História Retaguarda - É só cair...

O soar do apito, o alvoroço da torcida e a bola a voar em câmera lenta. Era um saque forte, passou por cima da rede, direto pelo bloqueio e continuou a voar, girando…

BaekHyun podia ver os companheiros de time em quadra, Yixing desacordado sendo levado de maca para fora dali, o treinador do outro time de olhos vidrados. Sentia a torcida ao redor, o coração batendo, o sangue sendo bombeado e, naqueles míseros segundos, pôde ver tudo o que havia acontecido naquele ano passar diante de seus olhos. Não existia ciúmes de Minseok, raiva de Park ChanYeol ou mesmo as piadinhas de JongDae sobre o time adversário.

Os músculos ficaram tensos, gotas de suor escorrendo e BaekHyun sequer ousou piscar. Não tinha tempo para isso, tudo o que precisava fazer era cair, mandar a bola para o alto, sabia que conseguia, já o tinha feito milhões de vezes. Era só cair…

— Ei, BaekHyun! Estou falando com você, dá para voltar do mundo da Lua? — Não obtendo resposta alguma, lançou uma das bolas que SeHun segurava na direção alheia, o atingindo em cheio na cabeça.

— Yah! Hyung! — resmungou enquanto levantava. Tinha certeza de que um grande galo já tinha se formado, o mais velho sempre colocava muita força quando jogava. — Não precisava fazer isso… Agora vou ficar com dor de cabeça por sua causa!

— Menos drama, Baek. E você teve sorte que não foi um saque na sua cara, ia ter que refazê-la.

Revirou os olhos para as gracinhas de JongDae, bufando em seguida em um claro sinal de irritação. Era sempre desse jeito irritante, apesar de algumas vezes não conseguir se controlar e rir junto do outro das piadas que este fazia. Talvez o que mais lhe causava frustração era o fato de não poder criticar o estilo de jogo daquele maldito com sorriso de gato. JongDae era bom e, o pior de tudo, sabia disso.

Um pouco mais afastado, Yixing recolhia a bola perdida enquanto os outros ainda se mantinham presos àquele melodrama de todos os dias. Já estava acostumado com as coisas acontecendo daquela forma, o máximo que podia fazer era arrumar a bagunça que eles faziam ou consertar as coisas que estivessem quebradas — o que incluía levá-los a enfermaria. Por sorte Minseok, SeHun e alguns membros do clube de basquete lhe ajudavam.

— Será que dá para vocês calarem a boca por um segundo?! — cruzou os braços diante do peito, a expressão nada contente se mostrando. Não levou mais do que um minuto para que o silêncio se estabelecesse e os outros se aproximassem. — Como sabem nós fizemos os testes para o time semana passada…

— Fizemos?

— Shh, Baek!

— Continuando: fizemos os testes semana passada e hoje eu gostaria de apresentar o novo membro do time, que está um pouco atrasado…

— … e vai ter que correr algumas vezes ao redor da quadra…

— … Park ChanYeol.

Meio segundo depois as portas se abriram com força e um rapaz alto escorregou para dentro, caindo sentado em um baque abafado, os cabelos descoloridos caindo sobre os olhos em um quase ninho. Ao notar o silêncio existente, tratou de levantar, quase caindo de novo no meio do processo, e se aproximar dos outros reunidos mais próximos do centro.

— Me digam... que eu... estou… no lugar certo. — sibilou ofegante, apoiando as mãos sobre os joelhos em uma tentativa de recuperar o fôlego perdido na corrida dada até o local. — Porque eu… eu entrei na outra quadra e tinha um pessoal meio esquisito. Um parecia uma menina, o outro tinha umas olheiras enoooornes e o terceiro… ah… era alto e com umas sobrancelhas bem…

— Intimidadoras? — SeHun arqueou uma das sobrancelhas ao falar.

— Isso! — afirmou com a cabeça. — Achei que eu fosse levar uma surra ou coisa do tipo.

Minseok riu negando com a cabeça algumas vezes, se aquele primeiranista lhe parecera um cabeça de vento quando fora se apresentar, agora aparentava ser mais hiperativo do que ninguém. Só esperava que ele não lhe fizesse voltar atrás na segunda chance que havia dado.

— Eles são do clube de basquete — explicou o mais velho. — Não são pessoas ruins depois que você passa a conhecê-los.

— SeHun jogava com eles no fundamental e Minseok hyung às vezes topa algumas partidas, não é hyung? — BaekHyun envolveu os ombros do outro com os braços e depositou parte do peso ali, rindo ao receber alguns resmungos como resposta. Sabia como ele odiava aquele tipo de coisa porque ficava desconcertado. — Mas hyung, me diz uma coisa.

— O quê?

— Por que você deixou um delinquente entrar para o time? — Aqueles cabelos descoloridos eram claramente a marca de uma pessoa causadora de problemas, do tipo que o fazia torcer o nariz por ser parecido consigo. Conhecia bem o estilo daqueles caras, fora um deles antes de assistir a um jogo do time de vôlei e tudo mudar.

JongDae e SeHun caíram na gargalhada quase que instantaneamente, tanto pela maneira como o outro tinha dito aquilo como pelo quão irônico era. Todos ali sabiam da aparência e do passado do baixinho durante o começo do primeiro ano no colégio, assim, até mesmo Yixing não conteve um riso baixo.

A atmosfera era tranquila e até mesmo descontraída para um treino de verdade que todos estavam acostumados. Os mais engraçadinhos podiam dizer que iria chover mais tarde, porque não muito depois Minseok passou a fazer brincadeiras e tirar sarro dos outros.

— Agora já chega, seus molengas — disse em um fim de riso. — Vamos nos mexer de verdade, os outros colégios também estão dando duro. Porque eu não quero perder para aqueles caras de Seul ou vocês querem isso?

— Não!

— Mas nem pensar!

— Riquinhos malditos…

— Então vamos! — ditou — Aquecimento e depois treino em duplas. ChanYeol.

— Hm?

— Você treina comigo hoje. Vamos ver o que consegue fazer.

O mais alto não soube dizer muito bem o que houve ali, mas viu algo nos olhos do outro que fez um longo arrepio subir por sua coluna. O que diabos era aquilo?

ChanYeol caiu exausto contra o chão. Ainda conseguia ouvir os sons dos tênis se movendo no chão e tudo o que conseguia pensar era em como aqueles caras conseguiam jogar depois de tudo o que já haviam feito. Todos os treinos durante aquela semana eram sempre da mesma forma: brutos e surpreendentemente exaustivos. Já tinha perdido a conta de quantos analgésicos tomara só para conseguir continuar se mexendo no dia seguinte.

Era muito diferente de quando estava no fundamental, Minseok, apesar da aparência tranquila e amena, conseguia comandar o time com mãos de ferro. Não havia treinador, era difícil achar um bom em cidades pequenas como aquela, mas não tinha certeza se eles realmente precisavam de um. Quando entravam em quadra, guiados pelo capitão, eles eram verdadeiras bestas, quimeras.

BaekHyun pisava duro enquanto andava, a mochila pendendo de um dos ombros e alguns fios de cabelo grudados na testa devido ao treino que acabara. Não se importava que estivesse escuro do lado de fora ou que Yixing estivesse lhe chamando de volta, pedindo para que esperasse, não aguentava mais aquela situação. Em todo santo treino que tinham, Minseok sempre fazia dupla com ChanYeol, enquanto que JongDae ficava como sua dupla.

A única pessoa que sempre fizera dupla com o mais velho era Yixing, justamente pelo fato de ele ser tão bom quanto, apesar da aparência sonolenta. No entanto, desde que aquilo — ou melhor — que aquele maldito poste tinha entrado para o time, sentia seu sangue ferver todas as vezes em que treinavam em duplas.

BaekHyun nunca tinha tido o direito de treinar à sós com o mais velho, então por que diabos aquele novato, que não conseguia acertar o tempo de um bloqueio sequer, podia? Dava-lhe nos nervos!

Chutou uma latinha de refrigerante enquanto andava, provocando um som tão alto que até mesmo um gato se assustou e saiu correndo.

— Merda.

— As latas não têm culpa da sua irritação — Ele virou a cabeça um pouco para trás só para confirmar a hipótese de quem poderia estar vindo, apesar de que a voz do capitão era sempre reconhecível a seus ouvidos. — E muito menos os gatos.

— Yixing pediu para você vir atrás de mim?

— Não — disse logo em seguida, apesar do chinês ter tentado sibilar algo antes que tivesse saído. — É bem a cara do Xing fazer isso, mas hoje não. Vim porque eu quis.

BaekHyun continuou andando, diminuiu o passo assim que passaram por uma loja de conveniência 24 horas e passou a praticamente arrastar os pés pelas partes de terra da rua. O colégio era mesmo afastado de tudo, mais do que conseguia notar nos dias em que todos iam embora juntos, conversando.

— Por que foi embora daquele jeito? Ainda tínhamos que fazer os saques — quebrou o silêncio assim que esse se tornou incômodo. — Pensei que gostasse dos saques viagem.

— E eu que você só fizesse dupla com o Yixing.

Minseok suspirou. Então aquele seria mesmo o problema? O mais novo podia ser bem infantil, mas não pensou que chegaria a tanto.

— BaekHyun… É complicado.

— Por que é complicado? — parou de andar. A alça da mochila era apertada com força entre seus dedos. — Por que as coisas têm que ser diferentes agora? O que aquele cara tem de especial?

— Não é que ele tenha algo especial. Por Deus!

— Exatamente! — aumentou o tom de voz ao falar. — Ele não bloqueia, não saca direito, é péssimo no recebimento e quase sempre parece que vai levar um tombo no meio da quadra. Por que Minseok?!

— Eu sou seu hyung, BaekHyun.

— E eu já estou cansado disso tudo. — Ao erguer o rosto para fitá-lo, viu uma expressão no rosto do mais velho que não se lembrava de já ter visto antes. Era diferente. — Por quê?

“Por que não pode ser eu? Por que eu não posso fazer dupla com você? Estou sempre aqui para proteger o time nos lugares em que os outros não alcançam, para te proteger. Por que não eu?”, BaekHyun quis dizer todas aquelas coisas que já lhe deixavam à beira de lágrimas, mas foi impedido pelo outro.

— Porque ele é como eu quando comecei. É por isso — Minseok também tinha algumas poucas lágrimas solitárias escorrendo pelo rosto, mas mantinha o olhar firme, ferido de um felino. — ChanYeol não é bom em nada, não consegue fazer nada, mas ele tem vontade. Ele tem vontade, BaekHyun… E foi justamente isso que não me fez desistir.

Não tiveram mais palavras naquele momento, porque BaekHyun não sabia mais o que dizer e Minseok já tinha dito tudo o que podia dizer. Não demorou muito até que os outros os alcançassem. Estavam no fim da rua, embaixo do poste de luz acesso quando o mais velho disse:

— ChanYeol vai levantar para nós a partir de agora. E você — voltou os olhos para BaekHyun —, o que me diz?

BaekHyun sorriu e todos os outros o acompanharam.

— Vou continuar protegendo esse time. Nosso time. Nós.

Ele nunca os desapontaria, porque era tudo o que tinha, mais do que o pai solteiro que cuidava de si e do irmão pequeno. Aqueles caras eram os seus caras.

A bola continuou girando, vindo em sua direção tão devagar que parecia parada no ar, mas provocando tanta tensão que jurava que sua mandíbula estouraria a qualquer momento. O apito já tinha soado, restavam apenas alguns segundos mais para que fosse o fim de tudo, de todo o trabalho que tinham tido até aquele momento e pôr aquele momento. Para terem uma chance, para mostrarem àqueles riquinhos de Seul que não eram “só mais um time de uma cidadezinha qualquer”.

Estavam quase todos ali, diante de si. E não se viravam para trás porque sabiam que não precisavam daquilo, porque BaekHyun estava protegendo a retaguarda. Estava os protegendo como fizera em todas as outras vezes, em todos os outros jogos e como continuaria fazendo até que fosse obrigado a parar.

Um sorriso repleto de adrenalina e felicidade surgiu em seus lábios, o suor escorrendo pelo rosto e o coração batendo rápido. A torcida os acompanhava e ele sabia o que fazer naquele momento, era só cair…