História Royals - Yoonmin - Cântico dos degraus

Não consegui. Do grande esforço através dos doze meses, doze signos, doze faces, só guardo essa certeza. Que tonta travessia. Tudo bem, descansa. Faz parte, não conseguir. Como Sísifo, se queres mitologias. Queres ainda? Por favor, estou farto. Brilhos baratos, as joias eram todas falsas. Está certo, mas não quiseram te fazer mal. O mal não existe reverso do bem. Tanto faz, só peço que me deixem. Vou ficar encostado na árvore até amanhecer. Olhos abertos, feito uma vela acesa. Se ela insistir, direi que não tenho piedade alguma. Que não compreendo, não aceito nem perdoo mais a loucura. Se ele vier, pedirei que fique. Serei bom para ele. Mentira, não pedirei nem direi nada a ninguém. É indivisível, aprendi. Talvez consiga dormir. Talvez consiga acordar amanhã finalmente livre de tudo isso..(...) É como uma cantiga de ninar nas cinzas do fim do mundo. Um barbitúrico, se preferires. Entorpece, melancólico, te leva para longe. Já se perdeu, não há futuro. Repousa, meu amigo. Deixa-me passar a mão nos teus cabelos. Está amanhecendo. Em voz baixa, eu canto para te enganar. – Do conto “Dodecaedro”, Caio Fernando Abreu.

Jimin observava as pessoas correrem de um lado para outro nos corredores do palácio, apressadas para acertarem os últimos detalhes de um evento que já tinha sido o mais adiado possível. Sorriu de lado, pensando em Yoongi e em todo o escândalo que ele fizera para não ser coroado, sobre como ele seria um péssimo rei, apenas para terminar no ponto onde todos esperavam que ele terminasse: com uma coroa na cabeça, sentando em um trono desconfortável demais para poder chamar com firmeza de seu.

Yoongi estava mais sumido do que nunca, tentando adequar-se em um sistema que claramente não queria pertencer. Ao contrario de Jimin, porém, todo o sistema fora feito sob medida para Yoongi. Ele tinha tudo que era necessário, preenchia todos os requisitos e Jimin não sabia o que fazer para Yoongi acreditar no que ele dizia.

Mas a verdade era que, querendo ou não, ele iria colocar a coroa que um dia fora de seu pai. E quando isso acontecesse, Jimin seria posto para fora da questão, como uma carta descartada em um jogo que já estava perdido há muito tempo. De alguma maneira estranha, isso não o entristecia. Ele sabia que seu futuro com Yoongi estivera condenado muito antes de eles nascerem, de se apaixonarem. Obviamente a questão de terem nascido herdeiros só piorava o impossível, mas Park Jimin gostava de acreditar que todas as coisas possuíam uma razão para existir então era praticamente impossível que eles estivessem vivendo aquele pesadelo inteiro em vão.

Talvez, quem sabe, sua alma e a de Yoongi estivessem pagando por um carma tão antigo que nem possa ser expresso em palavras. Talvez existam pessoas que foram feitas para se apaixonar e não para ficarem juntas. Pensar nisso fazia Jimin se sentir como o maior covarde da história das pessoas covardes, mas isso também não lhe importava. Ele sabia que nadar contra a correnteza só o faria mais cansado do que ele já estava e isso não podia acontecer, pelo menos não agora que Yoongi precisaria de todo o apoio que ele pudesse conseguir.

- Jimin! – Jaehyun falou, tirando o garoto moreno de seus devaneios infrutíferos. – Ainda bem que te achei. Estava te procurando há algum tempo.

- Olá, hyung! – Jimin disse animado, indo em direção a Jaehyun. – Aconteceu alguma coisa para você estar me procurando? – Perguntou preocupado. Geralmente ele ia atrás de Jaehyun, a situação inversa era um tanto rara de acontecer.

- Na verdade sim. E não. Quero dizer, nada de muito sério aconteceu, mas o Rei pediu nossa ajuda para tratar de assuntos da coroação. – Jaehyun respondeu, passando a mão nos cabelos lisos, um tanto impaciente e ofegante depois de tanto procurar por Jimin nos arredores do castelo.

- Assuntos... Da coroação? – Jimin perguntou, soando chateado. Claro que ele estava tentando ao máximo não se deixar abalar por conta disso, até mesmo encontrava-se feliz por Yoongi, mas isso não queria dizer que ele gostaria de se envolver um segundo sequer naquela cerimônia.

- Sim. O rei nos pediu para recepcionar os príncipes que chegarão hoje. Já montaram tendas no início da propriedade para que possamos esperar com mais conforto. – Jaehyun falou, pegando na mão de Jimin e o arrastando em direção aos Portões do Palácio.

- Hyung... Espere, por favor. – Jimin pediu, soltando a mão que estava entrelaçada com a dele. – Quem são os príncipes que virão? Pensei que seria apenas você. E, aliás, por que nós temos que ser as pessoas a recepcionar? Não fazemos parte da família de Yoongi.

- Jimin... O rei nos pediu esse favor, pois todos estavam ocupados demais. Quanto aos príncipes, creio que ainda virão Taeyong, Ten e Mark. Não sei se alguém mais virá.

- Taeyong estará aqui? – Jimin perguntou fracamente, lembrando-se do garoto que costumava brincar.

- Sim. Ele e esses que falei.

- Ah... – Park Jimin voltou seus olhos para o chão, desgostoso demais para seguir com Jaehyun em direção ao portão, onde recepcionaria pessoas que mal conhecia para uma cerimônia que destruiria todas as chances escassas que possuía com Yoongi. Controle-se, Jimin. Lembre-se dos ensinamentos de seu mestre no templo que frequentava, Jimin repreendeu-se mentalmente.

- Jiminnie... – Jaehyun falou, aproximando-se do garoto mais baixo. – Por que seu coração encontra-se tão pesado e escuro hoje? Geralmente penso em seu coração em tons claros, como branco, prata e dourado. Mas, hoje, Park Jimin, seu coração está em um tristíssimo tom de preto. Aconteceu algo, wǒ de tiānshǐ? – Jaehyun perguntou, fazendo Jimin sorrir com o uso repentino do mandarim que ele tanto amava.

- Ah, Jaehyun hyung. O coração de uma pessoa não é uma aquarela.

X

O dia estava muito quente e ficar em baixo de um enorme guarda-sol ao lado de um Jaehyun que não parava de falar um segundo sequer e estar vestido em uma das roupas mais quente que ele possuía, não estavam fazendo Park Jimin se sentir em seus melhores momentos.

Virou a cabeça para trás, respirando fundo e tentando não sucumbir ao mal-estar que percorria todo o seu corpo: ele não podia passal mal agora, não quando a coroação de Yoongi estava tão próxima.

- Você está bem, wǒ de ài? – Jaehyun indagou preocupado ao ver o estado que Jimin se encontrava. O moreno estava agindo estranho há dias, mas hoje, Jimin parecia quase translúcido, com a pele clara mais pálida do que o normal e os lábios avermelhados ressacados e com pequenos cortes que pareciam estar prestes a sangrar a qualquer segundo.

- Sim, estou. – Jimin respondeu com a voz fraca, esfregando os olhos com as mãos. A verdade era que ele não estava, mas não gostava de ficar preocupando terceiros com problemas que somente diziam respeito a ele próprio.

- Sabe você não me parece nada bem, Park Jimin. – Jaehyun disse, suspirando enquanto via o menor tentar esconder o rosto com as mãos. – Se não estiver se sentindo bem, é só falar. Tenho certeza de que o Rei entenderia perfeitamente se nós não esperássemos a chegada dessas comitivas. O que não pode acontecer de forma alguma, Jimin, é você perder a coroação do seu melhor amigo apenas por birra de não admitir que esteja, sim, doente. – Jimin revirou os olhos antes de volta-los para Jaehyun.

- Eu estou bem. Não estou doente, talvez me sentindo mal apenas um pouco, mas definitivamente, não estou doente, Jaehyun. Não precisa se preocupar comigo, nem mesmo tentar me tirar daqui porque eu não vou sair. E também não vou perder a coroação do Yoongi por nada nesse mundo.

- Está certo então, Park Jimin. Eu vou me lembrar bem de suas palavras para quando o louco inconsequente do Yoongi vier para me bater quando você estiver deitado em uma cama, doente demais para se levantar. Vou lembrar-me de dizer a ele o quanto você relutou em apenas ir ver um médio porque você se achava saudável demais para isso. – Jaehyun falou em tom de provocação, fazendo Jimin suspirar cansado e encostar a cabeça na mesa de madeira que se encontrava a sua frente.

- Faça como preferir, Jaehyun. Apesar de eu ter quase certeza de Yoongi nem mesmo saberia que estou doente, muito menos teria tempo ou disposição para me visitar. Quanto mais para tentar tirar satisfações com você. Nós dois sabemos melhor do que ninguém o quão ocupado ele está com assuntos da coroação, Jaehyun. Então mesmo se eu estivesse doente, o que não estou, você não conseguiria me chantagear com promessas de Min Yoongi de forma alguma. Sou adulto o suficiente para saber que não poderia cumpri-las, mesmo se quisesse.  – Jimin disse baixinho, soando totalmente derrotado e partindo o coração de Jaehyun, que nunca nem mesmo se importara com Yoongi uma vez sequer. Mas saber que Jimin, o garoto que ele tanto amava, estava sofrendo assim por conta do loiro azedo, o fazia sentir-se de jeitos que nem mesmo ele conseguia descrever.

- Jiminnie... – Jaehyun falou, passando as mãos nos cabelos negros e sedosos de Jimin. – Não é como se Yoongi tivesse algum tipo de escolha. Você sabe que se ele pudesse ficar com você, ele com certeza ficaria. Mas ele não pode subir ao trono sem o apoio do conselho do pai dele. Você sabe com as pessoas são idiotas nesse lado do mundo, Jimin. Yoongi deve estar fazendo o seu melhor para tentar dar aqueles velhos babões um pouco de sanidade.

- Eu sei hyung. Não sou louco como a maioria das pessoas pensa. Tenho plena consciência de tudo que Suga deve estar passando. E ele deve estar se sentindo tão sozinho agora. Sinto-me muito mal porque prometi que nunca o abandonaria e é exatamente isso que sinto que estou fazendo: jogando Yoongi sozinho diretamente na boca dos leões.

- Você não o abandonou, Jimin. Você nunca o abandonou. Quando amamos uma pessoa, a presença física é apenas um pequeno passo para demonstrar isso. Tenho plena certeza de que Yoongi não deixou seus pensamentos um segundo sequer e é isso que importa de verdade. Porque nós não devemos carregar as pessoas que amamos e ostentá-las como se fossem uma espécie de troféu. Amor não é contato físico, é conexão etérea. Você não precisa estar colado para estar com Yoongi e isso se aplica para os dois lados. Amar é muito mais, Jimin.  – Jaehyun falou em um tom doce, sorrindo para o garoto que lhe olhava assustado.

- Hyung... Eu... Eu não amo o Yoongi hyung. Ele é apenas meu melhor amigo e eu... Nossa, nada a ver eu e Yoongi... – Jimin começou a falar nervosamente e gaguejando, fazendo Jaehyun rir da tentativa miserável de mentir de Jimin.

- Jiminnie, não precisa fingir, pelo menos não pra mim.

- Como... Como você descobriu?

- Eu tenho dois olhos, Park Jimin. Simples assim. – Jaehyun disse, sorrindo da coloração avermelhada que o rosto de Jimin adquiria. – Não precisa se preocupar, o segredo de vocês está a salvo comigo.

- Pensei que você não gostasse do Yoongi, hyung. – Jimin falou um tanto quanto surpreso por descobrir que Jaehyun não só sabia sobre ele e Suga quanto havia acabado de dizer que não contaria a ninguém a respeito dos dois.

- Você tem razão, eu não gosto. – Jaehyun começou, suspirando pesadamente. – Nem entendo como você gosta. Yoongi é excessivamente grosso e ciumento e ele não faz seu tipo. – Jimin abriu a boca para protestar, mas Jaehyun pôs o dedo indicador nos lábios do moreno. – Deixe-me acabar, Park Jimin. Não gosto de Min Yoongi, mas gosto de você e é justamente por isso que ficarei calado a respeito da situação toda, apesar de sentir que não deveria. Você só sairá machucado disso tudo, Jimin. É praticamente impossível que consiga sair ileso dessa situação.

- Eu sei, hyung. – Jimin falou com um sorriso triste. – Eu sei que isso tudo é apenas um tiro no escuro, um beco sem saída. Mas eu não consigo escapar. Eu sou fraco demais para escapar. Não seja tão duro com o Yoongi, Jaehyun. Ele é uma pessoa realmente incrível e eu... Eu que não o mereço e já disse isso mais vezes do que consiga recordar-me. Yoongi nasceu para ser o Rei que meu pai sempre sonhou que eu fosse. E eu nasci para ficar nos bastidores, sorrindo alegre a cada conquista que ele consegue realizar.

- Jimin... Olhe para mim. – Jaehyun pediu, levantando o rosto do moreno até a altura do seu. – Você deveria se dar alguma graça. Eu vejo o quão duro é consigo mesmo e, de certa forma, Yoongi e eu somos culpados porque indiretamente alimentamos a sua ilusão de insignificância. Mas você merece graça, Park Jimin. Existe muito mais vida do que a que você se permite viver. Se permita viver, Jiminnie. E amar aquele idiota. Deixe a mistura acontecer, Jimin. Se deixe experimentar. Você não nasceu para bastidores, Park Jimin, porque ninguém nasceu. Você é o protagonista da sua própria história. Está em suas mãos a decisão do fim dela. Então, Jimin. Como vai ser? Comédia ou tragédia? – Jaehyun perguntou sem realmente esperar uma resposta, afinal, sabia que aquele tipo de pergunta não era tão simples de ser respondida; ele apenas havia feito para que Jimin pudesse repensar o jeito que olhava para si mesmo.

- Você tem razão, de certa forma. Sempre foi mais fácil para mim me dedicar para outras pessoas do que fazer eu mesmo uma mudança significativa. Estou me perguntando agora por que nós nos damos tanto para outras pessoas. Você sabe, hyung? – Jimin perguntou e Jaehyun balançou a cabeça em negação. – Acho que não deve ser apenas pelos seus corpos, mas pela alma também. Nós compramos seus sonhos, suas histórias, as partes escondidas, as que eles não deixam tão visíveis assim. O interessante, Jaehyun, é que eu tendo a gravitar em direção a pessoas tão marcadas pela vida quanto eu. Você, Yoongi e tantos outros. E isso é poético, de certa forma. Apaixono-me por pessoas marcadas porque eu sou marcado também, eu também possuo minhas cicatrizes escondidas. A diferença básica entre meu espectro e o seu é que o heroísmo falho que enche seus pulmões não existe em mim. Eu estou há muitos anos longe da salvação, hyung.

- Jimin, o que diabos você quer dizer com...

- Altezas! – Um dos guardas que eram responsáveis pelo portão gritou. – Creio que os príncipes acabaram de chegar.

- Não deixarei isso passar, Jimin. – Jaehyun falou autoritário, levantando-se junto do menor e andando em direção ao portão do Palácio.

- Mas é claro que não vai.

X

Taeyong, Ten e Mark desceram da carruagem amparados por guardas que estavam esperando sua chegada muito antes de Jaehyun e Jimin.

Taeyong estava exatamente como Jimin lembrava-se, a expressão séria estampada no rosto jovial e bonito. Mark descia com um sorriso enorme, animado por estar fora de casa pela primeira vez depois de tantos anos. O garoto que Jimin deduziu que fosse Ten, desceu sem expressão, os olhos escuros e cautelosos analisando cada centímetro do pátio onde se encontravam.

Jaehyun tocou suavemente na mão de Jimin, sugerindo que eles fossem à direção do trio inusitado, afinal, o Rei havia pedido justamente isso dos dois: que recepcionassem os convidados importantes que chegariam.

- Bem vindos ao Palácio. – Jaehyun falou com sua voz polida e educada, fazendo Jimin sorrir com a súbita mudança no amigo. Seus olhos foram direcionados a Taeyong, que também o encarava pesadamente.

- Onde está a família real? Não reconheço vocês como sendo uma parte dela. – O garoto bonito, Ten, perguntou com a voz cansada.

- Os pais de Yoongi estão muito ocupados com a cerimônia e nos pediram para receber vocês. E nós...

- Gentilmente aceitaram e bla bla. Já sabemos o resto da história. E você Jimin? Desaprendeu a falar?

- Não, Taeyong. Continuo falando muito bem, agradeço a sua preocupação. E você? Deixou a educação em casa? – Jimin falou com um sorriso, fazendo Mark cair na gargalhada e Jaehyun o encarar incrédulo.

- Vejo que você passou tempo demais com Yoongi, Jimin. – Taeyong falou rindo abraçando Jimin fortemente. – Senti sua falta, idiota.

- Também senti a sua. – Jimin disse, retribuindo o abraço feliz.

- Vocês se conhecem? – Ten perguntou desconfiado.

- Sim. Somos amigos de infância.

- Nossa que bom. – Mark intrometeu-se, abraçando Jimin também. – Já que você é amigo do hyung poderia nos levar para dar uma volta no palácio? Estou de saco cheio de ficar sentado em uma carruagem.

- Me deixa fora disso. A viagem acabou comigo. – Ten reclamou, olhando sugestivamente para Taeyong e Mark.

- Eu levo você até seus aposentos. Jimin pode levar Mark e Taeyong para conhecer os arredores. – Jaehyun sugeriu, sorrindo e empurrando Jimin na direção dos dois garotos.

- Ótimo! Você leva a gente, Jimin hyung? – Mark perguntou, fazendo uma carinha fofa e chamando Jimin de hyung propositalmente.

- Claro, Mark. Seria um prazer. Eu também estou precisando espairecer um pouco.

- Então excelente. Os guardas podem tirar nossas malas. Vamos logo, Park Jimin. Tem muitas coisas que eu gostaria de saber. – Taeyong falou, puxando os dois garotos na direção oposta a Jaehyun e Ten.