História Recess - The Other

— Então, você não apalpou ela? — A safadeza de Larry já estava passando dos limites estabelecidos. Para a minha infelicidade, Lilo não estava acordada. A noite de brincadeiras com o pai havia a deixado completamente exausta. Aquilo era ruim, contando com o fato dela ser a única criaturinha capaz de distrair Larry. E distraído, não haveriam perguntas tão desnecessárias, como as que ele fazia.

— Por favor, Larry. Acabamos de acordar. Me dê um tempo. — Cansado, precisei esfregar o meu rosto. — Tenho certeza de que nós podemos falar sobre isso depois, não é mesmo?

— Não mesmo. Faz um tempo que estou de fora desse assunto. — Do nada, ele fechou a cara, cruzando os braços. E eu revirei meus olhos para cima. — Você sabe que é verdade. Qual é? Nós somos irmãos. Não devia me abandonar nessa poça de curiosidade.

— E daí? O problema é seu se está cheio de curiosidade. — Tive que dar de ombros, enquanto voltava a degustar os ovos americanos que ele havia feito.

— Caramba, Laurent! Deu para ser cavalo e distribuir coices?! — Decidiu me provocar. — Só quero estar a par de tudo o que está acontecendo. E então? Quer me fazer o favor de abrir a boca, baby?

Não queria fazê-lo. Porém, naquele momento, Larry era a única pessoa que poderia compreender a grande bagunça que havia em minha cabeça. A mulher que amava queria conversar comigo. Eu iria voltar a vê-la. Entretanto, não estava convencido de que aquilo era o certo. Eu estava pensando em Melanie.

— Jessica irá vir para cá. — falei. E ele, exageradamente, arregalou os seus olhos. Larry tinha aquela mania de fazer cena. — Ela me enviou uma mensagem.

— Que merda. — balbuciou. Então, confuso, levantei uma sobrancelha. Pelo menos, Larry deveria estar feliz. Mamãe e ele não queriam o meu bem? — Quero dizer, puxa vida! Quando foi isso?

— Ontem à noite. Madrugada, para ser mais específico. — Acabei limpando o prato. Estava satisfeito. Até o instante em que ele perguntou a respeito do que havia feito com Melanie. — Fala sério?! É só isto que te interessa?

— Quero saber o quão longe estão indo, bro. — Devagar, ele se acomodou a minha frente. — Você tocou nela?

— O quê?! Por que eu faria isso?! — Fiquei com meus olhos arregalados. — E não sinto absolutamente nada por ela.

— Não vou cair mais nessa. — Seu semblante estava sério. Precisei dar um soco no braço dele. — Você a beijou?

— Não, Larry. Qual parte ainda não entendeu, hein? Não sinto nada por ela.

— Você apalpou ela?

— LARRY! — Eu estava começando a perder minha paciência.

— Você tentou fazer alguma coisa com ela, pelo menos? — Ele parecia um pouco decepcionado por saber que eu não havia tentado tocar nela. — Você só pode estar de brincadeira, Lau! Essa sua lerdeza me impressiona!

— Não é lerdeza. É respeito. — Era aquilo, afinal. Gostava dela. Porém, não da maneira como ele pensava. — Melly não é como as mulheres que nós somos acostumados a conhecer.

— Melly? — Ele repetiu, confuso. E só foi naquele momento que percebi as palavras que havia dito. — Vocês estão tão íntimos para começarem a chamar um ao outro por apelidinhos?

— Larry, por favor. Pare de ser um completo esquisito, tudo bem? — Eu tive que pedir. A qualquer momento, todo o estoque de paciência iria acabar. — Não deveríamos estar falando sobre ela. Nós deveríamos estar falando sobre Jessica.

— Acontece que nós não podemos falar sobre Jessica sem ter certeza dos seus sentimentos por Melanie. Pretende fazer o quê? Se encontrar com sua ex?

— Não tenho a mínima ideia.

— Já sabe o que ela quer?

— Não. — Tive que esfregar meus olhos, novamente. Me sentia estranho.

— Tomara que não queira reatar o relacionamento com você. Tomara. — A coisa mais engraçada nele era o fato de não mascarar seus sentimentos. Havia um certo incômodo em sua voz. Ele não parecia contente por saber que Jessica queria me ver.

— Por que essa mudança? Não era você que queria o meu bem, afinal? Jess virá até aqui para me encontrar. Deveria estar feliz com essa novidade.

— Você está feliz com a novidade?

Devia estar, pelo menos.

— Estou.

Mentiroso.

E ele apenas deu de ombros, como se eu houvesse acabado de convencê-lo dos sentimentos que nutria por Jessica. Além do mais, a amava. Eu a amava. Era para ser daquela maneira. Ela queria me ver, então, basicamente, iria para aquele parque por minha causa.

Só precisa ser convincente, Laurent Bourgeois. Está tudo da forma como sua cabecinha sonhava. Jessica Aidi o ama e quer viver ao seu lado. O que Singe tem a ver com isso, afinal?

— Quando a Jess irá chegar? — De repente, aquela era a dúvida dele.

— Hoje. Pelo menos, era o que ela dizia na mensagem de voz. Por quê?

— Por nada. — Rapidamente, Larry se levantou, indo para seu quarto. Fiquei o observando. — Eu só queria saber qual seria o dia em que você iria começar a atuar. — E sumiu de vista.

                             •••

Não sei o que você pretende fazer. Afinal, o que você pretende, Laurent?

Não tinha a menor ideia. Também não sabia como ela iria interpretar tudo aquilo. Certamente, não havia me levado até seu quarto de hotel para que, no dia seguinte, eu aparecesse de repente.

Ainda mais para fazer essa cena. O que ela tem a ver com sua situação?

Absolutamente nada. Mas, não era minha intenção deixá-la de fora. Queria que ela soubesse, afinal de contas, seus conselhos eram tão preciosos. Ela sabia exatamente o que se passava pelo meu coração. Mesmo que eu não dissesse.

Então, sem pensar duas vezes, fui até o Western Plus, enquanto Lay e Lilo se divertiam sozinhos. Era muito cedo. E ainda assim queria conversar com ela.

Sendo daquela maneira, assim que cheguei no hotel que estava hospedada, pedi para que o recepcionista permitisse a minha entrada. Me reconhecendo, ele nem sequer me enquadrou. Então, veloz, caminhei até o quarto de Melanie.

O que você espera ouvir, afinal? Só pode estar delirando, se pensa que a sua amiguinha irá odiar essa novidade. Qual é a sua, Laurent Bourgeois? Melanie não está interessada em você.

Também não tinha nenhum tipo de interesse pessoal nela. Mesmo. Melanie era uma grande mulher e eu estava feliz por conhecer uma personalidade forte e incrível como a sua. Eu precisava de seu ombro, naquele momento. Precisava de seus conselhos.

Precisava ouvir sua voz. Muito.

Porém, assim que cheguei em seu corredor e fiquei diante de sua porta, eu não tive coragem de bater. Estava longe de ser adequado. O amor da minha vida estava querendo me encontrar de novo e eu queria atormentar uma mulher que não significava tanto.

Não diga isso. Não se engane. Ela é muito significante, sim. Não diga isso. E o seu carinho por ela é inexplicável.

Era verdade. Então, bati na porta.

E fui surpreendido.

Não foi Melanie quem me recebeu. Ao invés do corpo atraente e esbelto, os olhos que ficaram me encarando foram os de um rapaz loiro. Ele tinha um estilo muito peculiar e ousado. Sorriso maroto e amigável. Parecia ser bacana.

Porém, de cara, odiei o camarada.

— Deseja alguma coisa? — Ele se encostou na ombreira da porta, com um sorriso enorme na boca.

— Melanie Singe. Esse é o quarto dela, não é? — perguntei, torcendo para que tivesse batido na porta errada.

— Ah! A Mell? Claro que sim.

Mell?! E você tem essa intimidade toda com ela, por acaso?!

De repente, ela apareceu. Os olhos grandes ficaram surpresos. Cabelos tão bagunçados, como se tivesse acabado de acordar. Camiseta branca totalmente transparente, sutiã cor de rosa. E pernas nuas, shortinho jeans destroyer.

— Laurent? O que faz aqui? — Com muita surpresa, perguntou. Eu não falei coisa alguma. De um modo estranho, eu parecia ter atrapalhado os dois. E sentia raiva daquilo. — Você está bem?

Sim, mas quem é esse cara?

— Acho que ele quer conversar. — O camarada se intrometeu, olhando pra ela. — Posso esperar vocês dois, Mell.

Por que você não pára de chamá-la assim? Aproveite e vá dar uma volta.

— Está tudo bem, Laurent? — Com sua atenção sobre mim, ela nem sequer olhou para ele. Porém, mesmo assim, eu me sentia péssimo.

— Sim, estou bem. Obrigado. Eu só queria saber como estava. — Menti.

— Queria falar comigo? — Sorrindo, ela perguntou, enquanto ajeitava alguns fios de seus cabelos. Encarei o cara que estava ao seu lado. Ele passava a mão pelas costas dela, lentamente. Parecia até que nem estava ali.

Acho que vou socá-lo.

— Não, não. Só queria saber como estava. — Comecei a fingir indiferença. E aquilo deixou ela confusa. — Ontem nós ficamos horas à fio conversando. Queria ver se acordou bem. — Aquelas palavras foram um tipo de provocação. Indireta.

Para ele.

— Estou ótima, obrigada. Você não precisava ter se preocupado. — A cor de seus olhos ganhou um brilho diferente.

— Imagina. Você é importante para mim, Melly. — Despretensiosamente, dei uma olhadela para o camarada estiloso.

Viu só?! Também tenho intimidade com ela, colega. Até mais do que você.

— Gostaria de entrar? — Sorrindo, ele questionou, abrindo mais a porta. — Mell e eu iremos tomar um cafezinho.

— Ele mesmo fez. — Os olhos dela ficaram sobre o sujeito de cabelos loiros e rebeldes. Não gostei da forma como o camarada olhou de volta. — Junte-se a nós, Laurent. Entre.

Eu até poderia entrar. Acontece que você não está sozinha. Quem é ele?

— Não, não. Obrigado. Preciso ir. — Mesmo descontente, sorri. Ela aceitou. E eu comecei a sentir uma tristeza. Não era exatamente aquilo que esperava. Eu não queria que ela tivesse aceitado tão depressa. Não queria que ela ficasse ali.

Com ele. Um cara desconhecido.

— Espero muito que vocês tenham um ótimo dia. — Foram minhas últimas palavras antes de me virar e ir embora.

Não me sentia bem. De verdade. O meu estômago estava esquisito, assim como o meu coração. Estava doendo. E muito. Entretanto, ainda assim, cruzei o corredor e voltei para a grande recepção do hotel Western Plus, deixando os dois na porta, me encarando. Havia sido bem difícil. Completamente. E além de estar apreensivo por causa da mensagem de Jessica, fiquei abalado com o que havia acabado de ver.

Meu coração doía devido aquela situação. Melanie Singe iria passar o dia ao lado de outro homem.

E não era eu.