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História Recanto - Capítulo Único


Escrita por: _wagner

Capítulo 1 - Capítulo Único


Fanfic / Fanfiction Recanto - Capítulo Único

"Nada é permanente, exceto a mudança" - Heráclito.

 

No instante em que ela disse que eu precisava ser forte, eu fechei os olhos. Simplesmente porque não queria rir escandalosamente, logo na frente dela. É até engraçado que quando o cinismo se torna algo tão recorrente na nossa vida, nós passamos a reconhecê-lo de longe.

Acontece que para sermos fortes de verdade, nos prepararmos psicologicamente para o que vai acontecer, é preciso ter tempo. É preciso ter mais de uma pessoa na sala de espera. É preciso ter vontade de continuar mesmo depois de ver a cara dos cirurgiões. E é preciso, mais do que tudo, olhar bem o rosto da pessoa que te colocou no mundo e não dizer que você já está pronto para morrer.

Foi por isso que eu fugi.

Burlei descaradamente a regra mais importante desde que o tratamento começou: fazer esforço. No fundo eu bem sabia que os exageros dos médicos eram apenas isso. Exageros. Nada passava de uma preocupação excessiva de que eu fosse me machucar outra vez.

"Charlie caiu mais uma vez das escadas".

"Para onde ela pensa que vai por pensar que sequer tem autorização para sair da cama?".

"Charlie não receberá visitas hoje, ela esfolou o joelho tentando ir ao banheiro sozinha outra vez".

Nossos limites estão apenas dentro de nossas cabeças. O corpo pode estar maltratado, mas a mente permanece jovem como uma criança que teve seu primeiro dia de aula no jardim de infância. Não é preciso um grande vigor para entender isso.

Fiquei sentada tanto tempo, ouvindo de todos eles que eu jamais teria uma vida normal, que nunca sairia daquele quarto; que me esqueci completamente de ser apenas eu. É como dizem: eu já não tenho muito tempo. Posso morrer hoje à noite, amanhã ou agora mesmo. Portanto, por que devo ficar trancafiada dentro de um quarto de hospital até o fim dos meus dias? Sem sorrir?

Eu não preciso de muita coisa para dar um sorrio. Sou uma pessoa simples. Sentir a areia da praia como faço agora, estremecer com o tocar congelante do oceano nas minhas pernas ou ainda respirar o ar salgado da praia é o suficiente para me fazer esquecer a condição terminal em que me encontro. Nada demais, mas muito difícil de se conseguir.

Quero apenas aproveitar o momento, já que o não-pensar sobre a consequente preocupação de minha mãe agora me faria ser preenchida até a cabeça pela culpa. Por isso, levanto o rosto para cima no intuito de sentir o queimar do sol diurno.

–– O que você tá fazendo?

Há alguma coisa bloqueando os raios solares, os impedindo de vir diretamente até mim. Assim, abro os olhos em busca de entender o que está acontecendo. Não consigo acreditar no fato de haver um garoto me olhando estranho, enquanto entorta a cabeça de maneira esquisita e franze o cenho. Estou sentada, e ele está atrás de mim, me observando de cima.

Faz alguns anos desde a última vez em que vi um garoto. Faz ainda mais tempo que não falo com um. Não sei o que dizer.

Aja naturalmente.

O que uma pessoa normal faria numa hora dessas?

–– O quê? –– finjo não ter ouvido sua pergunta. Acho que o deixo mais curioso e confuso, já que ele levanta as sobrancelhas. É engraçado vê-lo assim, principalmente se levar em consideração o tempo que fiquei sem conhecer alguém tão próximo da minha idade. –– O que você disse?

O garoto não responde, mas sai de trás de mim, ficando ao meu lado, em pé.

–– Perguntei o que cê tá fazendo. –– responde, grunhindo no final da sentença como uma criancinha mimada, após o sermão de uma mãe.

É inacreditável. Esperei tanto tempo para ter a chance de conversar com alguém que não fosse minha mãe ou que estivesse vestindo jaleco, que me esqueci da probabilidade de encontrar uma pessoa abusada para conversar.

Mas que escolho tenho? Temo que seja minha única chance de falar com alguém normal de novo. Alguém diferente de mim.

Agora, o garoto continua me olhando, contudo, sem portar uma expressão certa. Seus olhos parecem travar uma grande batalha para se manter sãos, pois vejo resquícios de lágrimas. Ainda assim, as íris são linhas tênues entre o castanho escuro e o verde oliva, sob as luzes florescentes dos raios do sol.

Ele é bem bonito.

Quando olha para minha roupa, mordo parte do lábio inferior. Ele deve estar se perguntando quem é a maluca sentada no meio da praia, com uma camisola hospitalar – daquelas que você vê pacientes usando após sair da sala de cirurgia.

–– Eu fugi do meu quarto de hospital. –– declaro em voz alta para que o garoto possa ouvir. Ele só assente para mim. E funga, com as vias nasais claramente congestionadas.

Já estou acostumada a ver pessoas chorando. Lá no hospital, quando mamãe estava adormecida na cadeira ao lado da minha cama, eu me levantava furtivamente e abria as persianas das janelas que davam para o corredor, em busca de assistir ao sofrimento alheio. Pode parecer até meio doentio, entretanto, é bom ver que você não é o único que está na pior; por um fio.

Por isso, por toda essa naturalidade a qual eu já havia sido exposta há tanto tempo, não esboço reação alguma ao ver que o garoto prende um enorme soluço no peito. Só que ele está aqui agora, falando comigo. Foi ele quem puxou assunto, então deve estar querendo alguma coisa – nem que seja companhia. Sendo assim, o jovem ao meu lado não se atreverá – penso eu – a despejar a choradeira na minha presença.

Não que eu fosse me importar se ele o fizesse. Sou sempre passional quando se deve ser.

–– E por que fez isso? A comida lá era muito ruim ou tinha algum enfermeiro tarado te cantando? –– as perguntas saem tão naturais da boca dele que não sei ao certo se eu deveria achar engraçado. Eu deveria?

–– Porque eu não queria morrer lá dentro, com a minha mãe assistindo o meu sofrimento e tudo mais. É muito drama. É até meio clichê de se dizer.

–– Então você vai morrer? –– fala para si mesmo, talvez tentando se convencer do que acabou de ouvir. –– Legal.

Contenho o impulso de rir pondo a mão na boca. Acabou que não deu muito certo. Nisso, nós dois estamos rindo nesse exato instante. Nossas gargalhadas soam congênitas ao ponto de que quem nos visse de longe pensaria que éramos amigos de longa data.

Acontece que não somos. Eu não tenho ideia de quem o garoto seja.

–– Estou brincando. –– ele esclarece para mim. –– É só que nunca me deparei com uma pessoa que estivesse prestes a morrer; só com pessoas que estavam vivas e morrerem logo depois devido a um acidente de carro.

–– Deve ser difícil.

–– Não é. –– ele maneia a cabeça de forma negativa. Quando aponta para o amontoado de areia ao meu lado, eu afirmo que ele poderia se sentar ali, se realmente o quisesse. –– É só que me sinto um pouco culpado.

–– E quem não se sente? A morte é exatamente isso, o imprevisível. Uma hora ela está aqui e na outra ela leva alguém que você ama. É assim que funciona.

–– Então que bom que eu não amava a Ashley e os dois irmãos dela. Só é um pouco duro acordar todos os dias e ver os pais deles, me cumprimentando com um "Bom dia" sem saber o que eu fiz.

–– E o que você fez?

Ele pensa um pouco na resposta, eu creio, escolhendo as palavras com cautela.

–– Se eu te contar, terei de te matar. E falo sério.

–– Já que pensa assim, se quiser me contar, eu poderia te dizer antes, como desaparecer com o meu corpo sem deixar pistas. Assim, fica mais fácil para você sair ileso do local do assassinato.

Nós rimos outra vez. É boa a sensação de fazê-lo rir, pois é tão fácil! Sua boca em forma de coração se contorcendo, a gargalhada se elevando. Enquanto ele olha para frente, para o oceano, tenho tempo de avistar a barba rala que domina os cantos do rosto; e os círculos roxos ao redor dos olhos. A pele dele é pálida, parecendo lisa como porcelana ao toque – características que realçam a vermelhidão que são os lábios.

De repente, o garoto leva os dedos grandes e irregulares até os olhos, esfregando os cílios para cessar algumas lágrimas. Volta a fungar.

–– Não lembro da última vez em que ri assim. –– me confessa. Há um sorriso se escondendo por trás da carranca da depressão. De súbito, sinto uma vontade estranha de pegar uma espécie de pá imaginária e cavar toda a terra cheia de problemas e arrependimentos que cobre possíveis sorrisos naquele rosto.

–– Minha mãe sempre diz que é melhor rir do que chorar.

Ele concorda com um aceno de cabeça.

Tudo bem. Eu retiro o que disse. Ele é muito, muito bonito. Parece aqueles cochilos que a gente dá depois do almoço, para depois acordar no fim da tarde, sorrindo feito um carneiro. Esse garoto é tão bonito que é o tipo perfeito de namorado que uma patricinha gostaria de exibir para suas amiguinhas de colégio.

Subitamente, ele desvia os olhos do oceano e os foca em mim, apenas em mim. E ao trocar a mão de lugar para se sustentar na areia, um dos dedos toca o meu. É proximidade demais para tanto tempo longe, sem um contato certo com outro adolescente. Acho que gosto disso.

–– Você é estranha. –– diz. –– Muito, muito estranha.

O jeito que ele retorce o nariz me faz pensar se aquilo lhe seria uma espécie de hábito recorrente. Com a proximidade de nossos rostos, percebo que não há mais uma lágrima atrás dos olhos. As escleróticas estão limpas como o transparecer das águas de uma grande lagoa.

–– Um "estranha" bom ou ruim?

Ele sorri, o inevitável conjunto retilíneo de dentes aparecendo em consequência. Contrastam tão bem com a boca, eu penso. Que poderiam ser do mármore mais bem lapidado de todos.

–– Ambos. Não sei qual mais combina com você. É por isso que parece ter um pouco dos dois. –– e continua sorrindo como se estivéssemos numa espécie de concurso. –– Eu me chamo Aaron. Só Aaron.

–– Tudo bem, Só Aaron. –– brinco. –– Meu nome é Charlie.

E aí apertamos a mão um do outro como se não fosse nada. Acontece que é alguma coisa, eu só não sei o quê. Nossas palmas estão cheias de areia, por isso, não dá para sentir a maciez da mão dele.

–– O que está fazendo aqui nessa praia, sozinho? –– questiono, descaradamente. Aaron parece não se importar.

–– Algumas vezes na vida você só cansa. –– a carranca da depressão de repente volta ao rosto dele; solta a minha mão. –– Uma hora você acorda e percebe que as coisas não são mais como costumavam ser. E sabe qual é a pior parte disso? Quando se dá conta que não pode fazer nada a respeito.

–– O impossível é apenas uma linha tênue que se move entre as possibilidades, Aaron. –– respondo.

Sinto um gosto diferente na boca ao pronunciar o nome dele. É como se de repente esse conjunto de sílabas fosse uma palavra inédita no dicionário – tão nova que causa um calafrio gostoso do tipo "quero mais".

–– As coisas só são impossíveis se você achar que elas são. Não há nada que se quebre que você não possa consertar com alguma tentativa e esforço mínimo. –– noto que tenho a atenção dele quando me olha nos olhos. O sorriso de Aaron é desafiador, como o bote de uma cobra, mas ao mesmo tempo delicado, como pétalas vermelhas de uma rosa; na qual os espinhos formam todo o amontoado de coisas ruins que já lhe aconteceu.

Sinto algo diferente no peito. Algo como esperança, que me diz que eu poria os dedos ao redor dos espinhos dele sem hesitar. É quase um sentimento de calmaria após uma longa tempestade, junto a uma trilha sonora de Gabrielle Aplin no fundo.

–– Coisas físicas são as mais difíceis de se ajeitar. –– confesso, avistando um brilho estranho nas íris meio verde oliva meio castanho escuro. –– Mas situações? Não, essas não são. Tudo o que tem que fazer é tentar. Você deve dar tudo de si para que tudo se conserte. E se no final a vítima não aceitar seu perdão, então é porque já não está mais no seu alcance ou obrigação de fazer tudo dar certo.

–– E se quem quer se descul... Quem quer consertar for o vilão? Que...

–– E quem nunca fez mal ao próximo? –– passo a língua no lábio inferior ao ritmo em que olho as nuvens dançarem no azul límpido do céu.

Minha garganta dói a proporção que o formigamento nos dedos anelares começa, se arrastando abraço acima. Uma vertigem leve me abate, e por um minuto, juro poder ver dois coelhos no céu brincando.

Em breve não conseguirei mais mexer as pernas. E nem definir o que é real e o que não é. Os efeitos estão voltando.

–– O cardiologista do décimo andar matou uma garotinha de sete anos. Isso foi há um mês. –– digo, me referindo ao hospital de onde fugi. –– Eu lembro que quando soube do que aconteceu havia um lindo pôr do sol por entre as nuvens, que pintava manchas cor-de-rosa no céu, deixando-as amareladas. Foi uma tarde de grande comoção e choros incessantes corredor afora.

Os olhos bonitos de Aaron estão me olhando com atenção agora, porém o único ângulo para o qual suporto olhar é para cima, longe de expressões faciais humanas.

–– O tempo estava acabando, não havia sangue o suficiente, e o cirurgião já estava exausto pelos plantões que prestara ao longo da semana. Um único movimento em falso foi o suficiente para por fim à vida de uma pequena fada que mal tivera tempo de crescer e saber o que viver realmente significa.

Sinto a consistência áspera da areia seca da praia por entre os dedos, que gruda a derme. É quando as primeiras dores na lombar começam, picando minhas costas como agulhas de tricô.

–– Betty morreu com três horas de cirurgia: o doutor Charles cortou alguma parte dela que não deveria, causando uma hemorragia impossível de conter. O corpo começou a reagir mal a substâncias que nele foram injetadas depois, gerando um choque anafilático. Foi fatal para a criança. Porém, quando Charles percebeu o que tinha feito soube reconhecer que jamais poderia reparar a vida dela. E de todas as coisas que poderiam ser feitas, ele escolheu o esforço.

As órbitas dos meus olhos queimam em brasa, fervendo os globos oculares um a um. Tento respirar fundo no instante em que a bile sobe garganta acima, forçando-me a por para fora meu almoço.

Só mais um pouco. O formigamento paralisa completamente meu sentido de tato: a areia se torna nada a partir do momento em que mesmo esfregando os dedos freneticamente um no outro, a sensação é de estar tocando papel. Não sinto a areia, ou o chão, ou ainda as unhas – que prenso perigosamente sobre as veias capilares das palmas. Aguente só mais um pouco.

–– Doutor Charles escolheu se dar o esforço mínimo de tentar consertar o que não tinha solução.

–– O que ele fez? –– Aaron pergunta.

Pelo canto do olho noto que ele pressiona a mão esquerda na minha direita. Mas não sinto nada. Devo estar chorando agora também, ainda que não sinta as lágrimas nas bochechas.

–– Ele deu a ela a chance de viver novamente. –– profiro, vendo gotas pulando direto para o meu colo, gotejando pouco a pouco sobre a camisola hospitalar. –– Na memória de todos os que estavam na sala de cirurgia, Betty fora apenas mais uma vítima de erro médico. E fora apenas isso o que os pais dela viram. Porque é tudo o que o ser humano consegue enxergar no outro. Seus erros. Nem sempre somos lembrados por grandes descobertas científicas, Aaron.

No fundo da mente eu vejo uma sombra caminhando lentamente sobre as águas geladas de uma rasa lagoa, debaixo de uma brisa castigadora – que levanta a areia, fazendo-a serpentear no ar, atacando a sombra.

Eu sou a sombra.

E atrás dela há algo lhe perseguindo rapidamente, com algo afiado na mão.

Ouço o barulho de algo estalando. Minha lombar.

–– Charles se desculpou com os pais dela pelo ocorrido. Ele até foi ao enterro dela. Contudo, o que mais chamou a atenção de todos no hospital foi que ele fez daquele erro o seu último.

Meus lábios estão secos por causa do ar.

–– Charles batizou sua filha recém-nascida de Betty. E em todas as vezes em que ele a olhar se lembrará instantaneamente da paciente que matou. Meio sórdido, não? Porém ele achou um jeito de fazê-la viver mesmo estando morta.

Aaron abaixa a cabeça para encarar nossos pés, estendidos desleixados por sobre o chão de areia. Há espuma perto de nós. Água toca nossa pele no momento exato em que o sol se põe.

–– Ele encontrou um jeito de se perdoar pelo que fez. Por que você não pode tentar fazer o mesmo? –– questiono-o.

–– Porque eu não me arrependo, Charlie. Não é possível haver redenção sem arrependimento. Eu sou mal, garota. Podre por dentro.

–– Todos nós possuímos rachaduras nas extremidades. O ser humano é composto por falhas rigorosas em alguns lugares, e leves noutros. Não pode deixar que elas te quebrem por inteiro! Que encontre o pior defeito e assim derrube todo o edifício!

Ele fecha os olhos e sorri. Os lábios rosados maravilhosos contrastam perfeitamente com a protuberância que são as maçãs do rosto, formando uma expressão digna de uma fotografia.

–– E como vou saber o que fazer para que as coisas deem certo novamente? –– pergunta, levantando-se.

–– Você terá de enxergar o lado oposto ao seu. Encontre os pais da Ashley e fale o que fez com ela e os irmãos.

–– E se eles não me perdoarem? Eu não tenho trigêmeos recém-nascidos para batizar com o nome deles. –– tento rir com a piada que ele faz, entretanto, fico impassível.

–– Então pelo menos você tentou.

Já de pé ele se mostra um tremendo de um gigante, erguido por pernas finas de calcanhares musculosos – como os de um corredor de maratona. E sob um raio rosado de pôr do sol, ele sorri, banhando minha visão do céu por uma perfeição inigualável.

Imagino seu corpo desnudo na areia. Seria uma breve releitura da escultura de Michelangelo, o Davi.

–– Eu vou te ver de novo amanhã? Nesse mesmo lugar, encarando o oceano como quem deseja capturar cada detalhe numa pintura?

Há um sentimento novo que não consigo classificar na voz de Aaron quando me questiona. As bochechas coradas me dizem que tem algo por trás dessa expressão angelical. Talvez um grande demônio.

–– Não. Minha mãe deve estar chegando a qualquer momento. –– minto.

Em instantes toda a luz gerada pelo crepúsculo se torna um grande borrão – a claridade já não passa corretamente pelas minhas córneas, estou ficando cega.

Não consigo mais ver o rosto dele claramente, está tudo turvo.

Aperto as mãos em punhos na areia, ainda que eu já não possa mais senti-la suponho que a esteja esmagando com tudo. Não quero desmoronar na frente dele. Não quero desmoronar na frente de mais ninguém – e pelos efeitos de abstinência que sinto agora no organismo (pela falta de remédios), não vou precisar de qualquer maneira.

–– Pense no que eu te falei. Se ao menos se der o esforço mínimo significa que você tentou. –– sorrio. –– Não quer ficar o resto da vida pensando no que poderia ter feito, quer?

Avisto aqueles dentes perfeitos outra vez num sorriso sinuoso.

–– Tchau, Charlie.

Ouço-o dizer um "obrigado" baixinho enquanto caminha para fora da praia.

Deito na areia vendo que há sangue pingando da minha boca na camisola. Estico os braços e pernas, arrastando-os de maneira uniforme para que eu possa fazer um anjo.

A última coisa de que me lembro é a lua. Então, tudo se torna nada.

De novo.

Nisso, como uma bomba relógio que passou de seu prazo de validade, eu explodo: sou uma montanha grande e cheia de estalactites, que morre pouco a pouco conforme uma avalanche de pedras cai desesperadamente.

Há um perfume salgado e um barulho de ondas se chocando quando morro, e uma espécie de paz.

Um recanto.

 


Notas Finais


A história foi igualmente publicada na wattpad: https://www.wattpad.com/story/85263995-recanto-a-c
Meu perfil da wattpad: https://www.wattpad.com/user/wagneredwards


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