Elena P.O.V’s On
Ao longo dos anos eu já vi muitas coisas ruins. Vi garotas vomitarem para que se sentissem bem, vi pessoas se submetendo a números absurdos de cirurgias, vi até pessoas tirando a própria vida após serem negadas de seus sonhos. Mesmo assim, uma das coisas que mais em assusta é a automutilação.
Para mim é algo inaceitável. É estragar minha beleza, marcar a pele que deve ser perfeita. Mas não é como se isso fosse o suficiente para impedir que Lola se cortasse.
Não sei há quanto tempo isso acontece, nem sei porquê. Eu tinha acabado de colocar um pedaço de torta de morango na boca e precisava cuspir. Tinha alguém ocupando o banheiro, um dos quartos dos meninos seria muito arriscado e a Blanca estava dormindo no nosso quarto, por isso entrei as pressas no outro quarto que pertencia ao Red Smoke. Simplesmente entrei, peguei a lixeira que ficava em um canto e vomitei lá dentro. Mas foi então que ouvi um barulho.
Lola me olhava com olhos arregalados. Na verdade, não sei se foi por ver o que fiz ou por ser pega no flagra, mas um silêncio sepulcral se instalou entre nós. Ela tinha as mangas da camisa xadrez dobradas até os cotovelos, os braços estavam cobertos de cortes horizontais e o barulho que ouvi foi a gilete caindo da mão dela e retinindo no chão do quarto.
- O que você está fazendo? – ela me perguntou.
- O que você está fazendo? – questionei em resposta.
- Nada. – respondeu Lola, escondendo os braços.
- Então eu também não estava fazendo nada.- falei.
- Por que? – ela me perguntou.
- Velhos hábitos... – dei de ombros – E você?
Ela desviou os olhos, que se encheram de lágrimas de repente.
- Eu tenho passado muito tempo treinando na SM. – ela sussurrou.
Franzi o cenho, tentando compreender o que era aquilo. Que diferença o tempo que ela treinava fazia? Não fazia sentido. Não entendi o que ela quis dizer com isso, então apenas desviei do assunto, me levantando e me arrumando para sair do quarto. Ela não fez perguntas sobre eu ter dito apenas que eram velhos hábitos, então não vou perguntar o que ela quis dizer com aquilo. Mas... tem alguma coisa que estou deixando passar. Eu sei disso! Eu sinto isso!
Descendo as escadas, consegui ouvir que Chen e Ace discutiam de novo. Mas dessa vez, bem mais baixo. Eles estavam em algum lugar do andar de cima e era possível ouvir tudo, “Eu errei e sinto muito” dizia Chen e sem dar muito tempo Ace despejava algum palavrão sobre ele, alegando que o que ele fez não tinha desculpas.
G.B estava sentada no sofá da sala, olhos baixos, uma sacola plástica caída aos pés dela. Quando entrei na sala, ela me olhou e deu um sorriso fraco. Mesmo com isso era claro que ela estava incomodada, as coisas não vão bem.
- Tudo bem? – questionei, mesmo sabendo que não.
- Só estou pensando sobre o passado. – respondeu G.B.
- Arrependida de algo? – perguntei.
G.B riu suavemente.
- Não tenho tempo pra me arrepender.
Ela sorria, mas era um sorriso vazio, sem emoção. Na verdade, ele era estranho em G.B, ela tem um sorriso sempre tão vivo.
- O que é isso? – questionei, me referindo a sacola perto dos pés dela.
- Tinta de cabelo. – ela disse e deu de ombros.
Ela mudou nos últimos tempos. De novo a sensação de estar deixando algo passar me assombrou. Os pequenos detalhes ficam fugindo, escapando entre meus dedos e fazendo com que eu me sinta tola. G.B se despediu de algo, alguma parte dela ficou para trás e não vai voltar mais. Mas estou perdida no labirinto que são os olhos dela. Eles não me dão chance para que eu desvende o que acontece.
Sem assunto, apenas me desviei para longe dali. Nós nos despedimos apenas com palavras, mesmo o amor fraternal entre nós não foi o suficiente. Naqueles poucos minutos foi como se eu sentisse a morte a espreita, então apenas permiti que G.B voltasse para seu devaneio e permiti a mim mesma que voltasse para meu luto.
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