História Seguir em frente - Aquele sem total contato

Festa. Dor de cabeça. David. Ligações. Dor de cabeça. Bárbara. Ludmila. Fotos. Dor de cabeça. Acho que acordei há uns dez minutos e ainda estou tentando assimilar o que aconteceu ontem. Acho que exagerei na bebida porque não consigo lembrar de muita coisa, para falar a verdade nem me lembro como cheguei aqui no meu quarto. Por sorte não cometi nenhuma loucura, pelo visto, já que estou sozinha e ainda com o vestido que usava na festa intacto. 

Depois de tomar uma ducha quente, fui procurar um remédio para ressaca no armário da cozinha, local onde mamãe costuma guardar os remédios. Estranhei não ter nenhum vestígio de que houve uma festa por aqui e me assustei quando vi a hora: 17h45. Eu dormi praticamente o dia inteiro e a sensação é de que virei no mínimo uns dois dias. Por que você se descontrola tanto quando bebe, Maitê?Meus pensamentos foram interrompidos por Lucas.

- Maninha -ele beijava minha testa- tá tudo bem por aí? 

- Mais ou menos, tô morta de ressaca 

- Não era pra menos depois do tanto que você bebeu. -ele dizia entre risadas

- Eu dei algum vexame? Diz que não, por favor... 

- Acho que não. Teve uma hora que o Pedro te ofereceu ajuda e você disse umas verdades na cara dele -ele ria- daí ele ficou puto e foi embora. Quando te encontrei de novo você tava tipo tri-louca e ficava me falando de um tal de David, aí achei melhor te trazer pro quarto. Aliás, quem é esse cara?

- Ahm... é o David Luiz. -fui sincera

- David Luiz? Que David Luiz? -ele me olhava surpreso

- Ué, você conhece algum outro David Luiz que mora em Londres?

- O jogador? VOCÊ TÁ PEGANDO O DAVID LUIZ? -ele subiu o tom de voz

- É. Mas fala baixo que minha cabeça tá doendo...-eu disse

- Como isso aconteceu?

Eu precisava falar com alguém. E o Lucas sendo meu irmão e homem, poderia me ajudar. Contei a história desde o começo, quando nos conhecemos e do nosso beijo lá no meu apartamento e do nosso primeiro "fim". Falei de quando reatamos e como eu estava sendo feliz nesse primeiro mês como acho que nunca estive com alguém. Lembrei também do quanto o dia de ontem foi estranho e que ele do nada parou de me atender. Enfim, contei tudo que era necessário.

- Mana, eu acho que você já fez de tudo, sabe? Já ligou, mandou mensagem... Se ele não deu notícia é porque não quer falar mesmo. Não acho que você deveria ficar insistindo.

- Cara, mas eu nem sei o que aconteceu de verdade. Ele não é do tipo que brinca com as mulheres para ficar comigo um mês e depois simplesmente fingir que não me  conhece, sabe?

- Hum... É que eu falo por mim, se eu tivesse nessa situação das duas uma: ou eu não queria nada sério com você ou estaria com raiva por algo que você fez.

- Mas nenhuma das duas faz sentido pra mim... Tô confusa. Acho que vou tentar dar esse espaço a ele, uma hora ou outra a gente vai se falar. -eu disse a Lucas mas no fundo eu queria ME convencer disso

- Tem razão. Qualquer coisa eu tô aqui, tá? É bom te ter de volta. 
(...)

Meus pais chegaram da empresa pouco tempo depois e não sei se já passei da idade, mas tudo que eu precisava hoje era um colinho de mãe. Pedimos comida japonesa e ficamos lá na sala assistindo TV, como nos velhos tempos, até que meu celular tocou. Era Ludmila. Pedi licença para falar com ela.

- Oi, Ludy -falei

- Mai, tá podendo falar? -eu disse que sim- olha, já sei o que aconteceu... David contou pro Oscar que você saiu com um ex-namorado aí no Brasil e acha que você ainda é apaixonada por ele.

Como o David sabe que eu encontrei o Pedro?

- Ahm... como ele sabe disso?

- Não sei, Mai. Mas ele tá pensando que você traiu a confiança dele e tudo mais.

- Cara, eu realmente me encontrei com meu ex aqui, mas foi por acaso. E não aconteceu nada! Pela primeira vez na vida eu não senti nada quando o vi, sabe? Eu percebi o quanto meu sentimento pelo David tá forte e... e não acredito que ele tá pensando isso de mim. Que merda.

- Calma, amiga. Quando voltar da viagem vocês conversam direitinho

- Você sabe como ele é cabeça dura, Ludy, se ele ta pensando que o traí não vai querer nem olhar na minha cara mais... Por isso não quer me atender. Eu não consigo entender como ele chegou a essa conclusão, não é possível... e por que ele não veio falar nem que fosse para me xingar? Eu me sentiria melhor do que essa falta de notícias.

- Olha só, não adianta você se desesperar a toa, tá? Lembre que você não fez nada de errado.

Cara, Ludmila sempre é a calmaria em pessoa. Sou tão grata por tê-la em minha vida.
(...)
 
            David P.O.V

Refletiu nos meus olhos adeus solidão
Duas histórias que se cruzam sem intenção
Combustível pra alma minha inspiração
Povoando minha existência e imaginação

Quando fecho meus olhos sempre posso sentir
Os seus olhos e seus lábios sorrindo pra mim
Nado nesses seus olhos mar de inspiração
Tua boca, tua pele, teu cheiro é canção

Eu vou cantar pra ela
Que sem ela não existo mais
Eu vou cantar pra ela

Que eu sempre a quero mais
E eu vou dizer pra ela
Que ela é a luz que me traz paz

- Mano, tu vai ficar muito tempo nessa sofrência aí? Eu não aguento mais essas músicas... - Oscar dizia ao meu lado

- Foi mal -eu disse simplesmente

- Amanhã a gente tem um jogo, lembra? quartas de final do campeonato, é tudo ou nada. Precisamos nos concentrar. -ele queria me convencer.

- É, você tem razão... -eu olhava para o teto.

- Eu só acho que você tá fazendo tempestade em um copo d'água, sabe? Esfria a cabeça, espera ela voltar e vocês conversam. 

- Já vi o que eu precisava ver. E não quero falar sobre isso. Vamos treinar -eu disse e acho que até soou rude 

- Tá bem, não tá mais aqui quem falou...
 

Foco, David. Foco. É isso que você precisa. Amanhã tem um jogo importante valendo vaga na semi-final do campeonato inglês. Jogo difícil contra o Liverpool e o time inteiro precisa de você. Não vai dar uma de louco e dar motivo para falarem de você mais do que já falam. O meu David interior falava tentando me trazer de volta à realidade.

- David -nosso técnico Antonio Conte dizia- eu quero você na cola do Fuller amanhã. Ele joga no seu lado então não dê espaço, ok? 

Como eu pude esquecer que aquele otário joga no Liverpool? 

- iiiiiih -ouvi alguém falar isso atrás de mim e quase tive certeza que foi o tampinha do Oscar. Olhei e ninguém se manifestou.

- Algum problema?- Conte disse

- Nenhum, professor. Pode confiar em mim. 

Se eu já tinha motivo para jogar bem amanhã, eles acabaram de ser dobrados. Eu vou colar naquele cara de um jeito que ele não vai conseguir fazer nada, só por todas as raivas que ele já me fez. Não que isso seja por causa da Maitê, que fique bem claro, mas o que ele fez não se faz com mulher nenhuma. Se fosse por qualquer uma eu faria o mesmo. É. Isso.
(...)

      Maitê P.O.V

Quando olho em seus olhos
É como observar o céu à noite
Ou um belo amanhecer
Há tanto que eles carregam
E assim como as antigas estrelas
Eu vejo que você chegou tão longe
Para estar bem onde você está
O quão antiga é a sua alma?

Não vou desistir de nós
Mesmo que os céus fiquem furiosos
Estou te dando todo meu amor
Ainda estou melhorando
E quando você precisar do seu espaço
Para navegar um pouco
Estarei aqui esperando pacientemente
Para ver o que você vai encontrar

Eu não quero ser alguém que vai embora tão facilmente
Estou aqui para ficar e fazer a diferença que eu puder

- Filha? -mamãe batia na porta do meu quarto. Tirei os fones de ouvido.

- Pode entrar.

- Tudo bem por aí? -ela passava a mão em meu rosto

- Tudo na medida do possível. -tentei não preocupá-la

- Olha, eu amei que você veio nos ver, mas tivemos um problema na sede da empresa no interior e eu e seu pai teremos que ir resolver. Ele como sempre vai cuidar do setor financeiro e eu do administrativo, então precisamos ir os dois. 

- E eu como fico? 

- Você pode ficar por aqui. A gente volta em no máximo dois dias. Eu prometo.

- Mas daqui a dois dias já será o meu dia de voltar para Londres...

- Eu sinto muito, filha, mas nós temos que ir, sempre resolvemos os problemas juntos e o negócio lá é urgente. 

- Argh. Tudo bem, mãe. Eu entendo. Tenho umas coisas para organizar mesmo -eu menti- vou remarcar minha passagem de volta para amanhã

- Tenho muito orgulho da pessoa que você se tornou -ela disse de repente- Nunca esqueça quem você é - me deu um abraço apertado e saiu.

Ok, vamos enumerar os ganhos e perdas dessa viagem ao Brasil.

( V ) Matar a saudade dos familiares
( V ) Festejar o aniversário do seu irmão
( V ) Notar que seu ex já foi superado há tempos
( X ) Manter contato com o David todos os dias
( X ) Descansar a mente
( X ) Continuar sendo uma pessoa forte e bem resolvida
 

É... até que não foi de todo ruim. E eu sou adepta daquela teoria de que tudo acontece por um motivo, se as coisas tiveram de ser assim eu vou entender o por quê depois. Não estava nos meus planos várias coisas que aconteceram, contando a de voltar para Londres amanhã. Mas, no fundo você ainda é uma mulher forte e decidida, Maitê. Vai dar tudo certo. Respira forte e vai. 
(...) 

Depois de duas horas de espera e uma dor de cabeça consegui o voo de volta à Londres. Cheguei no aeroporto ainda de madrugada por conta do tempo enorme que é uma viagem do Brasil para a Europa. Fazia frio em São Paulo e eu já fui buscar uma lanchonete para comprar meu café. Escolhi um com doce de leite na borda e sentei em uma cadeira da sala VIP no momento que meu celular tocou. Era Caroline.

- Oi Carol -eu disse

- Mai, você vai para o jogo hoje a noite? -ela me perguntou

- Que jogo?!

- O dos meninos, ué. Chelsea x Liverpool. Eu não quero ir sozinha e você é a única amiga que eu tenho por aqui...

- Ai, não sei, Carol. Eu tô no Brasil ainda meu voo só sai daqui a pouco. Provavelmente só chegarei em cima da hora

- Por favor, faz um esforcinho, por mim. -ela fazia chantagem. Merda.

Pensando pelo lado positivo, até poderia ser bom ir para esse jogo. Eu poderia ver David e depois conversar com ele e... e... nossa. O Thomas vai jogar também. Como ele é atacante, o David tem o dever de parar ele e tenho certeza que aquele moleque infantil vai provocar e o David é esquentado demais e pode acontecer uma merda. Esse campeonato é tão importante para o meu cabeludo... Nada pode dar errado. Espera, esquece essa parte que eu o chamei de meu cabeludo.

- Tudo bem, eu vou, Cá. Quando eu chegar te ligo para a gente combinar. Beijo
 

Um senhorzinho de pelo menos uns 70 anos de idade sentou-se na poltrona ao lado da minha no avião. Em determinado momento ele pediu-me licença e perguntou se estava tudo bem comigo. Estranhei, mas apenas disse a ele que estava com uns problemas amorosos. Ele disse que às vezes sente a tristeza nas pessoas e começou a contar algumas histórias sobre sua vida como por exemplo quando ficou afastado do amor da sua vida durante cinco longos anos por problemas entre as duas famílias e que ele nunca deixou de amá-la, até que conseguiram finalmente se casar. A moral da história é que ele queria me fazer ver que sempre há uma luz no fim do túnel, mesmo que tudo pareça perdido. Eu provavelmente nunca mais verei esse senhor na minha vida, mas ele me deu uma baita de uma lição.
 

(...) CONTINUA