História Seeing in the Dark - The new "babysitter"

 A parte detrás da minha cabeça estava repousada sobre o encosto do banco do carro, enquanto que meus olhos, cansados e sonolentos, vagavam sem rumo e fitavam qualquer coisa que não sou capaz de distinguir o que seja. Meus olhos são assim desde o dia do acidente.

Eu já estava farta de tanto ir para aquele hospital com a esperança de que alguém os consertasse, mas todas as vezes era o mesmo blá blá blá de sempre: você vai voltar a enxergar em breve, fique tranquila. Mas quando?! Quanto tempo terei que esperar? Mais oito anos? Eu realmente odiava quando essa merda saía da boca do Dr. Louis, meu médico oftalmologista e neurologista, assim como ele fez hoje novamente.

Acordei muito cedo, vesti uma roupa descente e coloquei um pingo de esperança que ainda me restava no bolso e fui até o hospital com a minha mãe onde o Dr. Louis trabalha. Ao sentar naquela cadeira cara a cara com ele, o mesmo me falou que sim, eu voltaria à enxergar, porém isso só seria possível se uma cirurgia no meu nervo óptico fosse realizada. Até aí, tudo bem, mas o último pingo de esperança desapareceu quando ele falou que uma intervenção cirúrgica desse tipo custaria em torno de dez mil dólares. Fiquei pasma e poderia imaginar que minha mãe também depois de ouvir isso. Saímos de lá frustradas, pois, provavelmente, nunca conseguiríamos arrumar essa fortuna toda.

Então, passamos o trajeto de casa quase todo em silêncio, se não fosse o barulho de nossos suspiros de decepção.

Sei que a minha mãe estava me olhando com desdém, eu poderia jurar, porque sinto seus olhos sobre mim.

Quando percebi que o carro tinha sido parado, minha mão direita tateava em busca da maçaneta interna, mas antes que eu pudesse sair mamãe chamou minha atenção.

— Camila… — voltei a minha posição anterior — eu sei que a gente não tem todo esse dinheiro, mas eu juro que vou tentar conseguir de algum jeito… eu sei que não será nada fácil arranjar dez mil dólares, mas, sei lá… eu posso fazer hora extra no trabalho ou posso conseguir um segundo emprego com um salário muito maior.

— Mãe, não precisa fazer isso. Eu vou ficar bem sem enxergar para sempre, se consegui suportar isso por oito anos, então posso continuar suportando até o fim da minha vida. — falei tentando a consolar de alguma forma.

Ficamos em silêncio.

Na verdade, tudo isso que acabei de falar em relação a minha cegueira foi uma grande mentira. A única coisa nessa vida na qual eu anseiava em conseguir era recuperar minha visão.

Ninguém nunca soube como foi difícil para mim ter que aceitar o fato de que nunca mais veria o rosto da minha mãe, o pôr do sol maravilhoso de Fort Collins, as borboletas enchendo de cores o jardim da minha casa, o meu violão favorito ou meu próprio reflexo no espelho. Não é nada fácil ter que viver na escuridão e muito menos ter que se conformar com isso.

— O que vai querer para o jantar? — perguntou depois de um tempo.

— Não sei… estou sem fome. Mas, talvez eu coma um pedaço de pizza antes de dormir.

— Camila, o que eu falei sobre você comer besteira na hora das refeições?

— Karla Camila Cabello Estrabão, você não pode comer besteira na hora das refeições porque esse tipo de coisa tem muita gordura e faz muito mal para a saúde, quer ficar igual a uma baleia? — falei imitando seu tom de voz.

— Isso! Mas não lembro de ter falado a parte de ficar igual a uma baleia.

— É porque você não falou mesmo, mãe. — voltei a tatear a maçaneta da porta.

Mamãe saiu do carro e foi correndo para me ajudar a sair do carro. Ela é tão cuidadosa e super protetora comigo que chega até a ser um exagero, mas fazer o que, mães são assim mesmo.

°°°°°

Logo que terminamos de jantar, fui ajudar minha mãe a lavar a louça suja e como sempre, ela fez tudo sozinha para que eu não tivesse a possibilidade de derrubar algum prato e me machucar.

Depois assistimos juntas a última temporada de Friends pela trigésima vez naquele ano, quer dizer, só ela mesmo que tinha o privilégio de assistir, enquanto eu só podia ouvir a voz dos personagens e imaginar como seria suas aparências, literalmente eu estava “enxergando pelos ouvidos”. Eu com a cabeça repousando sobre seu colo, enquanto ela massageava meus longos fios de cabelo, da raiz até as pontas. Quando o sono já quase me embalava em seus braços, mamãe me arrancou de suas garras e me trouxe de volta a consciência com sua voz suave.

— Mila? Ainda está acordada?

— Ah, sim… aconteceu alguma coisa? — minha voz saiu arrastada por conta do meu cansaço.

— Preciso te falar uma coisa. — levantei meu corpo e sentei-me ao seu lado — Era para eu ter te falado hoje mais cedo, só que com tantas coisas embaralhadas na minha cabeça acabei esquecendo.

— O que foi?

— Eu andei pensando sobre você ficar sozinha em casa enquanto estou trabalhando e acho que não é uma boa ideia.

— Ah não, espera… você não chamou alguém para cuidar de mim, não é? — entrei em desespero ao supor aquilo.

Ouvi sua respiração profunda e em seguida seu pesado suspiro, já sabia qual seria sua resposta.

— Sim, Camila. Olha, lamento que você não queira isso, mas é pro seu bem. É perigoso até para uma pessoa com a visão perfeita.

— Mas, mãe! Eu não tenho mais cinco anos, tá legal? Sou adulta o suficiente para fazer o que quiser sem a ajuda de ninguém.

— Mila, isso foi necessário. Logo agora que vou ter que te deixar sozinha por mais tempo por conta do meu trabalho.

— Humm — resmunguei igual uma criança se recusando a ter que comer um prato cheio de brócolis.

— Eu te garanto que ela é uma garota legal, você vai gostar dela. Lauren é um amor de pessoa, todo mundo gosta dela.

— Eu não sou todo mundo.

— Você nem a conhece e já a odeia? Vai se arrepender profundamente de ter falado isso, viu mocinha? — ela chegou mais perto de mim e beijou minha têmpora esquerda. — Agora vai descansar que amanhã a Lauren vai vir aqui bem cedo. Boa noite.

Ótimo! Outra idiota que vou ter que suportar o dia inteiro.

Não sei por que minha mãe tem contratar alguém para tomar de conta de mim como se eu fosse uma inútil. Eu sei muito bem me virar sozinha, isso é tudo culpa dessa super proteção exagerada dela.

Só espero que essa tal de Lauren não seja chata o suficiente ao ponto de eu querer expulsar ela da minha casa no tapa.