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História Seven love letters - Quero o divórcio... E o cachorro vai junto


Escrita por: myavengedromanc

Capítulo 4 - Quero o divórcio... E o cachorro vai junto


 

Era hora de buscar Chris na estação de trem. Tínhamos concordado que ficar parado no tráfego do aeroporto de Chicago na hora do rush, seria inútil. No caminho, dois carros de polícia estavam bloqueando a minha via. Pela cara da coisa, uma apreensão de drogas ou um roubo de carro tinha dado errado. Havia policiais parados com armas em punho e um bandido irritado de calça jeans folgada sendo enfiado na parte de trás de uma viatura. Fiquei ali parado no meu carro, nervoso, e não por causa da cena se desenrolando na frente da minha janela do passageiro.

Dez minutos se passaram. Meu celular tocou.

— Onde diabos você está?

— Estou a caminho. Aconteceu algum tipo de…

— Jesus Cristo, Frank. Só chegue logo. — disse ele, e em seguida, o telefone ficou mudo.

Os policiais finalmente me deixaram passar. O bairro da moda estava lotado de carros.

Cerca de meia quadra da estação de trem, fiz uma conversão à direita logo após Wicker Park e liguei para o meu marido. Ele ficou confuso sobre onde eu disse que tinha estacionado e não me deu um segundo para explicar. Buzinei forte quando enfim o vi, embora algo em mim quisesse apenas ir embora. Ele veio pisando duro em direção ao carro. Meu sorriso trêmulo desapareceu e se tornou uma cara fechada. Chris jogou a mala no banco de trás, arrastou-se para o banco do passageiro e bateu a porta.

— Puxa, não precisa ficar tão feliz em me ver.

— Eu estava, mas então…

— Ótimas boas-vindas.

Na volta para casa, eu mal conseguia enxergar através das lágrimas de raiva e frustração.

Brigamos o caminho todo. Sobre o quê? Não importava; nunca era importante. Manobrei o Jeep na nossa vaga e bati a mão no volante, soluçando. Quando ele tinha ficado tão irritado?

Quando eu tinha ficado tão triste? Nosso casamento não tinha começado assim. Por um tempo, foi incrível.

Ele pediu desculpas. Tinha perdido a paciência. Estava cansado. Não estava se sentindo bem.

Eu estava cansado das desculpas.

Eu estava cansado das explosões.

Eu estava simplesmente cansado.

Subimos as escadas até nosso apartamento. Ele tirou da mala dois vidros de perfume Jo Malone. Aparentemente, ele tinha passado uma hora escolhendo com a vendedora, em Londres. Ele perguntou se eu tinha gostado. Borrifei nos meus pulsos e confirmei.

Enxuguei as lágrimas e agradeci. Talvez eu estivesse exagerando. Talvez existisse algo naquele casamento que pudesse ser salvo. No entanto, se existia, por que meu coração escureceu no momento em que o vi? Por que eu me sentia mais eu mesmo quando ele não estava por perto? Como é que alguém podia acionar todas as reações erradas, fazendo a gente se sentir incompleto? Como foi que eu também acabei fazendo tudo errado?

Eu tinha chegado ao meu ponto de virada.

Chris começou a roncar, cochilando na poltrona verde estofada demais. Fiquei simplesmente olhando para ele, um pouco anestesiado, perguntando quem era aquele homem com quem eu tinha me casado. Eu não o reconhecia. Como foi que eu havia deixado as coisas chegarem àquele ponto? Roncos à parte, era quase como se eu não pudesse suportar o modo como ele respirava. Peguei-me tendo um devaneio, matando-o num acidente de avião.

Nada bom.

Antes que Chris pudesse ir ao encontro da morte prematura, ele acordou e pegou as chaves de cima do balcão da cozinha.

— Volto mais tarde. Vou malhar e depois tenho um almoço de negócios.

Deprimido, deitei no sofá, observando um avião rasgar o céu azul pálido de Chicago, ouvindo os pássaros cantando a distância. Liberdade era algo difícil de se encontrar com o fardo daquela minha vida. Liguei para a agência de emprego e perguntei se tinha aparecido alguma oportunidade.

— Desculpe, Sr. Iero. — disse a recrutadora — O movimento no mercado publicitário de Chicago está morto. Não há nada no momento, mas tenho esperanças de que as coisas vão entrar logo no ritmo. Eu te ligo no segundo que ouvir falar de qualquer coisa.

Lá estava eu, na esperança de encontrar trabalho como diretor de arte, diretor de criação, designer, um trabalho do qual eu já não gostava mais, talvez nunca tivesse gostado. Eu tinha caído nessa vocação porque era o jogo que meu pai tinha jogado com sucesso. Ele era um executivo requisitado, e o selo do meu pai no mundo da publicidade era o motivo de termos nos mudado tanto. 

Bert e eu muitas vezes brincávamos que eu tinha sido capaz de conhecer muito do mundo por causa das mudanças dos meus pais. De Nova Jérsei a Chicago, Chicago a Boston, de Boston a Londres, de Londres a Califórnia, da Califórnia a Virgínia, a Tucson, depois de volta a Virgínia e, então, à Califórnia novamente. Pensando nisso, eu nem era filho de militar, como a minha mãe. Não, meu pai era um Mad Man, um publicitário.

Nossa volta para a Costa Leste me afetou mais do que a maioria das pessoas, pois aconteceu no final do meu primeiro ano do ensino médio, enquanto eu frequentava a Chicago Academy for Performing and Visual Arts, fazendo teatro e canto, embora eu tivesse continuado envolvido com o clube de teatro depois da mudança. Ficava num subúrbio ao sul de Boston, no Cohasset High School, onde a arte se tornou uma parte da minha vida. No último ano, meus sonhos metamorfosearam, e eu decidi trocar as árias e os monólogos por blocos de desenho, tintas e gizes pastéis. Em vez de cantar One na Broadway, eu acabaria na Universidade de Syracuse, com especialização em design de publicidade, um último esforço de tornar meu pai orgulhoso. Após a formatura, não demorou muito para eu entender que aquele sonho simplesmente não era meu. Dezessete anos depois, eu era um designer desempregado querendo redesenhar a vida.

Eu precisava organizar minhas ideias, focar e descobrir exatamente o que estava procurando, então decidi levar o Ike para uma longa caminhada. Era um belo dia quente de primavera, o Sol estava brilhando, e as aves gorjeavam doces canções. A calçada estava movimentada, cheia de famílias… e bebês.

Eles estavam por toda parte.

Mães caminhavam empurrando carrinhos de bebê ou de mãos dadas com crianças pequenas.

Um pai todo bem-arrumado usava um canguru BabyBjörn chique, com um saltitante bebê de olhos azuis dentro, todo sorrisos. Era quase uma piada cósmica, o mundo me lembrando de que eu estaria batendo na casa dos 40 dentro de alguns meses.

E não tinha filhos.

Então, só para martelar esse fato lamentável na minha cabeça, um homem passou por mim, acompanhado por uma bebê que exibia um sorriso de “acabei de aprender a andar” no rosto coberto de baba, que esbarrou nos meus joelhos. A menina deu um sorriso banguela, seus grandes olhos azuis brilhando. Meu coração balançou.

Meus amigos sempre perguntavam quando eu planejava adotar crianças ou pegar uma barriga de aluguel, isso logo depois de terem me assustado até a morte, falando dos horrores de trocar fraldas e noites sem dormir. Perdoem-me, mas eu não gostei de ter ouvido que eu poderia ser acertado por um jato de xixi ao tirar a fralda, que teria que lidar com as cólicas, os choros, os dramas, as doenças... Claro, eu entendia, era um bebê, mas diarreias verdes e catarros?

No meu coração, sei que poderia ter superado todos os meus medos. Eu amava crianças. No entanto, com constantes desculpas fáceis, meu medo sempre tomava conta de mim. O mundo estava perdido. Filhos custavam caro; não tínhamos condições financeiras para isso.

Precisávamos passar mais tempo juntos. Não teríamos mais vida, eu não seria capaz de viajar, de sair. E se optássemos por uma inseminação artificial e o bebê nascesse com deficiência? As coisas não eram estáveis o suficiente.

Estávamos muito velhos.

O ponto central da questão era que, se eu quisesse de fato ter tido filhos com o Chris, a gente já teria tido. Eu precisava de alguém para me dizer que pai maravilhoso eu seria, que homem maravilhoso eu era, e Chris não estava fazendo isso por mim.

Arrastando os pés, voltei para o apartamento e direto para meu salva-vidas: meu computador. Quando o nome de Gerard apareceu na minha caixa de entrada, quase desmaiei.

Estupefato, balançando a cabeça, tremendo no meu all star branco, fiquei olhando para o nome dele pelo que pareceram horas e, quando enfim ganhei coragem para abrir o e-mail, tive de reler a mensagem cinco vezes para me certificar de que era realmente ele.

 

De: Gerard

Para: Frank

Assunto: Re: Minha carta está muito atrasada 

Caro Frank,

Da mesma forma que quando escrevi a minha primeira carta, não sei como começar esta. Vinte anos de memórias estão quebrando na minha cabeça como ondas. Vinte anos exatamente. Como faço para expressar as palavras que ficaram adormecidas, preservadas em algum lugar, mas um pouco cobertas pela poeira do tempo?

Sinceramente, quando vi seu e-mail pela primeira vez, não acreditei que era você, o Frank bonito e alegre que eu tinha deixado partir para sempre. Pensei que se clicasse no link do seu blog, eu seria levado a algum site pornô e cairia na pegadinha. Mas como você fez comigo, eu fiz uma pequena pesquisa, e procurei seu nome, mas com um sobrenome diferente do que da última vez.

Lembro-me da plataforma na estação parisiense (Gare d’Austerlitzou Gare de Lyon?). Meu cérebro ainda está um pouco nebuloso.

Dissemos nossos “até logo”, mas um adieu rapidamente os substituiu. Claro, pensando agora, tudo na minha cabeça estava me empurrando para subir naquele trem, para continuar nossa aventura de amor no sul da França. Eu deveria ter mantido o meu ardor. Falta de coragem? Durante os dias e noites seguintes, eu me culpei. Eu me culpei muitas vezes.

Sua mensagem e o blog são como um vento tempestuoso varrendo a poeira da minha memória. Bilhões de palavras estão surgindo nos meus pensamentos, uma empurrando a outra. Eu também tentei te procurar algumas vezes, encontrar uma maneira de entrar em contato com você, mas a vida decidiu outro caminho para nós.

Não se culpe. Na minha cabeça você era um príncipe (meu príncipe americano), e a precisão da sua narrativa é fantástica. Sinto vergonha de não ter mais todos aqueles milhares de detalhes da nossa história. Envergonhado. Espero que eu não esteja te deixando constrangido. Só estou colocando palavras nesta “folha em branco”, sem discriminação, mesmo depois de vinte anos.

Eu não sabia como começar esta mensagem, e ainda estou com dificuldade para terminá-la. Vou parar agora. Palavras demais para escrever. Poucos dedos para dizê-las.

Espero que esta primeira mensagem não seja a última.

Cuide-se,

Gerard

 

 

Durante a semana seguinte, uma enxurrada de novas cartas começou, uma após a outra, e-mail após e-mail. Pela primeira vez na minha vida, não me contive e me abri completamente para ele. Era algo fácil de fazer atrás de uma tela de computador. Meus dedos voavam pelo teclado, digitando, revelando pedaços e fragmentos da minha situação a Gerard, o que tinha dado certo e, principalmente, o que tinha dado errado. Um pouco reminiscentes de uma época passada, quando os amantes separados pela guerra só podiam se comunicar por meio de cartas, nós compartilhamos todas as esperanças, sonhos e medos, cada erro. Aceitamos os defeitos do outro, sem apontar dedos, sem julgar. 

Nossa comunicação entrou em sobremarcha e passamos a trocar três a quatro e-mails por dia, alguns deles em francês. Como eu não tinha falado uma palavra da bela língua em mais de vinte anos, confiei no Google Tradutor para me ajudar. Barreira linguística à parte, eu estava me comunicando com alguém como eu nunca tinha feito antes. Como meu marido e eu nunca tínhamos feito.

Logo fiquei sabendo que Gerard nunca havia se casado com a mãe de seus filhos, um menino de 10 anos, chamado Maxence, e uma menina de 12 anos, Elvire. Gerard e Frédérique se separaram em 2002, e no meio de uma crise de meia-idade, ele se envolveu com um homem mais jovem que conheceu durante uma viagem de trabalho; um relacionamento que durou pouco. Ele tinha a guarda compartilhada dos filhos e os visitava nos fins de semana até o câncer tirar a vida de Frédérique, em outubro de 2006, uma semana antes do sétimo aniversário de Max. Como um pai solteiro, o mundo de Gerard girava em torno dos filhos. Mas ele recentemente tinha se casado com uma física russa muito jovem, Natasha, que em vez de amor mostrava apenas tolerância pelos filhos dele. Gerard e Natasha tinham passado por um relacionamento ioiô por três anos, antes que ele sucumbisse às pressões do casamento. Ele pensava que a estabilidade mudaria a relação tensa que Natasha tinha com as crianças. Aparentemente, isso não aconteceu. Ela se tornou mais sentimental, o amor dele foi esfriando, e agora ele estava no processo de pedido de divórcio.

De certa forma, parecia que ele precisava de mim tanto quanto eu estava começando a precisar dele. Poderia haver algo mais entre nós do que a amizade virtual que estava brotando? Em especial depois que ele descreveu a cor exata dos meus olhos sem ter me visto durante vinte anos, mas empurrei o pensamento para o fundo da minha mente.

Mesmo que Gerard tivesse fornecido um tipo de sistema de apoio anônimo e me dado um impulso de confiança tão necessário, eu não abandonaria meu casamento por causa dele.

Contudo, o que ele representava — aquele algo mais, algo maravilhoso, existindo para mim — era outra história.

Ele era a esperança.

Precisei de dez dias para encontrar coragem. Primeiro, veio uma grande briga com Chris e, depois, dois martínis de vodca amorteceram todo meu medo. Com o nível de álcool no meu sangue pairando em algum lugar entre coragem e loucura, eu finalmente disse ao meu marido o que deveria ter dito a ele muitos anos antes:

— Quero o divórcio. E o cachorro vai junto.

Em vez de lutar por mim, Chris foi para a casa do pai dele, e a cavalaria veio correndo, cascos ecoando, e cornetas com toda força.

— Bert, por favor, me diga que eu não sou um idiota.

— Frank, você não é um idiota.

— Estou fazendo a coisa certa?

— Você sabe que está. Agora não me pergunte de novo.

Clique.

— Jess, eu vou deixá-lo.

— Diga-me quando e vou estar lá.

— Próximo fim de semana?

— Feito.

Clique.

— Mãe, posso voltar para casa?

— Vou com você. Quando você quer sair daí?

— A Jess vem me ajudar a fazer as malas. Então, não neste fim de semana, no próximo.

— Vou marcar minha passagem.

Clique.

— Bert, me diga que eu não sou um idiota.

— Você não é um idiota.

— Estou fazendo a coisa certa, não estou?

— Você não quer a minha resposta.

— O que você quer dizer?

— Não gosto do jeito que ele… — parou no meio da frase — Vou guardar minhas opiniões para mim mesmo até que você saia de casa e que o divórcio seja definitivo.

Recado entendido.

Clique.



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