História Reasons (HIATUS) - Começando "bem"

Norte de Nova Iorque - 10:48a.m

Se tem uma coisa que eu sempre prezei foi a minha individualidade, mesmo que eu não goste mais de ficar o tempo todo sozinha como antes. Isso pode soar contraditório e estranho, eu sei, mas se pararem para analisar não é. Eu gosto de estar sozinha e ter privacidade na minha vida, mas não de ser sozinha, tem uma diferença absurda entre as duas coisas.

Mesmo que agora eu tenha um lugar para chamar de meu, ou seja, o QG dos Vingadores — onde alguns deles já estão de mala e cuia —, eu ainda preferi me instalar no meu novo e humilde apartamento mesmo sendo convidada a permanecer na base. 

Por sorte meu novo prédio fica num bairro consideravelmente próximo ao complexo, e com isso eu não gasto tanto tempo/combustível para fazer o trajeto de cada dia e de quebra ainda não enfrento congestionamento. Não cheguei um único dia atrasada aos compromissos diários da nova agenda da equipe, o que tem me deixado muito satisfeita comigo mesma.

Tem sido uma correria danada nos últimos três meses, estes que se iniciaram mais especificamente quatro dias depois de Bucky e Fury partirem pra Europa. Eu levei quatro dias para encontrar o apartamento perfeito para mim, mas quando isso aconteceu fechei o negócio sem pensar duas vezes; ele é bem menor e menos luxuoso do que o outro, mas em compensação é exatamente do jeito que eu queria. Tem um quarto bem grande, que eu decorei com móveis escuros e alguns puffs coloridos; sala e cozinha em um único cômodo, separados apenas por uma bancada que também serve de mesa; uma área de serviço no final do pequeno corredor do quarto e um banheiro social nem pequeno nem grande, além do banheiro da suíte — que têm até uma banheira de hidromassagem, acreditam? 

Eu realmente não poderia ter encontrado um cafofo melhor, e quando o Bucky voltar da missão vou insistir quantas vezes forem necessárias para que ele venha morar comigo. Qual é, teremos uma banheira, a cama de casal que eu providenciei, estaremos perto do complexo e vamos ter privacidade, então não entendo porque raios ele disse aquele "não" quando eu expus a ideia de juntarmos nossos trapos. 

Se for por medo do que os vizinhos vão pensar quando ouvirem as nossas putarias eu diria que é uma preocupação inútil, pois na base vai ser muito pior e mais constrangedor para nós dois. Diferentemente da Torre lá no QG os quartos são mais próximos uns dos outros, além de ter câmeras por todos os lados e muito mais pessoas circulando pra lá e pra cá o dia todo, o que acaba com as nossas possibilidades de dar uma escapadinha sem ninguém saber.

Mas é claro que não quer dizer que isso seja impossível, a Natasha e o Steve mesmo batizaram um dos chuveiros da academia esses dias — segundo uma confissão da Viúva —, além do Tony e da Ligia que volta e meia dão umas escapadas pelos lugares mais inusitados do complexo, eu mesma já flagrei algumas cenas inapropriadas de ambos. 

Ah, é, antes de prosseguir preciso comentar sobre esse assunto. Ligia agora é uma das agentes que operam na base e sim, ela e Stark estão em uma espécie de amizade colorida e bem fogosa diga-se de passagem. Tudo começou uma semana depois da inauguração do complexo, quando eu a levei para lá a fim de ajudá-la em um de seus treinamentos. 

Tony estava de bobeira e resolveu ir até a academia para treinar, deu de cara conosco e meio que se encantou de imediato pela inteligência e personalidade forte da garota. Não posso negar que no começo estranhei um pouco vê-los como "casal", assim como todos os outros, pois foi um envolvimento rápido e inusitado considerando que Ligia também é ex de Thomas e muito mais jovem que Tony, mas no fim ela acabou fazendo muito bem ao Lata Velha e foi só isso que importou. 

O que fez o enferrujado olhá-la com outros olhos foi somente o fato de a hacker o apoiar e incentivar a seguir como Homem de Ferro, coisa que Pepper não fez. Ele e Ligia estão formando um casal muito bonito e estão felizes juntos, nunca achei que fosse dizer isso mas Stark finalmente parece ter achado a tampa de sua panela, e se continuar como está não tenho dúvidas de que esse relacionamento vai longe.

Bom, mas agora voltando ao que eu estava falando sobre...

— DROGA! — gritei voltando bruscamente para a realidade e afundei o pé no freio para não bater num dos vários carros engavetados a minha frente. De tão distraída que fiquei pensando em todas aquelas coisas nem reparei no caos do trânsito, não sei como consegui dirigir até aqui sem prestar atenção no que acontecia.

Tirei o cinto, catei meu coldre com armas do banco e saltei para fora do veículo apressada, correndo por entre os carros e pessoas para ver o que raios tinha causado aquele engavetamento. 

Espero que não seja nenhum lagarto gigante ou outra criatura humanoide, eu não estou preparada pra um evento desse nível hoje. 

— Saiam da frente! — eu exbravejei a medida em que passava pelos civis alvoroçados — Voltem pros seus carros!

Depois de alguns minutos pulando carros e bem dizer atropelando as pessoas do meu caminho finalmente cheguei ao fim da longa fila, e a cena que visualizei no meio da avenida não foi algo que estou acostumada a ver todos os dias. Vejam bem, como Vingadora e ex-agente da SHIELD eu me acostumei a situações extremas e presenciei incontáveis cenas chocantes, mas nenhuma igual essa de agora. Quando me deparei com esse engavetamento o que eu imaginei foi que algum acidente tivesse causado isso, ou algum assalto no início da via talvez, mas não que houvesse uma verdadeira carnificina ocorrendo ali.

Sim, a cena que me surpreendeu foi uma carnificina, uma sangria desatada em pleno centro da principal Avenida dessa região, aparentemente causada pelo maluco num traje vermelho e preto com duas katanas nas costas que no momento da minha chegada se encontrava batendo em um outro cara a uns 10 metros da minha posição. 

Com uma carranca de raiva eu retirei uma arma do coldre e comecei a caminhar pelos corpos — e pedaços de corpos — para chegar até eles, e por estar distraído gritando e espancando o homem de diferentes maneiras o maluco de vermelho não viu minha aproximação. No momento em que cheguei a uma distância considerável deles o cara que apanhava foi jogado contra a mureta lateral da pista e o outro simplesmente fincou uma de suas katanas no peito dele, o deixando pregado contra o concreto como se fosse um espetinho.

Minha Nossa Senhora Das Coisas Bizarras que Eu Ainda Não Presenciei, que merda é essa? — pensei ao parar atrás deles, porém o que saiu pela minha boca foi algo bem mais idiota do que eu previa:

— Ei, vocês! Parados aí se não eu atiro!

Mas que droga, Lewis. A vida inteira fazendo abordagens e prisões pra chegar e dizer isso? O que vão pensar de você?

— Ah, não! Mas que caralho! — o assassino do traje rosnou se virando para mim, e sua voz me fez armar uma careta ainda mais espantada — Que merda você tá fazendo aqui, mulher? Esse é o meu momento, porra, e tudo o que eu pedi foi pra não aparecer uma Vingadora gostosa pra roubar a minha cena! Se pelo menos fosse a Viúva Negra eu ainda podia relevar porque estaria realizando um sonho, mas você eu já conheço e por isso não tem aquela magia toda! Merda! E isso tudo é culpa sua seu filho da puta! — finalizou chutando a barriga do outro homem.

— Wade? É você? — questionei com a voz tão perplexa quanto minha cara, mas já tinha certeza que era ele. Quem mais falaria isso tudo em menos de um minuto e teria tanta facilidade para matar todos esses caras? Eu devia ter suspeitado desde o princípio. — O que diabos você pensa que tá fazendo, seu desgraçado? E por que matou esse...

Parei de falar e soltei um "argh" quando olhei para o homem careca pregado na mureta. Jesus, ele estava super vivo e não parecia estar sentindo nenhum incômodo com a katana enfiada bem no meio de seu peito, estava inclusive sorrindo de um jeito malicioso para mim.

— Eu ainda não matei esse merda, alguém me interrompeu na hora em que eu estava prestes a fazer isso. — Wade respondeu como se fosse óbvio, se afastando do careca e vindo até mim — E faz o favor de abaixar essa porra porque se você não percebeu eu já tô todo arrombado de bala, então não vai ser um tiro seu que vai me matar ou me parar.

Somente depois dessa observação foi que eu reparei nos vários furos em seu corpo. Um no antebraço esquerdo, dois na altura do abdômen, um na coxa direita e dois no peito, todos recentes. Quase involuntariamente eu fui abaixando a arma e deixando uma expressão de espanto dominar meu rosto, imaginando como caralhos ele ainda estava de pé após tantos tiros que deveriam tê-lo matado.

— Ok, eu vou perguntar uma única vez — pronunciei depois de respirar fundo, voltando a olhar para seu rosto coberto pela máscara —, o que é tudo isso e o que aconteceu com você pra não ter morrido? Virou mutante ou recebeu alguma entidade pra te proteger?

Enquanto eu fazia essas perguntas Wade pegou uma pedra e lançou na cabeça de sua "vítima", que soltou uma risada abafada ao ser atingido e novamente não demonstrou dor. Isso está cada vez mais estranho, acho que terei de marcar uma consulta extra com o Robert depois dessa manhã. 

— Você quer mesmo saber essa porra toda? Ok, espero que não tenha comido muito no café da manhã, ver uma pessoa vomitando na minha frente vai ser demais pro meu estômago. — o mercenário respondeu, parando na minha frente e puxando sua máscara. Ergueu o tecido vermelho até o alto da cabeça e gritou "buh" quando seu rosto ficou todo à mostra, no entanto minha reação não foi exatamente de susto.

Levei uma mão à boca e abafei o grito que quis escapar quando meus olhos focalizaram seu rosto desfigurado. Ele continuou por alguns segundos com a máscara erguida, fazendo caretas diante do meu espanto como se quisesse me assustar, o que só pra deixar claro não ia dar certo. Eu não me assustei de ver como ele estava, somente fiquei em choque porque no nosso último encontro ele estava com a aparência de um homem normal — e muito atraente, confesso —, e agora, vê-lo desse jeito, depois de ter transado com ele, deu um nó no meu cérebro e no meu estômago.

Será possível que eu estava tão bêbada naquela noite pra não ter reparado nisso, meu pai? — argumentei comigo mesma, olhando cada detalhe de seu rosto para tentar lembrar como era sua antiga aparência — Não, quando ele chegou no bar eu ainda não estava bêbada, e tenho certeza que ele não estava desfigurado desse jeito. 

— Deus do céu, Wade! O que foi que aconteceu com você? — eu questionei por fim, ele colocou a máscara de novo e apontou na direção do careca.

— Foi tudo culpa desse arrombado com nome de sabão em pó! Eu descobri um câncer um mês depois daquela nossa noite, e ele me enganou dizendo que podia me curar pra depois fazer essa merda comigo, aí quando eu finalmente o encontro pra saber como reverter essa porcaria você aparece pra interromper o meu interrogatório! — olhei para o homem de cenho franzido, como se quisesse uma explicação de sua parte, o vendo revirar os olhos e mover a cabeça pro lado. 

— Eu te tornei imortal, seu imbecil. Você devia me agradecer em vez de estar querendo vingança.

Imortal? Céus, como assim? Então se eu arrancar a cabeça dele, ele não morre?

— CALA A BOCA, AJAX! — Wilson berrou indo até ele e desferindo socos em seu rosto, enquanto eu fiquei parada no lugar sem saber o que fazer. — Graças a você eu nunca mais vou pegar nenhuma mulher gostosa, seu filho da puta maldito! De que adianta ser imortal se eu vou ter que bater punheta e me contentar com as mulheres feias que não se importam com aparência?

Ok, se eu me intrometer nessa briga das duas, uma: ou vai ser pra pôr a prova essa imortalidade do Wade e arrastá-lo ao QG pra se explicar com os outros Vingadores por esse circo todo, ou vai ser pra afastá-lo desse tal Ajax e perguntar o que diabos ele fez para deixar o pobre infeliz com essa aparência terrível e também de onde surgiu esse nome de marca de desinfetante.

Enquanto eu pensava se me intrometia ou não nesse duelo meu celular começou a tocar no bolso da minha calça, e com isso eu guardei a arma no coldre e o peguei para ver quem estava me ligando. Sorri de orelha a orelha ao ver a foto de Barnes no identificador de chamada, e sem pensar duas vezes ignorei a bagunça ao meu redor para atendê-lo como devia.

— Oi, Soldado. Achei que não me ligaria tão cedo depois da nossa última conversa. Ficou com saudade da minha voz?

Uma risada rouca escapou de sua garganta do outro lado, e mesmo sem vê-lo tenho certeza de que ele estava com um sorriso de canto de boca e algum pensamento inapropriado sobre a minha pergunta.

— Sim, principalmente de ouvir você gemendo no meu ouvido e pedindo pra eu ir mais forte. — respondeu maliciosamente, mordi o lábio inferior e fechei os olhos. Não falei? É sempre assim, esse safado joga uma provocação diferente em todas as nossas conversas. — Você tá em missão? Que gritos são esses aí?

Precisei abrir novamente os olhos e fitar a cena ao meu redor para lembrar o que estava acontecendo. Por um segundo eu desejei imensamente estar sozinha no meu apê para poder falar com Bucky sem interrupções e retribuir suas frases pervertidas como sempre faço, mas como minha sorte é desgraçada é lógico que isso não seria possível. Faziam quase dez dias que não nos falávamos, pois James não tem tido tempo de me ligar com tanta frequência ultimamente, e quando pode me ligar ou eu estou ocupada e não posso atender ou estou tão cansada que durmo no meio da conversa, então já dá pra imaginar como temos falado pouco né?

— Não, eu não tô em missão... — respondi após um pigarro, ele murmurou um "ah" —, só tô com um probleminha pra resolver aqui no caminho da base, mas nada que vá interromper nossa conversa. E então, por que você me ligou? Alguma novidade aí? 

Como eu disse, não ia deixar a briga na rodovia atrapalhar a nossa conversa. Coloquei meus fones de ouvido e guardei o celular no bolso enquanto voltava para perto deles, ouvindo a resposta de James a medida que me colocava em movimento:

— Sim, nós localizamos o cetro do Loki. Fury vai fazer contato com vocês ainda hoje pra informar a localização.

Senti um enorme alívio com essa informação, pois a tempos estávamos preocupados em descobrir onde estava esse bendito cetro para tira-lo das mãos de Strucker — sabe-se Deus o que ele pode fazer com aquela coisa, né? —, mas essa sensação de tranquilidade se foi tão rápido quanto veio. Tudo porque Wade ainda estava lá batendo no careca, e gritando como um verdadeiro doente cada vez que o golpeava.

— Seu fodido do caralho! Eu quero que você me diga agora como reverter isso! Eu quero continuar bonitão igual o Wolverine continuou!

Revirei os olhos e tirei os fones dos ouvidos. Isso já me cansou e acabou com a minha paciência, que já não estava muito boa por eu ter caído da cama quando acordei de manhã. Peguei o celular e coloquei Bucky em modo de espera, ligando para a central do complexo em seguida. Wilson parou o que fazia e assim como Ajax ficou me encarando em silêncio enquanto eu falava duramente no telefone:

— JARVIS, mande a Legião de Ferro pra minha localização agora mesmo! E avise a Hill que há uma ocorrência nível 7 aqui, sem vítimas civis mas precisando de assistência médica e policial.

— Entendido, senhorita Lewis. A Legião de Ferro já está a caminho, informarei imediatamente a senhorita Hill sobre a ocorrência. — o sistema de inteligência respondeu ao mesmo tempo que o mercenário tagarela soltou um de seus comentários e veio na minha direção:

— Legião de Ferro? Por acaso é coisa do Tony Stark? Eu sou fã desse cara, pegar todas as gostosas da playboy e ficar sexy numa armadura grotesca não é pra qualquer um.

Revirei os olhos e não o respondi. Destinei minha atenção a recuperar a chamada do ex-Hidra, por sorte ele ainda não tinha desligado e aguardava uma resposta minha.

— É a melhor notícia que eu poderia ter recebido agora. Bom trabalho, Soldado, eu sabia que vocês não iam demorar pra descobrir isso. E me desculpa por te colocar em espera, como falei tô com um pequeno problema aqui e não tô podendo te dar a atenção que gostaria.

— Você tá bem? Que problema é esse? Os outros não estão aí com você? — ele indagou transparecendo preocupação. 

Sorri com seu jeito de falar e me preparei para tranquilizá-lo, no entanto fui impedida de prosseguir graças ao fato ocorrido em seguida.

— Ah, não, porra! Volta aqui seu filho de uma égua! — Wade gritou quando sua "vítima" retirou a katana do peito e pulou do viaduto, mas antes de ir atrás ele virou-se para mim e soltou: — Me desculpa por ir embora antes da chegada dos seus amiguinhos, mas eu preciso pegar aquele lixo e não tô afim de ser preso hoje. Foi um prazer rever você depois daquela noite, e fico feliz que tenha ficado tudo bem com o soldado gostosão. Ele tem cara de quem faz uma mulher gozar mais de cinco vezes numa só foda, fico até duro de imaginar como seria participar de um ménage com vocês dois... mas enfim, fui. Manda lembranças minhas a todos os seus amigos fodões, ok?

Não consegui respondê-lo e nem sequer me mover para impedir que ele pulasse do viaduto atrás do careca, pois fiquei aturdida demais pra realizar qualquer ação depois de presenciar todas essas coisas num espaço de tempo tão curto.

— Lewis? O que aconteceu? Hey? — Barnes apressou-se em perguntar do outro lado, pisquei repetidas vezes e assenti com a cabeça, mesmo ele não podendo ver.

— Foi mal, é só que... — bufei e passei uma mão pela cabeça — O Steve vai me matar. Ocorreu uma chacina aqui numa via perto do QG e eu acabei de deixar o assassino fugir, e o pior é que eu conheço o desgraçado e mesmo que quisesse não ia conseguir impedi-lo.

Um breve silêncio se instalou entre nós, onde eu só consegui ouvir a respiração alterada do Soldado. Enquanto ele pensava no que dizer, eu fui até a mureta do viaduto e peguei a katana que Wilson deixou para trás, a mesma que estava fazendo espetinho do tal Ajax.

— Como assim você conhece o assassino? — o ex-Hidra, enfim, voltou a soltar a voz.

Dei um suspiro pesado e me coloquei em movimento na direção dos veículos engavetados. Não tinha razões para eu permanecer ali, o jeito era voltar para o meu carro e pegar outro caminho até a base já que este estava comprometido e pelo visto ia demorar a ser liberado. A NYPD que cuidasse da bagunça que aquele traste causou.

— Wade Wilson. — eu revelei apenas, ouvindo a respiração dele se tornar inaudível por cerca de um segundo — Não precisa nem dizer o que você tá pensando, não é nada disso.

— Você não sabe o que eu tô pensando. — retrucou com azedume, ri pelo nariz.

— É claro que eu sei, seu tom de voz e sua respiração estão transparecendo os seus pensamentos. Você deve estar se perguntando como e por que eu me encontrei com ele, e depois de eu ter dito que o "deixei" fugir deve estar pensando que foi de propósito por eu ter algum sentimento por ele. — falei tudo com a maior calma do mundo, mesmo estando uma pilha por dentro. Não por medo de brigar com James, mas sim pensando no sermão que ouviria de Steve quando contasse sobre esse incidente. 

— Eu não pensei que você deixou ele fugir de propósito, sei que jamais faria algo desse tipo. — retorquiu do outro lado, sua voz ácida mas ao mesmo tempo tranquilizante — Mas agora preciso desligar, tô muito cansado e vou tentar dormir um pouco. Se cuida.

Me controlei para não me exaltar e pedir pra ele continuar falando comigo até resolvermos tudo isso, pois no fundo eu senti que ele estava mesmo cansado e não queria estressá-lo com uma DR desnecessaria. Seria melhor resolver isso quando nós dois estivéssemos mais calmos, portanto me dignei a dar somente a seguinte resposta antes de finalizar a ligação:

— Ok, vai descansar. E se cuida aí também.

Ao tirar o celular da orelha, soltei um grunhido de raiva e atirei o aparelho com toda força contra um dos vários carros batidos, assustando dois homens que conversavam perto dali e me olharam torto pela atitude. Mas fazer o quê? Era isso ou socar a cara de alguém, e como a segunda opção seria impossível já que a pessoa cuja cara eu queria socar estava longe — Wade, por ter feito tudo isso e causado a discórdia entre Barnes e eu outra vez —, o que me restou foi imaginá-lo no lugar do meu iPhone e descontar essa raiva no objeto.

Olhei para os dois civis com a maior cara de paisagem do mundo e voltei a caminhar tranquila na direção do meu possante, segurando a katana firme entre os dedos e atraindo olhares assustados das pessoas pelo caminho por estar carregando tal arma. Se elas estavam imaginando que eu iria decapitá-las com aquela lâmina afiada eu não fazia ideia, mas também não me importei em tentar tranquilizá-las. Foi até bom o Wilson ter deixado essa coisa pra trás, agora ela é minha e eu poderei treinar minhas habilidades com uma arma diferente das que estou acostumada a usar.

Quando cheguei ao meu lindo Camry me joguei no banco do motorista, colocando a katana cuidadosamente nos bancos de trás para não danificar nada, e dei a ré após ligá-lo até ter espaço suficiente para fazer uma manobra e me colocar em sentido contrário na pista, em direção ao começo da rodovia.

Esse dia, definitivamente, começou muito bem. Só que não. Primeiro, aquele pesadelo que me acordou de uma das minhas melhores noites de sono dos últimos dias e ainda me fez cair da cama; depois o leite estragado no meu café e as panquecas que ficaram queimadas; e pra fechar com chave de ouro o reencontro com esse traste e esse desentendimento com o ex-Hidra.

Por Deus, eu jurava que o meu azar tinha ficado pra trás, pois nesses três meses deu praticamente tudo certo pra mim, mas pelo visto ele estava só tirando férias e resolveu voltar a minha vida justo no dia de hoje.