Amélia Lewis/Wendy – Point Of View
Amor nunca fora o meu forte.
Lembro-me que, aos meus dezesseis anos, eu via todos ao meu redor achando que o amor era tudo em suas vidas, se não o sentissem, então mentiam senti-lo, temendo ser diferente dos outros, como se ser diferente fosse abominável, consequentemente, achavam-me abominável – assim me parecia constantemente –, afinal, eu nunca possuí o amor e nem menti possuí-lo, o que me diferenciava deles, de uma forma ruim, é claro.
Para ser honesta, eu sempre me senti diferente, não mais bonita, não mais divertida ou inteligente, e sim porque acredito que todos nós temos asas, mas todos, exceto eu, queriam permanecer com os pés no chão, firmes e fortes, enquanto eu queria voar o mais alto possível, fechar os olhos e sentir o vento bater em meu rosto, o que sempre fora errado para eles, entretanto, o que é errado para eles é o certo para mim.
Eu sou um caso perdido, penso, segurando a porta para que ele saía e eu possa fechá-la, mas ele tenta tocar o meu rosto e eu me afasto, fazendo-o bufar. –– Eu deveria saber, mas é que... –– Ele hesita antes de dizer: –– Eu gosto tanto de você!
Sorri em deboche. –– Ótimo, gostar não é amar.
–– Mas eu posso amar. –– Deu um passo em minha direção, fazendo-me balançar minha cabeça de um lado para o outro, negando tal aproximação. –– Amélia, por favor, me deixe amá-la.
Maldito dia em que disse o meu nome, penso, enquanto passo as mãos em meus cabelos, puxando-os, em uma tentativa falha de permanecer calma diante do homem em minha frente que, se ficasse de boca fechada, seria perfeito, mas é claro que ele não ficaria de boca fechada, então uma fita adesiva resolveria o problema.
–– Não me ame, nunca.
Ele suspira fundo. –– Amélia.
–– Me chame de Wendy.
–– Por quê? – Bufa. –– Wendy não é seu nome de verdade.
–– O que você sabe sobre mim? –– Ri de escárnio. –– Você não sabe nada, meu bem!
–– Você tem razão. –– Ele riu baixo antes de dizer: –– Tudo o que sei é seu nome e suas manias, mas de quê adianta? Você usa uma casca impenetrável e indestrutível.
–– Você não entende, não é? Eu não quero ser amada, não preciso dessa bosta. –– Bufei. –– Por favor, vá embora. É para o seu bem!
Ele assentiu. –– Uma rosa bonita, mas com espinhos, uh? Quem diria que eu, o colecionador de corações quebrados, teria o meu coração quebrado por uma, também, colecionadora de corações quebrados. –– Passou as mãos no cabelo, endireitando-os. –– Mas tudo bem, eu não me importo em ter o meu coração quebrado por você. É até bonitinho ver o meu coração na sua estante.
Sorrio de lado antes de caminhar em sua direção e passar os braços em volta de sua cintura, apertando-o em meus braços, em um abraço de despedida. –– Você é doente. –– Afasto-me, mantendo minhas mãos em seus braços, vendo-o sorrir. –– É sério, você precisa se tratar.
Ele assente, sem tirar o sorriso dos lábios. –– Você me deixou tão maluco que acho que vou precisar, sim.
–– Adeus.
–– Adeus, Amélia.
[...]
Eu tinha dezesseis anos quando, à noite, decidi roubar a chave do orfanato, o que fora assustador tanto quanto a melhor coisa que fizera. Posteriormente, conheci pessoas incríveis e que me ajudaram, dando-me um teto e trabalho, o qual fora uma bênção, mas eu mexi com as pessoas erradas e, sem saber no que estava me metendo, eu achava que podia fazer o que quisesse e sairia ilesa, entretanto, como dizem por aí, aqui se faz, aqui se paga.
Um sorriso de escárnio se apossa de meus lábios ao lembrar-me do motivo que deu início a uma tormenta em minha vida, mas que, agora, ainda que sinta falta do passado, estou acostumada com o meu presente, o aceito, pois não quero sentir-me como um pássaro em uma gaiola, aprisionado.
Em cada fim de noite, eu me sinto horrível – ainda que tenha aceitado quem fui condenada a ser –, pois penso em tudo o que poderia ter sido e não fui, mas há uma coisa que aprendi, da qual nunca me esquecerei: O jogo pode virar, sempre. O amigo pode virar inimigo e o inimigo virar amigo, mas que, acima de tudo, nós somos o nosso maior inimigo e nem sempre viramos amigos de nós mesmos, tendo aquela partezinha como um diabinho, ao lado do anjinho, em seu ombro, dizendo-te mil e um males.
Continuo caminhando, com as minhas mãos no bolso do casaco, em uma tentativa falha de esquentá-las, mas isto deixou de ser um problema quando escutei um barulho no beco em que acabara de passar, fazendo-me voltar, o que fez com que os meus olhos encontrassem-se com os de um lobo cinzento, desesperado.
–– Eu vou ajudá-lo. –– Sorri de lado antes ao aproximar-me, fazendo-o recuar, o que me fez ver suas roupas molhadas em uma poça de água. –– Tudo o que você precisa fazer é esperar por mim, ok? Eu farei o resto.
Para que ele saiba do que estou falando, olho por cima do ombro antes de olhá-lo de novo e dar dois passos para o lado. –– Uma loja. Parece que é seu dia de sorte, bonitão. –– Afasto-me, caminhando em direção à loja, mas viro-me para dizer em alto e bom som: –– Eu queria que você fosse humano.
Bliss Montgomery – Point Of View
–– Eu vou dançar. Tudo bem?
Tudo bem? Não, não de verdade, penso, contudo, balanço minha cabeça para cima e para baixo, confirmando, mas ela é burra demais para perceber que estou quase subindo no palco, tirando o microfone da mulher cantando para perguntar o que há de errado com todo mundo ali, no bar, que dão risada em uma conversa, canto ou dança, como se não possuíssem nenhum problema, o que me deixa completamente indignada, afinal, eles lidam tão facilmente com os seus problemas e eu, definitivamente, não sei – ainda que tente – fazer o mesmo.
Apesar de aborrecida, não é como se eu quisesse vê-los como eu, perdida, longe disso, tudo o que quero é saber como eles lidam tão facilmente com os problemas, mas tudo bem, o barulho deles não me incomoda, pois o barulho maior está dentro de mim.
Batuco os meus dedos na mesa de madeira e fecho os olhos, tentando concentrar-me na melodia da música, mas minha tentativa é falha, pois me sinto terrivelmente ridícula ao lembrar-me de que saí do bar e olhei em volta como quem não quer nada, o que não era verdade, eu queria, é claro, contudo, o que teria feito se tivesse o encontrado?
–– Bliss? – Conto até três antes de virar e sorrir para o homem. –– O que está fazendo aqui?
–– Como assim o que estou fazendo aqui, Henri? –– Ri baixo. –– Eu não devo satisfação a você.
–– Você tem razão. –– Ele levantou as mãos em rendição. –– Está sozinha?
–– Não. – Bufo. –– Sim.
–– Ótimo. – Sorriu. –– Não está mais sozinha.
Sorrio de escárnio. –– Eu prefiro ficar sozinha.
Ele revirou os olhos. –– Será que você pode trancar a sua cadela interior, por favor?
–– Você não disse isso!
–– Bem, eu disse. – Deu de ombros. –– Como você está?
–– Henri!
–– Você quer um pedido de desculpas?
– Eu quero que você vá embora.
Ele bate na mesa, aborrecido. –– Porra, será que é pedir muito uma conversa civilizada com você?
–– Henri... –– Sorri em deboche antes de dizer: –– Tudo bem, sobre o que você quer conversar?
–– Bliss! –– Ele passou as mãos no cabelo, puxando-os. –– Eu só quero minha amiga de volta!
–– Com licença? – Sorriu. –– Eu sinto muito em interromper, mas é importante. Uh, eu ia esquecendo, meu nome é Amélia, mas pode me chamar de Wendy.
Wendy é nome de cadela, penso. –– Oi?
–– Eu... –– Ela mordeu o lábio inferior antes de dizer: –– Eu vi você com um lobo.
Mordo o lábio inferior, nervosa. –– Não, você não viu.
–– Fique calma, eu não vou tentar tirá-lo de você. Mas ele não está com você... –– Pausou. –– Ele está comigo.
Levantei-me, ficando em sua frente. –– Como é?
–– Você vai mesmo se colocar na minha frente como se fossemos duas adversárias? –– Ela sorriu de escárnio. –– Eu acho melhor sabermos usar o tom de voz para que tenhamos uma boa conversa, você não acha?
–– Certo. Você tem razão. –– Suspirei fundo. –– Eu estava desesperada atrás dele, então... Me desculpe.
–– Tudo bem. –– Ela deu de ombros. –– Você pode ir buscá-lo? Eu estou atrasada para um compromisso.
–– É claro.
Henri segurou o meu pulso, fazendo-me olhá-lo. –– Você não vai me deixar sozinho, não é?
–– Henri... –– Mordi o lábio inferior, soltando-o em seguida. –– Ele é importante para mim!
–– Isso significa que... –– Sorriu em deboche antes de continuar: –– Eu não sou importante?
–– Você é. Eu não lembro, mas sinto. –– Pausei. –– Você tem sido um filho da puta, então não me peça para escolher entre os dois porque escolherei ele, não você.
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