1. Spirit Fanfics >
  2. Repeat >
  3. Único

História Repeat - Único


Escrita por: Sweetmoon

Notas do Autor


Olaar,

Eu aqui novamente, apenas para postar minha fic do segundo SHINee Fic Fest, e lembrando: procurem shineeficfestbr. tumblr. com/ para verem todas as fics da parte 1 e 2.

Meu prompt para essa fic era: "Onew é médico em grande hospital de Seul, em uma noite de nevoada ele estava voltando para casa depois de um plantão cansativo e no caminho encontra um jovem desmaiado e todo machucado." e eu pirei bastante com ele. Acho que vai dar para perceber. Além disso: a fic foi betada pela galera do fic fest, assim como a capa também foi feita por eles!

AVISO: Tem morte de personagens relevantes para a história, okay? Mas aconselho a ler mesmo assim, haha. Espero que gostem <3

Capítulo 1 - Único


Ato 1

O Garoto Na Rua

Lee Jinki sempre voltava exausto de plantões. Tanto fisicamente quanto emocionalmente, sempre lhe falaram que anos como médico fariam com que se ele se acostumasse, mas não era realmente o caso. Continuava se envolvendo emocionalmente com todos os casos, além de passar por cada perda como se fosse a primeira. Obviamente, a vida do médico cirurgião era feita de perdas, mas, mesmo assim, era impossível não se culpar quando algo acontecia. Era madrugada, mas ele andava pelas ruas de Seoul tranquilamente, já que passaria o outro dia em casa. Seu apartamento era um lugar quase vazio, há pouco tempo tinha decido abacar com a solidão adotando uma gatinha. Mesmo assim, ela passava bastante tempo com seus vizinhos e pouco com ele mesmo. Assim como tinha sido com todos os relacionamentos amorosos que tinha tentado ter desde que começara a trabalhar no hospital atual. Era uma vida solitária, tinham lhe avisado.

E estavam certos. Todos eles.

Andar nas ruas vazias sempre lhe trazia um sentimento de calma que a solidão do seu apartamento não conseguia. As paredes lhe restringiam. Sugavam sua vida aos poucos. O ar frio e o vento bagunçavam seus cabelos e pensamentos, tiravam-no do mundo de sangue e órgãos e o levavam para algum lugar bonito, calmo. Fechava os olhos e via-se cercado de luz. Mas não o tipo de luz que cega, e sim aquele que lhe abraça e traz um sentimento caloroso.

Um gemido o tirou do seu fluxo de pensamentos. Franziu a testa. Seus ouvidos estavam treinados para identificar dor, portanto, soube imediatamente que alguém precisava de ajuda. Pegando o celular e já discando o número da emergência, foi se aproximando da fonte dos gemidos e encontrou um rapaz no chão.

Com o aparelho já pressionado contra a orelha, se aproximou com calma e pressionou dois dedos gentilmente atrás da orelha do outro, verificando que ainda havia batimentos cardíacos. Ótimo.

– Alô? – Ele falou assim que atenderam o telefone – Tem um jovem na rua – explicou rapidamente, olhos treinados percorrendo o corpo do outro – Está com ferimentos externos pelos braços, a calça jeans está rasgada, o pulso esquerdo parece ter uma luxação… Um momento – se movimentou em volta do corpo – Com certeza é uma luxação. Também tem arranhões e um ferimento na nuca, não parece pancada – franziu a testa, aproximando o rosto e notando que era uma ferida circular do tamanho comum de tubos hospitalares – Sua testa tem um hematoma, e o jovem está inconsciente.

–Senhor? – A atendente murmurou, soando um pouco sobrecarregada – É médico, deduzo?

– Sim, cirurgião. Lee Jinki – explicou.

– Jovem acima de 20 anos?

– Eu diria por volta dos 20-25 – estimou – Não toquei nele, estou esperando a ambulância.

Quando desligou, Jinki olhou em volta cuidadosamente, finalmente observando o local em que estava: era um beco sem saída. Estavam perto o suficiente da saída para rua e a ambulância os veria tranquilamente. Andou um pouco pelo local, olhando o chão à procura de qualquer documento que pudesse ser do rapaz, seus olhos sempre voltando para o corpo perto de si. Nada. Talvez tivesse sido assalto ou estivessem no bolso. Aproximou-se, com cuidado, e tentou ver se tinha qualquer volume em algum dos bolsos. Ao notar um documento em um, puxou suavemente.

Conferiu mais uma vez os batimentos cardíacos do outro, dessa vez no pulso que não estava machucado, e só então olhou o documento.

Kim Kibum

Data de nascimento: 23 de setembro de 1991

Data de registro: 23 de setembro de 2010

Franziu a testa. Como o rapaz poderia ter sido registrado só com 19 anos? E então se surpreendeu com o próprio fluxo de pensamento. O que era aquele registro? Virou o pequeno cartão em sua mão e viu uma logo que não conhecia. Talvez fosse estrangeiro, deu de ombros, fitando o rosto novamente. Parecia coreano, mas poderia ter vivido ali só recentemente.

Onkey

 – É o senhor que está com Kim Kibum? – Um rapaz perguntou, com um sorriso no rosto para Jinki, que só então percebeu que tinha cochilado na sala de espera.

– Aparentemente, sim. Acharam mais algum documento com ele ou, não sei, algum celular? – Deu de ombros – Achei que poderia ter sido assaltado.

– Era sobre isso que esperava poder falar com você, inclusive – estendeu a mão – Prazer, Choi Minho. Sei que é Lee Jinki, cirugião, segundo a atendente?

– Sim, eu mesmo – apertou a mão do rapaz – Espero não seja intimidante falar com alguém já com anos de atuação – comentou, apontando suavemente para o crachá do rapaz que dizia ‘residente’.

– É um pouco, – confessou – mas encaro tudo como aprendizado.

– E é um aprendizado, até se eu não fosse cirurgião – sorriu um pouco – E como ele está?

Choi mexeu na ficha em sua mão calmamente e então fez um gesto para que fosse seguido, quando foi andando pelos corredores do hospital.

– Suas deduções com base nos ferimentos dele estavam corretas, só não conseguiu ver os machucados nos joelhos e as incisões feitas em seu peito. Mas pela posição como ele estava, não tinha como você ter visto – explicou e então entrou em um consultório, deixando o outro passar.

– Você achou o Sr. Kim realmente jogado na rua?

– Sim, achei que tinha sido algum ataque – deu de ombros – Algo errado?

Olhando em volta para conferir se a porta estava trancada, o rapaz puxou algo da gaveta de cima da sua mesa e colocou no centro da mesa. Era um aparelho do tamanho de um celular comum, mas não parecia um celular comum. Tinha apenas uma tela, completamente transparente, e uma borda preta fina, onde havia apenas um botão.

– Isso estava com ele?

– No bolso da frente.

– Liga?

Choi encolheu os ombros e apertou o botão. Na tela, brilhou a imagem de um microfone apenas. O outro apenas apertou o botão e uma voz automática respondeu:

– Hello, Sir. Password, please.

– Não sabia que tinha algum lugar do mundo com esse tipo de celular – Choi falou, suavemente.

– Wrong password. Voice recognition failed.

– It’s an emmergency – Jinki falou para o aparelho.

– Find and protect the Time Guardian. He will know how to help Kim Kibum.

E então a tela ficou transparente novamente. Jinki estava com a testa franzida e recostou na cadeira. Aparentemente, nada em sua vida poderia ser simples.

– Ele já acordou?

– Acho que não – Choi assentiu lentamente – Acha que devo chamar a polícia?

– Não – Jinki sorriu – Isso deve ser alguma coisa de outro país e isso aí de “Time Guardian” – fez as aspas no ar com a mão – Deve ser alguma coisa de algum jogo que essa galera mais jovem gosta.

– Talvez – Minho sorriu – Eu não costumo ter muito tempo para jogos, não posso opinar.

– Exato, eu sou muito velho para isso – pegou o aparelho – Podemos ver se ele já acordou para esclarecer todas essas dúvidas. Agora, polícia acho de mais realmente.

E não comentou nada sobre o documento estranho que tinha achado. Não era nada de mais, repetiu mentalmente. Não tinha como ser nada de mais.

Onkey

– Desculpe – Kim Kibum sorriu para eles, mas parecia quase como uma ação automática de nervoso e não tanto de simpatia – Conheço vocês?

– Na verdade, não – Choi Minho sorriu para o paciente – Sou médico residente aqui. Choi Minho, prazer. E esse é Lee Jinki, médico cirurgião – apontou para o outro na sala – Ele te encontrou na rua.

– Entendo – o rapaz assentiu lentamente – E o que eu estava fazendo jogado na rua?

Choi e Lee se olharam lentamente, até que Jinki deu um passo à frente:

– Esperávamos que você pudesse nos dizer isso. Não sabemos nada de você e só encontramos duas coisas em seus bolsos – pegou o aparelho celular e o documento e os entregou na mão livre do outro.

Kim parecia ainda mais jovem acordado. Tinha olhos felinos, curiosos, que ficavam passeando pelo quarto de hospital quase como se não conseguissem focar em um ponto só. Seu rosto estava machucado, mas isso não atrapalhava a beleza única que se apresentava diante deles: o rosto fino, porém com maçãs do rosto pronunciadas, olhos pequenos bem posicionados deixando um espaço para um nariz pequeno, bonito, e lábios muito bem desenhados. Considerando que Choi Minho estava longe de ser feio com seus olhos grandes e rosto pequeno, Jinki se sentia quase um patinho feio e muito mais velho, com suas olheiras roxas debaixo de seus olhos, além da marca vermelha que sabia que tinha em seu queixo por ter cochilado com o rosto por cima do zíper do casaco.

– Não sei bem – Kim franziu a testa. Intuitivamente, levou o dedo até o local que ligava o aparelho. A mesma voz que mais cedo tinha falado com os médicos encheu a sala:

– Hello, Sir. Password, please.

– Não sei se tinha senha? – Kim murmurou.

– Hello, Sir, nice to have you back – a máquina respondeu e a tela imediatamente virou um celular quase normal, com menus flutuantes, sendo um deles a mesma logo do cartão de identificação de Kibum.

– Antes que se distraia, Sr. Kim – Choi chamou a atenção do rapaz, que o fitou em expectativa – Preciso saber exatamente qual a última coisa de que se lembra?

– Não sei, tudo parece muito confuso – franziu a testa, fechou os olhos com força, para logo depois abri-los novamente – Não sei. Lembro de um clarão azul e… Alguém dizendo que me amava. Um homem, acho.

– Desculpe perguntar, mas acha que estava sob efeitos de drogas? – Choi perguntou, fazendo o máximo para deixar sua voz amigável.

– Não sei, não me lembro de usar drogas.

– Do que exatamente você se lembra? – Jinki se pronunciou, observando que algo estava claramente mais errado do que parecia ali.

– Guardião do Tempo – foi a resposta imediata.

– O que isso significa? – Lee insistiu, chegando perto da cama.

– Não sei, sei que tinha algo importante com o Guardião do Tempo.

Choi fez algumas anotações na ficha do rapaz, conferiu se estava tudo certo com os medicamentos e só então voltou a falar:

– Tem quantos anos?

– Não sei.

A resposta simples e sincera atraiu novamente os olhares dos dois médicos para ele. Kim arregalou os olhos felinos e começou a estalar os próprios dedos, claramente nervoso com o rumo que a conversa estava tomando.

– Qual o seu nome?

– Não…sei – franziu a testa – Vocês estão me chamando de Kim Kibum.

– Não soa familiar?

– Talvez – encolheu os ombros – Tem nesse documento, afinal, embora ele pareça um pouco estranho – levantou o cartão – E consigo me lembrar de algo que soava como um K.

Choi respirou fundo, mas procurou manter a aparência amigável e fez sinal para que Lee Jinki o seguisse para fora da sala.

– Sei que não o conhece, pretende ficar aqui com ele?

– É amnésia, não é? – Jinki falou, cortando o primeiro assunto.

– Sim, ao que tudo indica. Vamos ter que fazer alguns exames e esperar para ver se em 24h ele não se lembra de nada.

– Vou falar com um colega – O cirurgião prometeu, assentindo lentamente – Ver se ele consegue fazer a localização dele, falar com o departamento de pessoas desaparecidas, não sei – murmurou.

– Sim, nós normalmente contatamos a polícia também, mas se você tem alguém de confiança – Choi abraçou a prancheta – Tem algo mais?

– Não, vou falar com ele – sinalizou a porta – E com meu amigo, e então o deixo com vocês.

– Certo, obrigado – sorriu para ele – Esses casos são sempre preocupantes, então é bom quando as pessoas que encontram estão dispostas a ajudar, além de ser algum tipo de conforto para quem acorda sozinho. Mas creio que já sabia disso.

O residente saiu pelos corredores e Lee voltou para o quarto. Assim que entrou, recebeu um olhar confuso do rapaz na cama.

– Disse que não me conhecia e só tinha me achado na rua?

– Sim, largado em um beco, completamente machucado – explicou calmamente, puxando o próprio celular do bolso para falar com seu amigo policial, Kim Jonghyun.

– Tem certeza?

– Claro que tenho – disse com os olhos presos à tela enquanto mandava mensagem para o amigo.

– Eu não tenho essa certeza toda.

Confuso, Lee Jinki levantou o rosto e viu o rapaz a sua frente lhe mostrando seu celular extremamente tecnológico, que exibia em sua tela fina uma foto deles dois, Jinki e Kim Kibum, sorrindo para a câmera. Ou melhor, Kim sorrindo para a câmera, já que os olhos de Lee estavam presos na figura mais jovem ao seu lado, mas com uma expressão que não via nos próprios olhos há muito tempo.

Ato 2

Sonhos

 Lee Jinki estava observando o outro dormir quando a porta do quarto se abriu, revelando um rapaz baixinho, com rosto longo e um sorriso sutil.

– Jong, e aí? – Lee se levantou para cumprimentar o amigo com um meio abraço.

– Eu estou bem, não sei você – gesticulou para a cama – Quem é?

Kim Jonghyun trabalhava em alguma coisa secreta que Jinki não podia saber. Ele era algum tipo de agente, mas essas linhas sobre o trabalho do outro sempre ficavam pairando no ar. A verdade é que, até agora, Jinki não tinha sentido necessidade nenhuma de saber. Respeitava os limites, e tudo mais, mas seus olhos vagaram para o rapaz adormecido na cama e percebeu que não tinha muito o que fazer.

– Não sei – respirou fundo – Estava esperando que talvez você pudesse me ajudar com isso.

Kim franziu a testa, colocando as mãos no bolso.

– Isso é um encontro profissional?

– Talvez – murmurou – Você trabalha com algum tipo de agência de inteligência internacional, certo?

– Achei que tínhamos passado da fase de tentar adivinhar o que eu faço – um sorriso forçado surgiu em seus lábios.

– Não é curiosidade, é só que ele – apontou para o rapaz na cama – tem alguma coisa.

Jonghyun se aproximou do rapaz, como se tentasse reconhece-lo, e ouviu atentamente quando o amigo contou a história em detalhes. Ao final, parecia levemente intrigado, mas não muito perto de dizer o que tinha acontecido.

– Cadê o celular?

Jinki pegou na cabeceira e lhe entregou. Nesse momento, o médico entrou pela porta, com uma expressão suave. Sorriu um pouco para a presença inesperada na sala.

– Boa noite, o senhor é parente do jovem Kim? – Choi perguntou, apertando a mão que lhe foi oferecida.

– Não, mas acho que podemos ter informações a respeito – Jonghyun analisou o celular – Preciso pesquisar um pouco. Kim Jonghyun, sou membro da CPT.

A sigla incomum fez Lee franzir a testa, mas gerou um olhar surpreso no residente. Cuidadosamente, o médico deu passos para perto da cama onde Kim ainda dormia.

– Nunca conheci ninguém da CPT – piscou um pouco.

– Então anda fazendo seu trabalho direito – Kim sorriu – Vamos investigar um pouco, veio dizer algo?

– Sim – pegou a ficha em mãos nervosas – o senhor Kim Kibum estará livre para ir amanhã, teve poucos gastos, mas eles precisam ser cobertos. Não podemos continuar mantendo-o no quarto estando bem e, principalmente, sem pagar.

Jonghyun assentiu lentamente.

– Faremos assim: você deixa Kibum ir com meu amigo aqui – apontou para Jinki, que abriu a boca para protestar, mas foi interrompido – Eu falarei com meus supervisores sobre a dívida. Se ele tem isso aqui, – levantou o celular – então é nossa responsabilidade.

– Então leve ele – Lee finalmente disse.

– Desculpe, mas não quero ir com quem não conheço – a voz vinda da cama pegou todo mundo de surpresa e eles se viraram para ver grandes olhos felinos os observando – Boa noite, sinto que deveria ser questionado sobre para onde devo ser levado ou não. Nunca vi o baixinho – apontou, fazendo Jonghyun reclamar – Não quero ir com ele.

– Nunca me viu também – Jinki argumentou.

– Realmente, mas algo me diz que confio em você – gesticulou para o celular, a foto dos dois ainda brilhava como descanso de tela – Mas se não quiser, tenho certeza que consigo achar algum lugar para dormir. Algum abrigo, não sei – encolheu os ombros – As dívidas, eu–

– Isso é comigo de qualquer jeito – Jonghyun interrompeu.

Lee observava tudo com olhos cautelosos: a ideia de deixar o rapaz sozinho em um abrigo lhe desagradava profundamente e não entendia exatamente o motivo. Abrigos ali eram bons, seguros e, definitivamente, uma alternativa melhor que dormir sozinho no apartamento pequeno de um desconhecido. Mesmo assim, a ideia de deixar o outro era quase dolorosa. Imaginava-o sozinho, sem memórias, sem ninguém, e isso lhe causava um desconforto incrível.

– Vem comigo – disse imediatamente – Se Jonghyun diz que pode te ajudar, a forma mais fácil de te achar é se ficar comigo – explicou.

– Acho que está decidido – Choi acenou – Vou falar com meus supervisores sobre a CPT, – disse para Jonghyun – e assim que os exames de Kibum chegarem, ele receberá alta – se aproximou do rapaz com mãos cuidadosas – A não ser que tenha voltado a febre.

– Então eu vou – Jonghyun avisou, observando o residente fazer rápidos check-ups no rapaz na cama, sob o olhar experiente do amigo – Amanhã volto para falar com supervisores. E Jinki, cuide dele.

Assim que Kim saiu da sala, Lee Jinki se viu observando os dedos longos de Kibum, que apertavam o lençol sempre que Choi mexia na agulha em seu braço.

– O que é a CPT? – perguntou, esticando a mão para pegar a do rapaz e transmitir um pouco de calma. Foi um gesto impensado, mas durante todos seus anos como médico tinha aprendido que o toque de alguém era sempre um fator muito calmante para quem estava passando por uma avaliação médica.

– Não sei ao certo – Minho explicou – Só sabemos que se algum agente da CPT aparece, ele tem que falar com o supervisor, e que é importante – deu de ombros – Às vezes aparecem pessoas aqui, como ele – se afastou da cama, anotando algo na ficha – Sem família, sem ninguém, e aí eles ligam para essa CPT. Nunca aconteceu comigo. Parece tudo ótimo – sorriu para os dois – Amanhã vocês podem sair daqui.

– Desculpe por te obrigar a me aceitar – Kibum comentou, assim que Choi saiu pela porta, deixando-os a sós.

– Não é um problema – respondeu calmemente – Apenas… Não sei o quão confortável meu apartamento pode ser para você.

– É definitivamente melhor que a rua – sorriu timidamente – ou que um abrigo.

– Vendo por esse ângulo – riu um pouco – Prometo que não sou um serial killer.

– E se fosse? – Kim murmurou, a voz sutilmente embargada – Se me matasse, seria como apagar alguém que já foi apagado. Como ficar passando a borracha no papel branco.

Lee, que estava sentado ao lado da cama, só então percebeu que seus dedos ainda estavam presos ao do outro e deu um aperto calmante em sua mão.

– Mesmo que não tenha memórias, é alguém – disse – Significa algo para alguém que está por aí, e vai lembrar logo, e poderei te devolver ao seu lugar.

– E se eu não tiver um?

– Então criamos um.

Fingiu que não ouviu o outro chorar em solidariedade. Manteve sua mão na dele até que as lágrimas parassem.

 Onkey

 – Qual sua idade?

Kim Kibum perguntou depois de passarem quase 10 minutos em silêncio no táxi. Jinki tirou os olhos da janela para fitar o rapaz com um sorriso amigável; tinha decidido que ser sério demais não ia ajudar. Kim precisava se sentir bem em ficar em sua casa.

– 27. Seus documentos diziam que você tem 25.

– Sim, Dr. Choi me explicou – deu de ombros – Ele disse que ninguém aqui tem documentos iguais aos meus.

– Não temos mesmo – Lee relaxou no banco, vendo os dedos longos do outro  brincarem com a costura da blusa que o mais velho tinha lhe emprestado – Desculpa se as roupas não ficaram perfeitas.

O corpo magro do outro ficava solto dentro das roupas largas. Jinki não era gordo, longe disso, mas seu corpo era obviamente de um biótipo diferente, com ombros e quadris um pouco mais largos e coxas mais grossas. Para piorar a situação, a maior parte das roupas de Lee eram um número acima, buscando sempre uma mobilidade mais fácil e mais livre, pensando em qualquer emergência médica.

– Gosto de roupas folgadas – Kim sorriu para ele, soando tímido – Não tinha percebido isso até me vestir – explicou calmamente – É estranho ir se redescobrindo assim, sabe?

– Não saber o que você gosta deve ser complicado.

– Eu não sei quem sou – deu de ombros – Aqui é bonito – murmurou, virando o rosto suavemente para a janela – Até com o tempo nublado.

– Não lembra de Seoul?

Isso fez o outro franzir a testa um pouco, parecia confuso. Os dedos tinham parado agora, e o tempo passou lentamente até a resposta chegar.

– É confuso, lembro de alguns lugares…. Mas eles estão diferentes na minha memória – tocou o vidro da janela do carro, parecendo intrigado – Prédios que estão aqui, mas não nas minhas lembranças ou vice-versa.

– Pode ser um sintoma da amnésia – Jinki começou, imediatamente tentando se controlar em termos muito específicos de medicina – Sua mente confunde sonhos com a realidade. Aconteceu um trauma e ela não sabe como lidar com isso.

Kim se voltou para ele sorrindo.

– Esqueci que era médico também. Acho que estou em boas mãos, afinal de contas.

O silêncio que caiu sobre eles depois disso foi mais suave, os dois pareciam tranquilos na medida do possível quando chegaram ao prédio do médico. Com passos tímidos e olhares curiosos, Kim seguiu o outro até chegar ao apartamento.

– Jinki hyung! – Uma voz jovem chamou a atenção dos dois, que se viraram para ver um rapaz muito magro, parecendo muito jovem, olhando para eles com um sorriso no rosto – Você sumiu! Ficou dias de plantão? A Lily pulou no meu apartamento, dei comida.

– Ah, sério? Lily! – O mais velho exclamou e, de repente, uma gata apareceu correndo da porta aberta do menino e correu para se esfregar nas pernas do mais velho. Ela tinha pelos brancos com manchas pretas e grandes olhos verdes, Jinki se abaixou para tocar trás de suas orelhas – Não atrapalhe o Tae, Lily!

– Tudo bem – o menino deu de ombros – Ela me fez companhia – seus olhos caíram em Kim, então estendeu a mão – Sou Lee Taemin, prazer.

– Oh, desculpe – Jinki riu sem graça – Ele é meu vizinho, Kibum.

– Sou Kim Kibum – apertou a mão do outro. Seu rosto tinha atingido um suave tom rosado, e ele deu alguns passos para trás do mais velho.

– É bom te ver – o mais novo dos três respondeu e então acenou – Estou indo para a aula, mais tarde nos falamos.

Depois que a figura sumiu no corredor, Kim soltou a respiração que não percebeu que estava prendendo. Um miado indignado foi ouvido e então alguns arranhões em sua perna. Olhos felinos castanhos encontraram os verdes. Depois de alguns segundos, Lily passou entre as pernas do humano recém-chegado, esfregou bem o rosto em sua batata da perna e o fitou um pouco. Somente quando dedos longos acariciaram sua cabeça foi que pareceu satisfeita e se afastou de ambos, entrando na porta, agora aberta, do apartamento do médico.

– Eu… Nunca vi isso antes – Lee comentou, soando realmente surpreso – Gatos costumam ser… Gatos são…

– Ela parece amigável.

– Justamente – Jinki riu, incrédulo – Ela agiu como se te conhecesse. Há anos – encarou o outro longamente, lembrando da foto dos dois juntos no celular. O rapaz parecia confuso com o que tinha acabado de ser dito, então o médico resolveu deixar de lado o assunto – Vamos conhecer seu novo lar, então? Deixa a Lily para lá, ela é doida.

Os dois sorriram diante disso, e o mais velho observou a reação do outro a sua casa. Gostava de seu apartamento na medida do possível: não tinha fotos suas, nem nada que todo mundo consideraria pessoal, mas sim livros de medicina espalhados por todos os cantos, alguns de culinária na cozinha, brinquedos da Lily por todos os lados, além dos pelos, e era o suficiente. Nem mesmo a pequena varanda tinha nada além de uma cadeira.

– Oh, que legal – o rapaz deu passos rápidos e pegou algo – Tem algum papel aqui?

Era um pote de tinta guache. Jinki tinha comprado algumas para contribuir com a ala infantil do hospital da rua – não trabalhava lá, mas ia sempre visitar as crianças internadas. Era um hospital comunitário e as pessoas não tinham dinheiro, então todo mundo que visitava tinha levado brinquedos ou materiais para eles. Essa tinta azul tinha sobrado, aparentemente.

– Papel tenho, mas não tenho pincéis, nem outros tons – deu-lhe um olhar quase envergonhado.

– Não tem problema – o sorriso que o outro lhe deu era o maior em dias – Algo me diz que gosto muito de pintar.

Uma hora depois, Lee estava na cozinha fazendo um jantar para os dois. Estavam desde que se acharam comendo apenas refeições no hospital e nada tinha gosto, então estava se dedicando a fazer algo que fosse bom. Conseguia ouvir na sala dedos rápidos correndo pelo papel e, às vezes, Kibum falando em uma voz muito aguda com a Lily. A gata não tinha parado de ser extremamente amigável, passando sempre perto ou em volta de Kim, cobrando carinho ou apenas olhando para ele. Era uma reação no mínimo inesperada, como a Lily o tratava quando passava tempo demais no hospital. Como se sentisse saudade dele.

Mas ela nunca tinha visto Kibum antes.

– Posso pegar água?

Um Kibum com dedos azuis, e uma Lily aos seus pés, perguntou hesitante.

– Banheiro é na segunda porta à direita – murmurou – É para lavar a mão?  – Quando o outro negou, Lee foi até o armário e lhe deu um copo descartável.

Voltou a cozinhar com os pensamentos presos no rapaz que observou fazendo o caminho de ida e volta do banheiro algumas vezes, até que em uma delas voltou com as mãos limpas. Lily sempre o seguia, como se tivesse medo de perde-lo de vista. Lee deu de ombros, decidindo ignorar as loucuras de sua gata e servir a mesa para os dois.

– Vamos jantar – chamou, vendo que o outro já tinha terminado – Desenhou o quê?

– Não sei – ele parecia bem sincero – Essa imagem se repetiu bastante nos meus sonhos no hospital – comentou – Achei bonito, não sabia que ia conseguir reproduzir tão bem.

– Outra coisa sobre você – sorriu para ele – Sabe pintar muito bem com dedos e apenas uma cor de tinta.

– Aparentemente sou cheio de talentos – o rapaz brincou e se levantou em seguida.

Foram para a cozinha, deixando o papel solto na mesa de centro da sala. O desenho era claro, uma figura no centro, feita com o tom escuro natural da tinta, e depois, a sua volta, havia uma espécie de redoma azul de energia, que pareciam várias telas planas de tablets interligadas em tons de azul mais aquarelado no final. Era realmente muito bonito, um sonho agradável para se ter, Lee pensou.

Mas ninguém sabia dizer se o contexto todo era de sonho ou pesadelo.

Ato 3

O Mensageiro

– Jinki hyung está aqui?

Kibum encarou o jovem a sua frente sem saber exatamente o que fazer. Lily estava enroscada em sua perna e o vazio do apartamento gritava a sua volta. Sabia que não deveria ter aberto a porta, mas ao mesmo tempo achou que poderia ser alguma coisa importante. Agora Lee Taemin o encarava diretamente.

– Tae?

Agradeceu mentalmente ao ouvir a voz do mais velho, que vinha da direção do corredor do elevador com um meio sorriso.

– AH, hyung, quero saber se pode me emprestar agora aqueles livros…

– Certo! Entre, Tae – O médico foi passando pela porta e parou, fitando o rosto de Kim com curiosidade: o rosado estava ali novamente – Tudo bem?

Kibum assentiu uma vez e deu passos rápidos para dentro do apartamento, não parando na sala e seguindo diretamente para a porta que era o banheiro. O mais velho suspirou, o outro era aparentemente muito tímido. Estava ali há apenas 2 dias, nos quais o médico já havia notado que não dormira mais que duas horas, e sempre se escondia quando o jovem vizinho aparecia. Lily continuava extremamente apegada a ele, vigiando-o com grandes olhos verdes sempre que podia.

– Ele é realmente tímido – Taemin comentou, observando o outro pegar dois livros da estante – Ou realmente não gosta de mim.

– Não se preocupe com isso – Jinki lhe entregou os livros em questão e colocou as mãos nos bolsos de sua calça jeans – Kibum… Ele está em uma fase difícil da vida dele. Para ele é tudo muito novo.

– Oh, tem algo que eu possa fazer para ajudar? Nem que seja nunca mais aparecer aqui – riu um pouco.

– Nada disso – deu de ombros – Só… Trate ele normalmente, sabe? É tudo bem… Confuso, mas ele se sente um pouco inseguro falando com pessoas.

Kibum apareceu na sala apenas 10 minutos depois que Taemin tinha ido embora. Lily estava deitada no colo de Jinki, que assistia um documentário qualquer na televisão. Kim pegou as tintas e sentou no canto, olhos presos no papel branco. Assim que a tinta azul acabou e Lee percebeu que o outro se expressava muito bem com pinturas, tinha saído e comprado várias tintas, pincéis e blocos A3 para pintura. Nunca ia esquecer a felicidade hesitante do outro quando o médico espalhou tudo na mesa.

– Achei que não gostasse de pintura – Kim comentou, dedos se contorcendo para não tocar em nada.

– É para você – sorriu amigavelmente – Achei que poderia ser bom, sabe? Ter além de uma tinta azul e dedos para ajudar.

– Tem certeza?

– Claro!

Kim tinha lhe fitado com gratidão, dado passos incertos até o abraçar rapidamente, porém de forma entusiasmada. Lee não comentou alto, mas tinha descoberto outra coisa sobre o outro: ele tinha ótimos abraços. Os melhores. Há muito tempo o mais velho não recebia abraços. Sua vida recente era cheia de sorrisos educados. O mais perto que chegava de gestos íntimos era ver a morte sugando a vida de seus pacientes. Observou alguns minutos o pincel correndo a página com avidez.

– Tudo bem, Kibum?

– Uhum – foi a resposta sussurrada que recebeu. Depois ele parou um pouco, fitando a parede a sua frente com o pincel quase esquecido na mão – Você quer que eu te chame de hyung? O Taemin sempre chama, e ele é mais novo… Eu também sou. Algo me dizia que não sou assim – deu de ombros – Mas talvez…

– Não me importo. Talvez você tenha passado tempo fora – deduziu – e perdido o costume. Seu celular estava todo em inglês, certo?

– Certo. Tem razão – isso pareceu aliviar o outro um pouco, que sorriu e voltou a pintar.

– Taemin acha que você não gosta dele.

– Não tenho nada contra ele – hesitou por um minuto – È só que ele é tão… Tão…

Lee viu mais uma vez o tom leve rosado aparecer no rosto do outro e não sabia bem o que interpretar disso.

– Tão intimidante – Kim completou, e então lhe olhou – Você não percebe? Ele tem uma coisa tão… Grandiosa.

– O Tae? – O médico riu um pouco incrédulo.

– Sim! Parece que os olhos dele veem tudo que você pensa – balançou a cabeça – Intimidante demais.

 Onkey

 – Não acho que ela está feliz – Kim comentou, quando Lily soltou um miado indignado de dentro de sua caixinha.

– Ah, ela não gosta de sair de casa, – Jinki respondeu, deixando seu braço trazer Kibum e a caixinha de Lily para mais perto dele no banco do táxi – mas vacinas precisam ser tomadas.

– É pro seu bem – Kibum falou para a gata, abraçando a caixinha de transporte e Lee se viu incapaz de conter o sorriso.

Esse mês que passaram juntos tinha sido tranquilo, Lee tinha explicado tudo no trabalho, e não tinha feito nenhum plantão até agora. Jonghyun tinha sumido completamente, já Kim tinha feito algumas descobertas: gostava de abraços, gatos, pintar e de comer peixe. Não gostava de cenoura. Nem de filmes de terror. Cada nova coisa deixava o clima no apartamento melhor. Lee tinha se acostumado a sair e voltar para encontrar papéis secando em seu sofá. Lindas pinturas de coisas que pareciam várias versões diferentes de filmes de ficção cientifica. No geral, Kim ficava bem sozinho, o que tinha sido uma preocupação no primeiro dia de trabalho. Mas continuava não dormindo praticamente nada, o que era preocupante.

Mesmo que tentassem achar alguma descoberta diariamente sobre a personalidade do outro, sabia que era desanimador passar um mês perdido, sem nem ter ninguém que o procurasse, e principalmente sem saber se realmente tinha alguém ali para ele. Lee ouvia o  outro chorar às vezes, no banho, mas nunca comentara nada. Só o recebia com um sorriso e tentava fazer de tudo para que o outro não se sentisse insignificante.

– Eu vou te dar biscoitinho em casa, Lily – Kim prometeu quando desceram do taxi e a gata fez outro som de tristeza.

Durante a espera no veterinário, Kim saiu para comprar alguma coisa para lanchar. Jinki se viu sozinho observando os outros animais. Era estranho um pouco estar longe de Kim na rua: sempre que saiam juntos, estavam juntos o tempo todo. Deixar o rapaz sozinho em seu apartamento era uma coisa, na rua era outra. Se ele se perdesse, não sabia se conseguiria voltar. Kibum ainda murmurava sobre a cidade estar diferente, narrava prédios que nunca existiram, ou tinha certeza de que outros tinham sido demolidos ou mudado de nome. Era tão complicado, mesmo com as descobertas, a vida dele ainda era tão confusa. Lee sabia de algo depois dessa pouca convivência com o outro: desejava sua felicidade. Ele era uma boa pessoa, criativa, carinhosa com a Lily, e até mesmo com Jinki, então-

Um grito interrompeu seus pensamentos. O médico olhou em volta: estava anoitecendo em Seoul, o veterinário tinha pouca gente e aquela rua em particular não era movimentada. Quando o segundo grito rompeu o ar, teve certeza que era a voz de Kibum. Deixou a caixinha com Lily com a moça da recepção e correu.

Não foi difícil, tinham sorvetes na rua. Correu um pouco e, em um beco sem saída, viu Kibum no canto, sangue em seu rosto e mãos desesperadas tentando se proteger. No chão, uma figura estranha estava tentando se recuperar para voltar a atacar, algo brilhante em sua mão parecia uma faca e Jinki não pensou duas vezes antes de se jogar no outro por trás, tentando fazê-lo se desequilibrar. A faca foi diretamente em seu braço, mas Jinki foi mais forte, jogando-o contra a parede.

– Jinki – Kim falou alto, tentando se aproximar para ajudar em alguma coisa, mas parecendo realmente atordoado.

Do nada, uma figura apareceu do mesmo lugar que Jinki tinha vindo e atirou contra o dono da faca duas vezes. Lee se afastou, correndo para Kibum e segurando seu rosto entre as mãos. Um corte profundo na bochecha alta do outro sangrava, enquanto os olhos felinos pareciam em choque. O homem pegou outra arma, parecida com a de fogo, mas em um tom de azul diferente.

– Vocês – o homem com a as armas falou e Lee se viu dando um passo na frente de Kim com um braço aberto. Seu rosto estava coberto com uma máscara, deixando nada além de olhos de fora  – Esse é o primeiro. Precisa achar o Guardião do Tempo. Dependemos disso.

– Do que está falando? – O mais velho falou alto, sentindo braços trêmulos envolverem sua cintura – Quem é você? Conhece o Kibum? Por que demorou tanto para–

– Ele é o escolhido, precisamos manter tudo certo até o final – E deu um tiro com a arma azul na própria cabeça, sumindo no ar imediatamente.

Os joelhos de Kim cederam, fazendo-o cair ajoelhado atrás de Jinki, rosto entre as mãos enquanto lágrimas e sangue se misturavam nos pingos no chão.

– Calma, Kibum – Lee se aproximou dele, ignorando a dor profunda no braço direito, e usou o outro para abraçá-lo como era possível – Está tudo bem.

– Ele se matou – sussurrou entre soluços – Ele me conhecia e se matou.

Pegando o celular no bolso com a mão machucada, o médico deixou o outro encostar a cabeça em seu ombro e cheirou os fios negros, tentando trazer conforto mais para si mesmo que para o outro. Sabia que nada seria poderoso o suficiente para diminuir o sofrimento de Kibum naquele momento, então fez o que podia: ficou ali com ele. Porque se o mundo todo estava virando as costas para aquele rapaz, ele se recusava a fazer o mesmo.

 Onkey

 Jinki observou pelo vidro do quarto enquanto Dr. Choi estava fazendo o curativo no rosto de Kibum, que, por sorte, não precisava de pontos. Ao contrário de seu braço, que estava com pontos, mas Lee sabia que poderia ter sido pior. Lily miou da sua caixinha, querendo obviamente sair, mas não era possível ali. Dessa vez, junto com Jonghyun, tinham mais duas pessoas que se diziam da CPT.

Quando o médico tinha ligado para Jonghyun, teve que admitir que estava inseguro. Um mês morando com Kibum e essa maldita CPT tinha sumido, sem nenhuma explicação, deixando apenas uma esperança vazia no jovem.

– Sr. Lee? – Dr. Choi sorriu para ele na porta – Pode entrar agora.

Lee levantou ansioso, levando a caixinha de Lily consigo. Deixou-a na cadeira e foi direto para Kibum, que o recebeu com olhares hesitantes nos olhos felinos, que estavam avermelhados e inchados de tanto chorar.

– Melhor? – Perguntou suavemente.

– Depende – Kim encolheu o ombro e esticou a mão para tocar na parte enfaixada de seu braço – Eu… Desculpe.

– Mas não é sua culpa – cuidadosamente, colocou ambas as mãos no ponto de encontro entre o pescoço e o rosto do outro, virando-o lentamente para ver o curativo que enfeitava a bochecha esquerda dele – Ele te machucou também.

– Claro que foi minha culpa – Kim murmurou, deixando as pontas dos dedos vagarem pela faixa em seu braço suavemente – Se eu não estivesse contigo, não teriam te atacado.

– E teriam te machucado mais, certo? – Lee fez com que olhos felinos encarassem os seus – Então ainda bem que eu estava lá – viu o outro abrir a boca para protestar e o puxou para um abraço reconfortante – Ninguém merece qualquer tipo de agressão, Kibum, não é sua culpa.

O som da porta fez com que os dois se voltassem para ela, vendo Jonghyun fita-lo com sobrancelhas arqueadas.

– Interrompo algo?

– Sim – Lee riu um pouco – Esse rapaz acabou de levar uma facada no rosto e eu uma no braço, estamos ambos passando por um momento meio complicado, se você se importa.

Jonghyun assentiu lentamente, não fazendo mais comentários sobre isso, e se aproximando deles com um saco plástico transparente que tinha o celular de Kibum dentro.

– Kibum, precisamos conversar – sorriu amigavelmente – Se quiser que Jinki saia–

– Ele fica – o jovem disse facilmente, afastando-se do abraço, mas segurando a barra da blusa dele por trás.

– Certo – Jonghyun falou, mas a resposta não parecia ser satisfatória – Esse celular tinha dados sobre os acontecimentos de hoje – explicou – Não dizia o que ia acontecer, nem local, mas tinha registro dos ferimentos. Sabe como isso é possível?

Kim respirou fundo, parecendo visivelmente chateado.

– Esqueceu que estou com amnésia? – Reclamou, soando realmente chateado de ter que dizer tais palavras.

– Certo – Jonghyun abaixou a mão que segurava o plástico e fitou os dois – Estava falando com meus colegas da CPT e decidimos que seria melhor que viesse conosco. Chega de morar com Jinki aqui – deu batidas animadas no ombro do outro – Vai morar na base de Seoul da CPT!

O horror refletido nos olhos castanhos foi o suficiente para o mais velho se colocar um pouco mais entre os dois e, sorrindo amigavelmente, dizer com todas as letras:

– Ele não vai.

– Não é uma questão de escolha sua, Jinki –Jonghyun retrucou – O melhor para Kibum é ficar cercado de pessoas que podem ajudar nessa jornada. Sei que você é médico e tudo mais – gesticulou rapidamente – Mas ele precisa de especialistas, como nós da CPT. Sei que ele entende essa necessidade também, certo?

– Eu não vou – foi a resposta de Kibum.

– Especialistas em que exatamente? – Lee perguntou e continuou sem esperar resposta – Pois não sei exatamente como podem ser especialistas em qualquer coisa considerando que esqueceram esse rapaz que está completamente sozinho e sem memórias por um mês! Trinta e um dias, Jonghyun! Acha que é justo aparecer do nada agora e arrancá-lo do pouco da rotina que ele conseguiu criar? Ele já tem um espaço lá em casa – disse quase exaltado – Tem as pinturas dele lá, o quarto de hóspedes, e a Lily adora ele! Um mês é muito tempo! Agora você quer pegar ele, levar para essa tal de CPT que ninguém sabe o que faz, para ele só ficar mais cercado de coisas que não lembra? Pessoas que não conhece?

– Não se engane – Jonghyun respondeu friamente – Ele não te conhece também.

Kibum pareceu particularmente chateado agora, balançando a cabeça e apertando a mão na blusa do mais velho.

– Eu conheço Jinki!  – exclamou – T alvez não tudo – admitiu suavemente –, mas ele não me machuca, tenta me ajudar a descobrir as coisas e ainda pergunta sobre minhas pinturas. Não sei exatamente por que essa última parte é tão importante, mas é – riu um pouco – Estou bem lá.

– Nós precisamos conversar com Kibum para saber mais sobre isso – Jonghyun mostrou o celular novamente –, sobre a identificação falsa e sobre os eventos de hoje.

– Identificação falsa? – Kim perguntou, confuso. Mas não obteve resposta.

– E nós podemos conversar – Lee respondeu – Todos nós. Mas no final, ele volta para casa comigo até alguém da família dele aparecer, ou até não querer mais, certo? – Fitou Kim, que assentiu avidamente – Hoje estamos cansados, mas pode marcar o dia que quiser nessa CPT aí e iremos lá.

Jinki ajudou Kim a se levantar da cama, pegaram a caixinha da Lily no caminho e foram atrás de Dr. Choi para ver se já podiam ir para casa. Durante todo o trajeto, Jinki se viu pensando em exatamente o que poderia ser a CPT, o que o passado de Kibum escondia. Fitou o outro, que estava colocando os dedos entre as grades da caixinha para acariciar Lily, e se perguntou o que poderia ter acontecido de tão errado para tentarem mata-lo.  O que era um Guardião do Tempo? O que isso tinha a ver com Kibum? O que deveriam fazer para que ele achasse seu rumo novamente?

Pela primeira vez, Jinki pensou que esses rumos provavelmente levariam o outro para fora de sua vida. Tentou imaginar o apartamento sem o cheiro suave de tinta, ou chegar sem achar as novas pinturas secando no sofá, e sentiu um leve vazio inexplicável no peito.

 

Ato 4

Sonhos

Quando Jinki acordou ouvindo gritos, ficou na dúvida se era um pesadelo ou realidade. Sentou-se na cama e olhou envolta no quarto escuro, tudo bem. Estava acordado. Uma dose de medo se espalhou por sua espinha e ele saiu correndo da cama, tropeçando no processo, indo imediatamente checar Kibum. Tinham trancado a porta e colocado um sofá para prendê-la, além de trancarem bem as janelas, afinal, aparentemente alguém estava atrás deles, então iriam dificultar isso.  

Foi para o quarto de Kibum e o encontrou sentado na cama, com as mãos nos olhos.

– Hey – se aproximou dele, sentando ao seu lado – Não precisa chorar.

O corpo do mais novo caiu contra o seu, gelado e mole, rolando e expondo o rosto bonito sem vida.

Lee acordou com um grito, olhando em volta e tentando controlar a respiração agitada. Apalpou a cama, sem saber exatamente o que esperava achar ali.

– Jinki?

Deu um pulo na cama, o coração acelerando ainda mais até reconhecer a voz. Levantou o rosto e viu Kibum encostado em sua porta.

– Eu… Desculpa.

– Não estava dormindo mesmo – deu de ombros – Quer falar sobre isso?

Lee balançou a cabeça e abriu os braços. O mais jovem não hesitou quando deu passos rápidos, sentou na cama, e deixou-se ser abraçado pelo outro, correspondendo imediatamente. Jinki fechou os olhos, sentiu o peso contra seu corpo, os fios de cabelo contra seu nariz e o cheiro suave de flores invadindo o quarto.

– Fecho meus olhos e vejo dor – Kibum murmurou – Sempre a mesma coisa. Sempre acordo com medo e sozinho.

– Por isso dorme tão pouco?

Kim assentiu. Era a primeira vez que falavam sobre as noites em claro do outro. Lee apertou mais seus braços em volta da figura esguia.

– É difícil – o outro continuou – Nunca sei se são sonhos ou realidade, nunca sei se toda aquela dor é real, se todo aquele sangue… E a escolha.

– Escolha? – franziu a testa, mas se recusou a soltar o outro, puxando-o para mais perto – Que escolha?

– Sempre tem uma escolha, não sei qual é, nem o que significa, mas me pedem algo – seus dedos apertaram o pijama do outro – Acordo sempre tão confuso, sem saber o que fazer, para onde ir…

– Venha para mim –  Jinki se afastou um para fitar diretamente os olhos felinos – Sozinhos estamos fracos, com medo, mas juntos ninguém pode pegar a gente – sussurrou – Minha cama é grande o suficiente se não se incomodar de passar a noite aqui. Podemos guiar um ao outro para o mundo dos sonhos.

– Espero que sim – ele sorriu um pouco, ombros relaxando ainda mais – Sei que você não me deixaria perdido no pesadelo se tivesse escolha.

A certeza na voz do jovem fez o coração de Jinki se aquecer, e então sentiu um beijo suave em seu rosto. Dormiram juntos, abraçados na cama, como se aquilo fosse o suficiente para afastar qualquer insegurança e, pela primeira vez em um mês e duas semanas, Kibum dormiu uma noite inteira.

 Onkey

 Lily soltou um miado irritado quando bateram na porta. Kim estava sozinho, já que Jinki estava trabalhando, e as mãos sujas de tinta o atrasaram para atender. Abriu a porta e deu de cara com um rapaz que nunca tinha visto antes, usava um terno e era muito alto.

– Boa tarde – Kim sorriu, tenso, e sentiu Lily em suas pernas.

– Boa tarde, Kim Kibum?

O rapaz segurou a porta com mais força e a trouxe para mais perto do corpo, pronto para bater a porta caso algo acontecesse. Costumava ter esperança de que eventualmente bateriam na porta, depois de verem a ficha dele em alguns sites de desaparecidos em que ele tinha se inscrito sem contar a ninguém, e diriam “Meu Deus, Kibum, a gente estava te procurando por todos os lados”, mas depois de quase dois meses esperando, simplesmente não tinha mais energia para ter esperanças. Assim como também estava confortável com a sua vida ali com a Lily e o Jinki.

– Eu mesmo.

– Eu sou Park Chanyeol, colega de Jonghyun, da CPT – Ele retirou do bolso um cartão de identificação e mostrou para o outro. Kim franziu a testa: era muito parecido com o seu próprio cartão de identificação, mudando apenas as cores. O logo era exatamente o mesmo: uma abelha delicada, sem nada escrito – Tivemos alguns atrasos em relação a começar os testes com você, mas vamos agora.

– Que testes?

– Creio que Jonghyun tenha lhe informado que precisamos analisar você um pouco, suas memórias, sua missão.

– Não faço ideia do que está falando – Kim fechou um pouco a porta, ficando espremido entre ela e a parede – Não vou a lugar nenhum.

Park pareceu realmente irritado com a recusa, dando um passo à frente e colocando uma mão na porta, empurrando-a suavemente.

– Jonghyun–

– Disse que precisávamos conversar e ficou combinado que eu iria na CPT às vezes, mas só com o Jinki – respondeu firmemente – e nada de testes foi mencionado. Além disso, vocês me esqueceram por um mês, aí eu sou quase morto na rua, então reaparecem dizendo que vão me ajudar e somem por 3 semanas? Como espera confiança de mim?

Isso parece pegar o outro de surpresa, visto que ele para um pouco de pressionar a porta e franze a testa.

– Nós precisamos fazer algumas investigações antes –  explicou – Além disso, para fazer algumas coisas precisamos de autorização e essa vem de muito longe, demora a chegar. A mesma coisa com algumas verificações a seu respeito que deveriam ter sido feitas já, porém a comunicação foi complicada e só recebemos respostas criptografadas.

Kim tentou controlar sua expressão para não parecer tão confuso. Que lugar poderia ser tão longe para uma comunicação demorar mais que algumas horas para chegar? Essas pessoas trabalhavam com cartas no papel?

– Eu–

– Kibum? O que está acontecendo aqui?

Os dois se viraram para ver Lee Taemin, segurando um livro na mão e a mochila em um dos ombros, com uma expressão fechada. Lily escapou pelo espaço da porta para se esfregar na perna do recém-chegado e miar de forma quase suplicante.

– Quem é você? – Chanyeol perguntou.

– Wow, nossa – Lee tinha uma expressão quase feroz – Quem é você? Kibum não parece feliz em te ver e, sinceramente, isso já seria motivo o suficiente para você sumir daqui.

– Nós realmente precisamos leva-lo para CPT e–

– Se ele não quer ir, você não precisa leva-lo para lugar nenhum! – Taemin foi até a porta e Kim o deixou entrar facilmente – Vá embora.

– Jinki vai me levar lá – Kim falou, fitando o outro severamente – Depois de falar com Jonghyun, que é alguém que ele conhece e confia.

Isso fez Park rir um pouco, de forma quase irônica. Mas antes que pudesse retrucar, Taemin fechou a porta e se encostou nela, deixando a mochila cair no chão. Lily miou satisfeita e se afastou.

– Você tem uma vida agitada – Lee comentou – não sei como aguenta.

Kim encolheu os ombros, sentindo-se levemente intimidado, como sempre acontecia na presença do outro.

– Eu também não sei como aguento.

– Acho que Jinki hyung não vai se importar se eu pegar alguns livros, já terminei aqueles – ele murmurou, se afastando da porta para encarar a estante – você pinta, certo?

Kim assentiu até perceber que o outro estava de costas e não poderia ver, então foi até a mesa – cheia de tintas, pincéis e um papel meio colorido – enquanto respondia.

– Aparentemente – deu de ombros. – É uma boa forma de tentar lembrar.

Taemin pegou um dos livros na estante e se aproximou da mesa, sorrindo ao ver o conteúdo no papel.

– E também para registrar as lembranças que tem medo de perder?

O rosto de Kibum corou profundamente, enquanto ele timidamente continuava a pintura de um Lee Jinki adormecido, com a luz do sol nascente brilhando suavemente no rosto bonito e relaxado do outro.

– Não sabemos o que pode acontecer amanhã – murmurou – se eu esquecer tudo de novo, então…

Como se percebesse que estava tudo muito constrangedor para o outro, o rapaz se afastou novamente para pegar os livros e devolver na estante. Kim observou curiosamente. Nesse período morando aqui, tinha visto essa troca incessante de livros entre os dois, sendo que Lee só tinha materiais voltados para medicina.

– Você faz medicina? – perguntou – Tem quantos anos?

–  Tenho 23 e não, não sou médico  – encolheu os ombros – estou no segundo semestre de física – deu de ombros – informação sobre tudo é divertido. Além disso, o hyung tem livro sobre física também.

Kim continuou pintando, mas riu um pouco. De repente, sua mente foi tomada por um clarão que não conseguia explicar. Ao fundo, conseguia ouvir uma voz irritada falando alto:

– Não é uma questão do que você gosta e sim do que é melhor para você!

Kim se viu ficar vermelho de raiva, levantar uma das mãos e gritar com força:

– É a minha vida, EU SEI O QUE É MELHOR PARA MIM!

– É UMA CRIANÇA – A voz agora tinha forma: um senhor mais velho, olhos negros, bochechas altas como as de Kibum, e fios grisalhos – NÃO TEM NOÇÃO DO QUE É BOM OU NÃO. Ficar brincando de misturar cor? Pelo amor de Deus, Kibum, você sabe como o mundo está hoje em dia! É preciso ir um pouco além de ser um hipster que vive colocando miçanga em quadro!

– Calma – uma senhora, também de fios grisalhos, com olhos felinos iguais aos de Kibum, se colocou entre os dois – essa conversa pode ser mais civilizada, sem berros, sem desespero.

– TEM DESESPERO SIM – Kim se viu gritar, parecendo muito mais jovem – O QUE VOCÊ ESPERA DE MIM? EU NÃO QUERO FICAR COLANDO FIO O DIA TODO, EU SOU MAIS QUE ISSO!

O senhor avançou para frente e um som de algo de vidro caindo no chão ecoou pela sala, enquanto mãos fortes seguravam braços magros e– Kim tinha derrubado o pincel no chão, e esse tinha feito um rastro de tinta vermelha pelo piso branco. Suas mãos estavam trêmulas e o ar faltava aos pulmões, tentou levantar da cadeira, mas quase caiu no processo. Lee tentou segurá-lo, mas os dois acabaram caindo no chão. O mais jovem se ajoelhou ao lado do outro, sem saber exatamente o que fazer.

– Calma, Kibum, eu – ele olhou em volta da sala completamente perdido – você não está passando mal, tem algum problema de saúde? – perguntou ao notar a respiração pesada – asma? Não sei, qualquer coisa?

Kim levantou as mãos em defensiva para o rosto e murmurou alguma coisa em voz chorosa.

– Eu não vou fazer nada contigo – Taemin assegurou – nada, eu juro, prometo, nada mesmo – colocou uma mão suavemente no ombro do outro e o sentiu ficar tenso, mas insistiu até que ficasse claro que não tinha a intenção de machucá-lo. Eventualmente, os braços caíram ao lado do corpo do outro no chão, que se encolheu em si mesmo, abraçando as próprias pernas silenciosamente. – Precisa de algo?

Recebeu apenas um gesto negativo em resposta, e pode ter certeza que ouviu um som ainda choroso vindo do outro, mas não tinha como ajudar sem saber o que era. Lily voltou para o cômodo e se posicionou deitada nas costas de Kim, dando um olhar quase suplicante a Taemin.

– Está preocupada? – Lee passou os dedos suavemente na cabeça da gata, que aceitou o carinho facilmente – pode ficar tranquila, eu vou ficar aqui de olho nele até o hyung chegar.

E ele realmente ficou ali até que, aproximadamente três horas depois, Lee Jinki entrou pelo apartamento.

– Kibum, você não vai acreditar, eu – ele parou no meio da frase, deixando sua mochila e uma sacola com uma expressão chocada – o que aconteceu aqui? Taemin?

O rapaz, que tinha tomado um susto com a porta abrindo, se levantou do chão, tropeçando um pouco no caminho, e viu o amigo mais velho se aproximar do rapaz deitado com a preocupação presente em todas as suas feições. Lily se afastou para dar espaço, mas também não tirou os olhos do dono.

– Um cara da CPT esteve aqui, ele estava tentando levar o Kibum embora – Jinki se virou para ele parecendo perdido entre estar extremamente preocupado ou muito irritado – Eu não deixei, ajudei ele a mandar o cara embora, e depois a gente entrou, conversou, aí do nada ele começou a chorar, caiu da cadeira tremendo e eu não sabia o que fazer – Lee finalmente deixou as emoções correrem por suas veias, agora que não precisava ser forte para manter Kibum bem, e sentiu seu desespero se refletir fisicamente em mãos trêmulas – achei que ele fosse, não sei morrer, não sei.

Jinki constatou que Kibum estava dormindo, então preferiu cuidar de quem estava acordado antes. Levantou e segurou o mais jovem da casa pelos ombros.

– Você foi ótimo, ok? Obrigado por ajudar ele. Não sei o que essa CPT quer, mas não acho uma boa ideia deixar alguém com amnésia ser levado assim. Obrigado – o Lee mais novo assentiu e parecia tão triste – quer ficar aqui essa noite? Pode dormir no quarto de hóspedes.

– Seria uma boa, sim – sorriu um pouco aliviado – eu fiquei tão preocupado, hyung.

Taemin tinha aquele olhar de novo. Às vezes, fitava Jinki de forma inexplicável, tinha amor misturado com admiração, e o mais velho sempre ficava um pouco na dúvida de como lidar com tantos sentimentos. Não sabia o que tinha acontecido com a família do outro, falavam pouco sobre isso, mas sabia que ele estava sozinho, então o acolheu facilmente em sua vida.

– Você foi realmente ótimo hoje, ok? – O mais novo assentiu e Jinki lhe deu um beijo na testa, antes de observá-lo pegar a mochila, um livro e se encaminhar para o quarto de hospedes.

Depois foi a vez de olhar o rapaz no chão da sua sala. Sentiu o próprio coração apertar um pouco diante da visão. O rosto bonito estava decorado com olhos avermelhados e lágrimas secas. O sono não parecia tranquilo, considerando que o outro tinha a testa franzida desde que chegara. Cuidadosamente, o pegou no colo, o braço direito embaixo de suas pernas, o esquerdo nas suas costas, como um bebê, decidido a colocá-lo na cama. No processo, sentiu olhos se abrirem contra sua clavícula.

– Jinki? – Era um tom carregado de sono, hesitantemente feliz, misturado a um medo suave.

– Claro que sou eu – murmurou de volta, parando para fitar o rosto do outro em seu colo – tudo bem?

– Agora sim – respondeu – Estava com medo de voltarem para me tirar daqui – Kim levou a mão para segurar gola da camisa do mais velho delicadamente – Tive alguns sonhos ruins.

– Tudo bem, ninguém vai te tirar daqui sem me levar junto.

– Promete?

– Sim.  Não vai ficar sozinho.

Isso contentou o outro, que se deixou ser levado para a cama. Falariam depois, tentariam entender o que aquela lembrança dizia sobre Kibum depois. Por agora, Jinki ia segurar o outro enquanto dormia, desejando que pudesse realmente cumprir o que prometia.

Ato 5

CPT

– Eu não sei bem – Kibum murmurou, soando particularmente triste, contra o travesseiro da cama de Jinki – era tão triste.

Lee se sentiu confortável o suficiente para correr os dedos suavemente pelo corpo do outro, indo do ombro até sua cintura e então puxando-o para perto de si.

– Quer me contar agora?

Kibum estava acordado há alguns minutos apenas, já Jinki tinha acordado há quase uma hora e ficara observando seu sono, vigiando seus sonhos, com medo que o episódio do dia anterior se repetisse e o outro ficasse sozinho.

– Tinha um homem – Kim encostou a cabeça no peito do outro, suspirando contente quando se viu completamente abraçado pelo o outro – ele estava gritando comigo, não gostava das pinturas… Acho que ele é meu pai.

– Não gostava de suas pinturas?

– É, ele estava um pouco violento, muito irritado – o mais novo levou uma das mãos até abraçar a cintura do outro também – parecia que ele ia me bater, aí uma moça… Eu acho que ela era minha mãe, ela… Eu não sei, Jinki, tudo parecia tão diferente… Não parecia com isso aqui, meus sonhos nunca parecem com isso aqui.

– Como assim?

– Parece mentira, parece que vai virar fumaça. E as ruas… Tem prédios diferentes, Jinki, tem alguma coisa errada comigo?

O mais velho sentiu um aperto no peito. Era terrível ver o outro passando por tantas inseguranças. E pior ainda saber que não tinha como resolver. Aparentemente, o pai do rapaz era um ser abusivo que batia nele, que não estimulava o lado criativo do outro. No fundo de sua mente, Jinki se lembrava da felicidade genuína do rapaz quando elogiava suas pinturas. Era o reconhecimento que nunca tinha tido, estava em seu inconsciente.

– Claro que não – respondeu, uma de suas mãos indo até a nuca do outro para fazê-lo olhar para cima, diretamente para os olhos do mais velho – você é incrível. Sei que parece que está sozinho, que não tem ninguém aqui, principalmente porque não consegue lembrar – levou seus dedos para o rosto do outro – eu queria tanto ser capaz de eliminar esses sentimentos ruins, te fazer ver o quão especial… Eu… Kibum…

Eles já estavam tão próximos que não foi realmente difícil para Jinki se inclinar e deixar os lábios tocarem os do mais jovem. Além disso, deixou muito espaço para que Kim se afastasse caso quisesse, mas os olhos felinos se fecharam. Lentamente o leve tocar de lábios foi virando um beijo calmo e dedos longos acariciavam as costas do mais velho.

Batidas na porta despertaram os dois do momento. Kibum deu um pulo, o corpo imediatamente tenso, e Lee demorou alguns segundos para entender.

– O Tae dormiu no quarto de hóspedes – explicou e viu o outro relaxar imediatamente – ele estava preocupado contigo.

O jovem parou um pouco, observando Lee abrir a porta para o rapaz: lentamente, nesses meses que tinha morado ali, as interações com Taemin tinham ficado mais razoáveis. Ainda era extremamente intimidador ver aqueles olhos que pareciam saber tudo sobre si, quando ele mesmo não sabia.

– Ele está melhor? – foi a primeira coisa que ouviu na voz sonolenta do outro.

– Está sim, quer entrar?

– Não vai atrapalhar?

– Não sei. Kibum?

Os dois se voltaram para ele, de repente, e suas bochechas começaram a esquentar com a atenção inesperada. Deu de ombros e observou a troca suave entre os amigos. Lee se inclinou para beijar a testa do mais novo que deu passos lentos até a cama, sentando na beirada. Talvez, levando em consideração o que tinha acontecido há alguns minutos, deveria sentir ciúmes, mas seu coração tinha apertado um pouco ao ver a cena a sua frente.

– Tudo bem mesmo?

Taemin estava lhe olhando daquela forma de novo, e Kim se encolheu até sentir o braço de Jinki em volta do seu ombro.

– Não sei – disse sinceramente – acho que agora agora – repetiu rindo um pouco – está tudo bem incrível.

Ninguém comentou que Lee Jinki estava um pouco corado depois disso, apenas continuaram falando sobre assuntos banais, preenchendo um pouco aquela manhã de assuntos leves.

OnKey

Taemin já tinha ido embora e Jinki estava terminando de se vestir para sair quando bateram na porta. Kibum estava deitado no sofá, Lily em sua barriga, vendo televisão, e nem se mexeu quando o som tomou o local. Quando Lee abriu a porta, viu a figura de Jonghyun lhe fitando com um sorriso suave.

– Jinki, precisamos levar o Kibum.

Lily miou irritada, e Kim não se mexeu, apenas cobriu o rosto com o braço.

– Bom dia, Jonghyun – Lee sorriu amigavelmente – ficou combinado que marcaríamos um horário para levar o Kibum na tal CPP–

– CPT.

– CPT – rolou os olhos – e que eu iria junto. E que depois ele voltaria.

– Sei que quer estar presente – Jonghyun disse, colocando força em todas as suas palavras – sei que está irritado pela demora, mas precisa entender que nem sempre tudo pode ser rápido ou depende de mim! Eu queria ter pego o Kibum no hospital, ter dado toda a assistência que a CPT poderia, mas tudo tem sido muito complicado, conseguir autorização para fazer todos os testes foi complicado – gesticulou irritado – e principalmente, ficamos de mãos atadas várias vezes! Sabe o que tive que fazer para conseguir isso aqui? Tive que bater meu pé para superiores, que deixar claro que tem uma pessoa perdida aqui e que é nossa função resolver isso, mesmo que – parou um pouco, como se estivesse pensando em qual palavra usar – chefes não queiram a gente nisso. Uma vida com bem-estar é sempre mais importante.

Em meio ao discurso, Kibum tinha sentado no sofá e estava olhando o desenrolar curiosamente. Obviamente, a ideia de que poderiam achar sua família, sua origem, era ainda tentadora. Mas depois de lembranças recentes, não sabia mais se queria encontrá-la também. Esteve bem ali com Lily, Jinki e Taemin.

– Do que está falando? – Jinki franziu a testa – Como assim autorização? Testes? O que é a CPT?

– Infelizmente essa informação é, ainda, confidencial – suspirou cansado – sei que é difícil acreditar, mas Jinki, nos conhecemos há anos… Acha que te colocaria em algo que não acreditasse? Sei que sente algo por ele, qualquer um com olhos pode ver; acha que o levaria para algo em que não acredito 100%, sendo que sou seu amigo há anos?

Jinki pensou por alguns segundos e então pegou o próprio casaco.

– Kibum, vamos com o Jonghyun – ao notar o horror refletido nos olhos felinos, foi até ele e segurou o rosto bonito entre suas mãos – irei com vocês, ficarei contigo em todos os momentos e vai ter liberdade de negar – disse firmemente sem nem tentar checar com Jonghyun se isso era possível ou não – sempre que não quiser fazer algo, certo? Confia em mim? Pelo menos é uma chance que temos.

Kim assentiu lentamente, mas seus olhos ainda pareciam hesitantes e tristes, então Jinki lhe deu um beijo rápido e suave, tentando conseguir um sorriso em resposta, e sentiu-se bem recompensado quando aconteceu.

Onkey

Jinki e Kibum entraram no prédio da CPT de mãos dadas, o mais jovem quase se escondendo atrás do mais velho, como se ele fosse seu muro contra o mundo. O local era bonito, um prédio todo formado por janelas pretas, que por dentro pareciam transparentes como qualquer janela normal. Pessoas passavam com terno e pastas, como qualquer outro prédio empresarial.

– Elevador – Jonghyun os guiou e sorriu para a moça na recepção – só eu entro agora, certo, Wendy?

– Okay – a moça sorriu e lhe entrou uma chave – Eles vão também? – Jonghyun assentiu e ela anotou alguma coisa no computador e lhe deu uma mesa digitalizadora para assinar.

Ao entrarem no elevador, Jonghyun colocou a chave no local indicado. Imediatamente a tela, que antes passava propaganda, mostrou números que iam de 10 a 15, sendo que os números normais do elevador iam de garagem a 9. Jonghyun apertou 11 e, inesperadamente, começaram a descer. Kim ficou imediatamente tenso, olhos arregalados buscavam saídas, mas estavam debaixo da terra: se algo desse errado, como fugiria? Notando a tensão do outro, Lee tentou esconder a própria e sorriu para ele, murmurando um “vai ficar tudo bem”, levantando seus dedos entrelaçados até que seus lábios tocassem a mão do outro.

Os corredores dessa parte do prédio eram altos, brancos, cheios de portas sem janelas e com telas localizadas no centro da madeira. Sem muitas pessoas de terno, apenas uma ou outra, e muitos jalecos. Pararam em uma das portas, Jonghyun digitou algo na tela e então entraram em algo que parecia um laboratório. Fotos de Kibum ocupavam um quadro, algumas de Jinki, junto com algumas equações. Na mesa que ficava embaixo desse quadro, alguns papéis estavam empilhados, além do celular do outro e a carteira de identificação. Jinki piscou vendo o logo de abelha que aparecia em verde no cartão de Kim. Estava plotado em preto e branco na parede a sua frente.

– Kim Kibum? – Uma moça de jaleco disse, se aproximando com um sorriso – Sou Irene, é bom finalmente tê-lo na CPT – apertou sua mão – e você deve ser Lee Jinki, Jonghyun nos contou tudo sobre você.

– Bom saber que alguém sabe de algo nesse relacionamento – Jinki apertou a mão dela, sorrindo ironicamente – considerando que Jonghyun se recusou a dizer qualquer coisa a respeito de vocês.

– Sei que é frustrante – ela encolheu os ombros – mas é o procedimento padrão. Agora, Kibum, posso te chamar assim, certo? – Esperou uma resposta positiva até continuar – Pois, Kibum, não temos autorização para fazer todos os testes comuns de alguém na sua situação, de amnésia em um local tão longe de casa, mas podemos fazer todas as ressonâncias, testes físicos e químicos, ou seja, tirar um pouco de sangue. Tem problema?

O jovem cogitou um pouco, apertando a mão do outro com força.

– Jinki pode ir comigo?

– Para todos os lados – ela sorriu – estou com uma cópia das autorizações aqui, e de mais algumas solicitações, então podemos começar de vez.

Lee observou enquanto tiravam sangue do outro, para logo depois encaminhá-lo para a máquina de ressonância magnética. Sendo médico, estava extremamente acostumado a ver coisas assim, então sempre que Kim procurava seus olhos, assentia e lhe dava um enorme sorriso de volta, tentando passar o máximo de calma. A curiosidade foi ficando cada vez maior, considerando que eram testes tão comuns, por que precisavam de tantas autorizações? O que estavam procurando, afinal de contas?

Foi quando começaram os testes físicos, que eram basicamente colocar o rapaz para fazer alguns exercícios enquanto era monitorado. Nesse momento, Kim pareceu relaxar, obviamente aquela sensação não sendo tão diferente quanto as outras, então Jinki se aproximou dele, perguntando se estava tudo bem se ele fosse ao banheiro. Assim que recebeu um sim, foi guiado por Jonghyun para o banheiro. Na volta, observou com calma todas as telas nas portas, notando que todas tinham na verdade a logo e um nome embaixo, em fonte pequena e fina; alguns tinham apenas “LABORATÓRIO” e uma letra, outros eram um pouco mais complicados, como “ANÁLISE DE RESULTADOS DA MÁQUINA X”, ou “CUIDADOS COM AS LINHAS” e algumas letras ao lado; “OBSERVATÓRIO DE PONTOS FIXOS” e nada parecia fazer muito sentido.

Assim que entrou na sala, e viu que Jonghyun se afastou para falar com Irene enquanto Kibum corria, atrasou os passos e olhou o quadro com calma: as fotos de Kibum eram todas recentes, menos duas. Tinha ele com o Jinki em várias situações, e o homem se sentiu um pouco irritado em saber que estavam lhe seguindo pela rua. Tinha Kibum no hospital, fotos provavelmente cedidas por Dr. Choi, de seus machucados e até mesmo uma de perfil que deveria ser sua ficha. E duas fotos. Apenas duas fotos em que Kibum aparecia um pouco diferente: a que era dele mesmo e de Kibum que estava no celular no outro, da qual tinha se esquecido completamente, e outra de um Kim um pouco mais jovem, um sorriso muito grande enquanto segurava alguns fios nas mãos. Ele parecia pego de surpresa, os olhos um pouco arregalados, mas a pessoa tirando a foto tinha consigo um sorriso mesmo assim. Como tinham conseguido aquilo e não sabiam nada sobre o passado dele?

Deixou os olhos caírem nos papéis na mesa e viu que tinham dois repetidos. Olhando em volta para conferir se Irene e Jonghyun ainda faziam testes físicos, escondeu esses dois dentro de seu casaco e se aproximou dos testes como se nada tivesse acontecido.

Onkey

– Eu achei que ia ser pior – Kibum confessou enquanto voltavam andando para casa. A noite estava levemente fria, e os dois estavam dando passos lentos de mãos dadas.

– Eu também – Lee riu um pouco – mas algo me diz que não vamos ver tudo que esses testes vão revelar. Algo me diz que tem algo realmente incrível sobre você e que vão tentar tirá-lo de mim.

Kim parou de andar de repente, e deu um puxão leve na mão do mais velho até ele parar.

– Não vão me tirar de você, eu quero ficar aqui – assegurou.

– Tem certeza?

– Absoluta – ficou nas pontas dos pés e beijou o rosto do outro, que sorriu, segurou seu rosto com as duas mãos e lhe beijou nos lábios. Essa liberdade entre os dois era maravilhosa, pensou, sentindo seu coração acelerar de ter o mais velho tão perto.

– Mesmo assim – continuou, ainda com o rosto do outro em suas mãos – tem algo diferente com você, algo que precisa de uma agência doida para investigar, algo inacreditável.

– Eu-

Foram interrompidos por um som alto, como se um raio caísse ao lado deles, e se viraram para ver um rapaz parado na frente deles. Lee não precisou olhar muito para reconhecer a roupa toda preta. Já tinham passado por isso antes, sabiam o que ia acontecer a seguir.

– Você não vai conseguir – o rapaz disse, parecendo um pouco alterado, quase como se estivesse bêbado ou chorando muito. Ou ambos – não é justo – puxou algo do bolso, que Jinki demorou a identificar como uma arma de foto – eu vou acabar com tudo antes que comece.

O som de tiro explodiu quebrando o silêncio da noite.

Ato 6

Documentos

Kibum estava trêmulo enquanto tentava puxar o soro em seu braço e sair da cama do hospital. Sua mente estava nublada, nunca achou que poderia ter uma sensação pior que quando tinha acordado ali pela primeira vez, sem memórias, sem preocupações. Assim que sentou, uma dor se espalhou pela parte inferior de seu corpo e notou que seu tornozelo direito estava enfaixado. Estava perto de começar a mancar para sair, quando a porta abriu, revelando um Dr. Choi sorridente… Até notar o paciente tentando fugir do quarto.

– Kim! – Minho franziu a testa – tem que ficar na cama. Seu tornozelo não quebrou, mas mesmo assim precisa de repouso.

O médico foi com mãos prontas para ajudar o outro a se deitar na cama novamente, mas o rapaz esquivou.

– Jinki!

Minho parou um pouco, parecendo hesitante e então suspirou, soando cansado.

– Ele ainda não acordou – explicou calmamente – ou não tinha, desde a última vez que eu estive no quarto dele.

– Acordou de quê? – Kibum forçou sua mente a funcionar, mas sua mente estava em branco. Sentiu lágrimas vindo aos seus olhos de frustração misturada com preocupação. Não aguentava mais não se lembrar das coisas, não queria ficar sozinho novamente.  Notando que o rapaz estava atordoado, Choi o encaminhou até uma poltrona que tinha no quarto, ajudando-o a se sentar, e abaixou na frente dele, quase como se falasse com uma criança.

– Primeiro, você precisa se acalmar, ou vou precisar te colocar na cama de novo e te sedar, ok? – Ele esperou Kibum assentir até continuar – você lembra de ter sido atacado por um homem na rua? – Mais uma vez, esperou uma confirmação para continuar – Certo. Jinki-ssi levou um tiro no ombro, está tudo bem com ele, a bala não pegou em nenhum órgão vital, apenas precisamos fazer uma cirurgia para retirar isso do braço dele, tudo bem?

Um sentimento de alívio correu seu corpo, mas as lágrimas continuavam caindo silenciosamente.

– Posso vê-lo?

Choi cogitou um pouco, olhou em volta no quarto vazio e então tomou uma decisão:

– Pode, mas você vai precisar esperar. Por mais que não seja muito sério, seu pé precisa de repouso. Vou ver se consigo alguma coisa para te auxiliar a andar. Além disso, tem um amigo de vocês aqui e ele vai te levar até lá.

Cinco minutos depois, Kim não ficou surpreso quando um Lee Taemin entrou pelo quarto com olhos preocupados e avermelhados, como se tivesse chorado há pouco tempo. O mais novo hesitou um pouco, observando Kibum até que este fez sinal abrindo levemente os braços. Era o primeiro abraço dos dois, considerando que Kim ainda ficava intimidado com o outro. Os fios castanhos do Taemin cheiravam a maçãs, o que era surpreendente, mas algo se aqueceu no peito de Kibum em um consolo silencioso.

– Está tudo bem – Lee murmurou – mas eu me assustei tanto quando ligaram – ele se afastou um pouco, segurando-o pelos ombros – vai ficar tudo ótimo. Vamos ver o Jinki hyung?

Aparentemente, as muletas estavam sendo utilizadas, o que fez Kim ser levado em uma cadeira de rodas para o quarto do outro. Quando abriram a porta, esperavam tudo, menos os olhos abertos em alerta que encontraram de volta.

– Kibum – Jinki falou em um tom muito aliviado, e logo depois piscou, parecendo notar a cadeira de rodas – tudo bem?

– Eu só torci o pé, eles estavam sem muletas – Kim queria abraçar o outro, mas se contentou em levantar e tocar a mão do outro, imediatamente entrelaçando seus dedos. O ombro direito de Jinki estava enfaixado e o cotovelo esquerdo também, mas ele sorria mesmo assim.

– Vai ficar tudo bem – murmurou – vem cá, me dá um abraço, só cuidado com o ombro.

Cuidadosamente, Kim encostou a testa no ombro livre do outro e sentiu dedos carinhosos em suas costas. Seu pé incomodava um pouco, mas queria ficar daquele jeito.

– Foi minha culpa – sussurrou – essas pessoas continuam vindo atrás de mim–

– E você não tem como ser culpado – o mais velho completou – sabe que não.  Quem pediria para ser perseguido? Ameaçado de morte? Nem entendemos muito o que são essas ameaças. Impossível te culpar por qualquer coisa, certo? – Kim assentiu – Kibum, olhe para mim – quando foi obedecido, o médico notou os olhos inchados e os traços secos de lágrimas enfeitando o rosto bonito. Delicadamente, puxou o outro até que os lábios se encontrassem sutilmente, por apenas alguns segundos, em um gesto de carinho, e então o abraçou novamente.

Eventualmente, o pé torcido começou a machucar muito e Kim se viu obrigado a sentar na cadeira de rodas. Mesmo assim, manteve as mãos dadas com o outro. Só então Jinki viu Taemin parado calmamente no canto do quarto.

– Tae, vem cá – fez um gesto com a cabeça e o mais novo se aproximou e beijou-lhe a testa. Lee sentiu uma emoção diferente de ter esses papéis invertidos: normalmente fazia isso com o mais novo quando queria passar-lhe tranquilidade, ou apenas demonstrar que estava lá. Eram vizinhos há bastante tempo, desde que Taemin ainda estava no ensino médio, e tinha criado uma afeição verdadeira pelo rapaz.

Era aquele olhar de novo. Mistura de admiração e amor. Ele tocou com carinho seu ombro bom e então passou os dedos nos cabelos de Kibum, dando-lhe o mesmo olhar sincero.

Onkey

Kibum viu o tiro atingir o ombro de Jinki e gritou, desesperado, sem saber exatamente o que estava acontecendo. Em um segundo, tinha uma arma a sua frente, no outro, o corpo do mais velho levava o impacto e ele estava no chão. Tudo era dor, e um mar de vermelho tomou conta de sua visão. Até abrir os olhos, quase caindo do sofá, e notar que estava na sala de casa.

Da casa de Jinki. Pois mesmo que se sentisse parte daquele lugar, sabia que não era. Kibum sentou sentindo o pé latejar e percebeu que tinha perdido a hora do remédio. Lee estava dormindo, estavam em casa há apenas dois dias – como os ferimentos foram leves, não precisaram ficar lá. Kim não lembrava nada em detalhes, apenas sonhos soltos. Conseguiram fugir, segundo lhe contaram, mesmo machucados. Correram a rua até chegarem em um local mais movimentado, e só então Lee tinha desmaiado de dor nos braços do outro.

Kibum achava que estava ficando louco, pois aparentemente ele tinha chamado a ambulância com o celular do mais velho. Tinha ficado ali, com pessoas a sua volta tentando ajudar, mas tão preocupado com o mais velho que só perceberam seus joelhos machucados e tornozelo inchado no hospital, depois de o arrancarem da maca de Jinki e o levarem para a cirurgia.

Tomou café e deu passos silenciosos e mancos até o quarto. Jinki insistia que dormisse ali, com ele, mas tinha muito medo de se mexer durante o sono e machucar ainda mais o outro, então ia para o sofá depois que o outro dormia. Tentou entrar no quarto sem fazer barulho algum, mas percebeu que não precisava. Jinki estava acordado, sentado na cama, Lily deitada em seu colo, com dois papéis a sua frente.

– Se não queria dormir comigo, era só dizer – comentou, sem levantar a cabeça.

– Eu só não queria te machucar – respondeu, o rosto levemente corado – desculpa, é só que… A ideia de perder você foi muito assustadora, de tantas formas diferentes, não sei.

Dessa vez, Lee levantou o rosto e fez um gesto com a mão livre. Kim sentou ao lado dele na cama e recebeu um beijo no rosto.

– Não vai acontecer nada comigo. O máximo é você se virar e bater no meu ombro, aí dói por cinco minutos e tudo ótimo – sorriu para ele – pode ser? – Kim abriu a boca para dizer não, mas recebeu um beijo nos lábios dessa vez – Só aceito sim como resposta.

Lily miou, irritada com os dois estarem se mexendo tanto, e desceu da cama, correndo para outro cômodo.

– Não sabia que estava entrando na ditadura do sono – ele riu um pouco e encostou a cabeça no ombro livre – o que é isso?

– Isso aqui é sobre você – Lee pegou uma das folhas – enquanto você estava sendo analisado, eu peguei umas folhas meio repetidas que vi por cima ali. Aliás – soltou a folha, soando irritado – sabia que essa tal CPT simplesmente está perseguindo você?

– Oi? – Kibum se afastou com olhos arregalados e pegou um dos papéis na mão: era uma folha simples, com a marca d’água com a folha da abelha, um cabeçalho e apenas uma linha escrita: “as informações sobre Kim Kibum são confidenciais”.

– Tem agente nos seguindo –Jinki explicou, e então apontou para o papel nas mãos de Kim – Jonghyun não estava mentindo. O problema é: quem pode ter informações sobre você? E como elas são confidenciais?

– Talvez eu seja, sabe, algum foragido – deu de ombros – vai ver eu matei alguém, vai ver… Não sei.

– O outro aqui – Jinki pegou a folha, que tinha a mesma marca d´água e leu alto – “Kim Kibum em um envolvimento direto com um ponto fixo. Levando isso em consideração, a liberação de qualquer informação pode ser prejudicial. Por favor, continuem suas investigações e não tentem mais buscar informações conosco.”

– Ponto fixo?

– Tudo é bem confuso – ele murmurou e então virou o rosto do outro para si com carinho – sei que está tenso, sei que é difícil, mas foi o que eu dizia antes: tem alguma coisa extraordinária a seu respeito – acariciou o rosto dele com o polegar – completamente especial. Tanto que tenho medo de te tirarem de mim antes mesmo de a gente criar memórias o suficiente juntos.

Kibum arregalou os olhos, vendo seus medos refletidos nos olhos do outro, e se inclinou até que seus lábios se encontrassem. A conversa séria parou por ali.

Onkey

– CUIDADO!

Kim saiu correndo por corredores brancos, descendo a escada correndo como se sua vida dependesse disso. Ouviu tiros vindos do andar em que estava e continuou correndo. Precisava sair dali, ir para a CPT, achar um lugar seguro. Ouviu gritos de vizinhos e soube que os homens estavam invadindo casas à sua procura. Encostou-se na parede e respirou fundo: precisava pensar com calma. Olhou pela janela e viu que mais homens estavam parados na frente do prédio.

Pegou o celular com mãos trêmulas e tocou a tela, colocando-o imediatamente no silencioso, e então sussurrou:

– Call–

– Ele está aqui – ouviu um grito e o som de uma porta sendo arrombada.

Com o celular ainda na mão, Kim abriu a janela da escada e se jogou na escadaria de incêndio. Desceu correndo sem olhar para trás, por algumas vezes quase caindo para fora da escada estreita, até chegar ao final, que ficava a alguns metros do chão, e se jogou. Sentiu o joelho doer, mas continuou correndo. Passou pelo meio das pessoas sem olhar para trás, sabendo que os homens continuariam o seguindo até chegar na rua do prédio da CPT.

Exausto, e com o joelho doendo, se sentou em um banco e tentou puxar a calça para ver o que tinha de errado ali, até sentir uma bola batendo no seu pé. Era uma bola redonda e verde; pegou-a e franziu a testa para ela.

– Minha – ouviu uma voz infantil murmurar – senhor.

Fitou o garoto que tinha grandes olhos castanhos e fios escuros, e que estava com as mãos estendidas esperando a bola de volta.

– Cadê seus pais, garoto?

Imediatamente soube que tinha dito algo errado, pois o garoto levou as mãos até a barra da própria blusa e começou a chorar silenciosamente. A cabecinha abaixada, os ombros sacudindo com soluços e a bola esquecida. Desesperado, Kim se ajoelhou para consolar o menino, gemendo de dor assim que a perna machucada entrou em contato com o chão.

– Calma, está tudo bem, desculpa – tocou os braços dele tentando acalmá-lo – vai ficar vai ficar tudo bem.

Ele viu o carro que estava antes na frente do seu prédio se aproximando, um homem para fora, e a primeira coisa que fez foi pegar o menino no colo e correr. Sentiu braços envolverem seu pescoço, e pensou ter ouvido algumas perguntas na voz infantil, mas estava ocupado tentando salvar a vida dos dois.

Até que tropeçou. Virou o corpo para não cair por cima da criança, o menino escondeu o rosto no seu pescoço ao ouvir berros, e ele ouviu um tiro.

E Kibum acordou com falta de ar. Olhou em volta do quarto sem saber o que fazer: não conseguia respirar nem reagir a nada. Não sabia o que aquilo significava. Alguém queria ele morto.

Muita gente queria ele morto.

Ele não poderia ser coisa boa se tanta gente o queria morto. Começou a tremer e fitou ao lado da cama Jinki dormindo tranquilamente. Gostava muito dele. Sentiu o coração apertar um pouco em pensar que estava colocando a vida dele em risco. Tocou o braço bom dele com as pontas dos dedos e desejou que tudo desse certo, que no final pudesse ter uma vida com Jinki.

Incapaz de continuar na cama, levantou e foi andar pelo apartamento. Na sala, suas pinturas tomavam praticamente uma parede toda. Quis pintar seu novo sonho, mas ao mesmo tempo teve medo de que Jinki, ao ver, o mandasse ir embora por ser obviamente um ímã de morte. Deu passos lentos até encontrar novamente os papéis da CPT. Lily apareceu, se enroscando em suas pernas, miando baixo, quase como se sentisse seus pensamentos ruins. Sorriu para a gata e se sentou no chão. Analisou novamente a folhas. A mesma abelha. As mensagens o encarando.

“Kim Kibum em um envolvimento direto com um ponto fixo. Levando isso em consideração, a liberação de qualquer informação pode ser prejudicial. Por favor, continuem suas investigações e não tentem mais buscar informações conosco.”

“As informações sobre Kim Kibum são confidenciais.”

Não sabia ao certo quanto tempo ficou encarando os papéis sem achar absolutamente nada novo a respeito deles.  Aparentemente, nada sobre ele poderia ser dito, só isso. Até que em dado momento deixou seus olhos irem para o cabeçalho. Tinham muitas informações que ele não entendia, números de série de alguma coisa que para ele não fazia sentido. E uma data.

Uma data que estava muito errada.

Ou então muito certa.

Ato  7

O guardião do Tempo

– 2026?

Jinki estava olhando os papéis em sua mão com uma expressão indecifrável, enquanto Kibum refazia o curativo do braço.

– Sim – Kim murmurou – faz sentido, sabe? – Sentou-se à frente do outro na cama – eu disse que as ruas pareciam diferentes e meu celular–

– Mas não faz sentido, você está aqui comigo – Lee tocou o rosto dele – palpável, todo mundo te viu, eu não estou louco.

– Não, não, sem loucura – sorriu um pouco e colocou a mão por cima do outro – alguma coisa me fez voltar, eu–

A conversa foi interrompida por batidas na porta. Kim deu uma última olhada no curativo do outro e ambos levantaram. Kibum colocou a mão na maçaneta, e então Jinki o impediu. Ele franziu a testa e gesticulou, encostando a orelha na porta; o mais novo fez a mesma coisa. Do outro lado, ouviram 3 pessoas falando ao mesmo tempo, sussurros, “fico na frente” e outro respondeu “eu vou empurrar a porta”. Estava tudo trancado, bateram novamente na porta.

Jinki segurou a mão do menino e o puxou até o quarto de hóspedes, que ficava longe o suficiente da porta para que conseguissem falar. Lily os seguiu, mas sentindo o clima de tensão, entrou no guarda roupa e ficou lá.

– Consegue passar para o apartamento do Tae? – Lee perguntou imediatamente – pela janela, digo.

Kim arregalou os olhos e foi até a porta. Tinha uma pequena varanda nas duas janelas, o que tornava mais fácil, mas mesmo assim era quinto andar. Alto o suficiente para assustar.

– Você não vai conseguir – ele disse, apontando para o ombro – eu não posso te deixar aqui.

– Eles querem você – Lee falou, segurando o rosto do outro em suas mãos – eles não vão conseguir, certo? Eu sozinho, no mínimo, eles precisam me manter vivo para descobrir – foi interrompido pelo som da porta sendo arrombada; abaixou o tom de voz imediatamente – tem a escada de incêndio, saia pela porta do Tae, explique o que está acontecendo e corra.

Deu apenas um selar de lábios no outro, e então ambos saíram para a varanda. Kibum pulou o mais rápido que conseguiu e Lee sentou em uma das cadeiras que tinha ali, e fechou os olhos. Kim caiu do outro lado sentindo uma dor profunda no tornozelo e entrou no apartamento imediatamente. O local estava vazio, se ajoelhou e ouviu a conversa se desenvolver no outro apartamento:

– Está surdo, não ouve a porta? – Um dos homens gritou, ele ouviu o som de algumas coisas caindo e um gemido de Jinki.

– Estou com tantos remédios – disse a voz sofrida – estava dormindo.

– Cadê seu amiguinho?

Kim se recusou a ficar parado e foi atrás do telefone. Não tinha como ligar para Jonghyun, então ligou para a polícia. Depois escreveu um bilhete explicando o acontecimento ao Taemin, e saiu dali. Sentiu um déjà vu ao parar no corredor e procurar a janela que dava para a escada de incêndio. Assim que achou, pulou para fora e desceu mancando. Quando se jogou no chão, se viu sem condições de correr devido à dor. Foi até um lixo que tinha ali e era enorme, sentou-se atrás dele e encolheu as pernas. Ouviu as sirenes de polícia, mas antes que levantasse e fosse ver  o que estava acontecendo, ouviu um baque e um gemido de dor.  Levantou para ver o que era e Jinki estava no chão, no mesmo lugar em que caíra há alguns minutos, com a mão no curativo manchado de sangue.

– Hey – foi mancando até ele, e tocou seu rosto – Jinki–

– Ki– bummie – ele sorriu um pouco e virou o corpo aparentando sentir dor –  bolso.

O mais novo procurou nos bolsos e achou o celular. Imediatamente ligou para Jonghyun, enquanto ouviam o embate entre policiais e os homens que invadiram a casa deles. Kim trouxe a cabeça do mais velho para seu colo, beijou sua testa e continuou murmurando que tudo ficaria bem.

Enquanto tentava acreditar nisso.

Onkey

–  Vocês têm uma vida animada – Dr. Choi comentou depois de refazer os pontos no ombro de Jinki e limpar o tornozelo de Kibum – sério, tomem cuidado.

Kim assentiu, com um sorriso educado, e apenas segurou a mão do mais velho, que ainda dormia. Estavam ali há quase duas horas, e já tinha recebido uma notícia de Jonghyun de que os agressores estavam presos, mas sabia que não era tão simples. Iriam continuar vindo atrás deles.

Dele, na verdade.

E se ele queria realmente manter Jinki seguro, deveria ter ido embora. Sumido, voltado para 2026 ou qualquer coisa do gênero, já que permanecer ali não estava dando certo. Correu os dedos pelos fios macios e castanhos do outro e pensou em quanto era egoísta. Não poderia ir.

Não conseguiria deixar aquilo para trás. Todos os lampejos da sua antiga vida pareciam tristes, preto e branco, sem propósito, mas agora estava ali. Dormia nos braços do outro. Acordava com beijos em seu rosto. Pintava o dia todo. Ria boa parte da noite. Como poderia deixar isso para trás e achar que teria chances de ser feliz?

Talvez fosse bobo, quase 3 meses seriam o suficiente para se entregar tão completamente a alguém? Talvez não, mas mesmo assim, não tinha como evitar. Sentia um aperto ao imaginar sua vida sem o outro, mas aparentemente era necessário.

Até porque, se estava no tempo errado, eventualmente teria que voltar.

Onkey

Kibum acordou com beijos suaves em seu pescoço e riu um pouco. Se virou nos braços do outro, e deixou-se ser beijado nos lábios dessa vez.

– Sério?

Lee Jinki sorriu para ele, se apoiando em um dos braços para fita-lo. Olhos cheios de admiração, amor e medo. Muitas vezes o mais velho tinha esses momentos e Kim não sabia exatamente como agir. Sabia que os dois estarem ali era definitivamente contra o que a CPT pregava, mas não podia negar o que seu coração dizia.

Aquele era o seu lugar. Do lado de Jinki. Acordando em seus braços. Todos os dias.

– Claro, não sabemos quando vamos ter essa chance de novo – ele murmurou, se inclinando para beijá-lo novamente.

– Sabemos sim – Kim acariciou o ombro do outro – pra mim, vai se passar três meses, para você alguns segundos.

– Quem sabe se você ainda vai me querer depois que os três meses passarem – Lee guiou a mão do outro para seu cabelo.

– Eu preciso de uma eternidade para me cansar de você – O mais novo murmurou – e mesmo assim não vai ser o suficiente.

– Convicção você tem, mas talvez não tempo – sorriu, e não deixou o outro continuar a conversa.

Kibum abriu os olhos e viu o os lençóis brancos da cama. Não se mexeu, deixou as memórias encherem sua mente calmamente. Obviamente estava no hospital depois de mais um ataque. Claro que Jinki estava machucado e não lhe acordando com beijos.

– Tudo bem? – Ouviu a voz do mais velho perguntar, e se limitou a assentir – Lembranças novamente?

– Eu não sei – disse, sua voz baixa – se eram lembranças ou sonhos.

Sentiu lágrimas chegarem aos seus olhos e se forçou a engolir. A situação já estava ruim, não precisava piorar tudo ficando emocional agora. Lee tocou a mão dele, trazendo-o para mais perto.

– Eu estava nele, certo? – O outro assentiu – Não pense nisso, estamos juntos agora – sorriu.

– E depois?

– Não importa depois, agora nós temos um ao outro – Fitou os olhos felinos com atenção – Eu-

Nesse momento, a porta se abriu relevando Taemin e Jonghyun. O mais novo foi até eles imediatamente, ainda hesitantemente abraçando Kibum, e depois se inclinando para beijar a testa de Jinki.

– Fiquei tão preocupado quando li a nota e vi a CPT lá no apartamento. Inclusive, a Lily veio para a minha casa de novo – ele sorriu, parecendo um pouco sem graça, mas aliviado de vê-los.

Jonghyun fechou a porta do quarto, se encostou nela.

– Taemin, pega aquela outra cadeira, coloca aqui e senta– ordenou.

O menino obedeceu silenciosamente. Dessa vez, Jonghyun tinha uma pasta na mão e uma expressão sombria. Analisou os dois por alguns segundos, antes de respirar fundo.

– Você estava com 2 documentos, Jinki – balançou a cabeça – não deveria ter pego.

Vendo que não tinha mais como manter segredo, Kim se levantou da cama, olhando-o diretamente nos olhos.

– Eu sou de 2026?

Jonghyun sorriu um pouco, balançou a cabeça e respirou fundo.

– Teoricamente você é de 2001, segundo minhas contas, e você mesmo – ele riu suavemente – está vivo agora, correndo pelas ruas dos Estados Unidos da América, com lindos 5 anos.

– No meu cartão de identificação dizia 1991 – Kibum sussurrou – faz sentido, eu tenho 25 anos, certo?

Jinki segurou a mão do outro e franziu a testa, mas não disse nada. Queria passar força ao outro, mas ao mesmo tempo a conversa estava tomando um rumo inesperado. Queria que surgissem pessoas gritando que foi uma pegadinha e que então pudesse voltar a dormir com Kim em seus braços.

– Falsificado – explicou – você nasceu em 2001, registrado em 2022, em 2026 foi mandado nessa missão – abriu os braços em um gesto genérico. – Para que não suspeitassem caso algo acontecesse e você fosse parar no hospital, como aconteceu, é importante que seus documentos não gerem desconfiança. É o procedimento padrão.

– Procedimento padrão de quem? – Jinki finalmente perguntou.

– Da CPT  – ele assentiu –  Centro de Proteção ao Tempo. Nós somos uma empresa fundada em 2020,  com o objetivo de auxiliar o Guardião do Tempo na proteção dos tempos fixos e evitar linhas desastrosas de acontecerem mais de uma vez.

– Guardião do Tempo – Kibum sussurrou e então fitou o outro – Todo mundo me disse que precisava ficar longe dessa pessoa. Guardião do Tempo, quem é?

– Essa informação é confidencial.

– Claro que não – O rapaz rebateu imediatamente, claramente irritado – eu estou aqui por causa dessa pessoa aí, tenho o direito–

– Confidencial para mim também – esclareceu – apenas algumas pessoas sabem quem é o Guardião do Tempo. Ele vive nas sombras, observa tudo que acontece, guarda os movimentos de todo mundo, protege os pontos fixos e, quando precisa de ações mais… diretas, nos manda missões. Além disso, é necessário ter pessoas cientes de que viagens no tempo são possíveis em todos os tempos, todas as linhas, perto de todos os pontos fixos ou algo pode dar errado. O Guardião do Tempo é muito útil, mas ainda assim é humilde o suficiente para pedir ajuda.

Lee assentiu lentamente, em dúvida sobre chamar as enfermeiras, pois seu amigo tinha enlouquecido, ou se deixar levar, crendo que aquilo era verdade. Kibum, por outro lado, parecia bem certo de que tudo era real.

– Pontos fixos? – Questionou, após alguns segundos de silêncio.

– Todas as linhas temporais são formadas por pontos fixos, ações que precisam acontecer para que a história tome o rumo mais correto possível – respirou fundo – imagina se Hitler não morre, por exemplo, o rumo que o mundo tomaria… – fez uma expressão temerosa – precisamos sempre tomar cuidado com esses pontos. Às vezes é algo tão grande quanto a Segunda Guerra Mundial, outras é uma borboleta… Alguns pontos fixos são tão importantes, que eles acontecem em todas as linhas do tempo, mesmo que sejam por motivos diferentes em cada uma, o universo sempre se reorganiza… Não sabemos muito sobre você, Kibum, mas sabemos que sua missão aqui é relacionada a um ponto fixo.

– Eu? – Franziu a testa – missão?

– Tentamos entrar em contato inúmeras vezes – seus ombros caíram – sei que viram as respostas, tinham as cartas, o fundador da CPT se recusou a dizer qualquer coisa. Então tivemos que investigar do zero. Sabíamos que é do futuro por causa do celular, mas ao decodificarmos ele completamente, achamos algumas coisas, fotos, vídeos… Um deles muito interessante, você fugindo por uma escadaria de incêndio.

– Caindo e machucando o joelho? Homens invadindo apartamentos atrás de mim? – Sentiu as lágrimas voltarem, sem conseguir conter: eram lembranças mesmo, afinal. Realmente vinha de 2026, sua mente estava lhe dizendo há tempos.

– Exato, depois parava – apontou os dois com um sorriso discreto – fotos de vocês.

– Então sobrevivemos? – Jinki perguntou, apertando a mão do outro – Estamos juntos no futuro?

– Podemos dizer que sim – deu de ombros – mas não tinha nada sobre a sua missão, apenas que precisava achar o Guardião do Tempo. Visto que está sem memória, não sei como seria possível. Fizemos testes, sua saúde está ótima. Normalmente, para a pessoa ter amnésia após a viagem é por alguma interferência gerada por doenças – explicou – mas achamos um chip no seu pulso. Alguém aqui está conseguindo saber seus movimentos e deduzimos que poderia ser o Guardião. Ele é um dos poucos que tem poder para solicitar viajante com chip. Ele e o fundador da CPT, digo.

– Então não sabem? – Soltou a mão de Jinki e se afastou, claramente abalado – pesquisaram tanto e não sabem, simplesmente não fazem ideia do por que estou aqui. Acham que tenho uma missão, mas não sabem qual é? Acham que eu posso saber quem é o Guardião, mas não lembro. Tem gente que me quer morto – bateu com as mãos nas próprias coxas–  e aqui estou eu completamente perdido a respeito de quem sou. Se eles me matarem, é quase como matar um fantasma; afinal, não faço ideia, sou como fumaça no ar.

Jonghyun foi pego de surpresa pela explosão do outro e tentou, calmamente, se aproximar, vendo que Jinki tentou se sentar, mas estava preso a cama.

– Não é assim.

– Claro que é assim! Preciso achar um Guardião do Tempo que ninguém sabe quem é para saber quem eu sou e a única esperança era CPT, aparentemente, e não sabem nada.

Lee conseguiu se soltar dos fios e estava sentado na cama, enquanto Kim se encostava na parede prestes a explodir caso Jonghyun tentasse lhe acalmar mais uma vez, até que ouviram uma cadeira arrastar. Lee Taemin estava em pé, cabeça abaixada fitando os próprios pés.

– Não é assim – sussurrou – as coisas são complicadas, e às vezes é necessário observar tudo de muito perto querendo ajudar, mas sabendo que existem coisas mais importantes que nossos próprios sentimentos.

– Como assim, Tae? –  Jinki que perguntou, depois de alguns minutos de silêncio completo no quarto.

Quando Taemin olhou para eles, tinha olhos profundos e maduros, como um rapaz de 23 não poderia, e um sorriso triste nos lábios.

– Há algum tempo, algumas pessoas descobriram que poderiam ser responsáveis pela criação da máquina do tempo e que poderiam comandá-la, caso conseguissem pegar seu criador antes que fundasse a CPT – Jonghyun parecia confuso, mas continuou ouvindo – para isso, decidiram voltar há um ponto fixo muito importante: quando a motivação do criador aconteceu. Porém, esse ponto fixo era guardado pelo Guardião do Tempo, então sempre falhavam.

– Como sabe tudo isso? – Jonghyun perguntou.

Lee Taemin sorriu.

– Pois eu sou o Guardião do Tempo.

Ato 8

Ponto fixo

– Então… – Kibum piscou confuso – durante todo esse tempo, eu estava procurando você?

Taemin assentiu lentamente, vendo que o outro parecia estar absorvendo as informações recentes muito lentamente, mas não podia culpa-lo. Olhou para a cama e Jinki parecia tão surpreso quanto.

– Pontos fixos são realmente muito complicados de se explicar ou entender –  Lee começou – o que o Jonghyun falou é verdade. Pelo menos, é a verdade que dizemos a membros da CPT: pontos fixos não podem ser alterados – encolheu os ombros – menos em alguns casos. Tudo na história pode ser alterado, se você fizer a viagem no tempo certo, na hora certa, mas, certamente, se eles mudarem, toda a história vai junto. Eu queria mudar um ponto fixo – explicou calmamente – estava cansado demais de ver as coisas se desenrolando como deveriam e nunca fazer nada para ajudar.

– Como assim?

– Eu menti para a CPT, pois queria fazer que tudo terminasse melhor – deu de ombros – eventualmente piorei tudo. Kibum, sua missão inicial aqui não tinha nada a ver comigo. Você sempre voltava no tempo para resgatar um grupo de pessoas, nada a ver comigo – repetiu e deu de ombros – E, nessa missão, você conhecia o criador da máquina do tempo, vocês se apaixonavam e esse amor era a motivação dele, no futuro.

– Sou eu, certo? – Jinki perguntou, seus olhos presos em Kibum – Eu criei a máquina do tempo, pois… Amava ele.

– Sim, conhecer ele te deixava fascinado com a viagem no tempo – Taemin encolheu os ombros – Você largava toda sua carreira médica e ia pesquisar sobre física, que já é um hobby, e tudo mais. Nisso, descobria a fórmula certa. Criava a CPT, e conhecia o Kibum… No futuro. Eu fui idiota –  o menino abaixou a cabeça, claramente buscando esconder suas emoções – queria que vocês fossem felizes, até o final. E sem pessoas os perseguindo; era tão ruim. Cresci vendo Kibum sendo perseguido por homens que queriam matá-lo antes de voltar no tempo.

– Nos conhece desde que é criança?

– Oh, sim – Taemin assentiu – na linha do tempo da qual vim, você me conhece com 10 anos – apontou para Kibum – mas não sei como vai ser agora.

Jonghyun sentou-se na cadeira na porta, sentindo-se quase um intruso no momento. Kim ainda estava encostado na parede, e Jinki sentado na cama, fios soltos a sua volta.

– Era tão triste – deu de ombros – então, em uma dessas viagens, eu alterei um pouco as coisas, mudei seu caminho, e mandei o Kibum de volta antes de te conhecer. A máquina não seria criada – assentiu lentamente e os fitou com olhos cheios de lágrimas – então vocês se conheceriam no futuro, como acontece, e ficariam felizes lá. Sem viagens, sem nada. Foi ingenuidade minha, mas vocês não se conheciam sem a CPT. Kibum… Ele entra na CPT por causa de problemas com a família, você continua médico, nunca se conhecem – respirou fundo – e outra pessoa eventualmente achou a fórmula da viagem no tempo. Essa pessoa não era boa, ela a destruiu.

As lágrimas finalmente caíram e, pela primeira vez, Taemin aparentou ser realmente jovem. Uma criança quase. Jinki quis abraça-lo, dizer que tudo ia ficar bem, mas ao mesmo tempo via o terror no rosto de Kibum, e não sabia como deveria agir. Qual o protocolo social quando alguém te conta toda sua vida futura?

– É horrível, é tão – o rapaz tirou o celular do bolso, um que nunca tinham visto e que era igual ao de Kibum, só que vermelho, e apertou a tela – linhas do tempo – Imediatamente uma projeção de expandiu em volta deles.

Jinki não precisou pensar muito para reconhecer várias pinturas de Kibum: imagens estavam projetadas em volta deles, como se fossem telas planas, quase como um túnel de várias imagens acontecendo ao mesmo tempo.

– Isso são várias versões diferentes de todas as linhas do tempo de que temos conhecimento até agora – o mais novo explicou – imagens coletadas com ajuda da CPT e da minha viagem através das linhas. Sou o único que consegue, quando fui eleito Guardião do Tempo pelo Jinki hyung. Ele me deu tudo que precisaria para interagir. Disse que estaria mais seguro em minhas mãos…

Kibum deu alguns passos até o centro, olhos arregalados ao ver tantas coisas que sonhava acontecendo nas telas, assim como as próprias telas em si. Jinki viu uma das telas e ficou preso nela, com Kim beijando seus lábios ao ar livre, um sorriso nos lábios dos dois. Lee obviamente mais velho e claramente feliz. Queria aquilo.

– Eu sonhei com isso – sussurrou e então aumentou o tom da voz – tudo isso esteve presente em minha memória em forma de sonhos, mas eu tenho amnésia. O que você fez? – O olhar traído direcionado ao mais novo era quase brutal.

– Precisava ter certeza de que, dessa vez, vocês iam se conhecer – murmurou entre lágrimas – eu… Você é o Kibum de outra linha do tempo. Apaguei sua memória com o chip. Naquela linha em particular você morre, eu te trouxe para cá antes que isso acontecesse…

– Por isso ele estava machucado – Jinki comentou, olhos arregalados para o mais novo.

– Sim, justamente – murmurou – quando uma pessoa que não tem o treinamento e os equipamentos que eu tenho é transferida de uma linha do tempo para outra, ela perde a memória. Mas foi bom – sorriu, apontou para Jinki – isso fez com que ele quisesse ficar com você aqui. Normalmente, você tem casa e tudo dado pela CPT, mas dessa vez a viagem foi toda ilegal, então…

Kim estava trêmulo, enquanto chorava olhando todas as telas refletidas a sua volta. Tinha ele sendo perseguido, nos braços de Jinki, com várias idades, com criança, sem criança, com aqueles que achava serem seus pais… Duas vidas em sua cabeça, e nenhuma memória concreta.

– Então fez tudo isso? Você – apontou o dedo indicador para Taemin em acusação – me viu perdido, tendo dúvidas, sozinho, sem conseguir entender nada e deixou? Ou melhor, gerou tudo isso. Eu poderia estar tendo conforto na morte, mas você me trouxe pra cá, para sofrer mais?

O mais novo respirou fundo e tentou dar um passo à frente, tocar no ombro do outro, mas foi repelido.

– Eu queria que vocês fossem felizes, só isso–

– É da sua conta? Por que você se importa tanto? – Kim limpou o rosto com raiva – Pelo visto, estava melhor antes do que está agora! Estou apaixonado por ele e aí? – Apontou para Jinki – isso faz o quê? Vamos para onde agora? Eu– Preciso ficar sozinho.

O rapaz mancou um pouco a caminho da porta; Jonghyun segurou a maçaneta com força e sorriu para ele.

– Não é seguro ficar sozinho lá fora.

– Você não é uma merda de um agente treinado? – Respondeu rispidamente.

Kim saiu pela porta, sendo seguido pelo agente da CPT. Taemin estava parado, fitando o espaço que o outro estava em pé com uma expressão triste.

– Ele fez uma boa pergunta – o médico começou – por que se importa tanto?

Jinki recebeu aquele olhar novamente: uma mistura de amor e admiração tão profunda que não tinha como explicar, e sorriu carinhosamente em meio às suas lágrimas.

– Você me escolheu para ser Guardião do Tempo por um motivo, hyung. Eramos próximos, nós três – explicou – acho que já contei tanto do futuro, que é melhor ficar calado – recolheu as projeções novamente no celular – mas vocês são especiais para mim.

Lee respirou fundo e voltou a se deitar na cama. Queria ir atrás de Kibum, mas precisava respeitar seu espaço. Entendia que deveria ser realmente mais traumático descobrir tanta coisa sobre si mesmo de vez. Até para ele estava sendo complicado absorver tudo, quando pensava nas pessoas tentando matar o outro para que não se conhecessem. Tudo era tão absurdo.

– Uma coisa – franziu a testa – se o Kibum está aqui contra as leis, e ninguém sabia disso além de você, como tinham pessoas querendo matá-lo?

– Oh, são agentes do novo criador – deu de ombros – não sei muito dele. Sempre observo mudanças do tempo de fora, pois com seus equipamentos, elas não me afetam. Nessa linha do tempo, eu… – respirou fundo – Tudo bem – sorriu um pouco – eu estou sozinho.

– Certo, mas como esses descobriram que vocês estavam aqui? – murmurou.

– O Jonghyun disse que a CPT tentou fazer comunicação com o futuro, certo? Falou sobre o Kibum.

– Essa linha do tempo não é a que você estragou me afastando do Kibum, certo? – Taemin assentiu – mas você já mudou a linha do tempo, então não sabemos de verdade qual futuro vai se originar dessa linha?

– Sim – O mais novo encolheu os ombros – eu sei as possibilidades, sei o que precisa acontecer para gerar cada uma delas – gesticulou com o celular – mas não sei qual delas realmente vai acontecer.

– Então não sabemos se a outra empresa, que não a CPT, foi a que recebeu essa comunicação, certo? Nem sabemos se o Jonghyun é da CPT mesmo ou de alguma empresa maluca que surgiu nessa linha do tempo? – Jinki respirou fundo – Além disso, linhas do tempo não são apagadas, apenas vão surgindo outras no lugar assim que algum elemento muda, não é? – O mais novo assentiu – Então qual a garantia que temos de que, nessa linha do tempo, o outro criador da máquina do tempo não elegeu o próprio Guardião do Tempo? Que fica vagando pelas linhas temporais tentando fazer o que você fez – sentou na cama – me afastar do Kibum, tirar de mim a vontade de criar a máquina do tempo e garantir que aquele criador continue o mesmo?

Lee Taemin arregalou os olhos, claramente surpreso de não ter pensado naquilo antes.

– Então, esse Guardião estaria aqui, como eu estou – concluiu – enquanto eu tento arrumar, ele tenta matar o Kibum.

– Exato, e talvez ele conseguisse rastrear o chip – murmurou – como você pode! E ele acharia Kibum em qualquer tempo, qualquer linha e iria vir para matá-lo.

– Iria orientar todos a matar Kibum?

– E deixar o Bummie na escuridão sobre quem realmente é, matá-lo antes que eu descobrisse, e assim eu nunca teria interesse pela máquina do tempo. Ia continuar sendo médico para sempre.

– Alguém que teve acesso assim que o Kibum chegou aqui, que soube desde o início da filiação dele com a CPT, sabia tudo sobre as viagens – Taemin assentiu – e pode rastrear seus passos lentamente, no escuro.

– Jonghyun – falaram juntos.

Nesse momento, ouviram um barulho muito alto e alguns gritos. Lee Jinki não pensou duas vezes antes de correr em direção ao som que tinha certeza de ter sido produzido por Kibum. Taemin ia atrás de si. Os gritos continuaram, algumas enfermeiras pareciam procurar também a sua origem, então o mais novo pegou o celular e acionou alguma coisa que fez com que ninguém olhasse mais para eles.

– Sistema de distração para quando tem algo acontecendo – Taemin explicou, sem parar de correr pelos corredores, olhando todas salas – faz com que todo mundo comece a pensar em outra coisa.

– AQUI!

Jinki empurrou a porta e parou no lugar imediatamente. Jonghyun estava no chão, sangue em volta da sua região da cintura, mas não parecia morto. Do outro lado do quarto, Minho tinha Kibum pressionado contra a parede e uma faca na mão. Kim estava com uma expressão chocada, um ferimento no braço esquerdo. Choi avançou e o outro desviou, caindo no chão parecendo estar em dor.

Taemin agiu rápido, sacando uma pequena caneta que facilmente se abriu até virar um bastão, e bateu na cabeça de Choi. O outro se virou com um sorriso.

– Demorou para cair a ficha.

– Choi – Jinki balançou a cabeça – a gente confiou em você.

– Justamente – Minho sorriu – foi muito fácil manter o rastro dos dois praticamente morando aqui. O problema é que as pessoas são bem incompetentes, e é necessário pegar os problemas para resolver com as minhas próprias mãos.

– Imbecil – O mais jovem atacou novamente.

Jinki se ajoelhou, vendo Dr. Choi avançar contra Taemin e conferiu se estava tudo bem com Jonghyun. Então foi até Kibum, tocou seu rosto suavemente e trouxe a atenção dele para si.  O sentimento de traição de pensar que tinha levado o outro para aquele lugar, diretamente para as mãos do inimigo era terrível. Queria tirá-lo dali, resolver todos os problemas de uma vez.

– Calma, tudo bem.

Nesse momento, Minho jogou Taemin contra a cama da sala e conseguiu enfiar a faca profundamente na cintura do outro, que reagiu rápido, jogando-o no chão e prendendo suas mãos com os joelhos.

– Tira ele daqui – o mais novo falou para o Lee mais velho.

Lee pegou Kibum, que estava mancando, e tentou ajudá-lo, passando o braço dele pelo ombro que estava bom e tentando sair o mais rápido possível, vendo Taemin ter problemas em manter Choi parado. Saíram do quarto e o mais velho imediatamente procurou um elevador. Uma forma fácil de descer e sair dali.

– Jonghyun… – Kibum murmurou, soando tão exausto que o coração de Jinki apertou.

– A gente ia demorar para pegar ele, ia atrasar – avistou um elevador e foram se locomovendo até lá, ainda ouvindo os sons de luta dentro do quarto – e também, o foco de todo mundo é matar você, então ele está a salvo no chão. Sem contar que, bom – sorriu um pouco – isso é um hospital.

Enquanto esperavam a porta se abrir, viram Choi sair da sala, sendo seguido de perto por Taemin, que usou a mesma arma para atacar o residente nas costelas e começar uma nova batalha entre os dois. Assim que a porta se abriu, os dois se jogaram dentro e travaram o elevador. Jinki pegou o tornozelo do outro em suas mãos: estava inchado, precisava imobilizar de alguma forma. Olhou em volta e então notou a manga longa de Kibum.

– Rasga isso.

Rasgaram juntos e Lee apertou mais o pé do outro com o tecido, e então se inclinou, pressionando os lábios no joelho dele e sorrindo.

– Vai ficar tudo bem – garantiu.

– Desculpe – Kim encostou a cabeça na parede – eu–

Ouviram algo se bater contra a porta repetidas vezes e destravaram o elevador. Assim que os movimentos começaram, os dois se levantaram, prontos para correr assim que chegassem no térreo. Teriam como se esconder, Jinki pensou, segurando os dedos longos entre os seus. Ficariam juntos. Um futuro só deles.

– Jinki – Kibum o chamou baixinho assim que chegaram no segundo andar – eu realmente gosto de você. Muito. Meu coração parece que vai explodir às vezes. Antes que Minho aparecesse, Jonghyun me disse que sentimentos estavam dentro de mim, mesmo sem memória, então é possível que eu te ame tanto que dói porque já o conhecia antes – os olhos felinos estavam refletindo tanto sentimento que Lee se viu sem palavras – obrigado.

O mais novo se inclinou para beijá-lo nos lábios. O mais velho recebeu tantos sentimentos através de um simples toque de lábios que se viu obrigado a aprofundar ainda mais o momento, a apertar o botão de travar o elevador novamente e encostá-lo na parede. De deixar claro o quanto sentia pelo mais novo, abraçá-lo murmurando todos os seus sentimentos.

– Você me trouxe uma nova luz – Jinki sorriu – minha vida era tão monótona, você me trouxe cheiro de tinta, cores e uma motivação.

– Motivação?

– Te fazer feliz – beijou seus lábios rapidamente – não importa como.

Destravaram o elevador, que rapidamente chegou ao térreo, e esperaram as portas abrirem. Os dedos longos de Kibum estavam entrelaçados aos de Jinki, como se pertencessem ali. Irradiando calor por todo o corpo do outro.

E então estava frios.

Tudo aconteceu tão rápido que Jinki não percebeu: as portas se abriram e um som alto invadiu o local. Um estrondo. E o corpo de Kibum foi com força contra a parede do elevador. Lee viu, em câmera lenta, o rapaz escorregar até o chão, deixando sangue em seu rastro, e caindo sem vida. Outro estrondo lhe chamou a atenção; esperou a dor.

Desejou a dor.

Mas não sentiu nada. Olhou em volta e viu o corpo de Choi Minho no chão. Sangue saindo de sua nuca.  E Lee Taemin parado com a arma apontada para a frente, lágrimas em seus olhos.

Ato 9

Luto

Lily estava miando tristemente, deitada no local em que tinham enterrado Kibum. Obviamente, não poderiam ter feito qualquer tipo de enterro muito elaborado. A gata estava insatisfeita, e se recusava a sair do local no jardim do prédio que tinha os restos mortais do jovem viajante do tempo.

– Ela lembra dele – Taemin comentou – animais sempre lembram; gatos e cachorros são especialmente sensitivos. Enquanto nós só conseguimos ver as linhas com vários equipamentos, fórmulas, máquinas, eles sempre sabem – sorriu um pouco – ela sempre encontra o Kibum, e você, não importa o que aconteça.

– É o destino dela?

– Não, ela ama vocês – O mais jovem sorriu.

Jinki viu o monte de terra, e sentiu as lágrimas no olhos novamente. O desespero surgiu em seu peito, não sabia exatamente como escapar daquilo.

– Por favor – começou, mas já sabia a resposta que receberia – volta no tempo, traz ele para mim de novo.

Taemin foi para a frente do outro e segurou seus ombros com força, até que estivessem se olhando diretamente.

– Sabe que não posso fazer isso, você pode – sorriu – mas agora você sabe: criar a máquina do tempo traz ele até você.

– E tira ele de mim também –  estava chorando de verdade agora – sei que ele vai me conhecer, que vamos nos amar e que irei perdê-lo sempre. Todas vezes. Depois de alguns meses… O que adianta? Eu vou ficar repetindo esse ciclo?

– Você que sabe – O mais novo sorriu tristemente.

– E se eu não criar a máquina do tempo? – Jinki se questionou – e se eu criar e der para outra pessoa ficar no meu lugar e me esconder de todo mundo, o que acontece na linha do tempo? O Kibum vai para essa pessoa que não sou eu? E se apaixona por ela?

– Talvez.

Lee Jinki fitou o céu azul e fechou os olhos. Ainda sentia o cheiro de tinta. Ainda chegava em casa esperando o outro. Sua vida parecia vazia e sem sentido.

– Mas é isso que você quer? – Taemin questionou.

Ato 10

Repeat

– Bom dia, Kim Kibum?

O rapaz levantou o rosto diante da voz que lhe chamara. Era um rapaz muito jovem, muito magro e com um sorriso amigável.

– Sou eu.

– Sr. Lee pode falar com você agora – fez um gesto para ser seguido e foi. Kim estava olhando em volta com olhos curiosos, o prédio da CPT era um mistérios para qualquer um que não trabalhasse ali – Sou Lee Taemin.

– Oh, são parentes? – A pergunta foi inevitável: não se sabia muito sobre o fundador da CPT, criador da máquina do tempo que mudara completamente a história da humanidade. Era incrível tudo o que poderiam evoluir apenas estudando erros passados, ou fazendo as espionagens corretas. Mas ele era recluso, diziam que vivia apenas com uma gata e uma criança que adotara recentemente. Só pessoas que estavam prestes a serem aceitas na CPT tinham o privilégio de fazer uma entrevista com seu fundador, todo o resto do processo era realizado por pessoas em outros cargos.

– Lee Jinki é meu pai adotivo – explicou – meus pais morreram quando eu era muito jovem.

– Oh, sinto muito – franziu a testa – ele adota muitas crianças?

– Não.

– Mas tem você e a outra… Acho que tem 10 anos, certo?

– Não, sou o único – disse, sorrindo – Chegamos, boa sorte.

Quando a porta se abriu, imediatamente avistou uma figura parada em frente a uma enorme janela, de costas para a porta.  A conversa ficou temporariamente esquecida quando uma gata veio ao seu encontro, enroscando-se em suas pernas de forma carinhosa.

– Acho que gatos não deveriam fazer isso com estranhos – comentou.

– Provavelmente não, mas Lily nunca foi muito normal – O fundador respondeu sem se virar – Por que está aqui?

– Meu pai – Kim fechou a porta e foi até uma das cadeiras – ele me disse que se eu servisse a CPT por pelo menos um ano, podia depois seguir meu sonho de virar pintor – deu de ombros – não foi como imaginei isso, mas pelo menos ele para de gritar comigo.

– Você acha que vai ser bom nisso?

– Acho que vou tentar – sorriu – sou Kim Kibum.

O homem se virou. Seu rosto era jovem, não deveria ter mais que 40 anos, mas seus olhos eram sábios. Profundos e pareciam enxergar até a alma.

– Eu sou Lee Jinki.


Notas Finais


Espero que tenho gostado <3 comentem.
Beijos ~


Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...