Sioux Falls
Danielle fechou os olhos depois de todo o interrogatório da polícia. Havia contado tudo, omitindo as partes da sua confusão mental. Tentou mostrar que foi um atentado aos dois, em vista de que a qualquer momento os investigadores poderiam ir até seu apartamento e ver o massacre que lá ocorrerá.
O melhor palpites da polícia era que alguém não estivesse satisfeito com o relacionamento dos dois, mas Dani continuava sendo suspeita.
Olhou para Rachel no sofá e a visão e a tormenta voltaram. Era sempre a mesma sequência de fatos: Rach jogada no chão, seus ossos começando a quebrar, seus gritos ecoando pela mente e, por fim, se transformando em uivos.
Amava tê-la por perto, mas só conseguia pensar no perigo que estava fazendo-a correr.
Sabia que Dean e Sam não estavam no hospital por estarem - legalmente - mortos. Se lembrava muito bem do lance dos assassinatos de 2005. Uma divergência de casos, apostava. Só queria que, de alguma forma, eles estivessem ali e trouxessem a tranquilidade por ser mais alguém que entendesse o que ela estava passando.
Fechou os olhos e tentou dormir, mas nem depois de tanto sofrimento os pesadelos a deixaram em paz.
◇
_ Ei, você já se arrumou! - Rach entrou no quarto, vendo a amiga sair do banheiro sem a roupa de hospital.
_ Me sinto muito melhor vestindo minhas preciosas roupas. - sorriu. - Obrigada por pegá-las para mim.
_ Na verdade, foi o Sam. - ela também sorriu. - Viram te buscar. Acham melhor você ficar no hotel com eles, já que não pode sair da cidade.
_ Ah, claro... - concordou. - Não sei nem se tenho uma casa agora...
A amiga a abraçou, tentando desempenhar seu papel da melhor forma que conseguia. Danielle desfrutou desse carinho.
_ Muito obrigada por tu... - ao abraçar a amiga, sentiu algo por debaixo de sua blusa larga. Foi rápida ao tirar o objeto de cano gelado de sua cintura, vendo a amiga ficar totalmente sem argumentos. - Uma arma? Por que você está com uma arma?!
_ Só estou protegendo você, ok? -ela tentou ser rápida em se explicar, afinal, não era ela que estava completamente sem chão e com uma arma no momento. - Você e Brian sofreram um atentado... Alguém podia aparecer aqui e...
_ Terminar o trabalho? - Danielle abriu o objeto, analisando as balas. - Alguém que fosse extremamente sensível a balas de prata... O que você sabe?
_ São de prata? Nem me toquei sobre isso...
_ Está mentindo!
_ Não, não estou!
Danielle sacou a arma, apontando-a para a melhor amiga. Sentiu vontade de chorar, mas sabia ser forte, só não conseguia admitir para si mesma o que era claro ali.
_ O que você é?
_ Que? Como assim o que eu sou?
_ Você é um lobisomem, não é?
Rachel parou por um instante, respirando fundo e aplaudindo mentalmente o sucesso da amiga como caçadora. Sempre soube o quanto ela fazia falta no ramo, mas não sabia exatamente o porquê.
_ Como você sabe?
_ Toda vez que te olho tenho a visão de você se transformando... Ah meu Deus, minha melhor amiga é um monstro!
_ Eu não sou um monstro, Dani. - tentou se aproximar, mas a outra voltou a erguer a arma com convicção. - Só estava tentando te proteger.
_ Me matar com essa arma é proteção?
_ E você vai me matar com ela?
Danielle ficou em silêncio por um momento, deixando que a tristeza a tomasse.
_ Não... Eu vou sair desse quarto... - caminhou até a bolsa de Rachel, pegando o celular da amiga. Depois, pegou suas coisas e se voltou para a questão. - E você vai ficar trancada no banheiro. Tem grades, não vai conseguir sair a não ser que alguém abra.
Com a arma ainda apontada para a garota, a incentivou a caminhar.
_ Tudo bem... - Rachel foi até o banheiro, cedendo. - Mas aqui vai um conselho para provar que sou sua amiga e que quero o seu bem: Saia da cidade, há outros atrás de você. É melhor se tornar foragida do que ser pega por eles.
Danielle se apressou em trancar a porta.
_ Outros lobisomens?
_ Outras criaturas.
Dani respirou fundo, guardando a chave na bolsa e seguindo para fora do quarto. Deixou a arma presa em sua cintura, pronta para ser usada.
Correu pelos corredores com medo de comprovar o que Rach havia falado bem ali.
Outras criaturas? Por quê?
Quando chegou ao estacionamento, abriu a bolsa em busca de seu celular, se sentando no meio fio onde podia ser escondida pelos carros.
A demora ao atender a fez ficar ainda mais impaciente.
_ Dani?!
_ Sam, preciso que venham me buscar agora!
(...)
Danielle viu os irmãos descerem do Impala. Sammy foi o primeiro a abrir um sorriso ao reconhecê-la, mas Dean, como sempre, permaneceu em sua postura de quem pouco se importava. Entretanto, ela sabia que ele ainda era o filho obediente e leal. Aqueles olhos verdes eram os mesmos que antigamente, sustentando a bondade carregada dentro de um corpo tão rabugento.
Ele ainda era o Dean que ela odiava e, visivelmente, mil vezes mais irritante. Era o que mais amava nele.
Vê-los trouxe ao seu coração a esperança de que tudo ficaria bem novamente, pois, de alguma forma, se sentia protegida. Como John havia prometido.
_Ah meu Deus! - Danielle gritou, indo abraçar Sammy. - Você está enorme!
_ E mais uma vez o Winchester incrivelmente alto é o centro das atenções. - Dean ironizou, revirando os olhos e falando baixo para poder desfrutar de sua implicância sozinho.
_ E você ainda é praticamente uma anã! - Sam abraçou a amiga, a tirando do chão. - É muito bom poder vê-la consciente.
_ Eu que o diga... - Dani se virou para o irmão mais velho. - Olá Dean.
_ Oi, Shaw. - ele ainda tinha a mesma postura prepotente de antigamente. - Espera que eu te de um abraço também?
_ Minha vida pode ter entrado em estado de destruição e minha sanidade está bastante comprometida, mas eu ainda recuso qualquer afeto vindo de você.
_ Por que a gente não deixou ela morrer mesmo? - Dean se virou para Sam, usando o bom humor como forma de expressar o que ele tanto queria que fosse no sentido maligno.
Sam ignorou, já acostumado com a aversão dos dois.
_ Sobre isso... - começou a dizer.
_ Precisamos conversar, eu sei. - Dani o cortou. - Mas será que da para ser em outro lugar? Aqui não é seguro.
_ Claro.
Os irmãos concordaram, seguindo para o Impala, mas Dean se virou para a garota antes de entrarem.
_ Eu dirijo e o Sam senta do meu lado, você vai atrás. - ordenou.
_ E dai?
_ E dai que todas as vezes que meu pai insistia em te levar para fazer algo conosco, ele me tirava da frente para te colocar no meu lugar! - ele agia como criança.- Sam na frente, você atrás.
O mais novo se virou para Danielle, quase suplicando para que ela não rebatesse, mas ela não podia deixar tamanha falta de noção de lado. Ela nem estava pensando em se sentar na frente.
Caminhou até o automóvel e jogou sua bolsa no banco de trás, fazendo Dean acreditar que ela iria fazer o que ele havia mandado. Todavia, caminhou até o banco do carona, abrindo a porta e se sentando de modo que houvesse bastante espaço para Sam se acomodar ao seu lado. A essa altura, Dean já queria estrangulá-la.
_ Você não acha que vai me atrapalhar a dirigir se sentando ai?
_ Você não acha que me dar ordens só vai gerar mais reações como essa? - rebateu.
O Winchester mais velho buscou o olhar do irmão, implorando por ajuda.
_ Ela está certa. - Sammy deu de ombros.
_ Filha da... - socou o ar. - Tudo bem...
Entrou no carro e se sentou, batendo a porta com toda a força. Sam fez o mesmo, mas de maneira natural.
Quando Dean foi passar a marcha, encostou acidentalmente na perna de Danielle, fazendo tanto ela quanto Sammy olharem para ele.
_ O que foi? Se esta incomodada vá lá para trás.
_ Se esta incomodado, dê logo a partida. - continuou rebatendo. - Quanto mais rápido chegarmos, mais rápido saio de perto de você!
(...)
Quando chegaram ao motel, Dani e Sam riam de algumas lembranças, enquanto Dean se sentia claustrofóbico. Aquela garota continuava contaminando o ambiente com a sua pesada presença, mas agora com muito mais intensidade.
Sam estava realmente feliz por tê-la perto e - aparentemente - bem. Todavia, se sentia incomodado com a implicância do irmão. Gostava muito da garota para querer que ela passasse raiva. Mas, conhecendo como conhece, ela também adorava a provocações de Dean.
_ Vejo que o espírito Winchester não saiu de vocês. - Danielle falou, assim que entrou no quarto erótico de duas camas.
_ Espírito Winchester? - Sam riu.
_ É... Caçar por todo país, viver em motéis...
_ Alugar hotéis caros ou apartamentos temporários é um luxo que nossos cartões fraudados não podem nos dar. - Dean respondeu.
_ Ainda fraudam cartões?
_ Sim, mas também trabalhamos bastante. - Sam respondeu, fazendo o irmão arquear a sobrancelha em dúvida.
_ Corrigindo: eu trabalho! - Dean falou. - Quem da duro na sinuca sou eu!
_ Sinuca, claro! - Danielle gargalhou.
_ Algum problema?
_ Não... É que... - ela respirou fundo, se sentando em uma mesinha de centro perto da TV. - É por essas e outras que larguei esse trabalho. Tudo parece muito absurdo.
_ Parece que a vida tem estado bem descontente com você. - Dean se sentou em uma das camas. - A julgar que está aqui agora.
_ É... - a garota respondeu, desanimada.
_ Dani... Conte-nos o que aconteceu. - Sam, que continuava em pé, perguntou.
Danielle esfregou as mãos em sinal de nervosismo, se preparando para o extenso monólogo que explicaria toda a sua trama.
_ Aconteceu um pouco depois que meu avô morreu...
_ Sebastian? - Dean interrompeu, fazendo o mais novo o olhar em repreensão. Não era hora para implicâncias.
_ Não... Anthony.
_ Anthony faleceu? - Sam não se conteve. - Não ficamos sabendo de nada.
_ Antes tarde do que nunca. - Dean pensou alto, sem se dar conta que os dois também ouviam.
Danielle olhou para ele com desejo de matá-lo, mas - para desviar a atenção - Dean levantou para pegar uma cerveja.
_ Foi de causas naturais, não acho que seja de grande assunto no meio dos caçadores. - ela continuou explicando. - Vocês sabem, toda a glória de morrer em uma caçada.
_ Ele ainda caçava? - Dean continuou falando sem pensar. - Quer dizer, ele era de idade. Pegar um rifle devia ser esforço para o ciático.
_ Você nem sabe o que é ciático. - Sammy disse. - E é melhor você calar essa boca.
_ Tanto faz...- Dani decidiu deixar de lado os comentários do Winchester mais velho. - Foi a última vez que fui a fazenda. Já na volta para Sioux Falls eu achei ter visto um corpo jogado na estrada. Quando desci e olhei a garota que jorrava sangue por todas as saídas, era eu! Quando dei por mim, estava de volta no carro. Por um tempo pensei ter só dormido no volante, até ocorrer outras visões e os sonhos.
_ E como são?
_ É sempre algo relacionado a morte, tortura ou sofrimento e todas ligadas a algo sobrenatural. Na maioria, eu sou a responsável por matar. Ou alguém próximo a mim esta sofrendo. Vejo demônios por todos os lados, escuto uivos. Me olho no espelho e me transformo em coisas.
Sam e Dean se entreolharam, sem nem fazerem ideia do que a garota pode estar passando.
_ Há algo recorrente nesses sonhos? - Dean perguntou.
_ No começo não, mas depois a frase "Diga sim" se repetia na minha cabeça.
_ A frase escrita com sangue na sua sala. - Sammy falou, fazendo-a concordar. - Você disse que tem visões com pessoas próximas, já aconteceu algo a elas?
_ Nunca tive sonhos ou visões com o Brian, mas tenho total certeza que tem algo a ver. Como se fosse um aviso de que as coisas iriam piorar. - contou. - E...
_ E...?
Danielle levou a mão a cintura, tirando a arma presa pela calça. Os irmãos prestavam atenção em cada detalhe.
_ Peguei isso da Rachel. - explicou. - Sempre tive visões com ela se transformando em lobisomem e... Bom, ela carregava essa arma com balas de prata. Eu a interroguei e ela acabou assumindo ser um monstro.
_ Deixamos você na mão de um lobisomem?! - Sam parecia não acreditar.
_ Você a matou? - Dean perguntou.
_ Não... A tranquei no banheiro do quarto.
Ele passou a mão pelo rosto, frustrado.
_ Você tinha uma arma carregada e um lobisomem bem na sua frente. Como você não a matou?
_ Dê um desconto, Dean, há menos de uma hora as duas ainda eram melhores amigas.
Dean caminhou até o criado mudo, pegando as chaves do Impala.
_ Aonde você vai? - a garota perguntou.
_ Ao hospital, fazer o que você devia ter feito.
_ Não pode ir! - Danielle se levantou, indo atrás dele.
_ Está com pena da sua amiga lobo?
_ Ela é o menor dos nossos problemas. - falou. - Disse que estava tentando me proteger e que tenho que sair da cidade.
Os irmãos travam uma luta interna tentando decidir o que fazer. Mas Sam e Dean eram seres pensantes totalmente diferentes um do outro, apesar do mesmo sangue.
_ Ela está certa... - Sam tentou dizer.
_ Isso quer dizer que Rachel sabe de alguma coisa. - Dean interrompeu. - Vou ao hospital e você fica com ela. Saímos da cidade quando eu voltar.
_ E para aonde vamos? - Danielle perguntou, se virando para Sam.
_ Bom... - ele olhou para o irmão, que também esperava a resposta. - Se essas visões começaram depois que você voltou da fazenda, talvez lá seja um bom ponto de partida.
◇
Dean estacionou em frente ao hospital, indo até o compartimento de armas - tomando cuidado para não ser visto - e saindo de lá com o que precisava.
Mesmo não sendo uma visita frequente, estava presente quando trouxeram Danielle ao hospital e se apresentou como primo da garota. Por isso, não teve sua passagem barrada.
Ao chegar no quarto, havia um homem arrumando o lugar. Seus olhos correram imediatamente para a porta do banheiro, que estava aberta.
_ Você deve ser parente da fugitiva. - o homem perguntou.
_ O que?
_ A paciente. - o homem se explicou. - Senhorita Shaw. Prendeu a amiga no banheiro e fugiu sem pegar a alta. Você chegou meio tarde, a polícia já veio e está procurando por ela.
_ E a amiga?
_ Eu a encontrei, deu o depoimento para a polícia e foi liberada. - o homem continuou a contar. - Não faz ideia de onde Senhorita Shaw possa estar?
_ Não... - Dean fez uma pausa. - Ela não entrou em contato conosco.
_ Pobre moça... - o homem voltou aos seus afazeres. - A polícia já está pela cidade procurando por ela, devia se entregar e assumir seus crimes. Ter fugido só piorou as coisas.
Dean não respondeu, contendo o desejo de matar Rachel e seguindo para a saída mais próxima. Não podia ser visto. Tirar Dani da cidade agora era uma prioridade.
À medida que caminhava, a raiva o consumida, pois a menina lobo era um ótimo trunfo para desvendar os enigmas que rondavam Danielle. Mas ele teria que se contentar em apenas protegê-la. Afinal, não seria hoje que teria sucesso em alguma coisa.
Tirou o celular do bolso, seguindo para o carro e se escondendo da viatura que passava. Tudo por medo de ser reconhecido como primo da garota ou, pelo assassino de mulheres de Sioux Falls. Ele nunca ira esquecer dessa história.
_ Dean? - Sam atendeu.
_ Precisamos tirar a garota da cidade. - o mais velho falou. - Não há só monstros atrás dela.
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