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História Reflexões da Alma - Preocupações


Escrita por: Dasf-chan

Notas do Autor


Olá!
Hoje trataremos de assuntos dolorosos para Hyoga...
Sem delongas... Até as notas finais...
Bjs.

Capítulo 26 - Preocupações


Afastando-se da residência, o cavaleiro de Cisne parecia correr até um lugar específico, que somente seu coração sabia onde era. Andrômeda o seguia, zeloso e apreensivo com o que o amigo faria, mas principalmente, com o que o amigo sentia. O cosmo melancólico e saudoso de Hyoga denunciava o local para aonde corria... Na direção túmulo congelado do corpo de sua mãe, Natássia.

-----*-----

Os dourados e o pequeno lemuriano almoçaram e logo Camus voltava ao seu quarto para descansar um pouco mais. Remexer naquelas emoções há tanto tempo decantadas no solo profundo do mar de sua alma havia lhe cansado o espírito impassível.

Enquanto isso, Afrodite e Kiki procuravam as tais amostras ao redor da residência, levando consigo alguns potes de vidro para acondicionar os espécimes encontrados. O menor carregava o embornal repleto de frascos, que encostavam uns nos outros fazendo um som interessante. O pequeno sentia-se um explorador das gélidas terras russas, com seu nariz arrebitado e, finalmente, usando o enorme casado que Mu lhe mandara usar na viagem.

O pisciano ria-se, por dentro, daquela atitude tão pueril e divertida. O jovenzinho afundava os pés na neve, vez por outra, sendo levantado por Afrodite, que permitia que a criança se divertisse com toda aquela neve. Seu coração preocupava-se com o pupilo, contudo, depois daquela demonstração de poder do castanho enfrentando e vencendo Alexer com um mínimo de ajuda, confiava no cosmo de Shun. Mas algo ainda inquietava seu espírito perspicaz.

Talvez fosse a nevasca que se aproximava, com os dois cavaleiros de bronze ausentes da proteção que a morada dos cavaleiros de gelo propiciava. Conversava consigo mesmo, enquanto o pequeno coletava as amostras vegetais.

Ah, Dite... Fique calmo e aproveite esse agradável momento com Kiki.

É tão raro um tempo de paz como este, em meio a uma paisagem tão bela...

Os galhos dos abetos estão repletos de neve, como se fossem despencar a qualquer momento.

É bom ficar de olho no pequeno.

Se um bocado dessa neve cair em cima dele, assim, de repente, pode não ter tempo de se teletransportar e ficar soterrado...

No meio desse tapete branco, ia demorar para encontra-lo, ainda mais porque o cosmo dele não está desperto...

Os poderes de telecinese e telepatia dele não dependem de cosmo...

– Ei, Dite! Isso aqui também?! – Chamava o pequeno, retirando o pisciano de seus devaneios.

– Ah, sim! É isso mesmo! – Respondia quase automaticamente. Não conseguia deixar de se inquietar ao imaginar seu kerub caminhando no meio daquela neve toda ou sendo surpreendido por um monte de neve, ou se acidentando em algum buraco escondido próximo ao tronco dos pinheiros.

Os galhos inclinados de uma árvore descansavam contra o tronco de outra árvore, criando uma espécie de telhado branco, por onde um pouco de luz passava, criando formatos brilhantes nos cristais depositados no solo.

O ruivinho usava de sua telecinese para buscar o que precisavam e acondicionava as amostras nos potes, perguntando sempre ao mestre de Peixes se estava acertando, e a cada reposta positiva, alegrava-se ainda mais. Parecia estar em um parque de diversões. Jogava a neve para cima de si mesmo, e deitava no solo branco, mexendo os braços e as pernas.

– Ei, Kiki! Você está parecendo um anjo!

– Anjo?

– Com asas e a barra da túnica! Só falta...

– O que está faltando para eu ser um anjinho, Dite?

– Ser mais obediente e parar de dar susto nas pessoas com seu teletransporte!

– Ah... Então, acho que não serei um anjo nunca... – Afirmava, fazendo um biquinho de manha irresistivelmente fofo.

Os dois riam-se como há muito tempo não era possível.

Seria tão bom se esse momento pudesse durar mais tempo...

Novamente, pensamentos de preocupação assaltavam o perspicaz dourado.

Ah, meu kerub... Onde fostes, afinal? Sinto teu cosmo tão ansioso, tão tenso...

Você gosta tanto do Hyoga e ele gosta tanto de ti...

 Ele será teu protetor nesta nova era que se aproxima...

Queria muito ser eu a cuidar de ti, mas a era de Peixes está se encerrando...

Preciso passar a missão de cuidar do menino da luz e das sombras para o pupilo de Camus... Para essa nova geração...  Preciso entender que, agora, teus amigos cuidarão de ti...

Tenho certeza que, igualmente e, até mais, Ikki sempre estará ao teu lado...

Os meninos Seiya e Shiryu serão fiéis amigos...

Contudo, eu nunca te abandonarei...

Cuidarei de ti com todas as minhas forças e com todo meu cosmo...

Mas ainda não entendo... Tua energia está tão tensa...

Mesmo diante daquela criatura grotesca de olhos cor de fogo...

Aquele ser tão deprimente e digno de pena no qual o Alexer se transformou...

Você manteve-se equilibrado como Shaka e eu lhe ensinamos...

Mas...

Me preocupa estas nuvens... Esta nevasca que se aproxima...

Por favor, não demore a retornar...

Afinal, o que estás fazendo? Sinto tanta tristeza em ti...

As nuvens baixas se aproximavam, fazendo com que o pisciano pedisse ao menor que terminassem a tarefa que foram executar.

Seria algo fácil, pois a diversidade de plantas medicinais específicas da região que se encontravam próximas, como se tivessem sido semeadas ali especialmente para auxiliar nos problemas recorrentes daquele local tão inóspito.

Era comum que os jovens que ainda não estivessem acostumados com o frio intenso fossem afetados por problemas pulmonares, que podiam ser utilmente tratados pelo óleo essencial da terebintina do grande abeto-branco, com seu aroma cítrico de limão.  Assim como os extratos das agulhas e da casca do pequeno pinheiro chamado lariço, que auxiliava no alívio das dores musculares causadas por exercícios físicos intensos, seja por meio de emplastos ou por fricção, além de suas ações anti-inflamatórias. As folhas da bétula eram igualmente importantes, pois auxiliavam no tratamento das lesões de pele, como as queimaduras de frio, por suas importantes propriedades antissépticas.

– Vamos, Kiki! Já terminamos de coletar as amostras! Parece que está nevando mais intensamente.

– Eu queria ficar mais um pouco! Mestre Mu nunca me deixava brincar assim... Sempre dizia que eu podia me resfriar, que eu podia adoecer, que eu podia qualquer coisa... Sei lá...

– Por favor, pequeno! Não insista! Também estou preocupado com o Shun exposto a esse clima...

– Acha que Hyoga não vai proteger ele?

– Não sei se é isso que está me incomodando... Não acho que ele machucaria Shun depois do que aconteceu hoje... Bom, vamos entrar e etiquetar isso tudo...

– Eu não escrevi em nada e não temos papel aqui! Como vamos arrumar isso, agora?!

– Eu sei o que tem em cada pote, não se preocupe. Vou usar pedaços de esparadrapo como etiqueta e escrever em cima. No Santuário, eu organizo melhor.

O pisciano segurava alguns potes, enquanto o lemuriano levava outros. Em pouco tempo, estavam na sala aconchegante, ao calor da lareira, ajeitando o que haviam coletado.

O dourado de Aquário ainda permanecia em seu quarto, descansando. Aquele clima frio lhe trazia um conforto indescritível e refazia suas energias físicas e morais. Dormia de forma calma e tranquila, sem se importar com a mudança climática que ocorreria dali a pouco. Concentrava-se em suas mais doces lembranças, sua mente vageava pelas planícies cobertas pela suave neve nos gramados do interior de sua amada terra natal. As árvores sem folhas à beira dos lagos, as antigas e belas construções com seus telhados brancos. Os campos lilases de lavanda, o estilo provençal da arquitetura, os jardins elegantes e bem cuidados. Tudo lhe remetia à paz.

Enquanto os dois dourados e o jovem lemuriano aproveitavam momentos de tranquilidade, em algum lugar, distante cerca de meia hora de caminhada na fofa neve, Shun se esmerava em seguir o Hyoga.

O virginiano se esforçava para correr atrás do amigo, que teimava em correr mais do que ele. Não havia almoçado, nem tirado o sobretudo marrom que usara naquela manhã. Se não fosse pela roupa quente que vestia, o vento gélido já teria impedido sua caminhada.

A neve recém-caída, fresca e intocada, igualmente parecia tentar impedi-lo de caminhar e acompanhar os passos do aquariano. A sobreposição de inúmeros cristais e flocos de neve formava uma camada de neve lisa e macia sobre o solo, formando um travesseiro natural, no qual suas pernas, menores e mais delgadas que a do amigo, afundavam. Se esforçava para não ficar preso.

O cavaleiro de Cisne estava mais acostumado àquela superfície macia, e conseguia esquivar-se dos obstáculos que a neve encobria, como pedras, gelo, árvores e até mesmo buracos, cobertos com uma fina camada de neve apenas, formando uma armadilha natural. Shun seguia suas pegadas, e pisava sobre elas, por segurança. A tempestade ainda não chegara, mas mostrava suas intenções com aquele manto branco que depositava nos galhos dos abetos.

O virginiano se esforçava para manter os olhos abertos, que turvavam enquanto um zumbido lhe incomodava os ouvidos. Um estranho suor brotava de sua nuca e de sua fronte, sentindo o próprio coração acelerado mais que deveria.  

Sabia que deveria ter sido mais cuidadoso e procurar outra roupa quente para não sentir frio, afinal, seu sobretudo estava repleto de rasgos. Porém, não havia tido tempo. Nada disso o incomodava realmente.

Sabia que se demorasse mais, as pegadas de seu amigo seriam apagadas e não conseguiria segui-lo. Estava preocupado com a dificuldade emocional que o outro enfrentava, e talvez fosse aquela a oportunidade de ajuda-lo de uma vez por todas.

Hyoga havia tomado um caminho totalmente diferente daquele usado mais cedo para alcançarem a origem das energias maléficas que precisavam refrear. Sem perceber que era seguido, caminhava como quem soubesse exatamente para onde ia.

Seu coração ansiava e o chamava a procurar o alvo de seus sonhos mais queridos.

As palavras do mestre e do amigo mais novo ecoavam profundamente em sua alma dolorida de saudade. Precisa libertar-se.

Porém, conversando consigo mesmo, negava o que a mente tentava dissuadí-lo a compreender.

Eu preciso vê-la... Preciso ter certeza... Ela está lá, eu sei... A culpa é minha.

Se eu tivesse sido mais rápido, se eu tivesse corrido, talvez ela não teria precisado se sacrificar para que eu vivesse...

Se eu tivesse obedecido quando ela me chamou para sairmos, talvez...

Se eu tivesse abraçado ela, e não tivesse soltado...

Ah, mamãe... Que falta você me faz...

Se eu tivesse....

Não devia ter deixado eles me levarem para longe de você...

Se eu tivesse sido forte o suficiente...

Se eu tivesse sido mais corajoso...

Se eu tivesse...

Ah, meu Deus...

Como eu queria ainda sentir seu perfume doce como as flores brancas de verão que tanto amava...

Eu queria ainda tocar em seus sedosos e longos cabelos, e brincar com eles como eu fazia quando era pequeno...

Eu queria olhar bem no fundo de seus olhos e sentir sua mão a segurar meu rosto dizendo o quanto me amava...

Eu queria...

Ah, mamãe...

Eu queria que ainda poder sentir seu hálito quente quando cantava ao meu ouvido para me fazer dormir...

Quando me acalentava...

Quanta saudade...

Me espere, eu estou chegando...

Você não ficará nunca mais sozinha...

Não mais te abandonarei...

Shun afundava os pés na neve fofa, cada vez mais espessa, à medida que se acumulava, denunciando a tempestade que se aproximava. Chamava pelo amigo, ainda conseguindo visualizar seus cabelos loiros curtos e revoltos, a camisa azul e a calça preta que usava. Não era difícil divisar Hyoga com seu olhar. Em seus mais de um metro e setenta, o bronzeado cavaleiro do gelo possuía uma incrível resistência àquele frio sibérico oriental, onde havia nascido e treinado para se tornar cavaleiro.

Contudo, difícil mesmo era acompanha-lo naqueles passos habituados ao vento gélido e à fofa camada branca que impedia que o menor andasse mais rápido ou que sua voz fosse ouvida em meio ao assobio que o vento gritava.

Após quase meia hora de caminhada, e depois de Shun quase perder o amigo de vista, este parou em frente a uma espécie de gelo reluzente, de um azul tão raro quanto a própria cor dos olhos do aquariano.

Tocava o grosso gelo com a mão esquerda como se acariciasse algo extremamente precioso, suspirando profundamente, enquanto a destra, fechada em punho, dava pequenos socos cada vez mais intensos.

– O que está pensando em fazer, Oga?! – perguntava o menor, apoiando os braços nos joelhos, de forma a tentar retomar o fôlego.

– O que você está fazendo aqui? Falei para me deixar! Vá embora!

– Nunca... Nunca te abandonaria sozinho... Principalmente em um momento como este...

– O que você pensa que está fazendo?!

O mais novo, gentilmente, estendeu o braço livre, falando calmamente, tentando trazer o outro à razão.

– Nosso primeiro instinto é buscar vingança pelas pessoas que amamos e que foram tiradas de nós... Mas não somos assim... Precisamos lembrar quem nós somos e quem devemos ser, um dia...

– O que você quer dizer com isso?!

– É aqui, não é?

– Como você sabe?!

– Posso ver por meio dos seus olhos... O navio está em um local muito profundo, em águas abissais... Foi colocado lá pelo senhor Camus para que você não fosse mais visitar aquela embarcação...

– Tenho o oitavo sentido, agora! Sou capaz de mergulhar tão profundo quanto for necessário!

Antes que o menor se aproximasse mais, concentrou seu cosmo cerrando a mão direita e socou o gelo com a maior força que conseguia colocar no golpe, trincando e afundando a grossa camada, mais espessa que em outras épocas devido ao inverno e à localização atual do navio.

Não conseguira fazer um buraco no gelo, como em tantas outras oportunidades havia conseguido, por ter gasto boa parte de sua energia na missão. Contudo, o ódio e raiva causados por aquela sensação de perda estavam mais fortes que nunca. O impacto do cosmo do Cisne criara uma expansão de energia repleta de um pó fino de cristais de água, que lançou os dois jovens para longe do alvo do golpe, fazendo-os cair contra a fofa neve que margeava o local.

– Está vendo?! Você me distraiu e não consegui quebrar o gelo!

– E nem vai conseguir quebrar, é muito espesso e você está cansado. Acha que o senhor Camus não pensou nisso quando enviou o navio dela para esse local? – Dizia de forma carinhosa.

Enquanto o mais velho levantava-se e procurava caminhar na direção onde o gelo parecia trincado, o mais novo segurou-lhe, firme e convicto do que deveria fazer.

– Larga meu braço, Shun! Vou tentar novamente! 

– Não vou deixar que se machuque, não dessa vez! Não aguento mais ver você se torturando desse jeito! – Afirmou, resoluto, contendo o amigo com suas suaves correntes luminosas de cosmo.

– Me solta! Você não tem esse direito!

– Hyoga, me escuta pelo menos!

– Tenho outra opção?! Você não para de tagarelar conselhos! Quem sabe assim você me deixa sozinho e volta para aquele atum dourado. Você não nasceu pra este clima nem para entender o que sentem os cavaleiros do gelo!

Ignorando as palavras ríspidas e deselegantes de Hyoga, o virginiano começou a explicar o aprendera. Talvez o que ouvira em seus treinamentos pudesse auxiliar seu amigo a libertar-se.

– O mestre Shaka me contou sobre um príncipe chamado Sidarta Gautama, que nasceu no Nepal e morreu lá na Índia. Um dia, após se iluminar em sabedoria, o príncipe perguntou aos seus discípulos qual era o inverso da morte. O que você acha que eles responderam?

– Ora essa, Shun! Agora vamos brincar de adivinhação?! Desfaça essas correntes!

– Vamos, Oga, pense... Qual o inverso da morte?

– Vida, é óbvio!

– Essa não foi a resposta... Depois de meditar, o príncipe redarguiu, tranquilo, afirmando que o inverso da morte é o renascimento, porquanto sempre se está na vida, seja por meio do corpo físico ou fora dele.

– E o que isso tem a ver comigo?! Por que está me prendendo para me fazer escutar isso?

– Porque sua mãe não está lá embaixo! – gritou Shun, tom desesperado começando a permear sua voz doce.

– Claro que está!

– Se o corpo dela tivesse sido enterrado em um cemitério de terra, não haveria mais corpo para você visitar! Só uma lápide de pedra, como Ikki fez em homenagem à nossa mãe! Você se engana e sofre toda vez que pensa que está visitando ela... Sua mãe não está aqui, Hyoga!

Afirmou categórico o virginiano, usando uma voz amorosa, porém muito firme. Seu coração se despedaçava ao falar aquilo, mas seu mais amado amigo precisava escutá-lo.

Verdadeiramente, sentia que uma amizade sincera não era aquela que sempre dizia o que o outro gostasse de ouvir, mas que dizia a verdade, com mel nas palavras e braços abertos a receber o outro e ampará-lo em sua dor. Era o que tentava fazer com Hyoga.

Soltou as correntes de cosmo e aproximou-se do loiro que fitava o chão congelado, segurando as lágrimas que se esforçavam em fugir de seus olhos azuis.

Tocando-lhe a face bronzeada pelo frio russo, Shun enxugou-lhe as gotas salinas próximas de despencar e segurou seu rosto com as duas mãos, esticando-se de maneira a ficar nas pontas dos pés. Desejava olhar as íris de safira marejadas do amigo em igual altura.

– Sua mãe está em condição de viajante do tempo e do espaço, singrando os oceanos de energia, espírito livre que é, agora. A vida, desde quando criada pela inteligência suprema do Universo, jamais se extingue, alterando-se constantemente de expressão de acordo com os instrumentos de que se utiliza, até alcançar o estado de plenitude, Oga... Ela sempre estará viva, seja em um corpo físico ou fora dele.

Controlando as emoções diante das sábias palavras recitadas com incrível doçura pelo mais jovem, o aquariano segurou-lhe os pulsos e afastou aquelas mãos delicadas, com dificuldade em aceitar o que escutava.

– Você é mesmo um fraco sentimentalista! Com que direito você fala estas coisas da minha mãe?! Vá embora antes que eu mesmo te jogue longe!

– Esse caminho que você está escolhendo continuar trilhando só lhe causará mais dor... Estivestes no submundo, sabes da realidade da vida e da morte... Eu não compreendo por que você se maltrata tanto...

– O que você não compreende?! Que eu sinto saudade daquela que me deu a vida? Que pecado há nisso? Estou errado, por acaso?! – bradava o Cisne, com toda a força de sua alma. Havia desistido de conversar sobre aquele assunto e agora partira para a discussão.

Entretanto, o menor continuava calmo, entendendo a dor que o amigo sentia e a dificuldade que demonstrava em deixar aquele sentimento de dor, com o qual já estava habituado. Tantos anos venerando o corpo da mãe pareciam ter feito com que acreditasse que sua alma também estivesse presa naquele navio nas águas abissais do mar de superfície congelada.

– Não é errado nem é pecado sentir saudade...  – E após um longo suspiro, falou aquilo que temia dizer, entretanto, diante da dor que o amigo fazia de estimação. Não mais pela mãe, mas pelo simples fato de acreditar que ciliciando-se apagaria a culpa e o remorso que sentia pela morte dela. Por acreditar que sacrificando-se para visitar o navio correndo risco de perder a vida, honraria igualmente o sacrifício dela.

Conhecendo o amigo aquariano a tantos anos, percebeu que apenas um argumento extremamente lógico o faria acordar daquela mono-ideia na qual ele mesmo havia se colocado.

–  Sabe o que parece errado, Oga? Você, conhecedor dos mistérios da vida e da morte, da Terra e dos Elíseos, continuar nesse suicídio lento... Como o Alexer...

– Eu não sou um traidor nem um suicida! – Gritava o aquariano, transtornado pela comparação que o menor fazia.

– Pense, Oga... Alexer não conseguiu conviver com o que aconteceu com a irmã e tirou a própria vida jogando-se contra uma parede de gelo. Por favor, você precisa despertar para a forma doentia como vem lidando com esta dor de perda que te consome dia após dia... Você está traindo o amor daquela que ofereceu a própria vida para que você fosse feliz!

– Não sou traidor! Estou é honrando a memória dela!

Como em uma última tentativa de salvar o amigo daquelas ideias de dor, Shun suspirou e lhe disse as frases que evitava dizer a tanto tempo.

– Hyoga! Não há ninguém lá embaixo! Ela nunca esteve lá! Você está é se torturando em busca do corpo morto de sua mãe, que estaria decomposto há muitos anos se não estivesse em um túmulo de águas quase congeladas!

– Ora, seu...

Antes do término da frase, o som alto de um tapa ecoou por meio do vento frio. O menor caiu sentado no gelo, tocando com a própria mão a face esquerda avermelhada e ardente, ainda assustado com a reação tão agressiva do mais velho, que parecia vomitar ásperas palavras repletas de mágoa e rancor.

– Você nunca entenderá! É um órfão que não conheceu a mãe! Fica falando essas asneiras, sujando este ambiente sagrado com suas palavras profanas! Vá embora daqui!

– Eu sinto, aqui, dentro do meu coração, é que sua mãe não deseja que você fique mais nesse suplício! E eu não vou deixar você se machucar, nem vou abandonar nesse momento!

–  Então, se você não vai embora, eu vou! Fique aí, se quiser! Não quero sua companhia, você desrespeita a memória dela!

Dando as costas para o lago congelado, o aquariano rapidamente pôs-se a caminhar de volta à casa onde estavam Camus, Afrodite e Kiki. Aquela meia hora andando de volta era o que precisava para espairecer depois do que ouvira. Sua cabeça parecia estourar com tanta informação.

O virginiano levantou-se e seguia o amigo, que andava em rápidos passos à sua frente, o máximo que a neve permitia, distanciando-se. A velocidade do vento aumentava, anunciando a tempestade que se aproximava. O clima da região era instável, e a previsão do dourado de Aquário parecia realizar-se mais cedo que o esperado. Chamou o amigo, mas este parecia não desejar conversar.

– Oga, espere... Me desculpa...

O som das palavras chorosas do menor dispersava-se enquanto o mais velho caminhava pela neve, escutando somente o assobiar do vento. Olhou para trás de relance, procurando saber se Shun o seguia, e incomodou-se ao ver que ele se esforçava em alcança-lo, falando qualquer coisa que não conseguia escutar.

Não se importava muito com o vento que cortava o ar e neve que se acumulava ainda mais, pois bastava que o virginiano seguisse a marca de suas pisadas para não se perder. Sentia o cosmo preocupado de Shun, contudo, mais importante para si era tentar encontrar uma explicação para aquela situação conflituosa em sua mente.

O jovem e melancólico aquariano não conseguia colocar em prática o que aprendera, quando criança, enquanto recitava as orações representadas pelo rosário que ainda trazia no peito.

... Seja feita a Vossa vontade...

... Mas livrai-nos do mal...

... Roga por nós...

... Agora e na hora de nossa morte...

Os ensinamentos da amorosa mãezinha pareciam manter-se em sua mente, vívidos como se os ouvisse ecoando, contudo, seu coração queria acreditar que quando visitava o corpo que ela desposara na Terra, era a ela própria a quem visitava. Leda ilusão. Queria acreditar em algo que sua consciência gritava não ser a verdade. Tantas rosas levara acreditando visita-la verdadeiramente, no entanto... O Cisne, no âmago de sua alma sabia que, um dia, precisaria acordar e seguir em frente. Era o que Shun estava tentando ajuda-lo a fazer. Seguir em frente, liberto.

(Continua...)


Notas Finais


Essa dor de saudade de um ente falecido é muito difícil de lidar...
Espero que nosso personagem consiga aprender antes que seja tarde e perca outro grande amor...

Muito obrigada pelo carinho dos comentários, vcs são uns amores.
Quando penso no que vou escrever, sempre lembro das carinhosas palavras de apoio e me sinto muito feliz.
Obrigada tb aos que favoritam e aos que leem em suas bibliotecas. Muito obrigada.
Bjs!


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