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História Skins - New Generation - S08E03 - Felicia


Escrita por: VOFLucas

Capítulo 3 - S08E03 - Felicia


Fanfic / Fanfiction Skins - New Generation - S08E03 - Felicia

Sentada na banheira, a água caindo sobre meu corpo, eu tinha esperanças de que a sujeira que sentia fosse lavada de mim. Tinha esperanças de que o nojo que eu sentia de mim mesma fosse embora... Mas é claro que isso não aconteceu. Na verdade, quanto mais eu tentava esquecer e me livrar das lembranças da noite passada, as imagens lampejavam com mais intensidade diante dos meus olhos.

As lágrimas e as gotas de água que corriam pelo meu rosto já não se distinguiam mais. Nunca chorei tanto em toda minha vida – e olha que eu sou uma garota bem chorona. Devo ter ficado umas duas horas apenas sentada ali, deixando a água cair e o choro estrangulado extravasar.

Ouvi Meredith, a nossa governanta, bater à porta algumas vezes e perguntar se estava tudo bem. Era a única pessoa que se importava comigo naquela casa, e eu não podia maltratá-la. Valorizo demais pessoas assim, porque são raras e preciosas.

- Está tudo bem – eu disse, tentando manter a voz firme.

E ouvia os passinhos dela se afastarem, pouco tempo depois.

Então, finalmente decidi que iria para escola. Iria enfrentar meus medos e vergonhas o quanto antes, porque sabia que teria de fazer isso algum dia. Por que não hoje?

Desliguei o chuveiro e enrolei-me na toalha. Caminhei até o espelho embaçado pelo vapor e fitei minhas feições desfiguradas refletidas ali. Aquela era eu. Felicia Griffiths, um monstro sob a pele de garota inocente.

...

 

Havia quatro chamadas perdidas de Ben no meu celular. Não retornei. Provavelmente estava “preocupado” porque eu sumi no meio da festa de ontem, sem dizer nada. Ou talvez Chad já tivesse contado que eu perdi minha virgindade com ele, na área de serviços da casa de Liam. Não acho que Chad tenha feito isso, porque Ben não ficaria zangado apenas comigo. Provavelmente o mataria, antes.

De qualquer forma, Ben era o culpado de tudo aquilo. Se ele não estivesse sendo tão seco, nos últimos dias... Se não tivesse dito para eu aprender “algo de útil” com a nova diretora que parecia atriz pornô... Se ele não tivesse levado uma caloura pra cama, na noite de ontem, quando eu estava disposta a finalmente ceder a ele o que ele queria, nada disso teria acontecido.

Eu sentia muita raiva de Ben, sim. Mas sentia uma raiva maior de mim mesma que, vendo aquela cena, ao abrir a porta do quarto de hóspedes de Liam, pensei logo em revidar e traí-lo com um de seus melhores amigos. E isso era tão baixo, tão indigno...

Eu me odiava.

Passei uma quantidade absurda de maquiagem no rosto, para esconder as olheiras e o inchaço dos olhos, e respirei fundo. Meredith bateu à porta do meu quarto.

- O café está na mesa, querida – disse ela.

- Obrigada, Meredith. Estou descendo.

Quando cheguei à sala de jantar, meus pais já estavam sentados à mesa. Papai, de pernas cruzadas, lia o jornal e bebericava uma xícara de chá. E mamãe comia frutas delicadamente, deslizando o dedo pela tela do tablet. Nenhum dos dois ergueu os olhos para mim, quando cheguei. Sentei-me em silêncio, e me servi de suco e uma fatia de bolo.

Lá fora, o sol brilhava com intensidade. Pássaros cantavam nas árvores do jardim. Mas meus pais não notavam nada disso. Estavam presos em seu mundinho fútil e moderno, alheios a qualquer coisa que não gerasse dinheiro, luxúria e prazer próprio. Mordisquei o pedaço de bolo, observando o modo como mamãe sorria, diante do tablet. Era uma mulher tão bonita e elegante... Mas como mãe, sempre deixou a desejar.

Meredith, que cuidava da nossa casa desde que nasci, era mais minha mãe do que ela, com certeza.

Sentindo-me sufocada com aquele silêncio e indiferença, deixei o café inacabado sobre a mesa e comecei a sair. Meu celular tocou, em meu bolso, e só então meus pais me perceberam.

- Já vai pra escola, filhinha? – perguntou mamãe, como se se interessasse.

- Aham – limitei-me a dizer. Saí da sala de jantar, em direção ao hall de entrada. Peguei minha bolsa e olhei para a tela do telefone. Era Emma. Atendi.

- Oi?

- Onde é que você está, sua desvairada?

- Em casa – suspirei. Passei por Meredith, que tinha uma pilha de roupas passadas nos braços e acenei para ela, com um sorriso sincero, antes de sair.

- Ben está louco atrás de você – disse Emma, do outro lado.

- Ele sabe onde eu moro.

- Hmm – Emma pareceu ofendida. – O que foi que aconteceu?

Fiquei em silêncio por um momento, entrando em meu carro. Dei a partida, e coloquei o telefone no viva voz, para não ter que segurá-lo no ombro.

- Hein? – insistiu Emma. – Aloô? Tá aí?

- É uma longa história, Emma – eu disse, por fim.

- Céus, você só conseguiu atiçar ainda mais minha curiosidade. Você está bem?

- Não. Não estou.

- Terei que esperar você chegar aqui para matar minha curiosidade? Ah, meu Deus, Licey! Conta logo!

Hesitei um pouco. Emma era minha melhor amiga, mas eu não tinha coragem de lhe contar que perdi a virgindade com Chad Cooper numa tentativa de me vingar de Ben. Não que ela fosse me odiar por isso, ou me julgar... Emma não é do tipo politicamente correta. Eu sou. E esse é o problema.

- Vi Ben na cama com uma garota, ontem à noite – eu disse, por fim.

- O quê?!

- É...

- Meu Deus, Licey...! Que cafajeste!

Engoli em seco. Ele é o cafajeste e eu sou o quê? Uma vadia? Felicia Griffiths agora é uma vadia. Quanto nojo eu sentia só de pensar nisso!

- Ele sabe disso? – perguntou Emma, despertando-me de meus devaneios.

- Sabe de quê? – espantei-me.

- Que você o viu...

- Acho que não – dei de ombros.

- Ah, Licey... Eu nem sei o que dizer. Eu sinto muito... Vai dar uma segunda chance a ele?

- Hmm... ainda não sei, eu estou tão... desequilibrada mentalmente. Eu não sei...

- Imagino... – Emma suspirou, do outro lado. – Liam acabou de chegar, com Ben e Chad. Vou desligar agora, okay? Te vejo quando chegar. Fica bem!

Estremeci, com a menção do nome de Chad. Emma desligou, e eu senti-me ligeiramente tentada a pegar outro caminho e sair dirigindo sem destino por aí. Estava com tanto medo. Tanta raiva. Tanta culpa e remorso... Mas, no final das contas, acabei parando no estacionamento da escola, minutos depois.

Respirei fundo algumas vezes. Lágrimas ameaçaram brotar em meus olhos, e as obriguei a estancar. Não ia chorar na frente de ninguém. Fiz muito disso durante toda minha vida... Chega.  

Desci do carro e, logo que me viu, Ben veio em minha direção. Mantive os olhos distantes de Chad, e me sentei a uma das mesas do Café, cruzando os braços sobre o peito. Pedi à garçonete que me trouxesse um café puro.

- Ei, Licey – disse Ben, olhando-me de cenho franzido, enquanto se aproximava. – Eu te liguei várias vezes, o que aconteceu? Você sumiu da festa, me deixou sozinho lá...

Baixei os olhos, sentindo uma pontinha mínima de alívio - ele não sabia sobre Chad. No entanto, a raiva ainda era maior.  

- Sozinho? – retruquei, erguendo as sobrancelhas.

- É. O que houve?

- Ora, Ben, me poupe desse teatrinho – ralhei, enraivecida. – Você não estava sozinho, quando entrei no quarto de hóspedes e vi você comendo uma pirralha do primeiro ano!

O rosto corado de Ben empalideceu. Seus olhos se arregalaram, e eu apenas consegui me sentir ainda pior com a sua reação.

- Não sei do que está falando... – balbuciou ele.

- Você disse que ia ao banheiro... E eu queria fazer uma surpresa pra você, mas, quando abri a porta do quarto, você já não precisava mais de mim. É disso que estou falando.

A garçonete aproximou-se cautelosamente, com uma expressão de espanto. Deixou meu copo com café puro e fumegante sobre a mesa e se afastou depressa.

Ben colocou as mãos na cintura, dando uma olhadela ao seu redor. Alguns alunos estavam observando-nos discutir. Geralmente, eu me importaria com aquilo, mas, naquele momento, eu não me importei tanto.

- Tudo bem – disse Ben, por fim, olhando-me com um brilho maldoso nos olhos. – Eu fodi aquela caloura sim, porque ninguém aguenta um namoro apenas assistindo filminhos românticos, comendo pipoca, maçãs do amor, beijinho aqui e ali, abraços... Eu estava até segurando demais, Licey. Porque eu realmente gosto de você, porra! Mas você não facilita!

- Gosta de mim? – aquele foi o ápice da minha raiva. Senti meu rosto afoguear-se, os olhos lacrimejando. – É assim que você diz que gosta de mim? Vá pro inferno! – e, sem pensar duas vezes, joguei o café fumegante em seu rosto. Ele gritou, levando as mãos aos olhos, mas eu não me importei. Levantei-me e saí em direção ao meu carro, ouvindo os alunos gritar e assoviar, diante daquele espetáculo.

Furiosa, dirigi pelas ruas de Bristol sem saber onde ir. Lágrimas rolavam por meu rosto. Passei por alguns sinais fechados, causando confusão no trânsito. Buzinas e o toque do meu celular insistiam em perturbar meus ouvidos, até que eu estivesse numa estradinha estreita que serpeava por entre um punhado de árvores, fora do perímetro urbano. Percebi que dava para um parque... Perfeito. Onde ninguém me perturbaria, onde eu choraria à vontade, onde eu poderia passar horas e horas pensando no quanto eu odiava minha própria vida.

Deixei o carro sob a sombra de uma árvore, e comecei a vagar pelas trilhas do parque, observando a paisagem com certo interesse. Enxuguei os borrões de maquiagem do rosto.

O vento soprava meus cabelos com um ar fresco e úmido. O som dos pássaros era como música. O farfalhar das ramagens das árvores me acalmava... E, enquanto caminhava, ouvi algumas risadinhas, vindo de algum lugar ali perto. Não tive medo. Segui o som das risadas, que vinha acompanhado pelo gorgolejar de um riacho. Se fossem assassinos, ou estupradores, ou simplesmente ladrões... que se foda. Não ligo mais para minha integridade. Não ligo mais para os bens materiais – aliás, nunca liguei muito. Sempre achei que eles formavam a barreira entre mim e meus pais. E, por isso, eu continuei seguindo o som, até encontrar um casal de estudantes fumando, sobre uma pedra às margens do riacho.

Reconheci a garota de cabelo rosa como Yazuko Shimizu, a sapatão traficante. E o rapaz ao lado dela era alto, louro e muito atraente... Chamavam-no de Dual, porque ele curtia garotos e garotas.

Os dois olharam-me com naturalidade, como se eu não estivesse parecendo um palhaço de cara borrada. Estanquei, sentindo certo desapontamento. Não era nenhum assassino, ladrão ou estuprador... Apenas os antissociais de Roundview.

- Olá – disse Yazuko, inclinando a cabeça. – Tá tudo bem?

- Parece que ela não tá bem...

- Não, não está – riu-se a garota, pateticamente.

- Desculpe, eu – fiz menção de me virar. – não queria flagrá-los...

- Não, não, volte aqui – chamou Dual. Ao seu lado, Yazuko abafou mais risadinhas. – Volte... Pode conversar com a gente se quiser... ou... fumar um baseado. De graça.

- É, de graça – enfatizou Yazuko. – Aproveita que hoje estamos bonzinhos!

Os dois riram mais uma vez. E, por mais que aquilo soasse um tanto anormal, a proposta de fumar maconha me agradou. E isso me surpreendeu muito porque... eu sou “politicamente correta”! Nada de perder a virgindade antes do casamento! Nada de drogas ou bebidas alcoólicas! Nada de roupas vulgares! Nada de ver pornografia na internet! Nada de matar aulas! Enfim... eu já não estava mais com vontade de ser assim. Eu já havia ferrado com grande parte das coisas mesmo.

- Tudo bem – eu disse, aproximando-me deles. – Eu aceito.

- Uh – cantarolou Yazuko.

Sentei-me ao lado de Dual, que me passou seu cigarro e, reunindo coragem, dei uma tragada. A fumaça encheu meus pulmões mais rápido do que julguei ser possível e, de repente, eu estava tossindo feito louca, com Dual e Yazuko rindo de mim.

- Você nunca fez isso, não é? – perguntou Dual.

- Não... – concordei.

- Ei, você não é a Griffiths? – interveio Yazuko.

- Sou.

- Meu Deus... você está horrível!

- Yaz! – repreendeu-a Dual, embora abafasse uma risada.

- Olha só a cara dela!

- Tudo bem, eu sei que estou – dei mais uma tragada no cigarro, tossindo menos dessa vez. Não era, nem de longe, tão desagradável quanto achei que fosse durante toda minha vida.

- O que houve? – quis saber Dual. – Conte-nos seus problemas...

- É, o Dual é um ótimo conselheiro. Pode te ajudar com xoxotas, bundas ou pênis, é só falar...

Eu dei um meio sorriso, começando a sentir os efeitos da droga. Ergui os olhos para o céu, e as copas das árvores pareciam dançar lá no alto, numa sincronia lenta e arrastada.

- Ontem vi meu namorado na cama com outra garota – eu disparei. – E perdi a cabeça e também a virgindade com Chad Cooper...

- Que coragem! – sussurrou Yaz, chocada. Mas eu continuei:

-... só como vingança. E Chad é um dos melhores amigos dele. E eu não posso contar a ninguém, porque... Minhas amigas me consideram a Dona Certinha, e provavelmente jogariam isso na minha cara, quando tiverem chance... e meus pais... eles não se importam comigo, nem com nada fora de sua visão capitalista e luxenta... E hoje, eu tive uma discussão com Ben, na frente de toda escola, porque ele disse tanta bobagem... e...

Àquela altura, eu já estava chorando de novo. Dual tocou meu ombro sutilmente, como que para me consolar. E eu estava tão carente que recostei a cabeça em seu peito e deixei as lágrimas rolarem, enquanto ele afagava meu ombro.

Nenhum dos dois disse nada, pelos próximos minutos. Respeitaram meu sofrimento. Ficamos ouvindo o canto dos pássaros e o gorgolejar do riacho. Revezamos o cigarro de maconha, em silêncio, e eu me senti tão reconfortada quanto não me sentia há muito tempo.

Então, traguei uma boa porção de fumaça, e inclinei-me para os lábios de Dual. Ele os abriu com suavidade. Não protestou. Soprei a fumaça para dentro de sua boca, e dei-lhe um beijo rápido. Nossos olhos se encontraram. Eu já não chorava mais. E, então, caímos numa risada gostosa e patética, que existia apenas pelo simples prazer de rir.

- Tudo bem! – exclamou Yaz, de repente. – Pro inferno os problemas! Vamos nos divertir! – sem dizer mais nada, a garota despiu as roupas até ficar completamente nua e saltou para dentro do riacho, gritando. Água respingou em minhas roupas, mas não pude deixar de rir. Dual levantou-se e seguiu o exemplo de Yaz, inteiramente despido diante de meus olhos, sem se enrubescer. Seu corpo era incrível, e deixou-me sem fôlego.

Ele gritou e pulou no riacho também.

- Vem, Griffiths! – chamou Yaz, afastando os cabelos dos olhos. – Vem! Vem! Vem! – cantarolou, com Dual entrando no coro.

Por que não?

Tirei a bata pela cabeça e baixei a calça, ficando apenas de calcinha e sutiã. Não ia ficar nua em pelo na frente de um garoto, por mais que Yazuko estivesse. Talvez ainda houvesse algo de minha integridade pulsando dentro de mim.

Tomando fôlego, soltei um brado esganiçado que ecoou pela copa das árvores e saltei para o riacho, sentindo-me engolida pela água fria e barulhenta. Logo emergi na superfície, rindo como uma louca... Aquilo foi maravilhoso.

...

 

Passamos as horas seguintes brincando como crianças no riacho, jogando água um no outro; tentando empurrar um ao outro para o fundo; subindo nos ombros largos de Dual apenas para saltar na água em seguida... Fumamos mais maconha, e demos muitas risadas, com brados de “Foda-se o mundo”.

Eu já estava alucinada e dizendo coisas sem nexo. Mas estava me divertindo. E me divertindo com pessoas que eu jamais imaginara que fossem divertidas... Pessoas que eu não acreditava que pudessem ser minhas amigas, até aquele momento.

Só que chegaram algumas crianças no parque e tivemos que sair às pressas do riacho, cobrindo as partes íntimas com as mãos. Ríamos como se aquilo fosse a melhor piada do mundo. Yaz mandou que fossem procurar outro lugar, mas elas pareciam hipnotizadas com o que viam. Foi aí que Yaz começou a atirar pedras nelas, xingando-as com toda sorte de palavrões. Só então, elas saíram correndo, amedrontadas.

Nos vestimos e, por fim, caminhamos de volta à entrada do parque, com a barriga doendo de tanto rir.

- Nunca me diverti tanto – eu disse, sendo sincera.

- Quem diria, Dual? Somos divertidos!

- Bem, eu sempre fui... já você...

- Palhaço – resmungou a garota baixinha, dando-lhe um empurrão de leve. E rimos mais uma vez.

Ofereci carona a eles, mas recusaram, dizendo que gostavam de andar. Até fiquei tentada a deixar o carro ali e acompanhá-los, mas não podia. Então, nos despedimos, com relutância. Principalmente eu. Não queria voltar para casa, não queria voltar para a minha vida. Gostei de ser aquela Felicia Griffiths que gritava “foda-se o mundo” e nadava com amigos pelados no riacho do parque.

- Tenho que trabalhar no Tarantle daqui a pouco – disse Dual, com pesar. – E passar na farmácia...! Merda, eu havia me esquecido disso! A farmácia...! Precisamos ir, Yaz. Até logo, Griffiths... Vamos!

- A gente se vê, Griffy! – exclamou Yaz, sendo arrastada pelo rapaz parque a fora.

E logo eu estava sozinha mais uma vez, dirigindo pelas ruas de Bristol em direção à minha casa. Meu cabelo escuro estava molhado e escorria em torno do meu rosto, molhando ainda mais a bata, que já estava úmida por causa do sutiã. Não chequei o celular e não pretendia fazer isso tão cedo.

Continuei dirigindo, tentando não deixar que os maus sentimentos tomassem lugar dentro de mim. Tentei não pensar em Ben, nem em Chad. Tentei pensar nas risadas que dei durante toda a manhã, na companhia de Yaz e Dual. Mas, quando cheguei à porta de casa e vi uma viatura da polícia, todas essas tentativas se perderam.

Estacionei bruscamente atrás da viatura e desci do carro, com passos rápidos. A porta estava aberta. Passei por ela, correndo os olhos pelo hall de entrada e pela sala de estar, que era de onde vinham as vozes. Vi Emma, Liam, papai, mamãe e uma dupla de policiais reunidos num canto.

- O que houve? – perguntei.

Todos os pares de olhos voltaram-se para mim ao mesmo tempo.

- Ah, é ela – disse papai, suspirando. – É a minha filha.

- Querida! – exclamou mamãe, a voz soando um tanto dramática. – Onde esteve? Ficamos tão preocupados!

Franzi as sobrancelhas, incrédula.

- Ahn?

- O que houve com você? – Emma veio em minha direção. – Está toda molhada... Parece péssima.

- Hmm... Estou bem – eu disse, dando de ombros. Em seguida, a gargalhada explodiu em minha garganta... Talvez eu ainda estivesse sob o efeito da maconha, mas aquilo me pareceu um tanto engraçado, quando as peças se encaixaram em minha cabeça. – Pera aí... – eu disse, levando a mão à boca. – Vocês não chamaram a polícia para ir atrás de mim, não é?

- É claro! – foi mamãe quem respondeu. – Emma nos disse que você não foi à escola, e saiu de carro há horas, meio alterada... Nos preocupamos, achamos que havia acontecido algo!

Eu não me contive. Caí numa gargalhada cruel, diante dos olhos de todos, que me observavam com coerente assombro. Vi papai conduzir os policiais até a porta, com sussurrados pedidos de desculpa, e ri ainda mais, tendo de me sentar no sofá para não cair. E, quando percebi, estava meio que chorando também.

- Vocês... preocupados?! Me poupem, por favor...

- Licey – Emma enlaçou meu ombro com um braço, parecendo chocada. – Acho melhor subirmos para o seu quarto. Vamos.

- Você está drogada, Felicia? – perguntou mamãe, quase interrompendo Emma. – Você andou se drogando? É isso?

- E você se importa?

- Claro que me importo, sou sua mãe!

- É? – gritei, agora definitivamente aos prantos. – Quando você se deu conta disso? Foi só agora que percebeu que tem uma filha?

- Felicia, o que você está dizendo? – papai vinha do hall com uma expressão de completo horror. E foi maravilhoso vê-lo daquela forma.

- Querem saber? – levantei-me, ainda abraçada por Emma. Ergui o dedo do meio de ambas as mãos, com um sorriso que deve ter parecido meio mórbido. – Fodam-se! FODAM-SE!

E só então me deixei ser arrastada por Emma para o segundo andar. Ouvi mamãe chorando e dizendo coisas, mas eu também chorava, e estava tão alucinada pelos efeitos das drogas que não entendi uma única palavra. Emma tirou minhas roupas e me deixou sentada na cama, enquanto enchia a banheira. Depois, me levou até lá e, como quem cuida de um bebê ou de um bêbado – ou de uma nova drogada –, pôs-se a me dar banho. 

- Licey, Licey... – a ouvi dizer, antes de fechar os olhos e me render ao esgotamento mental. – Nunca achei que faria por você o que já fez por mim tantas vezes... E olha só onde nós estamos: os lugares inversos – ela deu uma risadinha. – Quem diria? O mundo dá tantas voltas...



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