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História Salve-me - Cartas à mesa, verdades expostas


Escrita por: Ixteeer

Notas do Autor


Boa noite! Aí vai o segundo capítulo _ enorme para a alegria da Otaka123♥ _ de "Salve-me". Escrevi com muito carinho, espero que apreciem.
Sem mais delongas, boa leitura! ❤
Obs: Obrigada pelo apoio. Tia ama vocês ♡♡♡

Capítulo 2 - Cartas à mesa, verdades expostas


Fanfic / Fanfiction Salve-me - Cartas à mesa, verdades expostas

 

_ CAPÍTULO DOIS _

Cartas à mesa, verdades expostas

•  25 de maio, 2016

 

Atrás de uma, das muitas, estantes abarrotadas de livros até o topo, sob a luz ofuscante do sol que inebriava lá fora e iluminava o cômodo através da janela aberta, Elaine ficava na ponta dos pés e puxava um livro muito acima de sua cabeça pela lombada.

A biblioteca de sua escola tornou-se sua segunda casa, onde ela passava todos os seus intervalos devorando livros e mais livros, vindo até mesmo algumas tardes com a desculpa de que teria de fazer um trabalho em grupo e que iriam se encontrar ali.

Papo furado. Elaine queria mesmo saber se Capitu traíra ou não o pobre Bentinho _ duvida essa que permanecera sem respostas mesmo depois da garota ter chegado a última página de Dom Casmurro, seu clássico favorito da literatura brasileira.

Deitada em sua cama com o livro de física aberto sobre o peito, Elaine acabou pensando em Ban. Pensou se ele estava bem, se estava comendo as três refeições básicas, se estava indo trabalhar no bar de Meliodas, se estava bebendo mais que o comum. Enfim, se de alguma forma Ban estava tentando superar a traição, ou se por ventura estaria inconsolável _ talvez deitado em seu sofá, rodeado de garrafas de vodca, olhando a tela de seu celular como se de repente o nome de Jericho fosse surgir e ele fosse lhe dizer, desesperadamente, que se equivocara em sua decisão precipitada.

_ Chega... _ Elaine murmurou, se sentando no colchão e repousando o livro em sua frente. _ Ban não vai voltar atrás, sem chances. _ ela retirou um lápis de dentro do estojo ao seu lado e encarou as letrinhas da questão 1, sem prestar realmente atenção no que elas diziam. _ E mesmo se voltar, não tenho nada a ver com isso. _ mas não adiantava muita coisa repetir para si mesma uma mentira. Por mais que você continue a repetindo, na esperança que de repente você comece a acreditar nela, é uma mentira. Não vai deixar de ser, por mais que sua crença seja grande.

Elaine não tinha exatamente ciúmes de Ban. Era preocupação. O imaginava nos braços daquela que lhe feriu sem sequer pestanejar, como um cachorrinho domesticado fingindo-se de morto. Fingindo que nada aconteceu, que Jericho não transou com outro e mentiu o tempo todo.

Não é da sua conta, ela murmurou entre os dentes, irritada consigo mesma.

Antes de dormir checava o celular, mas não havia nenhuma ligação ou mensagem de Ban. Só de sua mãe, lhe contando as maravilhas que estava vivendo com o amor de sua vida e que estava morrendo de saudades. Elaine suspirava e digitava um "Também sinto sua falta, mamãe. Estou cansada, amanhã tem prova de cálculo. Me deseje sorte". Mais mentiras para sua coleção de lorotas.

E assim, maio se foi.

*  *  *

Elaine dormia segurando seu caderno. Havia adormecido enquanto resolvia uma questão de química, exausta da aula de educação física que tivera mais cedo. Como acontecia sempre que pegava no sono, ela estava em meio a um pesadelo quando acordara de repente, encarando o breu com os olhos arregalados. Alguns segundos depois, percebeu algo vibrando em sua nuca e, rapidamente, arremessara seu travesseiro longe, apanhando o celular e olhando a tela acesa.

_ Ban? _ murmurou completamente rouca. Estava descabelada, os olhos semicerrados tentando ver algo na escuridão que estava seu quarto. 

_ Oi, garotinha... acho que te acordei, pelo seu tom de voz.

Elaine levantou-se da cama e caminhou a passos inseguros, tateando as paredes e finalmente achando o interruptor.

_ Você está bem? _ perguntou coçando um olho e fitando sua janela aberta. Já havia anoitecido e a brisa que invadiu o cômodo arrepiou os pelos de seus braços.

_ Sim. Mais que bem, na verdade. _ respondeu e em seguida riu baixo. Elaine engoliu em seco, já imaginando o motivo da animação. Ele voltou com ela e ligou para me contar. Talvez só queira alguém para dividir sua felicidade.

_ Huuum... _ murmurou caminhando até a janela e escorando os cotovelos no parapeito. _ E qual a razão?

_ Jericho me ligou. _ soltou de uma vez. _ Conversamos e decidimos voltar. Eu também não sou perfeito, sabe... todos merecemos uma segunda chance.

Elaine fechou os olhos e respirou lenta e profundamente. Uma nova brisa lhe acertou em cheio, movendo seus fios bagunçados, e ela fechou a janela rapidamente, apoiando o celular no ombro a fim de leva-lo para junto do ouvido e respondê-lo.

_ Que legal. Bom para você. _ por alguma razão desconhecida, até mesmo por ela, sua voz saiu amargurada e ressentida. Ela tossiu ao perceber isso e tratou de emendar algo _ Sabe como é, você que sabe. 

Um silencio se estendeu e Elaine começou a pensar nos possíveis motivos. Ban percebeu sua reação. Ban percebeu sua reação e está se perguntando o motivo dela. Ban percebeu sua reação, se perguntou o motivo dela e chegou a conclusões que Elaine não queria nem imaginar.

Uma gargalha irrompeu a ligação, fazendo a loira franzir as sobrancelhas e segurar o aparelho, liberando o ombro ossudo. 

_ Você acreditou? _ perguntou uivando de rir.

_ Não era para eu acreditar? _ balbuciou sem entender mais nada.

_ Como você é boba, garotinha! Feliz primeiro de abril! _ Elaine fechou os olhos lentamente, os lábios apertados em uma linha tensa.

_ Você é um imbecil. Você é O imbecil número 1, e ah, isso não é uma piada de primeiro de abril. _ e então encerrou a ligação sem despedidas prévias. Caminhou até seu banheiro, repousando o celular sobre a pia de mármore e se encarando em seu grande espelho. Estava com a pele grudenta de suor, o vestido azul úmido colado ao seu pequeno e magro corpo.

Enquanto se afundava na água morna, ria mesmo sem querer. Idiota... e eu mais ainda de ter acreditado tão fácil. Eu acreditei tão fácil... Ban não é o tipo de cara que dá segundas chances. Ban é o que enche a cara até não saber os motivos que o levaram para o bar, que corre quilômetros para estar exausto demais para pensar em algo além de sua cama. Que vai morrer sangrando, mas não voltara atrás de uma decisão que lhe machucou profundamente. Esse é o Ban, não um cachorrinho domesticado fingindo que não foi apunhalado pelas costas. 

Enquanto amarrava o laço que unia as laterais do busto de sua camisola branca, Elaine deu-se conta que, mesmo sem ter a mínima remota ideia, Ban interrompeu um pesadelo seu. Uma sensação de gratidão lhe acometeu, e, mesmo sentindo-se uma idiota, deitou-se na cama de peito para cima e começou a digitar uma mensagem. Desculpe... não gosto de brincadeiras idiotas, por fim enviou. A resposta veio rápida e fez Elaine deduzir que Ban já estava com o celular na mão, esperando por aquilo. Tudo bem, garotinha. Meliodas tá muito chato para eu fazer alguma piada com ele, por isso fiz com você, dizia a mensagem.

E assim, Elaine foi dormir 3h da madrugada, conversando sobre os livros que leu até aquele presente momento e ouvindo Ban contar sobre sua nova rotina _ que consistia em cem flexões ao acordar e mais cem antes de dormir. Ela também renomeou seu contato, preferindo "Imbecil número 1" ao "Conselheiro Amoroso ♥ ". Não tem sentido mesmo, pensou enquanto renomeava, não estou procurando amor para precisar de conselhos nesse quesito.

*  *  * 

_ Cacilda, eu corri tanto que nem sinto minhas pernas! _ King comentou ao sentar na cadeira do refeitório. Estava suado, com a regata da educação física colada ao peito magro. Ele estendeu a mão e apanhou a garrafinha de suco de uva sobre a mesa, bebendo o líquido em grandes goladas ruidosas.

Meliodas o fitava na cadeira ao lado com o semblante fechado, também com uma regata usada nas aulas de educação física. O tecido igualmente grudado em sua pele úmida, deixando visível os músculos sutis que o rapaz ostentava.

_ Para de drama. _ murmurou agarrando sua garrafinha de suco de morango a fim de dar uma golada. _ O professor nem pegou pesado hoje.

_ Tem borracha nesse seu estojo? _ Elaine perguntou de repente. Elizabeth permaneceu em silencio, distraída observando o peitoral suado de Meliodas. _ Elizabeth! Pare de comer seu namorado com os olhos e me responde...

Meliodas ria presunçoso enquanto a garota corava violentamente e abria seu estojo o mais depressa possível, entregando o que a outra pediu. A verdade é que Elaine ainda estava um pouco irritada com o episódio constrangedor em que ficou sentada no sofá a ouvindo gemer no primeiro andar. Se fechasse os olhos e forçasse um pouco, ela ainda lembrava até o ritmo que a cama batia na parede.

Diane surgiu andando a passos saltitantes, fazendo alguns garotos virarem o pescoço para vê-la passar.

_ Bom dia! _ disse ao largar-se ao lado de King, para em seguida o puxar pela roupa e o beijar. Os garotos que antes davam olhadelas furtivas desviaram o olhar, desanimados. Meliodas ficou encarando as bocas se moverem juntas como alguém olharia para o cocô que sem querer pisou com seu sapato novo.

_ Vem, Elizabeth. _ ele levantou da cadeira puxando a garota pela mão. _ Vamos para algum canto que não tenha ninguém. _ ela assentiu, ajeitado a franja sobre um dos olhos. Então Meliodas continuou mais baixo, sorrindo sem mostrar os dentes enquanto passava um braço em sua cintura _ Espero que não se importe em ficar um pouco suada.

Elaine rabiscava as respostas das questões de química fervorosamente, mas os ruídos dos beijos trocados por King e Diane já a tiravam do sério. Ela já estava ali, em uma mesa do refeitório, porque ir para a biblioteca teria o efeito de um alcoólatra que busca parar de beber num bar. Mas, mesmo tendo consciência disso, Elaine resolveu que iria arriscar, bufando em seguida ao dar-se conta que Meliodas e Elizabeth provavelmente estariam por lá, onde apenas ela costumava ir aos intervalos.

_ Deem um tempo _ pediu ao virar a página do caderno com violência. _ Tem alguém tentando identificar a nomenclatura de uma cadeia ramificada.

Diane deixou os lábios de King e fez bico.

_ Você é uma criança malcriada, Elaine. Devia arrumar um namoradinho para saber como é legal beijar.

_ Não, obrigada. _ respondeu depois de fingir pensar com uma mão no queixo, voltando a rabiscar a folha do caderno. _ Beijar deve ser legal, mas os livros que ocupam as estantes da biblioteca não são devorados sozinhos.

_ Vai para lá, então _ King sugeriu, rindo. Ele tinha certeza que aquilo ia acontecer _ sua irmã sempre foi uma leitora alva. Ainda recordava-se de vê-la metida em uma barraca feita com lençóis e pregadores, lendo com os olhos grandes e curiosos "O pequeno príncipe".

_ Boa ideia. _ respondeu o olhando, e, em seguida, bateu na própria cabeça com o lápis. _ Ah, é mesmo! Deve ter algum anão transando atrás de uma das estantes. 

King riu do que ela falou. Ali estava sua irmã: O sarcasmo em pessoa. Finalmente agindo normalmente, pensou.

_ Eu espero que eles tenham camisinha. Imagina que cool deve ser responder para os netinhos que os pais deles foram feitos na biblioteca da escola. _ ela disse, e então percebeu um garoto que a encarava fixamente por cima do ombro de King. O olhos em um tom alaranjado, os fios verdes, aquele sorriso quase imperceptível nos lábios finos. Muito familiar.

King olhou para trás ao notar o olhar da irmã e virou-se novamente, se ajeitando no assento. Elaine o encarou com as sobrancelhas arqueadas.

_ Quem é?

_ Não lembra dele?

_ Não, mas acho que já o vi antes...

_ Ele era um amigo meu. _ King assoou o nariz e batucou a mesa com os dedos. O assunto o deixava visivelmente inquieto. _ Melhor amigo. Mas nos afastamos quando entramos no ensino médio.

Diane o observava falar, enrolando a ponta de um dos lados da Maria Chiquinha.

_ Ah, é mesmo! _ Elaine exclamou, finalmente recordando do garoto brincando no quintal de sua casa. Já fazia muito tempo desde aquela lembrança, seu pai nem bebia tanto naquela época.

_ O que deu? _ Diane perguntou-o.

_ A gente tipo se apaixonou pela mesma garota... _Diane olhou em volta, como se esperasse que a tal dita cuja estivesse em uma das mesas. _ Não, ela não estuda aqui. A família era Britânica. Ela só passou as férias de verão na casa vizinha a minha.

_ E aí? _ Insistiu, querendo saber a história toda.

_ Eu me apaixonei por ela. Helbram também. Helbram teve coragem de falar primeiro, mas ela me preferia. Ele ficou irritado comigo e se afastou. No ano novo, ela voltou para a Britânia e eu nunca mais a vi. Satisfeita? 

_ Não fica irritadinho comigo não, hein! _ Diane bufou, cruzando os braços sob os seios. _ Você ainda gosta dessa fulaninha aí?

_ Claro que não! _ King respondeu na defensiva. _ Eu nem lembro do nome dela direito... era algo com "M". Maria, Marina, sei lá.

Elaine olhou de um a outro, dando-se conta de que aquela era a primeira briga dos dois.

_ Huuum... _ murmurou voltando a enrolar a ponta do cabelo.

_ Qual é! Eu não gosto de outra garota além de você!

_ Mesmo eu sendo mais alta que mais da metade dos garotos da escola?

King riu, malicioso.

_ Isso não é problema, é vantagem para você eu não precisar ajoelhar.

Elaine desviou o olhar para o seu caderno, voltando para as questões de química. Não queria entender o que aquilo significava, nem muito menos o motivo por trás daquele sorrisinho traquina que a garota deu como reposta. Não queria saber mais nada além dos nomes das nomenclaturas das cadeias ramificadas.

 

[...]

 

_ Parabéns, Elaine! _ Elizabeth disse sorrindo enquanto caminhavam em direção ao jipe preto. A garota se referia ao comentário que o professor de história fizera na última aula.

Elaine ainda estava corada, desacostumada com tanta atenção sobre si.

_ Não faço nada além do meu dever, afinal das contas... _ respondeu apertando a alça da bolsa.

Antes de entrar pela porta traseira do jipe, ela olhou para trás e percebeu o garoto a encarando. Aquele olhar fixo de mais cedo, que não deixava duvidas de que era para ela que Helbram olhava. Não era para alguém atrás dela, ou para o carro ou ainda para o casal beijando-se no banco traseiro.

Era para Elaine.

Ela se enfiou depressa no automóvel e bateu a porta com força, encarando os dois ao lado como um leão prestes a rugir.

_ Parem! Que saco...

King se assustou com o tom de voz da irmã e a olhou, assombrado.

_ Que foi, anjo? Tá com dor de barriga? _ Diane indagou-a com sua voz afetada.

_ Não, mas é possível eu ficar enjoada se continuarem nesse ritmo. _ ela desviou o olhar e viu Meliodas puxar a marcha, repousando a mão sobre a coxa de Elizabeth logo em seguida, a deslizando para a parte interna delas. _ Cristo... acho que vou na mala.

Todos riram e Diane abraçou seus ombros miúdos, a chacoalhando como faria a alguém que recebeu um noticia terrivelmente triste.

_ Acalme-se, santa portadora da pureza mundial. _ ela disse dramaticamente, fazendo os outros rirem ainda mais, e Elaine virou o resto para a janela, corada até os ombros.

_ Vão à merda.

 

 

 

Deitada respondendo uma tarefa de inglês, Elaine atendeu o celular na primeira vez que ele vibrou, o levou para junto do ouvido apoiando o aparelho no ombro, e continuou  respondendo as questões enquanto falava.

_ O que quer, imbecil número 1?

O riso ao fundo a fez rir também.

_ Oi, garotinha. Nada, só estou entediado mesmo.

Elaine revirou os olhos e bufou.

_ E aí me liga para eu tirar o seu tédio? 

Ban riu mais uma vez, mas de forma diferente. Saiu como uma risada nervosa que você daria se seus pais lhe questionassem o porquê da nota vermelha em seu boletim.

_ Na verdade, eu não estou muito bem. 

Elaine fechou o caderno e sentou-se no colchão, segurando o aparelho entre os dedos tensos.

_ O que houve?

Ban suspirou pesadamente.

_ É a Jericho, sinto falta dela... nem fodendo que lhe dou uma segunda chance, mas ainda doí, sabe... doí muito.

Elaine entendeu, embora nunca tenha sequer tido um namorado. Não importava se já fazia praticamente três meses, ainda doía. Doía muito. 

_ Topa me encontrar no café Gowther? _ perguntou enrolando o dedo em um fiapo do jeans.

_ Pode ser, pode ser. _ respondeu ligeiro, parecendo muito animado com a possibilidade.

_ Ótimo. Esteja lá às... _ ela verificou rapidamente a hora no celular e o pôs de volta rente ao ouvido _  Às 2h.

_ Às 2h tá ótimo.

Elaine sentiu-se estranha. Não estranha como quando sua mãe lhe enfiou em um vestido rosa de babados e lhe apresentou para todas as suas amigas em um salão de beleza. Estranha por agir como uma garota antes de um encontro.

Isso não era um encontro, era? Ela apenas iria em um café, servir-se de psicóloga para um amigo, apenas isso

E então mais uma peça era jogada sobre a cama, recusada na prova de roupas.

Já era uma e meia da tarde quando Elaine vestiu o suéter rosa bebê, a jardineira jeans e enfiou algumas moedas no bolso. Calçou o par de sapatilhas brancas _ que achou ao erguer o cobertor da vovó e dar uma olhada debaixo da cama _ e enfiou o celular no outro bolso, amarrando o cabelo em um rabo de cavalo baixo e discreto.

No banheiro, deu uma rápida escovada nos dentes e borrifou seu perfume doce sobre as roupas, repetindo para si mesma que era para caso suar demais, e não para chamar atenção de Ban.

_ Onde está indo? _ King perguntou sem desviar os olhos da tevê. Ele e Meliodas jogavam Street Fighter sentados no sofá, os dedos apertando os controles tão fortemente que não seria surpresa um tendão rompido a qualquer momento.

_ Indo ver o Ban. _ Elaine respondeu já passando pela porta de casa. Ela ouviu um grande e sonoro "Como é?!" e em seguida correu até a esquina, voltando a andar normalmente a partir desse ponto.

Ao passar pela porta do café, o sininho tocou chamando a atenção do homem sentando na ultima mesa. Ele observou Elaine se aproximar com as mãos nos bolsos e sorriu torto quando ela sentou a sua frente.

_ Está atrasada, garotinha. 

Elaine praticamente esfregou o celular na cara de Ban.

_ Duas em ponto. Garotão.

Ela o encarou enquanto guardava o aparelho outra vez, e Ban abriu o cardápio sem tirar aquele sorriso torto dos lábios em nenhum momento. Um sorriso desafiador, intimidante.

_ Biscoito de canela está bom? _ indagou sem desviar os olhos.

_ Biscoito de canela está ótimo.

_ Gowther. _ Ban murmurou, encarando o rapaz que o tempo todo esteve sentado no banco em frente o balcão.

 _ Hum? _ ele respondeu-lhe ao virar-se para o fitar.

_ Não é "Hum", é "O que você deseja, querido cliente?"

Gowther desviou os olhos de Ban e abaixou os óculos para mirar Elaine.

_ Quem é essa doce senhorita sentada na mesa de meu estabelecimento?

_ É uma cliente. Trás uma porção grande de biscoito de canela. _ Ban respondeu com voz autoritária.

_ Tenho a estranha sensação de que já lhe vi, doce senhorita. Mas onde... 

_ Gowther. Biscoito de canela. Agora.

_ Ah, deve ter vindo outro dia. Desculpe nunca ter lhe notado, é um prazer tê-la aqui. Minhas garçonetes estão de folga, espero que elas tenham lhe tratado bem.

_ Vai buscar essa merda antes que eu vá e enfie onde doí.

Elaine olhava de um a outro como alguém observando uma peteca ir e vir. Ela esticou o pescoço quando o rapaz sumiu na cozinha, e ao se endireitar no banco e fitar Ban, percebeu que ele lhe encarava.

_ Ele é gay _ avisou.

_ Ah, até estava cogitando tentar algo. _ mentiu com sarcasmo. _ Por favor, Ban. Olhe bem para a minha cara e veja se pareço uma mulher desesperada por um homem.

_ Não, até porque você não é uma mulher. É uma garotinha. _ respondeu pincelando o nariz arrebitado de Elaine e recebendo um tapa na mão como resposta. _  E Gowther não é um homem. Sequer é um ser humano. Há um animal preso naquele corpo medonhamente afeminado: Uma cabrita saltitante que almeja saber até o porquê da bosta ser marrom.

Elaine riu e cruzou as pernas.

_ Engraçadinho. Muito engraçadinho. Sabe o que você é, garotão?

Ban deu seu sorriso predatório e esperou que ela continuasse.

_ É o tipo de pessoa que quer algo, mas espera que os outros o consiga para você. Olha tudo com ar superior e sempre de cima, mesmo se estiver por baixo. Você é a raposa que deseja as uvas, e quando não as consegue, as deprecia para diminuir o peso de seu fracasso.

O sorriso de Ban se desfez um pouco, como uma flor murchando. Ele desviou o olhar para a mesa e batucou os dedos em silencio.

_ Sabe? Você tem razão, garotinha. Sou exatamente assim. Veja, pus todas as minhas expectativas em Jericho. Eu realmente achei que iria casar com ela. Mas quando meu relacionamento não deu certo, eu pensei em coisas como "Ela nem era tão bonita assim mesmo" ou "Foi melhor assim, aquela mania de mascar chiclete é irritante". Mas bem, eu sinto tanta falta dela... 

Elaine engoliu em seco e, sem pensar, tomou a mão que estava sobre a mesa.

_ Não se martirize assim! Ela escolheu isso, o fim do relacionamento de vocês veio como consequência da escolha dela...

Ban encarou a mão com unhas pintadas de azul que apertava a sua própria. Elaine percebeu o olhar e, lentamente, fez menção de puxar sua mão de volta, mas Ban a segurou com sua mão livre, como se por reflexo. A garota arfou com o toque, sentindo como a palma de Ban era quente. Não quente a ponto de ser incomodo, mas quente como um agasalho no frio. Quente de forma aconchegante, convidativa.

_ Aqui está. _ Gowther anunciou ao pôr os pedidos sobre a mesa. Ele desceu o olhar para as mãos e tombou a cabeça para o lado, franzindo as sobrancelhas. _ Fico me perguntando... o que estão fazendo?

Elaine puxou sua mão sutilmente, evitando os olhos de Ban.

_ Obrigada pelos bolinhos. _ agradeceu sorrindo de forma doce. Gowther inclinou o corpo em sua direção, a fazendo acreditar, por um segundo aterrorizante, que iria lhe beijar. Mas ele apenas farejou o ar e se afastou sorrindo.

_ Que perfume adorável a senhorita tem. Se eu escolhesse as mulheres por quem me atraio, tenha certeza que a optaria.

_ É. Mas como todos sabem, você nasceu de cesariana para passar bem longe. 

Elaine observou Gowther voltar para o seu canto e abrir novamente o livro que lia. Ban se esgueirou sobre a mesa, fazendo ela sobressaltar-se ao virar a face e se deparar com a sua própria a poucos centímetros da do homem.

Ele puxou o ar profundamente e então voltou para o seu lugar, com seu sorriso torto rotineiro.

_ Frutas vermelhas. _ disse convicto de sua suposição, e em seguida levou um bolinho a boca.

_ Não viemos aqui para falar da sexualidade do Gowther ou do meu perfume. Continue contando o que sente. _ pediu e mordisca a massa macia.

_ Bem... é como eu disse. Sinto falta dela, mesmo depois de tudo aquilo. Eu passei três anos da minha vida com aquela mulher, é muito tempo... sabe o que é pior nisso tudo?

Elaine murmurou sem parar de mastigar a comida, o incentivando a continuar.

_ Não sei se a amo ou se só estou acostumado com ela... porra, isso dói. Há menos de um mês atrás eu estava cheio de planos... agora não tenho nada além de um punhado de lembranças e incertezas. Eu não sei nem mais onde vou pôr meus pés no passo seguinte, todo o meu futuro eu planejei com ela e agora tenho que tomar um novo rumo, um novo futuro.

Elaine entendeu mais do que gostaria. Ela sentia-se exatamente assim. Desorientada, vendo-se forçada a planejar as coisas às pressas, tentando nadar contra a corrente antes que fique exausta demais e afunde.

_ Sei que parece um conselho idiota e clichê _ disse desviando o olhar para a vitrine e observando a rua praticamente deserta. _ Mas nesse caso, acho que tem que apenas deixar a vida levar. A vida se encarrega disso, às vezes precisamos apenas nos recolher e esperar o temporal passar.

Ban já devorava quase metade dos bolinhos de canela quando veio responder, de boca cheia.

_ Acho que tem razão, garotinha. _ ele engoliu a comida e limpou a boca com um guardanapo posto ao lado do prato. _ Não vou fazer nada com relação a isso, apenas vou continuar vivendo.

_ Um passo de cada vez _ instruiu ainda olhando a rua.

O homem a observou em silencio.

O nariz pequeno e arrebitado, o contorno dos lábios cheios e rosados, os cílios longos e loiros que emolduravam os olhos cor de mel. A pele branca e de aspecto macio, coberta demais com os suéteres que Elaine aparentava gostar. Em um ultimo momento de analise, Ban observou o busto da garota e constatou que, se usasse alguma blusa de tecido fino, seus seios surgiriam, mesmo que sutis.

O suéter rosa bebê lhe deixava ainda mais miúda e escondiam as possíveis curvas delicadas de Elaine.

_ Não sente calor? _ perguntou de repente. Elaine o fitou confusa e ele continuou, vendo-a mudar imediatamente. _ Está sempre usando suéter. Não é incômodo? 

Antes pensativa e distante, agora inquieta e nervosa. Ban arqueou uma sobrancelhas ao ver aquilo.

_ Não mesmo... não gosto de mostrar muito meu corpo. _ respondeu fechando as mãos e sentindo suas unhas afundarem em sua palma.

_ E por que não?

_ Bem, meio que não tem lá muita coisa para mostrar. _ respondeu rápido, visivelmente desconcertada. _ Sinto-me melhor assim. As garotas costumavam pegar no meu pé, principalmente nas aulas de educação física.

_ Elas te xingavam?

_ É... _ Elaine voltou a olhar a rua e suspirou pesadamente _ Porque sempre fui magra demais e fui a única que não mudei. Todas as garotas cresceram, ou ficaram até baixas, mas mudaram em algo. Tipo, algumas ficaram com os seios fartos, ou ganhou bunda, ou apenas engrossou as pernas... mas eu? Eu permaneci da mesma forma. Eu não mudei nadinha, nadinha mesmo. Isso foi muito constrangedor... e sempre que algum professor me elogiava, elas diziam que era sorte eu ser inteligente. Porque burra e sem graça já seria um carma que eu teria que pagar nessa vida.

_ Foi por isso que saiu da Austrália? 

Elaine mordeu o lábio inferior e encarou Ban. Seus olhos ficam úmidos de repente, como se ela fosse chorar a qualquer momento. Mas as lágrimas nunca vieram.

  A loirinha desviou o olhar para os farelos no prato de porcelana e forçou um sorriso fraco, até um pouco trêmulo.

_ É, foi por isso mesmo. _ confirmou com o máximo de convicção que conseguiu reunir.

_ Sinto muito, garotinha. Pegavam no meu pé também, sabia?

Elaine o fitou surpresa. Ban não parecia alguém que sofreu humilhação no ensino médio. Era mais fácil de acreditar que era ele que humilhava os outros.

_ É, eu sei que não parece. _ ele riu. _ Mas eu nem sempre fui forte e intimidante. Também já fui um pivete magricela e inseguro, o que fazia alguns caras mergulharem minha cara na privada psra tirar o tédio. Porém, um belo dia, um anão do sexto ano me disse para fazer algo. Então eu lhe respondi: "O que diabos vou fazer? Já pedi para pararem, sou fraco demais para obriga-los a me obedecer". E aí ele disse: "Então pare de reclamar. Ou faça algo ou se conforme. Reclamar e pedir para que parem não resolverá seu problema. Ficar forte e quebrar a cara deles, sim".

_ Meliodas? _ Elaine supôs, completamente centrada na história.

_ É. Foi com esse conselho de Meliodas que comecei a dar duro e me tornei esse amontoado de músculos. Na festa de confraternização, eu bati em todos eles e depois os mergulhei no mictório. _ Ele riu com os olhos distantes, recordando do momento em que fizera os covardes provarem do próprio veneno _ Devem lembrar do cheiro de mijo até hoje.

Elaine pensou um pouco sobre aquilo. O que ela poderia fazer com aquelas garotas? Malhar como uma maluca e depois bater em todas aquelas garotas quando estivesse forte o suficiente? Não. Elaine nunca gostou de brigas e não começaria a gostar por causa de meia dúzia de meninas com falta do que fazer.

Também pensou sobre seu padrasto e nas coisas que ocorriam quando sua mãe estava fora de cena. O que ela podia fazer com aquilo? Meliodas tinha razão, afinal. Se você tem um problema, ou você faz algo para resolve-lo ou você se conforma e para de reclamar. E foi o que Elaine fez.

Sair da Austrália foi o que a loira julgou ser a solução. Se exercitar e se vingar foi a opção que Ban optou. Ambos estavam corretos em suas escolhas distintas.

_ Meliodas tem ótimos conselhos. _ ela comentou depois de longos minutos de silêncio.

_ É. Para os outros. Quando o assunto é ele, Meliodas sabe nem para onde vai.

Elaine riu.

_ Deve ser tipo não saber cortar o próprio cabelo...

_ Na mosca, garotinha.

Os dois se encararam por alguns segundos, tempo suficiente para o clima mudar. De repente o sorriso de ambos se desfaziram, de repente ficou abafado demais _ como se tivessem ligado um secador. Elaine engoliu seco. Ban assobiou baixo, também sentindo as mesmas coisas, porém disfarçando melhor.

Gowther observava os dois por cima dos óculos, completamente confuso sobre o que estava acontecendo.

_ O que significa essa troca de olhares? _ se perguntou. _ Estão tentando se comunicar secretamente? Isso é o que o que dizem ser o amor? Uma comunicação silenciosa e que apenas duas almas perdidamente apaixonadas podem decodifica-las? _ o rapaz fechou as hastes do óculos e apoiou o queixo na palma da mão, tombando a cabeça para o lado enquanto continuava a observar, borbulhando de perguntas sem respostas.

*  *  *

Os pequenos flocos começaram a cair suavemente naquela manhã silenciosa. Quando Elaine acordou, abriu a janela de seu quarto e sorriu como uma criança que ganhou o que queria no natal. Mas não era natal, era Junho. O inverno dava seus primeiros sinais de vida.

_ Bom dia, dorminhoco! _ Elaine disse ao pular na cama do irmão.

_ Me deixa dormir! _ King reclamou, cobrindo a cabeça com o travesseiro. Elaine bufou e bateu na nádega do garoto. _ Mas que diabos! _ resmungou rolando e caindo no piso, levantando-se em seguida e encarando a irmã _ O que você tem?

_ Tudo! _ respondeu ficando de pé sobre o colchão e começando a pular diante dos olhos semicerrados de King.

_ Isso por acaso tem haver com Ban está vindo para cá de novo? 

Antes que Elaine lhe respondesse, antes mesmo que ela sequer abrisse a boca, a porta fora aberta e sua pergunta, respondida.

_ O que ele tá fazendo aqui? _ sibilou.

_ Vamos fazer bonecos de neve e guerra gelada. _ ela respondeu energicamente, e em seguida se jogou para cima de Ban quando ele chegou perto o suficiente. Ele lhe pegou sem dificuldades, apoiando-a em um braço enquanto que com a mão do braço livre subiu a alça de sua camisola.

_ Que animação, garotinha. Parece que nunca viu neve.

_ E eu nunca vi _ contou fazendo bico. _ Só pela tevê.

King observava a aproximação dos dois com os olhos estreitos, fixos naquela mão tão perto das nádegas de Elaine.

_ Então faremos o maior boneco de neve da história. _ e saíram daquela mesma forma. Elaine apoiada em um braço do homem, como se fosse uma bonequinha de pano, enquanto o próprio continuava a conversa sobre bonecos de neve e instruía a garota a se agasalhar adequadamente para a brincadeira.

King bufou e chutou o travesseiro que caíra no chão, batendo a canela na madeira dura da cama e uivando de dor enquanto pulava numa perna só.

 

 

_ Acho que seu irmão ficou um pouco chateado _ Ban comentou, passando os braços atrás da cabeça ao deitar na cama tão bem arrumada. Tudo era tão bem organizado que Ban sentiu-se um porco por sequer dobrar as roupas antes de as pôr no armário.

_ Ele sempre fica quando você vem aqui! _ Elaine respondeu de dentro do banheiro. _ É normal, ele é ciumento. 

A menina andou de um lado a outro dentro do cômodo, procurando seu suéter amarelo. Estava quase pronta _ com sua legue preta, botas marrom sem salto de cano baixo, os cabelos soltos e partidos ao meio e seu sutiã rendando cobrindo os pequenos seios.

Ela bufou, finalmente lembrando que o havia esquecido no quarto, preso no cabide pregado à porta do cômodo.

_ Ban? _ o homem ouviu a garota lhe chamar. 

_ Que foi?

_ Esqueci meu suéter aí. Pode pegar pra mim?

Ban permaneceu fitando o teto branco até sentar-se e saltar da cama.

_ É esse amarelo? _ perguntou puxando o cabide e soltando-o da roupa.

_ É sim.

Ban caminhou até o banheiro e parou na soleira com o olhar baixo. Elaine viu sua sombra por baixo da porta e a abriu lentamente, pondo apenas seu braço para fora para que ele lhe entregasse o suéter. Mas Ban não lhe entregou seu suéter amarelo, ele fez algo que nunca havia feito com Elaine. Algo que nas últimas semanas tinha ocupado sua cabeça de tal forma que ele andava malhando cada vez mais para ocupar sua mente fértil.

 Começou devagar e sorrateiro, como um predador mirando sua pobre presa. O homem sequer notou aquele sentimento até que ele ficara quase palpável. De repente Elaine não era mais a irmãzinha que ele sempre quis ter. De repente ele não queria ser mais seu conselheiro amoroso, embora em nenhum momento a garota tivesse demonstrado interesse por alguém. De repente ele ficara curioso, querendo descobrir o que Elaine guardava com tanto zelo sob a camada grossa de seus suéteres.

_ Q-que merda tá fazendo?! _ ela gaguejou dando passos para trás e tropeçando no vaso sanitário. _ Não! Não se aproxime! 

Mas Ban não lhe deu ouvidos e tentou lhe erguer do piso, notando algo muito errado. A forma que Elaine tentava se cobrir... era mais que timidez. Era medo, ela tinha medo de que Ban visse demais.

_ Ei! Sou eu, sou o seu Ban, garotinha. Não precisa temer _ disse ao abriga-la em seu peito, e ao passar as mãos pelas costas da garota, sentiu algo sutil. Listras finas e desregulares sobre a pele macia de suas costelas.

_ Não! Ban, por favor...

_ Eu não vou te repreender se tiver alguma coisa estranha em você. _ Ban prometeu, achando ser alguma marca deixada por suas agressoras. 

Elaine virou de costas, totalmente encolhida e trêmula. Ao sentir os dedos do homem tocar sua pele, sentiu uma corrente elétrica lhe percorrer. Mas não era algo incômodo, ela chegou a desejar que ele não se afastasse. No entanto, ela continuou quieta, esperado o veredito.

_ Foram elas que fizeram isso? _ indagou com a voz neutra, deixando difícil para Elaine saber o que ele sentia no momento. Mas ela foi incapaz de responde-lo. Não queria mentir, estava cansada de mentir o tempo todo sobre aquilo. "Estou bem, só estou cansada da educação física."  "Não gosto de mostrar meu corpo porque não o acho atraente". "Sair da Austrália porque sofria bullying". Tantas mentiras para encobrir aquela única verdade que ela simplesmente chegou ao seu limite, desejando berrar o que tanto escondia. _ Elaine, foram elas? Foram elas, não foi? Te cortaram com algum estilete?

Nada. A garota permaneceu de costas para Ban, abraçando os joelhos.

_ Quem fez isso com você? _ dessa vez sua emoção foi nítida. Ban estava contendo uma raiva que só crescia com aquele silencio. _ Elaine! Quem fez isso com você?! _ insistiu a virando para encara-la, fitando os olhos marejados, incapazes de lhe encarar fundo. _ Não foram elas, não é? _ continuou, diminuindo o tom.

Elaine negou com a cabeça e Ban a soltou, sentindo-se uma chaleira a ponto de apitar.

_ Me desculpa... me desculpa, eu menti o tempo o todo! _ disse atropelando as palavras. _ Eu não vim para cá por causa das garotas... 

_ Quem te maltratava, Elaine? _ Ban questionou-a, seu coração batendo dolorosamente rápido. 

_ O meu padrasto.

Foi como aterrissar do jeito errado. Como acordar de um sonho inquieto _ que no momento que você irá se esborrachar no chão, você acorda com o coração ameaçando saltar pela boca. Ban sentiu-se assim. Era tão óbvio, era tão fácil de desvendar, mas ele sequer cogitou aquela hipótese. 

Não era estranho Elaine vir para o Japão fazendo nem bem um mês que sua mãe havia casado? Que tivesse um comportamento esquisito, como uma criança que tem as mãos atrás de si, escondendo algo veementemente? Sem mencionar os pesadelos que King às vezes comentava...

_ Com o quê ele fez isso?

_ Com o canivete que sempre está em seu bolso.

_ Por quê?

Elaine se encolheu, sendo puxada instantaneamente para entre as pernas de Ban e envolvida por seus braços. Ela virou-se, recostando as costas no corpo quase três vezes mais largo que o seu.

_ Porque eu não cedia. 

Ele piscou, pensando no que seria não ceder. Não queria pensar no pior, mesmo sendo óbvio que o pior havia acontecido.

_ Não cedia? Com o que você não cooperava?

Elaine mordeu o lábio inferior, não querendo pronunciar aquilo. Doía como se tivesse ocorrido à 5 minutos atrás.

_ Aquilo... entende?

Os braços fortes se fecharam ao redor da garota, abraçando-a forte.

_ Ele conseguiu?

_ Não. _ ela lhe ouviu soltar um suspiro involuntário e encarou seu pequeno tapete em frente o boxe. _ Se tivesse acontecido... seus braços continuariam ao meu redor?

Ban roçou seu nariz no pescoço desnudo _ que exalava aquele perfume doce que secretamente desejava sentir em suas roupas _ , fazendo-a arfar baixinho.

_ Sempre. Meus braços sempre estarão ao seu redor, até dizer que não os quer mais por perto.

_ Eu quero _ falou rapidamente, o apertando como se de repente ele fosse sumir. _ Ban? Você não sente mais nada pela Jericho, não é? Não sente mais falta dela, nem um pouco?

_ Por que esse assunto agora?

_ Eu só tenho medo. Se ainda gosta dela, não me faça promessas que não será capaz de cumprir...

_ Escute, Elaine. _ ele chamou sua atenção, aproximando os lábios da orelha coberta pelas mechas loiras e sentindo-a arrepiar-se _ Você é minha única mulher, entendeu? A única que penso quando vejo comerciais piegas e casais se beijando.

Ela corou até os ombros. Era a primeira vez que Ban se referia ela como uma mulher.

_ Pensei que eu fosse uma garotinha _ murmurou tentando disfarçar o constrangimento.

_ Você é a minha garotinha também. Você se tornou tudo, Elaine. Eu nem mesmo posso dormir sem que você invada meus sonhos.

Ela riu, virando-se para abraça-lo. Sentia-se mais leve, finalmente respirava e seu coração não doía _ pesado com tantas mentiras guardadas às sete chaves.

_ Obrigada... _ murmurou em seu peito.

Ban foi tomado por um forte desejo de erguer a face miúda da garota e provar aqueles lábios que há muito admirava em silêncio. E ele já havia baixado a cabeça, roçado o nariz na bochecha corada e quente de Elaine, mas batidas na porta o impediu de consumar o ato.

_ Que merda tá fazendo aí?! Responde, eu sei que está aí, Ban! _ King o acusou, quase socando a porta do banheiro. _ Elaine, não se preocupe, eu irei lhe salvar!

Eles riram baixo, os hálitos se misturando. Elaine ajoelhou-se e segurou o rosto de Ban com as duas mãos. Ele a observou se aproximar, suspirando ao sentir os lábios cheios cobrirem os seus, segurando sua cintura fina com ambas as mãos e apertando-a veementemente, a trazendo para perto com gemidos abafados por sua boca.

_ Ban! O que está fazendo com minha irmã? Ela está chorando? Que som é esse?!

Elaine se afastou delicadamente, envolvendo o pescoço do homem com seus braços finos e repousando sua cabeça no ombro largo.

_ Vamos sair antes que ele descubra que a porta tá aberta _ ela sussurrou.

_ Sim. E resolvermos seus problemas.

Ela estagnou com os olhos arregalados, parando de respirar por alguns segundos.

_ Ban...

_ Não. Ele não pode fazer uma coisa dessas com você e ficar impune, garotinha. Vamos resolver isso.

Elaine queria dizer para ele esquecer aquilo, queria dizer que isso vai destruir a felicidade ingênua de sua mãe. Queria berrar que a culpa foi dela também, que deveria ser mais precavida, que deveria trancar a porta do banheiro antes de ir tomar banho, que não deveria acordar na calada noite para fazer um chá. Mas ela estava farta de se culpar por algo que, no fundo, ela sabia que nada teve culpa.

Elaine se deixou ser embalada pela primeira vez, permitindo-se ser acarinhada e consolada. Sentiu-se bem, de uma forma que já não sentia-se há muito tempo. Ela sequer lembrava a última vez que sentiu-se tão leve, tão limpa. 

A menina finalmente parou de nadar contra a corrente e agarrou o bote salva-vidas que Ban estendia para ela, seguindo o conselho de Meliodas. Ou eu faço algo sobre isso ou me conformo. Fugir não vai diminuir minha dor. Sentar com meu pai e meu irmão, e contar tudo, provavelmente.

Estava decidido. As cartas seriam postas à mesa.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Notas Finais


O que acharam? Por qual razão Helbram observa Elaine? Quem será a ex-crush do King? Tá, essa última tá bem fácil kkkkkkkkkkkkkkkkk :P Espero que tenham gostado e até o próximo! ❤


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