História Resistance - Tudo errado

    * Narração por Eric Cartman *

Estava novamente dentro daquele espacinho escuro e claustrofóbico que me trazia divertidas recordações. Mas dessa vez, era a negócios. 

Depois de explicar passo a passo o que o loiro desconfiado que me encarava teria que fazer e em seguida todos os cuidados minuciosos que deveria tomar para não ser pego, deixei que ele finalmente se pronunciasse. 

— Sério que me fez atrasar a próxima aula pra me convencer a te ajudar nessas suas babaquices, Eric ?! - Butters pos uma das mãos no rosto evitando que uma sequência de espirros não atingissem a minha cara.-  Acho que a explosão da sua rinite serviu para irritá-lo mais ainda - Se a direção telefonar para a minha casa avisando que eu atrasei duas aulas no mesmo dia, e que ainda por cima estou me encontrando com a pior influência dessa escola em um depósito.. meus pais vão me colocar de castigo! 

Algumas coisas realmente não mudam depois de anos. A diferença é que agora eu preciso aperfeiçoar minhas técnicas de persuassão em algumas pessoas. Butters por exemplo, não acredita em mim tão cegamente quanto na infância e na pré-adolescência.

Sua missão era simples. Baseava-se em escrever dois bilhetes pedindo para encontrar uma determinada pessoa na cafeteria dos Tweek depois das aulas e enfiar cada pedaço de papel na abertura dos armários do Craig e do Tweek  sem que ninguém percebesse. Desse jeito eu faria com que os dois pombinhos ' se convidassem' para ir até o mesmo lugar enquanto meu subordinado os fotografassem em uma cena romântica que partiria o coração de diversas menininhas, inclusive uma de cabelos cor de lama que costumava usar aparelho. 

E então acabou. Borritos, Casa Bonita, Kyle.  Kyle.. 

Como tocar no nome do ruivo piolhento sem lembrar da tarde passada? Guardei cada detalhe do seu corpo esguio contorcendo-se de dor e prazer ao mesmo tempo naqueles lençóis brancos. Ele parecia tão delicado. Eu sabia que seria incrível, mas não imaginei tão rápido. Quer dizer, nós suamos feitos porcos e foi tão, tão bom cada uma daquelas sensações que a única coisa que eu concluí quando acabou é que eu queria repetir tudo denovo. 

Não é como uma música que voce ouve duzentas vezes e enjoa. É como donutts que quanto mais voce come, mais voce quer. Acho que essa é a melhor comparação que pensei até agora. 

— Ei! tá me ouvindo? - Butters me tirou de meus devaneios voltando a reclamar sobre eu estar ocupando o seu tempo.

— Butters! - cortei sua tagarelice impaciente - Ouça cara, voce precisa fazer isso para ajudar o Craig e o Tweek. 

— Hein? Ajudar? 

— Voce não percebe?! - ele arregalou os olhos enquanto eu sacudia seus ombros  - Aqueles dois se amam incondicionalmente em segredo! Eles precisam de um empurrãozinho para ficarem juntos sem medo da opressão da sociedade.

— E por que sou eu que preciso ajudá-los? - voltou com os espirros- Se meus pais souberem que vou sair á noite para tirar fotos de pessoas, vão me colocar de castigo! 

Retirei um bolo de figurinhas de dentro da mochila e a expressão do loiro mudou como da água para o vinho.

— Isso  por acaso não são.. cards especiais do novo álbum do Snoopy, certo? 

Confirmei com um breve sorriso. Nerds!  Ele tentou pegar as tais figurinhas mas antes eu as escondi atrás das costas.

— Nããão, primeiro voce irá cumprir as ordens, depois o pagamento. 

— Tá, tá, o que voce quiser.

Decidimos coisas como o horário e lugar de encontro para a entrega das fotos, logo depois saímos um de cada vez verificando se alguém estava ouvindo do lado de fora. 

                    . .

 No dia seguinte..

Corria o mais depressa que minhas pernas aguentassem sobre aquela calçada estreita. Corri tanto que fui obrigado a parar em uma parte meia deserta do bairro. Me apoiei em qualquer parede recuperando o fôlego aos poucos para voltar a correr ou quem sabe encontrar algum esconderijo onde eles não me achassem.

Ouvi alguns murmúrios e meus batimentos cardíacos aceleraram ainda mais. Minhas pernas se moveram sozinhas e o melhor esconderijo que pude pensar na hora foi atrás da maior lata de lixo cinza-quase-ferrugem amassada do local. O falatório se aproximava, como o som dos passos também. Espiei rapidamente esperando visualizar o número dos meus perseguidores. Sem contar Craig Tucker, claro. 

 Afinal, ele é o ''cabeça'' de todo o grupo. 

Haviam um total de 9 garotos, 7 deles valentões brutos já bastante conhecidos e Clyde, que apenas seguia Craig para qualquer lugar que ele fosse como uma espécie de bicho de estimação ou algo assim.  

Um timbre de voz familiar ecoou por toda a extensa esquina me assutando um pouco. 

— Sei que está por aqui, Cartman! Facilite para voce mesmo e saia de onde está.- Sua voz grave parecia mais intimidadora que o normal - Nós podemos conversar e talvez voce não ganhe uma surra de nós. 

Sabia que não havia escapatória. Mesmo que eu obtivesse sucesso em vazar dali, eles viriam atrás de mim depois. O jeito era arriscar. 

Ergui as duas mãos em um sinal de rendição e fui me levantando lentamente detrás das latas de alumínio. Olhei para Craig tentando prever o que viria. Eu tinha razão de estar nervoso mas ele também tinha de estar puto. 

Não é a primeira vez que Butters falha em seguir os meus planos. Parece que dessa vez, o incompetente esqueceu de desligar o flash da câmera enquanto fotograva Craig e Tweek de mãos dadas na cafeteria e o resto.. bom, da pra imaginar. Craig saiu do interior do estabelecimento e socou a cara dele até que o mesmo respondesse o motivo de tudo aquilo. Provavelmente já havia se tocado que eu estava por trás. 

Craig e eu temos uma certa inimizade por conta do espiríto competitivo. Eu sempre fui conhecido por falar coisas que as pessoas não gostam de ouvir, por diversão. Já a Bella de Crespúsculo apenas era sem filtro, dizia o que pensava sem objetivo algum. As pessoas  -especialmente garotinhas virgens - acabaram o admirando pelo jeito descolado e algum charme. Com o tempo acabamos batendo de frente por causa de nossas personalidades relativamente parecidas. 

Ele devia estar há uns dez passos á minha frente. Cochichou algo para um garoto de dreads que fez um breve sinal para os outros que logo vieram até mim. Tentei me mostrar confiante mesmo com todos se aproximando a cada segundo. Fizeram-me entrar em um beco em que a claridade não estava tão presente. Cacete..

— Okay, okay.. - bati na parede de tijolos sem perceber - Sei que fiz merda, tá leg..-

— Vigiem a entrada. - Ordenou Craig ignorando-me completamente. Os outros o obedeceram e se afastaram para a entrada do local. Eu apenas esperei o que estava por vir, mesmo que fosse um soco ou um chute nas bolas. Não tinha outra saída. - Por que fez o que fez? - abri os olhos lentamente - Eu imagino que foi apenas por diversão, já que voce é apenas um gordo debochado sem vida. 

— Já deixei claro que tenho ossos largos. - respondi emputecido

— Han.. acho que isso não importa agora. - disse obviamente

— Certo, vou me explicar - tomei fôlego e comecei - Sei que adoro saber coisas comprometedoras de outras pessoas e sair espalhando por aí, aliás tem um tempo que não faço mais isso, saudades.. - divaguei um pouco  e Craig suspirou de impaciência - É provável que voce não acredite mas eu precisava contar essa informação preciosa para uma pessoa e isso adiantaria não só a vida dela, como a minha. 

— Não passou pela sua cabeça de merda que estaria expondo minha vida pessoal para alguém?! - era um Craig indigndado, achei mesmo que ele iria me socar mas ele acabou se contendo outra vez - Ah é, esqueci que é voce. 

— Fala sério, cara! eu iria te ajudar ao mesmo tempo. Quem na escola não ficaria feliz de saber que voce e Tweek estão namorando? 

O mais alto não respondeu dessa vez e se afastou um pouco, só não me deixou sair.

— Só explique exatamente como isso beneficiaria voce e essa pessoa que citou - fiz uma cara perguntando-me porque ele queria saber justo isso, afinal as provas do crime - as fotos- já estariam com ele a essa hora. - Fiquei curioso, apenas - admitiu como se lesse os meus pensamentos. 

 Era uma questão de vida ou contar. Falei sobre minha amiga caidinha por ele, falei que fizemos uma aposta, e que embora eu esteja puto com isso, admiti que estava perdendo para aquela vaca. E eu não sou um bom perdedor, por isso precisava de um plano para ganhar e ir para a minha tão sonhada Casa Bonita no México, mas simplesmente não precisei passar horas pensando em um, porque descobri um segredo de Craig que a de aparelhos jamais iria imaginar, e assim, eu me livraria do medo dela acabar descobrindo que estou perdendo e ganharia a maldita aposta. Brilhante.

 A única coisa que não mencionei foi que teria que me relacionar com alguém, muito menos que esse alguém era o Kyle. 

— E qual o desafio proposto? - ergueu uma sombrancelha decido a saber de tudo.

— Han.. eu teria que ficar com uma pessoa e não criar sentimentos por ela. 

Não estava gostando do rumo daquela conversa mas decidi aparentar estar relaxado diante da situação, assim ele não saberia do que eu escondia, ou quem eu escondia. 

— Essa pessoa é o Kyle né? 

Merda,merda,merda,merda,merda

— Não sabia que voce andava usando drogas. 

— Nem vem com essa seu gordo, é óbvio que voce sempre gostou dele e só aceitou essa aposta pra confirmar isso, talvez até pra si mesmo. 

— Esta enganado e-

— A pergunta é se voces já transaram e decidiram ter um filhos juntos. - Ele mirou os olhos em mim - Que bonitinho.

— CALA A BOCA, SEU VIADO DO CARALHO! - Senti como se tivesse voltado a infância.

Os garotos lá da frente espiaram pra saber se estava tudo bem depois do meu surto. E Craig parou com a tortura sendo direto de uma vez.

— Fale alguma coisa pra alguém sobre eu e Tweek e eu conto sobre voce e o seu namoradinho, apenas. 

— E quem vai acreditar em voce? 

Resolvi arriscar preferindo levar um soco no meio do cara do que ouvir o que o meu adversário disse a seguir.

— Todo mundo vai acreditar em mim. 

E saiu andando na frente visto que não tínhamos mais o que conversar.