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História Ruídos de Saturno - Amor


Escrita por: souhamucek e Jeleninhaz

Notas do Autor


Olá, gente! É a Jéss, um pouquinho atrasada nas notas e na atualização de hoje. Relevem!
Hoje não tenho muito o que enrolar aqui.
Um dos poemas citados no capítulo é do Vaz de Camões, todos os créditos a ele, os demais são de nossa autoria 💜
O capítulo ficou um pouco maior que os passados porque tem três poesias, mas pedimos desculpa pela diferença discrepante.
Espero que gostem tanto quanto nós gostamos.
Tenham uma ótima leitura ;)

Capítulo 13 - Amor


Fanfic / Fanfiction Ruídos de Saturno - Amor

​Uma semana depois.

 

A galáxia representa teus braços:

Diz respeito ao limite de minha fúria;

Rege os caminhos da ansiedade,

Protege os planetas como me proteges.

Galáxia é aconchego.

Dr. ª Patricia segura o pequeno bloco de anotações em ambas as mãos e sorri. Ela está contente com o que acabou de ler. De fato, devo admitir que é bonito, mas, sinceramente, não tenho a menor ideia do porquê de ler isso. Ela nunca lê nada do que escreve para mim. Eu nem sequer sabia que escrevia sobre os céus, achei que fossem sobre mim.

— Gostou, Shawn? — balanço a cabeça em concordância. — Fiz para você, porque sei que adora o espaço. Confesso que não é uma de minhas melhores, porém me esforcei.

— É bonito.

Sua assentida sutil me expressa um agradecimento, então, devolvo-lhe um sorriso.

— Agora é a sua vez. — a psicóloga estende a mão em direção, guiando meu olhar.

Espanto.

Vejo a pilha de livros colocada sobre a mesa sem aviso. Eles, que possuem um volume curiosamente menor que os expostos na estante, são sustentados por um pequeno carrinho de mão. Alguns carregam a aparência de novos, entretanto, outros me parecem mais envelhecidos. Não sou capaz de contá-los, contudo, são muitos.

Livros nunca foram um assunto interessante aos meus olhos. O modo que as letras se encaixavam numa frase me entediam, embora eu saiba que, muitas vezes, eles possam guardar uma bela história entre as páginas. Falta-me vontade para acompanhar até o final.

Percebendo isso, dr. ª Patricia decidiu que, na consulta de hoje, faremos algo diferente: iremos além dos diálogos compridos, a aproveitar minha linha do silêncio.

— Nã-não gosto muito de livros. — confidencio precipitado.

— Desses você gostará! — ela afirma com certeza. — Em um atendimento, você me disse que vez ou outra você lê artigos ou notícias sobre o espaço. Isso me fez pensar que sua leitura só se estende até os assuntos que conhece. — dou com os ombros. — Sendo assim, acho que seria legal tentarmos partir para os que não.

Franzo o cenho em confusão.

— Esses livros são um pouco diferentes dos que está acostumado. Não possuem história própria, ou várias, também não são relacionados a artigos ou notícias; são poesias, cada página contém uma. — esclarece, mas mantenho o semblante confuso. — Sabe o que é uma poesia, Shawn?

— São t-extos, um pouco menores que os normais. São divididos em partes pequenas e as vezes acabam rimando. — ao terminar a fala, concluo o provável motivo dos livros serem menores e mais finos: não há muito o que colocar nas folhas afinal.

— É mais ou menos isso. — seu tom é de puro divertimento. — Cada livro retrata um tema. Alguns são mais antigos, por isso têm uma linguagem mais complicada, mas creio que entenderá tudo.

Ainda sem entender como isto tenha alguma utilidade, enfio a mão no carrinho de madeira atrás de uma boa opção. Meus olhos avistam um livro de capa dura e marrom. Não tardo a pega-lo na mão.

Não ouso a ler o nome antes de folheá-lo, apenas abro em uma página qualquer e encaro o texto. Pelo tom amarelado na beirada, é evidente o estado envelhecido. A loira me acompanha com os olhos até o costumeiro divã, onde me vejo confortável o bastante para, enfim, dar uma olhada no conteúdo.

Logo em uma das primeiras páginas, o poema que suga minha atenção por não só não ser tão grande, entretanto, a carga depositada desde a primeira frase é capaz de bagunçar meus pensamentos.

— "Amor é um fogo que arde sem se ver..." — começo, um tanto trêmulo.

Luís Vaz de Camões. — complementa, acredito que dizendo quem o escreveu. — Adoro este poema. Continue.

"Amor é um fogo que arde sem se ver.

É ferida que dói, e não se sente;

É um contentamento descontente;

É dor que desatina sem doer.

 

É um não querer mais que bem querer;

É um andar solitário entre a gente;

É nunca contentar-se e contente;

É um cuidar que ganha em se perder;

 

É querer estar preso por vontade;

É servir a quem vence, o vencedor;

É ter com quem nos mata, lealdade.

 

Mas como causar pode seu favor

Nos corações humanos amizade,

Se tão contrário a si é o mesmo Amor?"

Abro um sorriso estreito, quando chego ao fim. Os olhos azuis meramente acinzentados reluzem, como se a doutora estivesse emocionada. Fecho o livro com as mãos e repouso-o sobre as pernas fletidas. A psicóloga começa a falar sobre a belíssima poesia lida há instantes, no entanto, minha mente se prende ao tema confuso abordado nele:

"Amor."

Já ouvi essa palavra várias vezes, mas nunca parei para pensar sobre seu significado. No poema, o autor encaixa inúmeros significados para o amor, significados que eu jamais associaria. Parece ser um sentimento mais forte do que os que estou acostumado a sentir, mais intenso e real.

Intrigado, vasculho discretamente as outras páginas do livro em busca de outros poemas do tipo. Não é difícil encontrá-los, tampouco demorado. Lendo inúmeras situações curiosas, percebo que o amor pode tanto machucar quanto cicatrizar; é capaz de alegrar ou entristecer; assim como doer ou aliviar.

É estranho constatar que um único sentimento consegue manipular tantos outros.

Entendi, com a ligeira leitura nos textos rimados, que o amor pode envolver mais de uma pessoa, referir-se a alguém ao invés de um objeto e que, na maioria das vezes, diz respeito a uma garota. Ora a detalhar sua beleza única, ora a enaltecer a personalidade marcante. Solto uma risada curta, absorvendo meramente algumas informações.

O amor é algo muito maior e mais complexo do que meu cérebro antes entendia. Sei que amo o espaço, os planetas e os cometas. Porém, este amor não entra explicitamente em nenhuma destas poesias. Só na da psicóloga. Talvez esse cuidado dela também seja uma forma de amor.

•••

O final de semana chega mais rápido que o normal, como se viesse embarcado em um foguete. As chamas de sua vinda, elas colorem minha manhã e acalmam. Ao julgar pelo horário, Iris virá a qualquer momento.

Sentado sobre o chão de madeira corrida, com as pernas cruzadas, agrupo meus papéis repletos de pesquisas, desenhos e poemas. Dr. ª Patricia estava certa sobre o experimento me ser bom. De fato, foi. Gosto de me desafiar. Movimentar a arte em mim é a melhor parte de nossos encontros, com a Anna falávamos muito e, por mais que eu adorasse, explorar meus limites me traz a sensação de importância. Sinto-me blindado pelo ofício.

Uma sequência ritmada na porta rompe meus pensamentos, seguida pelo som da rotação na maçaneta.

— Com licença, Shawn, posso entrar? — a voz da filha de minha doutora chega aos ouvidos. Confirmo com a cabeça.

Ela veio.

— Bom dia! Dormiu bem? — balanço a cabeça mais uma vez. A garota adentra, encostando a porta de volta e a se sentar ao meu lado sobre o chão. — Minha mãe falou que vocês se divertiram bastante na consulta dessa semana.

— Muito. Foi muito legal.

Os lábios rosados e desenhados da loira se esticam em um sorriso largo, no qual consigo ver seus dentes grandes e brancos. O silêncio preenche todos os espaços do quarto em seguida, porém. Engulo em seco o assunto vazio. Uma ideia súbita brilha em minha mente, como uma lâmpada acesa.

— Poemas. — os olhos azulados me espiam. — Li poemas com a sua mãe. Descobri que gosto disso... é... é bonito.

— Poesia é a coisa mais linda desse mundo, músicas não deixam de ser poemas, inclusive. — choco-me com o óbvio só agora percebido.

— Nun-nunca tinha pensado nisso.

As mãos magras da menina fazem menção às minhas folhas empilhadas sobre o piso frio. A expressão em seu rosto me parece de dúvida, sinto como se ela quisesse saber o que são. Seguro-as, passando o polegar na beirada dos papéis ajuntados.

A ansiedade me consome, a me fazer hesitar em revelá-los tão depressa.

Meus rascunhos e rabiscos são íntimos, desabafos, nem sequer são bonitos. Posso decepcioná-la. Melhor evitar isso.

Todavia, escondê-los de Iris também não lhe seria uma espécie de decepção?

— Tomou gosto por desenhos? — indaga, analisando a primeira página em minhas mãos.

— Artes. — afirmo, mais confiante do que até eu mesmo imaginaria. — Dr. ª Patricia me ensinou a gostar de arte. No geral. Músicas, no entanto, ainda são um pouco barulhentas para mim... apesar de escutar Yellow várias vezes ao dia. Isso foi você. Você.

— Fico feliz em saber que esteja se descobrindo, Shawn.

Suas palavras me confortam, como de costume. Brevemente abraçado pela confiança, trago os papéis para perto e espalho-os sobre o chão, bem diante de nós dois. Um a um, aponto os rabiscos que fazem sentido só para mim e explico-os, sem dar muitos detalhes. As bochechas encarregadas de sustentar o sorriso no rosto da estudante de astrofísica me mostram certa satisfação com meus pensamentos ilustrados.

Planetas. Temos a fascinação pelo espaço em comum. É provável que meus traços tortos da galáxia tenham a agradado por isso. Há mensagens por trás dos desenhos, desabafos silenciosos, mas, ainda assim, ilustram o sistema solar.

— E essa folha embaixo de seu pé? — puxa-a, com certo cuidado.

— É um poema... — seus olhos parecem perfurar o papel — sobre o amor. — noto uma de suas sobrancelhas castanhas claras se erguer.

— Leia-o para mim, se você se sentir à vontade.

Sua mão me entrega o texto amassado nas pontas. Seguro-o, a encarar as palavras enfileiradas.

— Posso gaguejar. — falo, mais como uma confissão. Iris dá com os ombros, como quem diga "e daí?". — Não está muito bom. Isso é só... um rascunho.

— Não se preocupe.

Ame o seu mundo... — meus lábios cospem o primeiro verso, é como se o receio lesse as palavras ao invés de mim. A loira faz que sim com a cabeça, acredito que peça para que eu continue. — Ele é seu.

Ame o seu mundo

Ele é seu

Mesmo que moribundo

Mudá-lo cabe a você, não eu.

 

Ame. Desame. Re-ame.

Camadas protegem seu planeta

Encha-se e se derrame

Desenhe anéis ao seu redor com caneta

 

O silêncio é constante;

O romance eminente

Você é importante,

Muito embora o chamem de impotente.

 

Ame-se. Dane-se.

— Uau.

É tudo o que diz.

— A-achou ruim? — o vexame percorre minhas veias. — Eu não devia ter lido. Não devia. Desculpe... — ela me interrompe.

— Não. Shawn, ficou maravilhoso! É muito mais que "bom", é incrível.

Antes que eu possa prever, seus braços compridos me envolvem em um abraço. Afundo meu rosto na curta de seu pescoço alvo e fechos os olhos, em forma de resposta. Com um sorriso amplo no rosto, suspiro fortemente.

Este é o momento em que o cheiro de seus fios dourados invadem as minhas narinas. Eles têm um cheiro doce, sem ser em demasiado. Um bom aroma.

Levando em consideração que consigo sentir o olor dela, é bem provável que a de olhos azuis sinta o meu. Acordei há menos de uma hora, posso não estar com o um odor desagradável. Assim sendo, afasto-me.

— Shawn, é deste modo que vê o amor?

Ergo uma das sobrancelhas.

— De que forma? — pergunto, em nítida confusão.

— Subjetiva...

— Não sei. Co-como assim? — mordo a parte de dentro da bochecha. — É errado?

— Não existe certo ou errado no amor. — em vez de esclarecer as ideias, ela as bagunça mais.

Sigo meu olhar acastanhado para as minhas mãos. Não olhar diretamente para Iris é uma ótima forma de defesa.

— Como você vê? — questiono-a.

— Não como você. — cerro as mãos vigiadas em punho, perdido. — Enxergo o amor nas coisas: em atitudes, palavras, objetos, ..., até em pessoas.

— Como? — insisto.

— Você ama o espaço. Percebo isso pelo seu interesse exagerado; o brilho nos olhos ao falar ou escutar sobre ele; é notável em seus traços imprecisos dos desenhos... — sua mão cálida apanha a minha. — Vejo amor em você.

Ainda mais quente que os dedos contra minha pele, suas palavras me aquecem. Ágeis como uma estrela cadente, meus olhos encontram as constelações nos dela. Meu rosto, em questão de segundos, mantém um largo sorriso.

Sou um dos sentidos de amor.


Notas Finais


Obrigada por lerem!
Com amor,
Jéss e Lali

► Playlist da Fanfic • https://www.youtube.com/watch?v=yKNxeF4KMsY&list=PLQ-MVX5tT4rnzig0i0zEog6RFlXKL0L-1&index=4
► Teaser da Fanfic • EM BREVE
► Amputado (escrita por Lali) • https://spiritfanfics.com/historia/amputado-7215366
► Disfarce Invisível (escrita por nós duas) • https://spiritfanfics.com/historia/disfarce-invisivel-9197476
▶ Hurdle (escrita por Jess) • https://spiritfanfics.com/historia/hurdle-8473781


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