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História Seven love letters - E a noite nunca acaba


Escrita por: myavengedromanc

Notas do Autor


Esse capítulo é a continuação do flashback... Só para lembrar <3

Capítulo 12 - E a noite nunca acaba


 

O nervosismo do “primeiro encontro” finalmente se acalmou.

Passei pelo coq au vin sem quaisquer catástrofes alimentares embaraçosas, nem um pedaço perdido de frango ou de pimenta preso nos meus dentes. Claro, eu tinha me lembrado de não engolir meu jantar como um porco faminto em um cocho cheio demais, e de não falar com a boca cheia. Mas quer eu estivesse usando o garfo certo ou não, a companhia na nossa mesa ofuscava a refeição, e a conversa, junto da nova garrafa de vinho, fluiu.

As onze e meia da noite se aproximavam. Hora de fechar. Tínhamos passado da hora no café. Os garçons colocavam as cadeiras em cima das mesas, lançando a nós olhares de reprovação. Mesmo que não tivessem jantado com a gente, Gerard e Quinn pagaram pelo nosso jantar e sugeriram que a gente fosse à Champs-Élysées para um digestif. Eu não fazia ideia de como tínhamos chegado ao mais ilustre boulevard de Paris. Até onde eu sabia, poderíamos ter sido teletransportados, afinal, estávamos com um cientista de foguetes. E, de repente, estávamos lá.

O bar escolhido tinha uma visão distante do Arco do Triunfo, brilhando num tom dourado, e a vida noturna parisiense piscava. Quinn e Gerard pediram bebidas. Maravilhado com Gerard, depois de olhar para o Arco do Triunfo, não vi mais muita coisa. Rindo com meu melhor amigo e dois franceses encantadores, pensei: Vida, não tem como ficar nem um pouco melhor que isso.

Na frente de Bert e Quinn, o garçom colocou dois copos cheios até um quarto do volume com um líquido amarelo-dourado e um ou dois cubos de gelo, que não estavam conseguindo vencer a guerra contra o calor do verão. Como acompanhamento, ele colocou uma pequena jarra de água. Duas tacinhas com um vinho tinto inebriante foram colocadas na frente de Gerard e mim.

— Normalmente — disse Quinn, seu sotaque era pesado e suas palavras eram lentas e conscientes —, o pastis é servido como aperitif, mas também é uma boa bebida nas noites quentes de verão. — Quinn colocou um pouco de água na bebida dele e na de Bert, e diluiu a mistura até alcançar uma tonalidade amarelo-pálido.

— O que é isso? — perguntou Bert.

— Uma bebida com sabor de anis — respondeu Gerard.

Bert cheirou seu copo e tomou um gole hesitante.

— Humm, é, hum, forte. — eu poderia dizer pela sua expressão que ele não tinha gostado.

Ele estendeu a taça — Aqui, Frankie, é bom mesmo, experimente.

— Não, obrigado. Acho que vou ficar com o vinho. Não quero misturar.

— Não é vinho. — disse Gerard — É porto. Já experimentou alguma vez?

— Não. Faço parte de uma irmandade. Nas fraternidades, somos apresentadas ao ABC da Cerveja.

A boca de Gerard se contorceu num esgar.

— Não gosto de cerveja.

Tomei um gole do porto, rico e espesso.

— Pensando a respeito, nem eu.

Logo, eram duas da manhã, o horário de fechamento do nosso novo refúgio. Mas por que parar nossa aventura amorosa em Paris, certo? Bert e eu não queríamos voltar para o nosso albergue depois de termos bebido na Champs-Élysées, e Quinn era sócio de alguma casa noturna exclusiva.

Pelo que me lembro, a viagem de táxi foi tanto extasiante, como aterrorizante. Corremos pelas ruas de Paris, pelas fachadas históricas de pedra e pelos pedestres num borrão. Onde quer que estivéssemos indo, eu queria chegar lá vivo. Deus do céu, o jeito com que os parisienses dirigem — parecendo os taxistas enlouquecidos de Nova York, só que pior — me deixou morto de medo. No banco de trás, uma das minhas mãos cobria meus olhos e a outra repousava sobre a coxa de Gerard. Sua colônia aromática, cítrica e picante, flutuava até minhas narinas. Sofisticado, mas sutil, a atração àquele perfume foi instantânea. Francês demais. Inebriante. A energia sexual entre nós era palpável, mas além de acariciar as costas da minha mão com o polegar, ele não fez seu avanço… ainda.

Por fim, chegamos ao nosso destino: La Bas, um lugar exclusivo que, tal como nos foi dito por Quinn, servia principalmente à ilustre burguesia e ao ilustre público da moda parisienses. Enquanto caminhávamos para o clube, o baixo da música dance dos anos 1980 tinha uma batida que acompanhava a do meu coração. Tum. Tum. Bum. Tum. Tum. Bum.

Quinn nos levou a uma fileira de sofás de couro, escondida num canto escuro, longe das luzes intermitentes da pista de dança. O clube estava vazio, exceto por um ou dois outros casais. Estava escuro. O DJ tocava o hit popular da época, “Lambada”, de Kaoma. Gerard me puxou para perto, suas mãos nas minhas costas, minhas mãos em seus ombros. Um pouco de dança atrevida se transformou num beijo. Assim que começamos, não paramos mais. Uma total demonstração pública de afeto, mas quem se importava? Aquilo não era uma ficada típica de faculdade, ou sessão de amassos. Era uma intensa, completa e absoluta experiência fora do corpo. Não posso falar por eles, mas acho que Bert e Quinn também estavam se divertindo.

Hey, se Negócio arriscado tinha nos ensinado alguma coisa, de vez em quando, a gente tinha de testar como os franceses… beijavam. Pelo menos até a casa noturna fechar. O que, naturalmente, aconteceu. Às seis da manhã, fomos expulsos da boate. O Sol ofuscante já estava em seu lugar no horizonte, os parisienses andando apressados pelas ruelas de paralelepípedos, seguindo caminho para o trabalho e iniciando seu dia. Não nos deixando ir embora sozinhos, Gerard e Quinn escoltaram Bert e eu até nosso albergue da juventude.

O albergue ficava num belo edifício coberto de vinha, com uma fachada de pedra de cor creme, localizado no 4o distrito, bem no coração de Saint-Gervais, uma área conhecida por suas ruas estreitas, mansões particulares e casas geminadas. Não tinha como a localização ser melhor: dava para ir andando a Notre-Dame, ao Sena e, é claro, ao Centro Georges Pompidou, onde conhecemos Gerard e Quinn. Nosso quarto podia ter o mínimo necessário, nada além de duas beliches, mas era limpo e barato. A única desvantagem era ter de dividir nossos aposentos com dois sul-africanos empertigados, loiros de olhos azuis.

Gerard sorriu.

— Esta é uma das minhas ruas favoritas em Paris. Venho aqui para fugir. Amo a história daqui.

Em silêncio, observamos nosso entorno. Um caminho de tijolinhos levava à bela Église

Saint-Gervais, que era a igreja mais antiga na margem direita do Sena. Luminárias de ferro tradicionais estavam penduradas nas laterais dos edifícios. Bicicletas com cestas de vime estavam estacionadas em frente ao café local, cuja fachada era pintada de azul. Nós quatro ficamos em frente às portas de madeira entalhada do albergue, bem debaixo de varandas de ferro ornamentado estilo Julieta, com nossos próprios Romeus franceses. A despedida, de fato, foi uma doce tristeza. Mas o romance não poderia terminar. Não ainda! Tínhamos quatorze horas restantes na cidade do amor! Quinn puxou Gerard de lado. Bert e eu nos encostamos na parede, falando em sussurros.

— Estou com cara de nojento? — perguntei — Como um rato de esgoto parisiense?

— Seu cabelo está um pouco bagunçado, mas você está bonito. — ele fez uma pausa — E eu?

— Você nunca fica feio.

Um grupo de meninas saiu do albergue e parou no meio do caminho. Elas olharam para os nossos dois franceses bonitos e então avistaram Bert e eu. Adagas de ciúmes dispararam de seus olhos e talvez nojo.

— Você viu aquelas meninas secando o Gerard e o Quinn? — perguntei.

— E você as culpa?

Nem um pouco.

Gerard e Quinn se viraram para nos encarar.

— Quinn e eu temos dias de férias que podemos usar. Sem dormir, nenhum de nós consegue ir para o trabalho. Então, vamos buscar vocês daqui algumas horas, mostrar um pouco de Paris. — ele fez uma pausa — Se estiver tudo bem para vocês.

Ele estava brincando? Tanto Bert quanto eu sorrimos.

— Dors bien, ma belle — disse Gerard. Durma bem — Buscamos vocês ao meio-dia.

Gerard e eu trocamos um último beijo e, então, ele e Quinn dobraram a esquina e foram embora. Bert e eu subimos aos trancos e barrancos a escada até o nosso quarto e nos deixamos cair na parte de baixo do beliche, sorrisos patetas distendendo nosso rosto.

— Ai, meu Deus. — disse Bert — Acho que estou apaixonado.

Apoiei-me nos cotovelos. Amor? Ele não podia estar se apaixonando. Para ser mais específico, eu não poderia estar me apaixonando. Era só desejo, aquela primeira reação química que provocava tanto o cérebro quanto o corpo. Certo? Eu ainda estava na faculdade, no norte do estado de Nova York. Gerard morava aqui, em Paris. Aquilo nunca iria dar certo. Mas, meu Deus, se eu tivesse uma lista de tudo que eu sempre tinha sonhado num homem perfeito, Gerard teria pontuado em todos os quesitos.

Bufei.

— Não seja ridículo. Acabamos de nos conhecer.

— Frank, “Viva! A vida é um banquete e…”

— “…a maioria dos lastimáveis otários está morrendo de fome!”

Caímos numa gargalhada tonta quando eu terminei a citação do filme favorito de Bert, de todos os tempos.

— Sobre o que você e Quinn falaram, afinal?

— Música, Beatles, cultura americana, coisas assim.

— Então vocês conseguiram se entender?

— Teve um pouco de confusão, mas conseguimos — ele bocejou, não fazendo nenhuma tentativa de cobrir a boca — Frank, estou muito cansado, mas acho que não vou conseguir dormir. Meu coração ainda está disparado.

— Bom, a gente deveria tentar.

Arrastei-me pela escada de madeira até o beliche superior. Deitado ali, olhando para o teto, pensei: Não. De jeito nenhum eu poderia estar me apaixonando. Não, não eu. Não tinha a menor possibilidade de eu estar me apaixonando.

 

Acordei com o som de alguém batendo na porta do nosso quarto. Olhei no meu relógio. 11h20. Vinte minutos depois do horário do nosso check-out. Quarenta minutos até Gerard e Quinn chegarem. Não tínhamos feito as malas, não tínhamos tomado banho. Desci correndo a escada do beliche, abri a porta e gritei para Bert:

— Acorda!

Ele não se moveu, só continuou roncando. Uma mulher corpulenta com um coque apertado apertou os lábios e colocou a mão no quadril. Sua outra mão segurava um esfregão.

— Por favor, s’il vous plaît — eu disse — Podemos ter quinze minutos… quinze minutes? Perdemos a hora. — apontei para as nossas malas ainda por fazer e juntei minhas mãos numa posição de oração, para o caso de haver qualquer falta de clareza — Quinze minutes? S’il vous plaît?

A mulher fez uma careta. Certamente, ela ia dizer que não. Porém, ela me surpreendeu quando não recusou.

— Quinze minutes. Pas plus.

Nem um minuto a mais. Ela deu meia-volta sobre o sapato sem salto e seguiu caminho pelo corredor.

— Merci — agradeci de longe, antes de correr para Bert e sacudir até ele acordar — Acorda. Agora. Dormimos demais.

Temos cinco minutos para tomar banho. Eu vou primeiro. Comece a fazer as malas.

Bert se sentou.

— Merda.

Disparei para o banheiro. Logo, éramos dois demônios da Tasmânia molhados girando em torno de uma explosão de roupas e sapatos. Não exatamente mochileiros, nós dois estávamos com malas pequenas de rodinhas. E não querendo arriscar percevejos ou outras criaturas estranhas que poderiam nos morder no meio da noite, tínhamos até trazido nossos próprios cobertores. Nossas malas mal fechavam.

— Sente em cima — eu disse — E eu puxo o zíper.

Vinte minutos depois, sem fôlego, Bert entregou a chave do quarto a um cara que parecia um estudante alienado atrás do balcão. Ele não ergueu os olhos da revista, apenas continuou lendo. Descemos e colocamos a nossa bagagem na área de armazenamento do porão. Saltitantes, exatamente ao meio-dia, fomos até o saguão, à espera de ver nossos Romeus esperando por nós. Eles não estavam lá. Cinco minutos se tornaram quinze. Empolgação se transformou em tristeza. Quinze minutos transformados em 45. Andamos de um lado para o outro no saguão do albergue, nos sentindo como o personagem de Edvard Munch em O Grito: agonia pura, tremendo de ansiedade.

Senti como se estivesse no colégio de novo: à espera do telefonema que nunca vinha, os sentimentos de rejeição absoluta, a humilhação. Menos de oito horas depois de me conhecer, Gerard tinha conseguido partir meu coração em pedaços minúsculos. Eu não o culpava. Ele não tinha nada a ganhar com o fato de me conhecer melhor. Bert e eu iríamos embora naquela noite.

— Não posso acreditar que eles nos deram o cano — disse Bert.

Olhei para o meu relógio. Agora eles estavam com mais de uma hora de atraso. Eles não iam aparecer de jeito nenhum.

— Vamos tomar um café.

— Vem com um carro de brinde?

— Ah, Mame precisa de combustível?

Porém, agora, nada poderia nos fazer sorrir.



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