesmo Kai de sempre, mas ele falava como se realmente se privasse de sair por muito tempo, seu olhar era distante e de alguma forma nostálgico. Estranho que de repente a mesma sensação me dominou, como se estivesse preso naquele quarto e ansiasse pela mesma liberdade que ele.

- Do que está... – Comecei, mas fui interrompido quando a porta se abriu.

- Jongin! – KyungSoo entrou afobado. – Te procurei em todos os cantos! Não suma novamente, entendido? – Ele tratava o mais novo igual a um paciente.

- Eu só estava conversando. – Kai explicou cruzando os braços, mais inquieto que o normal. – E também já estou pronto.

- Aish, estou começando a me arrepender deste passeio... – Disse, mas ao ver o semblante triste que se formou no mais novo mudou suas palavras. – Brincadeira, mas vamos logo.

Kai se animou com aquilo, indo até o enfermeiro e enlaçando seu braço com o dele. E eu estava invisível. Até a forma que se comportavam era a mesma, pelo que me lembrava das idas e vindas do relacionamento dos dois eram exatamente daquela maneira.

- Hey, eu estou aqui! – Reclamei.

- ChanYeol, eu quase esqueci de você. – KyungSoo sorriu irônico, deveria estar se lembrando do fato de eu expulsá-lo do quarto noite passada. – Sua comida já está a caminho.

Bufei irritado, agora eu era conhecido como o morto de fome daquele hospital. Eles se despediram porque segundo o mais velho estavam mesmo atrasados, só acenei dando tchau porque diferente deles não iria a lugar algum, talvez para o quarto – segundo o doutor Chen – e a partir daí poderia pensar em ter alta. Outro fato estranho, já que minha saúde era de ferro, não havia nenhum osso quebrado e toparia ser jogado para longe por outro carro de tão bem que me sentia, deveria ser apenas por prevenção.

Enquanto a refeição não chegava fiquei revirando na cama, tentando achar uma posição para me sentir mais confortável. Acho que ajeitei os travesseiros umas quatro vezes, depois entediado alonguei meu corpo e fui até o banheiro porque minha bexiga já estava estourando e era bom dar uma caminhada. Tudo muito divertido, tanto que quando recebesse alta escreveria um livro com dicas de “como se entreter em um quarto branco de hospital” e ficaria rico.

- Posso entrar? – Ouvi algumas batidas na porta enquanto tentava lamber meu cotovelo. Respondi com um “sim” meio desgostoso e deixei que o enfermeiro entrasse.

Ou melhor, deixei que meu melhor amigo entrasse.

- Vejo que está bem disposto. – Comentou assim que depositou a bandeja em meu colo. – Também, depois do susto que nos deu ontem deve ter dormido como um anjo.

Claro, sedado qualquer um dorme.

- Por que está com essa roupa? – Perguntei ignorando a comida. – O que exatamente está acontecendo? Desde quando é enfermeiro?

SuHo ao ouvir minhas perguntas arrastou a poltrona velha até ficar próximo da minha cama, se sentou e em seguida apontou para o prato com sopa de macarrão, como se fosse natural um advogado estar vestido como enfermeiro, sendo que não tinha diploma para ocupar tal profissão. Deveria ser alguma brincadeira por parte dos meus amigos, só para me deixar confuso e não estava gostando nem um pouco disso. Queria meu amigo de volta, não aquele estranho que tentava me convencer a comer.

- Desde sempre, ChanYeol. – Disse calmo, como se já estivesse acostumado com as minhas perguntas. – Você sabe disso, tente lembrar...

Mordi meu lábio inferior tentando controlar a vontade de gritar com ele, estavam me fazendo de otário naquele lugar e não aguentava mais nem um segundo ouvindo tantas mentiras. Tudo só era possível caso estivesse louco, e eu não estava louco, o problema era com eles e não comigo. Eu só queria ir para casa logo, beijar BaekHyun e esquecer dos dias que passei ali.

Só percebi meu descontrole quando joguei a bandeja longe, sujando a roupa de cama e quebrando o prato quando a queda foi inevitável, minha respiração estava alterada e eu mesmo não respondia por meus atos. Ver meu melhor amigo me passando para trás despertou algo incômodo em mim, talvez fosse tudo armado pelo maldito médico do sorriso simpático, que queria me deixar longe de BaekHyun, mas eles não iriam conseguir, nenhum deles.

- Olhe para mim! – SuHo ordenou, mantendo a voz firme e segurando em meus braços. – Você sabe quem sou e principalmente sabe quem você é.

- Você é meu melhor amigo. – Respondi com a voz cortada pela vontade de chorar. – Nós estudamos Direito juntos, nós trabalhamos juntos! – Gritei. – Pare de agir como se não fosse verdade, tire esse uniforme ridículo e me diga onde ele está!

- Shiuu, calma. – Pediu, se sentando na cama e passando os braços pelo meu corpo. – Eu sou seu amigo. – Disse e pouco a pouco meu coração se acalmava. – Mas nós não estudamos Direito juntos, sou apenas o enfermeiro responsável por você.

- Não, não, não... – Eu me negava a acreditar. – Por favor, é tudo um pesadelo não é? Eu vou acordar e as coisas voltarão a ser como antes.

Não estava aguentando a dor que rasgava meu peito, sentia seu perfume e reconhecia nele a nossa amizade, seus braços firmes ao meu redor passavam uma proteção única, sua voz suave lembrava os sermões e ensinamentos que ele sempre me dizia. Então por que mesmo assim as coisas estavam fora do lugar? Foi inevitável chorar, as lágrimas simplesmente criavam vida diante do meu desespero e molhavam o jaleco branco que ele usava.

- Você teve uma crise muito forte, está confundindo as coisas. – Continuou dizendo aquelas mentiras. – Acho que sua noção da realidade está voltando.

Quis rir em meio ao choro. Nada se encaixava e só reconhecia o cuidado que ele sempre teve comigo, estava até mesmo mais cauteloso, medindo as palavras para não me machucar ainda mais. Bem diante dos meus olhos, vi tudo desmoronar junto do que ele dizia ser verdade, se nós não estudamos juntos como o conhecia tão bem?

- Eu te vi no primeiro dia de aula, me sentei ao seu lado e pedi uma caneta emprestada. – Comecei mesmo sem forças. – Desde então nós nunca mais nos separamos, por que diz coisas tão cruéis?

 Ouvi sua risada baixa, como se discordasse de tudo que eu disse.

- Quando você chegou aqui estava acuado e perdido, preso em seu próprio mundo. – Ele mudou todas as minhas palavras. – Já faz tempo, confesso... Desde então eu cuido de você. – Pegou em minha mão e a levou até minha cabeça. – O que você diz aconteceu somente na sua imaginação.

Puxei minha mão com raiva, me soltando do abraço e saindo da cama indo até o canto do cômodo. Minha roupa estava suja por causa da sopa, mas não me importei, abracei meu corpo e comecei a tremer por causa do descontrole emocional, chorava sem parar, mas de olhos fechados porque encará-lo era o mesmo que encarar a verdade. Ele tentava me chamar, eu continuava na mesma posição negando sua ajuda, suando frio e vagamente me lembrando de conversas soltas e aleatórias.

Todas as conversas eram em volta das paredes brancas, estava feliz e conversava com SuHo animadamente, em algumas imagens  vi o rosto de outros amigos como Kai e LuHan, tudo no mesmo ambiente seco e frio. Eram tantas recordações que pareciam ser feitas em anos no mesmo lugar abandonado pela realidade, ás vezes se mesclavam com fatos da minha passagem pela faculdade. O que mais me transtornou foi ver a cena de quando conheci SuHo passar bem diante dos meus olhos, mas era outra pessoa em seu lugar, um sujeito de boa aparência e cabelos dourados.

- Por quantos dias eu realmente dormi? – Perguntei, abrindo os olhos marejados.

- Seis. – Repetiu o que todos disseram anteriormente. – Você gritava muito, dizia coisas sem sentido e se debatia. Tivemos que sedá-lo.

- Como ontem? – Indaguei irônico e ele assentiu. – E por quanto tempo eu estou aqui... De verdade?

- Irá completar três anos semana que vem. – Respondeu, se aproximando e me fazendo caminhar até a porta.

Três anos.

Se o que ele dizia era verdade, eu estava preso dentro da minha mente há muito tempo. Três anos não eram seis dias, se o mundo é capaz de se extinguir em um segundo, todo esse tempo fazia uma diferença enorme na minha vida, em que não sabia diferenciar o que era real e o que era parte da minha imaginação. Fiquei tão assustado que não percebi que saímos do quarto, meus pés descalços tocavam o chão cinzento e frio, mas meu corpo parecia alheio a qualquer intervenção do espaço a minha volta.

Olhei para o corredor e vi outros enfermeiros carregando pacientes inexpressivos, eles pareciam cascas vazias a procura de uma alma, ou uma mente em busca de consciência. Eu deveria estar no mesmo estado que eles, talvez pior já que acreditava que o enfermeiro era meu melhor amigo e que meu amante era o irmão da minha noiva.

BaekHyun... Ele também fazia parte de uma alucinação?

Continuei andando com SuHo que me levava para outra ala do hospital, ele até disse alguma coisa que passou desapercebida diante da confusão em que me encontrava, deveria estar explicando aonde estava me levando. Só parei quando chegamos a um enorme banheiro – coletivo pela quantidade de divisões e chuveiros – que estava vazio naquele horário, ele me encaminhou até um dos chuveiros, tirando minha roupa sem muito esforço. Eu me comportava igual a uma marionete, que obedecia todos os comandos de seu criador.

Em poucos minutos me vi nu, mas não sentia vergonha. Chorava tanto que não restava espaço para outro sentimento além da dor, da revolta e do medo que arrebatava e quase me fez desabar com o contato da água morna. Não relaxei em um momento sequer, enquanto JoonMyun pacientemente me lavava, meus cabelos grudavam na testa e só então reparei em como eles estava compridos.

- Pare. – Pedi. – Eu não estou doente e muito menos sou louco.

- Eu sei. – Respondeu. Seus dedos faziam uma leve massagem em minha cabeça, me encolhi tanto que ele conseguia fazer seu trabalho tranquilamente sendo que eu era mais alto. – Acredite, você ter a mínima noção do que está acontecendo já é um avanço.

Sorri fraco, então eu não era doido segundo ele.

- O que eu sou? – Indaguei baixinho quando ele desligou o chuveiro.

- Você é o ChanYeol. – Ele disse simples, começando a me enxugar. – Nunca deu muito trabalho e eu considero um bom amigo.

Certo, eu era um cãozinho obediente e assustado. Ele me secou assim como deu banho – com toda a paciência do mundo –, depois me ajudou a vestir a roupa íntima, uma calça larga de moletom e uma camiseta simples na cor branca. Perguntei se era o uniforme do lugar e ele disse que sim, aquele tecido parecia moldado em minha pele, provavelmente por usar o uniforme por tanto tempo. Também escovei os dentes e tirei o gosto ruim de remédio da boca.

- Você vai voltar para o seu quarto agora, irei pedir outra refeição. – Lembrou-se do meu pequeno escândalo com a sopa. – Está com fome?

- Sim. – Disse monossilábico.

Ouvi o suspiro profundo que ele soltou, com certeza desacostumado com a minha apatia, mas não conseguia reagir de outra maneira. Novamente voltamos a caminhar pelos corredores do hospital, era uma grande construção pelo pouco que reparava, atravessamos um jardim bem cuidado antes de chegar à área onde os dormitórios deveriam ficar.

- Que lugar é esse? – Parecia mais um internato do que um hospital.

- É um hospital psiquiátrico. – Disse enquanto ainda me guiava. – Temos o prédio principal que era onde você estava, o dormitório dos funcionários e o dormitório dos internos. – Explicou.

SuHo me levou até o quarto, o dormitório era grande mas estava vazio naquele horário, pelo menos eu não vi ninguém ali. Acho que ele percebeu minha curiosidade, pois informou que os outros pacientes daquele setor estavam na sala de artes ou no jardim, acompanhados por outros enfermeiros. Pelo jeito o lugar era realmente grande, pela quantidade de enfermeiros e médicos, deveria ser o melhor do país naquele tipo de tratamento. “Não, se fosse já estaria curado”, pensei ao adentrar o meu quarto.

Frio e solitário.

Era praticamente um espaço vazio, não existia vida ali. Uma cama, uma mesinha de cabeceira e uma escrivaninha com alguns livros em cima, tudo branco e um pouco desgastado. Segundo SuHo me disse, Kai dormia no quarto da frente e durante a noite ele costumava invadir o meu quarto quando estava sem sono, acabei rindo fraco porque ele era exatamente igual ao Kai criado por minha mente doente.

- O que ele tem? – Acabei perguntando por curiosidade, ele parecia normal quando o vi.

Eu também achava que eu fosse normal...

- Transtorno bipolar. – Respondeu, mas pelo que eu sabia não era caso para internação.

- É tão grave assim? – Kai estava ótimo para continuar naquele lugar.

- A família optou por deixá-lo internado. – Pude notar o tom de voz triste. – Não conseguiam lidar com as mudanças bruscas de humor, mas não seria necessário mantê-lo preso aqui.

Assenti, imaginando se minha família estava fazendo o mesmo comigo. Me deixando preso ali longe da sociedade, longe de correr o risco de me comportar de forma estranha em algum jantar, assustar uma prima distante com os meus delírios ou abraçar o carteiro achando que éramos noivos.

- SeHun e LuHan também são frutos da minha ilusão? – Kai mencionou o nome deles na conversa, talvez trabalhassem no hospital...

- Não, estão internados aqui. – Informou. – Eles são um casal, você dizia que o LuHan era chefe de cozinha e ele sempre sorria tímido ao ouvir isso. – Comentou e vagamente me lembrei de alguma conversa com ele em um jardim.

- E a YunHa? – Perguntei desejando que ela estivesse bem, sua memória era dos meus momentos de sanidade.

- Ela era sua noiva antes de você ser internado. – Suspirou, indo até o banheiro e voltando com um pente em mãos.

Não perguntei mais nada, aparentemente ele preferia não tocar naquele assunto porque ficou sério de repente. Tudo envolvendo minha noiva e seu irmão – que eu já não sabia se era irmão de fato – era dado como um assunto proibido. Não insisti e não perguntei sobre BaekHyun, apenas fechei os olhos concentrado em minha dor. Não era uma dor física, era um sentimento ruim, quase uma tortura mental diante de tudo que vivi naquele dia. SuHo respeitou o meu momento, passou a pentear meus cabelos sem perguntar o motivo do meu silêncio, deveria ser óbvio o quanto estava abalado.

Em algum piscar de olhos ele saiu, voltando minutos depois com outro prato de sopa. Dessa vez comi tudo sem reclamar, estava até gostoso e me esquentava por dentro, também tomei o suco – junto com o remédio – e de sobremesa consegui comer metade de uma maça. Na verdade tinha medo de vomitar tudo que ingeria, mas estava tão acostumado com aquele remédio que logo seu efeito me deixava mais calmo e relaxado, antes de dormir novamente conversei um pouco com SuHo, deixando ele assegurado de que eu não iria fazer nenhuma besteira.

Depois disso ele me deixou sozinho com os meus pensamentos, mas estava tão confuso que evitei pensar muito. Apenas fechei os olhos e fiquei ali no silêncio, admirando o teto e vez ou outra olhando pela janela que não existia em todos os quartos, meu melhor amigo disse que eu não tentava fugir de noite como outros pacientes. Fiz mais duas refeições naquele dia, quando SuHo veio me trazer um copo de leite e me desejar boa noite fiz um pequeno pedido:

- Pode me trazer um espelho?

- Claro, irei buscar. – Acatou solidário, não demorando muito para voltar.

Entreguei o copo de leite já vazio, pegando o espelho de suas mãos e respirando fundo antes de encarar meu reflexo.

- Pode olhar. – Ele riu notando meu nervosismo.

Fiz o que SuHo mandou.

Eu estava mais magro, um pouco pálido e com olheiras. Não existia nenhum corte em meu rosto, muito menos sinais agressivos pela passagem de tempo, diria até que era o mesmo de antes se não fosse pelas marcas que o espelho não revelava. Minha alma estava cansada, como se não conseguisse juntar mais forças para habitar aquele corpo débil e controlar a mente dispersa. Duvidava até mesmo da minha respiração ser real, daquele lugar realmente existir ou ser outro truque e não passar de mais uma alucinação.

Entreguei o espelho disposto a dormir para nunca mais acordar, disse um “boa noite” fraco e ouvi SuHo abandonar o quarto em poucos segundos, como se evitasse fazer barulho para não atrapalhar ou coisa parecida. Ele não atrapalhava, pelo contrário, se não fosse por ele teria sido sedado novamente porque não aguentaria lidar com tudo sozinho.

-

Dormi por algumas horas, quando abri os olhos novamente suava frio devido ao pesadelo que tive. Não vi muita coisa, apenas sangue e uma imagem distorcida, mas senti como se revivesse a cena do atropelamento que não sabia se aconteceu de fato. Minha boca estava seca e resolvi procurar um bebedouro, levantei e então calcei meus chinelos, o quarto estava quentinho e senti um leve arrepio ao me deparar com o corredor vazio, todos aparentemente estavam dormindo.

Pelo jeito estava com sorte, o dormitório estava aberto e pude sair sem ser notado por algum funcionário de plantão. Lembrei de ter visto um bebedouro no prédio onde estava internado antes, talvez conseguisse chegar até lá sem ninguém perceber que minha cama estava vazia, seria rápido e não era como se eu quisesse fugir daquele lugar.

Porém, ao atravessar o jardim eu congelei.

Em um dos bancos vi a figura de alguém sentado e no mesmo instante meu coração parou de bater.

“BaekHyun”, minha mente gritou e passou a controlar minhas pernas, que se moveram pouco a pouco até estar próximo o suficiente para ver seu rosto.

Era ele, o meu anjo.

O luar parecia cobrir seu corpo como um manto, estava mais bonito do que lembrava e cogitei a hipótese de ser um sonho, se não fosse pelo seu perfume quase me inebriando novamente diria que sim, que era o mais doce dos sonhos. Quando ele notou minha presença se levantou e pude observá-lo melhor, tentando gravar cada característica e cada detalhe para nunca mais esquecer caso o tirassem de mim novamente.

Meu coração estava tão descompassado que temi desmaiar antes que pudesse tocá-lo, queria gritar e ao mesmo tempo não dizer nada, me concentrando apenas na visão mais linda entre todas as belezas do mundo. Ele não me reprimiu quando as pontas de meus dedos longos tocaram sua bochecha, apenas me encarou esperando meu próximo movimento. Queria beijá-lo, sentir seu corpo em meus braços e contar tudo que estava acontecendo comigo e também pedir uma explicação.

Meu desespero era palpável e ele claramente percebeu, levando sua mão direita até a minha e afastando o toque, para depois segurá-la em um gesto que dizia “eu estou aqui” e que me acalmava. Sorri diante de sua imagem bonita, ele também sorriu e continuou em silêncio.

- Achei que você não viria. – Fui o primeiro a falar.

- Você precisava de mim, não tinha como deixá-lo sozinho. – Disse calmo, eu sentia falta da sua voz.

- Está tudo tão confuso... – Minha voz não demonstrava nada além de agonia.

- Eu sei, mas logo irá passar. – Ele me confortou, passando os braços pela minha cintura em um abraço carinhoso. – Agora volte a dormir. – Pediu.

Um pedido tão sincero que prontamente obedeci.

Logo me vi deitado novamente, seu olhar pesava sobre mim e com isso o sono veio como um bom amigo abraçando meu corpo e mente. Sorri antes de fechar os olhos com a visão do meu anjo da guarda, porque mesmo que BaekHyun fosse apenas criado por minha imaginação estava feliz. Quando fechasse os olhos poderia vê-lo novamente, amá-lo como das outras vezes, sentir sua pele grudada na minha, seu sorriso fraco após chegarmos ao nosso limite e por fim sentir seu abraço quando tudo acabasse.

Então compreendi que nosso amor era algo celestial quando ouvi sua doce voz, cantando a mesma melodia suave que me guiava para o mundo incerto dos sonhos, em que nós poderíamos ser felizes.

-

“Mesmo se eu tivesse perdido a vida eterna...

A razão pela qual estou feliz é porque o meu para sempre é você agora.

Eterno amor.”

-



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