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História Side to Side - Let It Rain


Escrita por: fireprincess

Notas do Autor


Depois de muito tempo, eu voltei, e com o maior capítulo agora! Eu finalmente me livrei um pouco do bloqueio que estava tendo, então fiquei bem satisfeita com esse capítulo e da maneira como ele fluiu. Espero que gostem tanto como eu, e novamente, muito obrigada pelo apoio e pelos elogios! Fico muito tocada quando leio isso, e agradeço do fundo do meu coração. Agora, boa leitura!
(Prometo que agora passo a responder os comentários. ♥)

Capítulo 4 - Let It Rain


Yeri usava as roupas de Joy, que eram um pouco mais largas, já que a mais velha era definitivamente maior que ela. E não num sentido ruim, não enxergava aquilo como um problema, já que Sooyoung era bonita apenas do jeito que era, e roupas largas sempre faziam com que ela se sentisse confortável; era aquilo que usava em casa, quando podia ficar de bobeira.

Joy voltou da sala com uma toalha enrolada na cabeça e com o telefone nas mãos, digitando o número da mãe impacientemente. Tirando o barulho que as teclas faziam ao serem pressionadas, o único som que podia ser ouvido no quarto de Joy era a chuva batendo contra o telhado. Era a oportunidade perfeita de analisar um pouco o ambiente, principalmente pela distração da dona da casa. Yeri também gostava de analisar cada detalhe das coisas, e por isso às vezes se tornava uma pessoa tão silenciosa.

O quarto de Joy tinha até que uma boa variedade de objetos rosas, o que agradava o gosto de Yerim. Ela tinha prateleiras de madeira clara, e estas eram preenchidas de livros, o que fez a menor se sentir confortável, já que gostava tanto daquele ar que os livros traziam. Era charmoso, podia até chamar assim. Na frente dos livros, também havia algo que gostava muito: uma coleção de globos de neve, todos eles de lugares diferentes, e achou aquilo extremamente amável. Nunca tinha tido paciência e nem compromisso para ter uma coleção, apesar de já ter pensado várias vezes em ter uma coleção de botões. Até teve, por alguns dias, mas descobriu que era um fracasso pra esse tipo de coisa. Ficava então, só na admiração.

– Aparentemente, minha mãe não consegue atender. O que faremos... – Joy tirou Yeri de suas distrações, e acabou flagrando a mais nova observando seu quarto nos mínimos detalhes. Logo percebeu que a mesma havia ficado envergonhada. – Ei, você quer dar uma olhada nos meus livros? Tudo bem se quiser levar um emprestado.

– Mesmo? – Yeri nem mesmo hesitou, se levantando do chão para analisar a estante de perto. – Nossa, você tem muitos! Leu todos eles?

– Hm, não. – Joy confessou, se aproximando também. – Alguns têm a leitura muito complicada, e eu sinto como se os autores quisessem que os leitores tivessem que ler com um dicionário do lado. Quer dizer, um vocabulário extenso é ótimo, mas não faz sentido. E outros... Bem, eu não consegui me apegar. Eu comecei a ler, mas eles não me prenderam, e eu insisti tantas vezes... Até que cansei e eles ficaram aí. Por exemplo, esse. – Joy passou o braço por cima de Yeri – propositalmente – e puxou dois livros. Um grosso, com uma menina deitada de barriga para cima e um livro nas mãos na capa. Já o fino, tinha um rapaz com o peito aberto e um coração mecânico, no sentido metafórico da coisa.

Yeri ficou algum tempo revirando ambos nas mãos, e depois correu os olhos pelas páginas.

– O grosso é o difícil, e o fino é o que não me prendeu. Acho engraçado, um livro tão simples e rápido ser tão... Desinteressante. 

– Você nunca mais vai ler esses livros, certo? – perguntou Yeri, ignorando a fala da mais velha e olhando para Joy com um sorriso escondido naqueles lábios travessos. – Eu tive uma ideia!

– Ah, mesmo? – Joy procurou os bolsos da calça de moletom, e ali aqueceu as mãos. Ainda não havia superado o banho de chuva. 

– Nós podemos levar esses livros pra livraria! E então, podemos fazer como uma biblioteca, as pessoas levam e trazem de volta. Várias pessoas não se interessam mais por seus livros, então sua mãe também deve ter alguns, as pessoas da escola... Eu realmente sinto que isso pode ir pra frente! – a menor exclamou, animada de um jeito que Joy nunca havia visto. Não era como se estivesse descontrolada ou coisa do tipo, mas por seus suspiros, podia ver que estava, no mínimo, alterada. – Se não for problema pra você, claro. Digo, dar os seus livros assim...

Joy desviou o olhar. Encarou a estante em sua frente e pendeu a cabeça para o lado, encarando todos os livros que havia tido em toda a sua vida. Eram livros infantis, livros que acompanharam sua pré-adolescência, livros que fizeram a sua história. Era uma pessoa apegada, e a variedade de cores e palavras em sua frente fazia com que seu coração apertasse. 

Então, olhou para Yeri, que segurava em suas mãos, dois livros completamente inúteis e impossíveis de serem aproveitados, e Joy percebeu que todo aquele sentimento dentro dela era uma ilusão.

– Me parece ótimo.

Yeri sorriu, um sorriso lento e sincero, que se espalhou aos poucos até iluminar todo o seu rosto.

* * * 

– Você quer ver uma coisa? – Joy perguntou, de pé em sua cama, pegando os livros que estavam nas prateleiras mais altas. No chão, com dezenas de livros ao seu redor, a pequena indicou com a cabeça que queria.

Joy quicou no próprio colchão e foi até um interruptor. Estava escurecendo, a chuva ainda caia e o clima ainda era pesado. Pelo menos lá fora. Dentro da casa da mais velha, ela e Yerim se davam muito bem. Compartilhavam risadas, histórias, conversavam sobre livros e esclareciam dúvidas umas das outras. O que preocupava Joy, lá no fundo, era sua mãe, que não havia dado notícias.

Então, para que tivesse um pouco mais de magia naquele ambiente, apertou o interruptor, que acendeu várias luzes, daquelas de Natal. Elas não piscavam e nem eram de cor irritante, então serviram para deixar o quarto ainda mais aconchegante. Yeri achou aquilo incrível, pois sempre quis ter um daqueles charmes em seu quarto.

Mas em sua casa, tudo era diferente. 

De repente, se sentiu um pouco triste. Lembrou que, em algum momento, teria que dizer para Joy que não poderia sair com ela no sábado, o que pesava o seu coração. Não era como se estivesse "terminando" algo, mas pensar em Joy decepcionada a fazia sentir-se um pouco mal.

– São lindas. – não conseguia esconder a tristeza em sua voz, mas a maior não percebeu, pois voltou para o alto de sua cama. – Ei, Joy. Posso conversar com você sobre algo?

– Claro. – Joy disse, parando de mexer nos livros que tinha, tentando decidir qual deixaria para trás. – O que é? 

Assim que Yeri abriu a boca e sentiu que sua voz sairia, o telefone tocou, e Joy rapidamente desceu de onde estava correu para atendê-lo. A mais nova não sabia se considerava aquilo como alívio ou como uma tortura, já que teria que tomar coragem de novo.

– Alô? – Joy atendeu no telefone da cozinha, e logo percebeu que a ligação estava bem ruim. – Alô?

– Joy? Sou eu, mamãe. – era, de fato, sua mãe, só que com a voz extremamente abafada. – Você já está em casa, certo? É uma pergunta óbvia... De qualquer forma, eu liguei pra avisar que estou bem, só estou presa na escola. A chuva inundou tudo por aqui, e eu vou esperar para tirar o carro da garagem. Você está bem? Está sozinha?

– Eu trouxe uma amiga comigo, estamos bem. Você acha que vai demorar?

– Eu não sei... Uma professora disse que mora aqui perto e que eu posso dormir lá, se for preciso. Mas vou pensar positivo. De qualquer forma, que bom que você tem companhia. Eu fiz compras, então se você sentir fome, tem comida na coz–

Naquele momento, a ligação foi cortada. Mas não só a ligação. Todas as luzes da casa, e Joy percebeu que era horrível ter um telefone sem fio naquele momento. O segurou com força na mão e suspirou, o colocando de volta na base.

– Joy? – a voz fina de Yeri a chamou do quarto.

– Espera um segundo, eu vou pegar uma vela. 

– Eu posso ir com você? Não quero ficar sozinha... – ela apareceu encostada no batente da porta, com as mãos atrás do corpo, como se timidamente fizesse um pedido. Mas era aquilo que estava acontecendo, na verdade.

Sooyoung disse que tudo bem, e Yeri estendeu a mão para que a maior a guiasse. Aquele gesto foi surpreendente, mas agradável. De repente, Joy sentia como se já estivesse acostumada com essa coisa de dar as mãos, então não precisava hesitar.

As duas foram até a despensa, e no meio do breu, Joy conseguiu enxergar o pacote de velas junto aos fósforos. Pediu para que Yeri pegasse um prato, e com cuidado, imitou o processo que a mãe sempre fazia; primeiro, acendia a vela, pingava a cera no prato e grudava a mesma ali. Por garantia, levaram mais algumas velas e fósforos, caso a vela se apagasse ou alguém quisesse usar o banheiro sem deixar a outra na escuridão.

De volta ao quarto, ambas se sentaram no chão quase que automaticamente. Ficaram um tempo em silêncio, assistindo a pequena chama dançar.

– Acredita que eu nunca li Pequeno Príncipe? É engraçado como sempre mencionam esse livro, mas... Nunca li. – Yerim disse, pensativa. Não olhava mais para a chama, e nem olhava para Joy, mas encarava os próprios pés.

– Jura? – a maior parecia realmente surpresa. – Puxa! Você realmente deveria. É incrível...

– Você deveria ler pra mim algum dia. – ela fez uma pausa, e a frase teve bastante impacto. – Quando estava pesquisando sobre algumas frases para usar no meu perfil na internet, eu encontrei essa e achei realmente interessante, apesar de não ter entendido. "É bom ter tido um amigo, mesmo se a gente vai morrer." Sabe, é meio... Contraditório. 

Joy sorriu de canto, e então encarou seus próprios pés.

– Não, faz todo o sentido. Porque amigos verdadeiros nunca morrem.

O quarto ficou em silêncio novamente, mas só até o vento soprar a janela com tanta força, que mais parecia um canto. Só de ouvirem aquele som, sentiram arrepios percorrerem seus corpos. 

– Então... Sua mãe. 

Joy percebeu que não havia explicado nada para Yeri.

– Ah! Certo. Bem... Ela disse que não volta hoje. – Joy sentiu o rosto corar por alguma razão. 

Lembrou daquelas tirinhas na internet, daquelas em que alguém diz "meus pais não estão em casa", e a outra pessoa corre pra lá, e assim, coisas acontecem.

Torceu para que Yeri dissesse "relaxa, ela vai voltar". 

Yeri levantou, e com as mãos ao redor do corpo, indicando que sentia frio, foi até a janela e observou a rua. As árvores balançavam com o vento, a chuva ainda caia com força e a rua estava alagada. Mas o que poderia fazer? Dormir na casa de Joy?

– Joy, eu... Eu acho que vou pra casa.

Esperou por uma resposta, e então, sentiu algo caindo por cima de seus ombros. Era uma mantinha cor de rosa que aqueceu seu corpo imediatamente, e então olhou para trás, se deparando diretamente com os olhos escuros de Joy, que pareciam encarar sua alma. Naquele momento, travou completamente.

– Você não vai a lugar nenhum. – ela disse com uma voz mansa, e depois fez Yeri girar seu corpo  até que ficassem de frente uma para a outra. – Não com essa chuva. Não tem problema se você ficar por uma noite.

Yeri assentiu com a cabeça, sentindo as bochechas corando.

– Eu vou fazer uma ligação na sala, tudo bem? – a mais nova pegou o celular, uma vela, acendeu, a posicionou e fez exatamente o que disse que faria. Digitou o número do celular da mãe e esperou que a mesma atendesse.

Quando finalmente atenderam a ligação, a grande surpresa foi a voz masculina. Ela repetia "alô" várias vezes, até que desligou. 

"Provavelmente posso me resolver com a minha mãe depois." Yeri pressionou o celular contra o rosto, mesmo desligado. "O meu padrasto não entenderia. Seria melhor dizer que a ligação falhou, mas que eu tentei ter contato com eles."

Finalmente voltou para o quarto, e foi exatamente isso que disse para Joy, que assentiu, dizendo que o sinal estava realmente ruim e que ouvir sua mãe lhe tomou bastante tempo. Novamente, se sentaram no chão, e Yeri passou a mão pelo tapete rosa. Realmente não estava no clima de contar.

De repente, sentia que tinha trazido todo o frio do lado de fora da casa para dentro. Sentia-se culpada, e Joy parecia também  não ter nada a dizer. Teria que dar um jeito naquilo, mas como?

– EI. Você conhece a piada do pônei? – Yeri perguntou, hesitante.

– Não. – Joy olhou para ela, provavelmente surpresa pela quebra do silêncio. 

– Pô... Nei eu. – Yeri prensou seus lábios e espero uma reação.

Joy passou a língua no interior de sua bochecha e deixou escapar uma risada soprada.

– Eu te odeio.

"Já é um começo.", pensou Yeri. 

E odiava por tantos motivos... Mas o principal deles era fazê-la ser tão apaixonante. 

Yeri sorriu com a resposta, seus olhos brilhando como estrelas e seu sorriso se curvando como uma meia-lua. De repente, mais do que nunca, teve vontade de explorar a galáxia inteira com ela.

Num sopro, Joy apagou a vela, e a única luz que entrava no quarto era a luz do céu que às vezes se acendia, mas sem som algum, indicando que o raio caíra bem longe.

– Estou cansada. Vamos deitar.

O coração de Yeri parecia querer sair pela boca. Por que Joy havia inventado, de repente daquele jeito, que queria se deitar. 

– Ah, tudo bem, eu fico aqui, uh... Esperando você acordar. – disse com um sorriso amarelo e com uma risadinha nada convincente. 

– Eu disse "vamos", então vamos. – Joy havia se levantado e puxava as cobertas de sua cama. – Te deixo até ficar do lado da parede.

O rosto de Yeri indicava um excelente mid blowing. Por que é Sooyoung estava lhe chamando daquele jeito? Yeri apertou o tapete felpudo entre seus dedos. 

Quando Sooyoung havia se tornado tão ativa? Podia jurar que até ali, ela era a garotinha da história.

Se esforçou em pensar que estava sendo maliciosa, e por isso a situação parecia tão esquisita. Mas elas eram amigas, não eram? E eram bem próximas, tinham até mesmo uma espécie de estabelecimento juntas. Não era o que eram, amigas de negócios?

Yeri se deitou primeiro, para que ficasse do lado da parede. Foi quando percebeu que realmente estava cansada e que suas costas doíam e pediam por arrego, coisa que finalmente havia cedido, já que naquele momento estava relaxando em cima de um colchão maravilhoso. Até se esqueceu que estava na casa de Joy, mas isso até que a maior deitasse ao seu lado. Ambas de barriga para cima, encarando o teto.

Mais silêncio. Até quando ficariam daquele jeito? 

– Você acha que vai chover sem parar até amanhã? – Yeri perguntou, preocupada. Pensava até mesmo na escola naquele momento.

– Eu não sei. – precisava ser sincera. Não se lembrava da última vez que chovera tanto em sua cidade. – Vamos torcer pra que dê tudo certo.

Silêncio. Trovoada. 

Yeri se encolheu, e Joy percebeu.

– Você tem medo?

– É difícil não ter, né? Ou pelo menos não se assustar, não sei.

"Quantas vezes vamos continuar voltando nesse silêncio?", Yeri pensou, impaciente. Talvez o nervosismo a deixasse assim.

– Se você quiser, pode me abraçar, não tem problema.

Yeri virou a cabeça na direção de Joy, e a maior fez o mesmo. Os olhos de Yeri passearam pelo rosto alheio inteiro, quase como se esperasse que, em algum cantinho dela, fosse encontrar algo que lhe dissesse que era apenas uma brincadeira. Mas não encontrou nada além de muita, muita beleza.

Mesmo na pouca luz, conseguia enxergar cada detalhe de seu rosto, desde seus lábios carnudos e rosados até seus olhos levemente arredondados. Perto daquele jeito, podia até mesmo sentir seu cheiro, um aroma suave que lembrava maçã, mas ainda mais doce, e era realmente agradável.

Quase que automaticamente, Yerim suspirou e voltou o corpo todo para Sooyoung, e então, passou o braço por cima de seu tronco e a trouxe um pouco mais para perto.

Naquele noite, dormiriam cedo, mas dormiriam juntas.

* * *

Yeri dormia tranquilamente na cama de Joy, quando de repente sentiu um cheiro de queimado. Quando abriu os olhos, viu o quarto tomado em chamas, e imediatamente sentiu-se acordada. Os livros haviam virado cinzas no chão, as cortinas haviam sido consumidas, a madeira da estante estalava e ameaçava cair, como se indicasse que Yeri precisava sair dali imediatamente. Pela porta aberta, dava pra perceber que o fogo já havia se espalhado pela casa inteira. Num pulo, saltou da cama e olhou para os lados, na procura da amiga. Não estava em lugar nenhum daquele quarto, mas por um estalo distante, deduziu que ela estava na sala.

Yeri correu no meio das chamas, no meio do calor e da fumaça. Tossia, cobria o rosto, e em poucos segundos, já estava encharcada de suor. Sentia como se estivesse numa panela, e não tinha por onde escapar. Já na sala, procurou por Joy e gritou seu nome, mas não tinha voz. O que estava acontecendo? Um raio havia caído na casa enquanto elas dormiam? Por que não conseguia se ouvir?

Seu coração batia com tanta força e tão rapidamente, que pensou que aquilo só contribuiria para sua morte. Precisava encontrar Joy e dar o fora daquele lugar, mas como? Não ouvia nada além do fogo consumindo a casa inteira. Foi quando olhou para frente e sentiu os pés pregados no chão. Naquele momento, realmente não sabia mais o que fazer.

Sentiu o fogo subindo por suas pernas, tronco e rapidamente se espalhando pelos braços. Tentou gritar, mas não conseguia, então tudo que tinha era aquela sensação horrível. Enquanto o fogo continuava avançando por seu corpo, assistiu a última cena que seus olhos puderam ver; uma menina com cabelos vermelhos estava de costas para ela, e conforme o fogo subia, ela ia virando seu rosto, até que seus olhos se encontraram e Yeri sentiu seu coração queimar.

A dor era tanta que era quase como se fosse... Real.

Yeri suspendeu o corpo e soltou um som de desespero. Seus olhos tentavam processar o local. Era o quarto de Joy, mas ele não estava consumido pelas chamas. Ainda estava um pouco escuro, mas tinha a sensação de que o sol já estava pra nascer. O céu era de um azul escuro quase que arroxeado, e das vezes que madrugou, lembrava-se daquelas nuvens como pinturas. O tapete rosa continuava com sua maciez no chão, os livros continuavam separados num canto a partir de seus tamanhos, e os globos de neve continuavam docemente posicionados na estante.

Então, tudo aquilo havia sido um sonho?

– Yeri? – a voz de Joy era doce e rouca, como se fosse a primeira palavra que falava no dia. – Você acordou.

Yeri assentiu, olhando para a mais velha, que em suas mãos carregava uma grande bacia cheia de água, e boiando na mesma, havia um pano. Foi então que Yeri percebeu que estava fervendo, não tinha muita firmeza nas mãos e sua cabeça pesava.

– Eu tive um pesadelo. – disse, com o inferior tremendo.

– Você está com febre. – Joy sentou num banquinho ao lado da cama e fez sinal para que a mais nova deitasse novamente, e ela obedeceu. – Provavelmente acabou delirando por causa disso... Mas está tudo bem. E se quiser conversar comigo sobre isso, pode dizer.

Yeri suspirou e assistiu Joy posicionar a bacia em seus joelhos, pegando a toalhinha, a afundando e então a torcendo para tirar o excesso. Colocou em cima da testa de Yeri e passou a mão por seus cabelos, mantendo um olhar sereno, e foi quando Yeri percebeu que era um olhar cansado.

– Você ficou cuidando de mim?

– Fiz isso durante a noite inteira. – Joy abriu um pequeno sorriso. – Eu estava dormindo quando te senti realmente quente. Fui pra cozinha, enchi a bacia, peguei um pano e desde então venho repetindo o processo várias vezes. Eu tinha levantado pra trocar a água. Esperava que você acordasse pra tomar algum remédio.

Ela lhe esticou uma cartela de comprimidos e disse que pegaria um copo d'água. Parecia não se importar nem um pouco com o trabalho que Yeri havia dado.

Yerim segurou a cartela em suas mãos trêmulas e ficou pensando no que acabara de ouvir. Então, Sooyoung havia tomado conta dela durante a noite inteira. Ela abriu mão do próprio sono para cuidar dela, que estava com febre por conta da chuva que haviam tomado. Que azar.

Já se achava um peso por ter que dormir em sua casa, e ainda por cima havia ficado doente. Talvez fosse hora de voltar pra casa, de fato.

Sentou-se na cama, tirou a coberta de cima de seu corpo e suspirou, massageando as têmporas. Sua cabeça estava realmente doendo. Levantou-se, ainda meio bamba e caminhou em passos curtos até o batente da porta. Pôs a mão na testa, e realmente estava muito quente.

Joy, que voltava para o quarto com o copo na mão, assistiu o corpo de Yeri aos poucos de desmanchando, até que  ficasse de joelhos no chão. Não havia sido uma queda, já que estava apoiada, mas era preocupante, de qualquer jeito. Joy deixou o copo em cima da mesa, e num suspiro maternal, puxou Yeri para que a mesma ficasse de pé, e num esforço relativamente grande, a segurou em seus braços. Segurou a nuca da menor e fez com que ela a olhasse, mas antes que pudesse dar qualquer bronca, apenas depositou um pequeno selo na ponta de seu nariz.

– Pare de tentar fugir. Está tudo bem em cuidar de você, quando estiver melhor, pode ir pra casa.

Yeri não concordou, mas não discordou. Apenas continuou com a expressão cansada que já estava antes, e sem teimar, voltou para a cama, onde tomou o remédio.

Joy sentou-se no banquinho novamente, colocou a bacia em cima dos joelhos, afundou o pano, o torceu para tirar o excesso da água e o posicionou na testa de Yeri novamente.

Então, deslizou os dedos por seus cabelos.

* * *

– Eu te disse que não precisava vir até aqui comigo. – Yeri reclamou, na porta de sua casa. – Eu só te dei trabalho desde ontem.

– Não é verdade. – Joy ajeitou o cachecol no pescoço de Yeri; havia insistido para que a menor usasse, afinal, já havia reclamado de dor na garganta. – Já te disse que não tem problema.

A rua já não estava mais alagada, já haviam almoçado e Yeri já tinha condições de voltar para casa. Depois de tanto insistir, Joy não podia mais dizer que não. Ter sua presença durante praticamente 24 horas era quase como a realização de um sonho, e estava orgulhosa de si mesma por não ter se sentido desconfortável ou por ter tido condições de conversar normalmente.

Agora sentia-se livre, sentia que podia gostar dela sem que a colocasse em uma espécie de pedestal, como se não pudesse chegar perto.

Sentia-se muito bem.

Yeri não tocou a campainha, apenas ficou encarando Joy. Olhou para o céu nublado acima de suas cabeças e pigarreou, pondo as mãos pequenas dentro dos bolsos do casaco que Joy também havia emprestado.

– Bem... Você pode ir agora.

– Você realmente quer que eu vá, não é? – Joy riu, e se lembrou da maneira como Yeri falava de sua casa. Pensou que já havia pego muito em seu pé, e realmente era hora de ir. – Ei, então... Até amanhã, se você estiver melhor.

– Até amanhã... – Yeri murmurou. – Ah! Eu pensei em uma coisa sobre os livros. Nós podemos anunciar nos grupos que fazemos parte, sabe? Assim, tipo, "doem seus livros, eles estarão disponíveis para todos em breve", algo assim. Não sou boa com anúncios...

– Eu converso com eles, pode deixar. Eu gostei bastante da ideia, vai ser divertido. – Joy sorriu com sinceridade.

E como se despediria de Yeri? Com um abraço? Com um beijo na bochecha?

Yeri se aproximou de Joy e encostou a cabeça em seu peito, depois envolvendo o tronco maior num abraço apertado.

– Obrigada por ter se importado.

Joy demorou, mas então envolveu o corpo da menor.

– Obrigada por ter sido minha companhia.

Se separaram, se olharam pela última vez naquele dia e depois, quase como se fosse obrigada, Joy foi embora.

Yeri assistiu a morena andar pela rua até que sumisse de vista. Era legal, a sensação que tinha ao tê-la por perto. Foi uma aproximação lenta até que se tornassem o que eram naquele momento, mas afinal, o que eram? Amigas? Melhores amigas?

Não, Yeri não sentia que era nada do tipo. Obviamente gostava muito de Joy e a queria por perto, mas não era como queria uma colega ou uma amiga de classe. Era bem mais do que isso, era quase como que uma pequena dependência e um pequeno conforto para seu coração.

Era como se sua vida fosse preta e branca, mas quando Joy surgia, iluminava tudo com seu sorriso. O céu tomava cor, as flores desabrochavam por todo o seu corpo, as folhas balançavam dentro de seu estômago e borboletas pareciam fazer cócegas. Era como enxergar som nas cores, era uma sensação que jamais havia sentido.

Não queria parar de sentir tão cedo, e esperava ter Sooyoung junto com ela por um bom tempo.

Suspirou, virou-se para a porta, tirou uma das mãos de dentro dos bolsos e apertou a campainha. 



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