--- Ah com licença. Poderia me dizer onde encontro a senhora Camila Jauregui, por favor?
A mulher, bonita até, me encara sem qualquer constrangimento, passando seus olhos críticos desde a raiz dos meus cabelos até a ponta dos meus tênis.
--- E você seria...?
--- Lauren. A esposa dela.
Sua expressão surpresa e incrédula só me dá mais certeza de que escolhi as vestes erradas nesta tarde. Contudo, o que posso fazer se é assim que gosto de estar quando longe do meu próprio trabalho?
--- De fato? - Gruda seu olhar na aliança dourada que ostento orgulhosamente em meu anelar esquerdo --- Infelizmente não estou autorizada a permitir a entrada de ninguém. Além disso, Camila não gosta de receber... Visitas
Essa mulher está sendo irônica comigo?
--- Acho que ainda não entendeu... Susana – digo observando o nome em seu próprio crachá --- Eu sou casada com a senhora Jauregui, estou certa de que ela pode me receber.
Qual é? Eu vejo que nem tem tanto movimento assim na sala adiante. A imensa parede de vidro mostra vários homens e umas poucas garotas sentados concentrados em seus monitores.
--- Aqui você é somente uma visitante e eu digo que Camila não vai receber ninguém. Ela está muito ocupada.
Mas que coisa!
--- Eu espero.
--- Não pode esperar aqui, sinto muito.
Seu tom debochado demonstrando o quanto sente.
--- Veremos.
Poucos passos e sento-me num sofá solitário disposta a tomar um bom chá de espera, mas irredutível em minha vontade de ver Camila e ainda mais, em esfregar nessa cara de cavalo que sou sempre vem vinda onde quer que minha menina esteja. Alcanço meu celular depois de me contorcer toda para tira-lo do meu bolso apertado e respondo alguns emails de alunos enquanto o tempo resolve se arrastar.
Eu vou dar nessa ruiva de farmácia, tô avisando!
DJ:
Vai lá! Mas, calma, vamos fazer uma vídeo chamada, não perco isso por nada!
......
É sério, Dinah! Essa mulher tá cheia de sorrisinhos debochados pro meu lado! Tá adorando me fazer esperar e nada da Camila aparecer!
DJ:
Se essa Susan, ou sei lá o nome, tá fazendo isso é pq sabe que tá te deixando irritada. Liga pra bunduda e avise que está aí.
......
Eu faria isso, se minha mulher me atendesse!
O telefone da diaba, digo, secretária toca uma, duas vezes até que ela responde com um “ Sim, Mila “ que me azeda até a alma.
--- Pois não, Mila, num instante – olha para mim – Não, nada de importante. Já levo pra você.
Levanta-se e sem me dedicar uma olhada sequer caminha por entre as mesas atrás daquele vidro entrando numa sala logo em seguida.
É oficial, Jane. Ela vai morrer.
***
Estou a ponto de explodir quando os muitos funcionários começam a deixar suas mesas e passam por onde estou, alguns sem me notar, outros que eu preferiria que seguissem esse exemplo.
Estou sentada nessa poltrona há quase duas horas, sendo que na última, o cabelo de fogo se enfiou na sala da minha esposa e jamais saiu de lá.
--- Alô!
Atendo sem notar quem me ligava.
--- Isso é jeito de falar com sua mãe?
Era só o que me faltava!
--- O que você quer? Já não disse pra não voltar a ligar?
--- Lauren Michelle eu ainda sou sua mãe!
--- Problema seu! Já vou dizendo que tô sem paciência, fala logo.
--- Calma, eu não eu não tenho culpa dos teus problemas, menina.
--- Clara, você é a razão de mais de metade deles. Agora, para de me encher o saco.
Encerro a ligação no momento exato em que a folgada aparece, seguida por uma mulher mais baixa, ambas sorridentes.
Faço questão de ficar de pé, braços cruzados na altura do peito e minha melhor expressão de “ que merda é essa! “ .
Só então os olhos castanhos que tanto amam me encontram e vendo minha postura nada amigável seu sorriso diminui aos poucos.
--- Oi Lo.
Beija meu rosto e mesmo sem querer passo meu braço por sua cintura mantendo-a junta à mim. É quase instinto.
--- Faz tempo que chegou?
Olho para minha “ adversária “ de olhos cerrados. É claro que ela não disse nada sobre eu estar aqui.
--- Um pouco. Vamos?
--- Humhum...
--- Ah, esperem, por favor. Vou descer com vocês.
Ahh mas não vai mesmo!
--- Pode ir. Minha mulher e eu podemos esperar.
--- Imagina! Vamos as três juntas.
Falsa!
--- Acho que já notou, mas essa é minha esposa, Lauren. Lo, ela é minha secretária, Susana.
--- É um prazer, senhora Jauregui.
--- Ôôô...
--- Perdão, o que disse?
--- Nada.
O térreo nunca me pareceu tão longe. Naturalmente que a latina ao meu lado notou o clima carregado, porém, a falsa do outro lado com toda certeza não seria interrogada como eu, o que serve somente para me deixar mais nervosa.
--- Bom, foi ótimo te conhecer, Lauren. Até amanhã, Mila.
A safada beijou o rosto da minha esposa! Na minha frente!
--- Você me segue no seu carro, Lo?
--- Tenho outra opção?
--- O que te deu, hein? Não pense que eu não percebi o jeito que você tratou a Susi.
--- Susi? Susi, Camila?
--- Eu não tô entendendo, Lauren.
--- Quer saber? Deixa pra lá. Vamos.
Vou até meu carro e depois de encarar os vidros por alguns instantes Camila faz o mesmo e logo sai cortando caminho por onde podia em meio ao trânsito pesado.
---- Susi! Eu vou mostrar quem é Susi!
Sabendo o que teria de enfrentar quando estivéssemos em casa e sentindo meu cérebro protestar, resolvo enfim ir até o hospital mais próximo e conseguir algo que faça minha cabeça desistir da ideia de estourar ali mesmo.
Digito uma mensagem rápida dizendo que não me demoro, envio ara Camila e pouco depois estou numa sala de espera fria e quase vazia.
Até meus olhos ardem tamanha a pressão em minha cabeça, sem contar a forte náusea que insiste querer despejar todo meu almoço nesse chão. Sentada, cabeça baixa e entre os joelhos não escuto até que a pontinha de tênis parecidos com os meus aparecem em meu campo de visão e ignorando as pontadas em minha nuca, levanto os olhos encontrando um rostinho infantil de olhos puxadinhos e... Assustados.
O choro estridente tem ligação direta com a parte dolorida do meu cérebro, além de me apavorar.
Sem hesitar coloco-me de joelhos à sua frente pondo-me a dizer palavras que, penso eu, pudessem acalma-lo e ao mesmo tempo carro o lugar procurando por alguém que o conheça.
--- Calma... Calma, menininho, sua mãe. Já volta.
Quanto mais eu falava, pior ficava seu choro.
--- Ai meu Pai, tô ferrada.
Cadê a mãe dessa criança?
--- Liam! Meu Deus, Liam, você quase mata a mamãe.
Reiterando... Agora sim eu tô ferrada.
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