História Seele - 11 - Garoto confuso, homem decidido: antes da... viagem?

"Me dobre, me quebre
De qualquer forma você precisa de mim"

(I Think I'm Paranoid - Garbage)

Suas mãos tremiam ao segurar aquela carta de convocação. Daqui a dois dias, estaria partindo para Leningrado. Não era justo. Logo quando finalmente acertou as coisas com Monika. Mal fazia cinco meses que estavam enamorados e então, a guerra veio fazer o seu chamado. Johann faria parte de um dos três destacamentos que seguiam para a União Soviética, como parte da Operação Barbarossa. Somente seus pais e sua pequena irmã Heike souberam da notícia. Ainda não sabia de uma maneira melhor para contra a Monika que iria para um lugar desconhecido. 

Levantou-se do sofá de sua casa e resolveu ir na residência dos Ehrlinger. Teria que contar para a sua amada que a guerra iria lhes separar por um breve momento. Faria de tudo para voltar vivo para Dresden e nunca mais ficar longe de sua doce namorada.

Acordou chorando com o fim do sonho. Fazia um bom tempo que Victor não sonhava com os dois alemães e não entendeu porque isso acontecera. Levantou-se ainda sonolento, visto que ainda eram 5h da manhã. Notou que Yurio já estava acordado, sentado na beira de sua cama com o semblante preocupado. O loiro aproximou-se um pouco mais apenas para enxugar as lágrimas que deslizavam do rosto do outro russo. E essa não era a primeira vez que isso acontecia.

- в чем проблема (qual é o problema)?* Você parece assustado, Vitya. Foi mais um daqueles seus pesadelos? - permaneceu ao lado do mais velho, querendo arrancar de vez o que ocorria. Yuri já chegou a presenciar vários episódios de Victor acordando assustado ou chorando, ainda quando estavam na Rússia.

- Acho que sim... Yuratchka, você já sonhou com alguma coisa que você sente que aconteceu, que foi real mas... era só um sonho? - perguntou, intrigado.

- Por que essa pergunta estranha, Victor? Você por um acaso bebeu e o efeito da vodka ainda persiste em seu organismo? Não. Nunca tive essa sensação na vida. Sonhos são apenas sonhos e não sei interpretar o significado de nenhum. Se era só isso, é melhor voltar a dormir, coisa que eu também farei. Só acordei porque estava com sede. Se deita e tenta pensar em algo que te deixa relaxado... como o cara de porco, por exemplo. - o russo cora ao ouvir a última sentença.

- Não mude de assunto! O Yuri não tem nada a ver com nossa conversa! - Yurio volta para a sua cama e se deita, ficando com o rosto virado na direção do colega. Victor o imita e faz bico.

- Não mudei de assunto, só dei uma sugestão. Aproveita que as coisas estão melhores entre vocês e tenta pensar em algo bom com ele. доброе утро (bom dia)**.  - fechou os olhos e voltara a dormir. Coisa que o prateado não conseguia fazer.

Mesmo que Yuri Plisetsky fosse um pentelho às vezes, ele tinha razão no que dizia. Já fazia uma semana que finalmente o fotógrafo que ocupava seus pensamentos deixara de fugir. Após à noite no boliche, Yuri Katsuki o procurou, propondo apenas amizade entre ambos. O ator ficou um pouco confuso, pois sentiu um pouquinho de decepção dentro de si com aquilo. Não sabia nem denominar direito o que realmente sentia pelo japonês. Primeiro, era apenas a curiosidade por ele lembrar a tal Monika Ehrlinger dos seus sonhos, principalmente a voz e o jeito de olhar para as pessoas. E depois, era como se algo o atraísse para o rapaz, dando a impressão de que algo de fato aconteceu entre ambos anteriormente. Victor encontrava-se em um turbilhão de sensações desconhecidas, provocadas por aquele fotógrafo temperamental. E foi pensando nisso que voltou a adormecer. Seu pequeno Yuratchka estava certo mais uma vez.

Acordara um pouco melhor, graças ao conselho do seu compatriota. Porém, ao virar o corpo para o outro lado, deparou-se com uma cena bastante incomum. Yurio aos beijos com o tal Jean-Jacques, o canadense do boliche. E mais incomum ainda, era o fato de ambos estarem deitados na cama, pouco se importando com a presença do mais velho ali. Mais uma vez, as imagens de um Yakov sapateando em seu cadáver apareciam em sua mente. Teria que interromper, pois além de não respeitarem o seu espaço, os dois adolescentes não precisavam ver um homem de 27 anos trajando apenas uma cueca boxer preta de pé no quarto. Quanto a esse detalhe, era o que menos importaria agora, justamente por ver que o moreno que estava em cima do menino loiro começava a insinuar uma invasão de suas mãos para debaixo da camisa do menor.

- Yuratchka. O que pensa que está fazendo? - os dois jovens logo pararam o que faziam e encaravam um Victor com cara de poucos amigos. - Logo de manhã e nem pra controlar os seus hormônios?

- Desculpa, Vitya... é que... eu achei que você estava dormindo ainda... - aproveitou que Jean saíra de cima para sentar-se na cama. 

- Só te perdoo porque o Yakov não está aqui no momento para dançar ballet em cima do meu caixão. E quanto a você, garoto do Canadá... quais são as suas intenções com o meu amigo Yuratchka? - fora bem direto. Jean teve que falar sério, por mais que quisesse ignorar a imagem daquele homem de cueca fazendo pose de pai protetor.

- Monsieur***... eu garanto a você em nome da honra do Yuri que somos amigos. É... que nós estamos nos... conhecendo de o-outra maneira. Pardon**** se fui desrespeitoso. - apesar de constrangido pelo flagra, JJ olhava nos olhos do ator, demonstrando sua sinceridade.

- Se quiser meu perdão, me chame somente por Victor. Não sou tão velho assim. E outra coisa: cuidado com isso aí, vocês dois. Porque quem brinca com fogo, já vai na intenção de se queimar. Espero de coração que seja realmente algo sério e não uma distração para provocar o outro amigo de vocês. Amor não é experimento científico pra saber se vai dar certo ou vai ser descartado. - tocara no ombro do rapaz canadense, buscando demonstrar apoio. - Yuratchka é apenas um menino, JJ. Não seja omisso com ele, meu menino ainda não sabe lidar com essas coisas. Ou vai acabar se deparando com um Victor Nikiforov carregando o Satanás no corpo se eu o encontrar chorando e descobrir que foi você o culpado.

Pegou um roupão pendurado no cabide do quarto e entrara no banheiro. Vendo que Yuri ainda estava um pouco constrangido, Jean acaricia sua cabeça. Ele sabia muito bem do que Victor falava em seu conselho disfarçado de sermão. Não contou ao mais velho da desfeita que Otabek fizera ao loiro quando anunciou seu namoro com Mila Babicheva três dias depois daquela noite, de maneira fria e com a intenção de magoar. O moreno jamais faria mal ao adolescente russo, pelo fato do mesmo estar precisando dele mesmo não sabendo direito o significado de ter um coração partido. Perguntaria depois ao prateado se ele conhecia algo que deixaria Yurio feliz.

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"Por que simplesmente não ficamos todos juntos?"

(Androgyny - Garbage)

Yuri achava que perderia a paciência de vez com Phichit. Depois que o tailandês recebera uma ligação do ex-namorado, o mesmo decidira ir a um templo budista e a partir daí, ficara paranoico. Atormentava-se o tempo todo e culpava sua vida passada por isso acontecer. O japonês realmente não entendia muito bem dessas coisas e tentaria fazer o amigo desencanar e esquecer esse assunto. Mas nem o katsudon do refeitório do trabalho de ambos foi o suficiente para manter a calma de Yuri.

- Phichit-kun... esquece isso, pelo amor de Athena!! Troca o número do celular, tranca seu Instagram e bloqueia esse sujeito! - imaginava o que Chris faria para fazer com sucesso aquilo no que o moreno estava fracassando no momento.

- Yuri, isso só tá acontecendo porque eu devo ter sido muito ruim na minha vida passada! O karma veio me atingir só agora! - o mais novo fizera bico. 

- E por que eu devo acreditar nisso? Phichit-kun, essa coisa de vida passada não existe! - levara mais uma porção de katsudon à boca. 

- Querido amigo... eu vim de um país budista e sou budista. Nós acreditamos sim em reencarnação e vidas passadas. Tudo o que fazemos agora podem se voltar contra ou a nosso favor na próxima vida que vivermos. Nada escapa do ciclo. - o olhava sério. Não gostava quando Yuri bancava o cético. 

- Não sei quanto a você, mas vou voltar ao meu serviço. Quer um conselho? Afasta Lee Seung Gil da sua vida e assuma o Chris de uma vez. - levantou-se da mesa que dividia com Phichit no refeitório e fora em direção ao estúdio onde hoje iria auxiliar nas cenas de Victor.

O russo pelo menos o entenderia. Desde que finalmente deixara o estrangeiro se aproximar, era com ele que o nipônico costumava jogar conversa fora e desabafar um pouco. Parecia algo fácil, se não fosse o estranho sentimento de que já tivera algo com o prateado antes. Mesmo que sejam somente amigos, Yuri sentia que havia muito mais do que uma simples amizade ali. Sacudiu um pouco a cabeça e correu para o seu local de trabalho, onde ouvia os gritos de seu superior. Queria poder se livrar daquilo o mais rápido possível, mas só de ver Victor em cena, atuando de maneira impecável, ignorou os chiliques do diretor de fotografia atrás da câmera, insinuando que usaram as partes erradas do roteiro para colocar nas filmagens. 

Após aguentar aquele velho por mais de uma hora e meia, finalmente tudo terminara. Era agora a hora de voltar para o seu apartamento e assistir Saint Seiya enquanto comia umas duas latas de Pringles acompanhadas de uma Pepsi bem gelada. Porém, antes de pôr os pés para fora do estúdio, fora avisado de que deveria ficar. O restante do elenco chegou ao local e pelo o que deu a entender, haveria um comunicado. Andou rapidamente para o lado do ator russo, que ficou tranquilo ao ver seu objeto de afeição ao seu lado. O diretor-geral e o roteirista estavam de frente para todos os envolvidos naquele trabalho, sendo tanto da produção quanto os atores. 

- Estimados colegas... agora chegamos em uma fase de Rise and Fall bastante importante. Ficamos contentes com o sucesso de audiência do nosso drama e precisamos manter esse ritmo. O que eu e o roteirista queremos lhes dizer é que iremos sair do Japão para filmar o que seria o início da nova fase. Nossa primeira parada será em São Petersburgo, na Rússia. Teremos duas semanas para nos prepararmos para essa viagem. E quero contar com cada um de vocês para esta empreitada. 

Um certo homem de cabelos prateados ficou paralisado com a notícia. Não imaginaria que voltaria a pisar em sua cidade natal depois de tanto tempo. E ainda... como as pessoas iriam reagir à sua breve volta para a Rússia? Será que logo fariam questão de jogar todos os seus escândalos na sua cara sem hesitar? Não queria que Yuri soubesse de seu passado negro e conturbado. Mas pelo menos, ele pensava, o japonês não sabia falar russo e sequer entenderia o que diriam sobre ele. Saiu de seus devaneios quando sentiu o fotógrafo lhe tocar. Achou que seu coração ia sair pela boca naquela hora, por conta daquele toque delicado.

- Victor-san... aconteceu alguma coisa? Se for problema de azia, eu tenho um remédio na minha bolsa... - viu o russo suspirar antes de lhe responder.

- Não é nada, Yuri... não precisa se preocupar. É que... faz tempo que não piso em minha cidade natal. Sabia que eu nasci em São Petersburgo? Acho que você gostaria de conhecer. Mas primeiro de tudo, vou só te dizer algo: você vai odiar viajar pela Aeroflot, porque... - e foi logo mudando de assunto aos poucos, para que o moreno não soubesse o porquê de sua reação acabar preocupando o menor.

Além da surpresa de voltar para casa, mesmo sabendo de tudo o que aprontou na Rússia, um pensamento lhe perturbou. Ou melhor, um nome que surgira em sua mente no instante que recebeu a notícia.

O nome Leningrado.

"Tente não pensar, seja legal, acalme-se, seja falso"

(Blackout - Garbage)