História Show Me What I'm Looking For - Hi Miami

Natalie

Eu não tenho um sono pesado, acordo por qualquer coisa, e dentro do avião não foi diferente.
Só consegui dormir por um pequeno tempo, talvez por causa da ansiedade ou por causa da grande quantidade de café que eu havia ingerido, o resto da viajem toda fiquei mexendo no meu celular.
Ouvi algumas músicas animadas e então do nada minha playlist resolveu mudar para a opção “bad profunda” sem me avisar.
Interessante como uma música pode mexer tanto com nosso estado emocional não é mesmo? Uma batida lenta, uma letra que faz a gente repensar a vida e quando me dei conta já estava lembrando da minha mãe.
Acho que lembrar é uma palavra até forte de mais, para você  lembrar de alguém tem que ter vivido ou pelo menos ter passado um tempo com a pessoa, certo? Pois bem, nem isso eu tive com ela.
Minha mãe, Charlie, morreu quando eu tinha dois anos de vida. Um motorista bêbado bateu em seu carro quando ela saía do estacionamento de uma farmácia. O mais irônico é que na delegacia ele disse que havia bebido muito pois teve uma discussão com sua namorada infiel após ela contar que estava grávida. Ele queria se matar pois não queria ser pai de uma criança que não era dele e acabou tirando a vida de uma mãe que tinha saído pra comprar remédio para a filha. Eu sinceramente odeio pensar nisso, mas ao toque de uma musica triste tudo se é lembrado.
Uma voz me tirou de mais devaneios, graças a Deus, a aeromoça dizia suavemente que o avião estava pousando.

-Senhores passageiros, bem vindos a Miami.

Ao ouvir essas palavras meu coração quase explodiu de felicidade. Eu estava totalmente fora da área chamada casa que eu tanto queria me libertar.
Olhei pela janela do avião enquanto ele pousava. Com certeza eu era a única que estava feliz.
O sol tinha acabado de dar as caras e eu sorria com um brilho quase tão radiante quanto o dele.

...

Da sacada da minha suíte no hotel eu olhava a praia, tão linda sob aquele sol de manhãzinha.
O hotel em que meu pai faz reserva para mim era maravilhoso, exageradamente luxuoso para quem não ia ficar ali por muito tempo. Mas para meu pai luxo é normal, cresci nessa vida e ainda não sei quando vou me acostumar com ela.
Nessa hora repensei meus atos. Eu queria liberdade, certo? Mas meu pai que estava bancando todas as minhas despesas.
Eu não queria isso, sei me virar e tenho meu próprio dinheiro mas parte do combinado era esse, eu saía pelo mundo com a segurança de que todos meus gastos seriam cobertos.
Isso com certeza tinha dedo do meu avô no meio.
Ah, meu avô...
Abri minha agenda e procurei a parte onde eu escrevia sobre meus avós.

“Hoje estou em NY, vim passar uns dias com meus avós. Meu avô é um empresário de sucesso e muito respeitado por aqui. (Acho que é coisa de família ser tão “poderoso’ e ter tanto dinheiro). Algo que já me faz pensar novamente em como me sinto deslocada nessa família. É tudo pelo dinheiro. Tudo. Onde está a felicidade deles? Eles a compraram e guardaram em um cofre? Só pode. Enfim...Meus avós maternos são legais. Elizabeth e James, belos nomes não é? Eles sempre me contam sobre mamãe, mas eu percebo a dor em seus olhos sempre que falamos dela então evito ao máximo ficar perguntando sobre. Contei a eles sobre meus planos de viagens pelo mundo e meu avô quase teve um infarto. Ele disse que eu tinha que sossegar e me formar na faculdade, virar uma médica, ou uma advogada. Como se isso fosse possível! Logo eu? Amo minha família mas novamente me sinto como se eles não quisessem que eu seja eu mesma, querem que eu seja uma cópia perfeita deles.” 

Fechei a agenda e pensei um pouco, conseguia até ouvir a voz do meu avô falando ao meu pai: “Harry, se vai deixar essa menina sair pelo mundo então pelo menos que não deixe ela com essa idéia maluca de se virar sozinha. Se não cobrir os gastos dela eu mesmo faço isso.”
Respirei fundo e me joguei na cama, deixei o cansaço da viajem ir me consumindo. As horas não dormidas no avião vieram a tona e fui vencida pela tentação de tirar um cochilo.