História So Numb - Revolução

Hoje era mais um dia entediante de aula, mais um agonizante dia em que eu me esforçava ao máximo para parecer no mínimo razoável (sem vontade de me matar), mas na realidade, eu só queria paz interior em um local bem longe daqui.

Infelizmente, teríamos educação física, uma das últimas aulas do ano (ainda bem), porém, a escola estava inaugurando hoje a piscina olímpica que demorou mais de seis meses para ficar pronta. Então, tivemos entregues em nossas mãos, as roupas de banho que já haviam sido medidas e encomendadas há algumas semanas atrás. Pelo menos, não seríamos obrigadas a usar biquínis, pelo menos, eram maiôs. Pelo menos eu não teria que expor meu corpo quase por completo para a turma toda.

Junto com as garotas da turma, saímos da sala e nos encarregamos até o vestiário, Isabelle precisava resolver uns assuntos com a direção, então disse que demoraria a chegar até onde estávamos.

Todas as garotas tomaram seus lugares, e começaram a tirar suas roupas. Procurei por uma cabine de banheiro vazia, mas estavam todas ocupadas, e o tempo estava contado, não poderia ficar esperando até saírem do banheiro para me trocar em uma privacidade maior. Fui obrigada a escolher um canto e me trocar ali mesmo.

Virei-me de costas para o restante das garotas, e comecei a tirar minhas roupas. Já sem a calça jeans, apenas com uma camiseta, peguei meu maiô, e o ajeitei rapidamente para facilitar a ação de vesti-lo. Enquanto levantava e deslizava minha camiseta por sobre minha cabeça, vi de relance que saíram de um dos banheiros, duas garotas loiras, uma com a raiz castanha aparecendo em grande escala, e a outra, com um tom de loiro tão intenso que parecia ter sido descolorido ontem.

Usando apenas roupas íntimas, senti olhares estranhos sobre mim, e, a garota loira da raiz castanha cutucou sua parceira, a mesma soltou uma gargalhada direcionada a mim, que foi tão alta que poderia ser ouvida do lado de fora. Entristeci-me quando outras garotas também começaram a caçoar de meu biótipo magro.

Então, Isabelle chegou, algumas pararam de rir, mas a dupla loira não. Ela veio até mim e me perguntou a razão das risadas. Eu apenas a olhei com desânimo, e Isabelle pareceu sentir na pele o que eu estava sentindo no momento.

- Aí, faz quantos dias que você não come? – Perguntou a garota loira do cabelo brilhante, rindo descaradamente.

Ignorei a piada e tornei a tirar minhas roupas, ficando nua e rapidamente cobrindo meu corpo com o maiô. As piadinhas continuaram, eram palavras que me cortavam com força. Desde magrela à anoréxica, puro-osso, esqueleto, bulimica, entre outras coisas do qual eu preferi nem prestar atenção.

Saímos do vestiário e fomos direto para a área da piscina, contornando-a com passos até acharmos uma parte da borda sem muitas pessoas ao redor, sentando-nos ali. Estava cabisbaixa.

- Ei, não dê atenção para ela. É só mais uma garota imbecil.

- Urgh, eu odeio minha vida. Sério. – Suspirei.

Muitos garotos olhavam para nossa direção, mas eles mantinham seus olhos nas curvas de Isabelle. Mesmo assim, era legal imaginar que eles estavam olhando para mim. Suspirei novamente, dando-me conta de nunca receberei tais olhares de um garoto. A vida tem dessas.

Às vezes eu me pergunto a razão de continuar viva, pois minha vida é uma droga, as coisas desmoronam na minha cabeça com força, e eu quase não tenho mais força para suportar. Sinto-me sem saída, sou uma doença sem cura, uma dor sem alívio. Uma pressão sem entorpecente.

A professora então chamou Isabelle, e a mesma levantou-se indo em sua direção. Deixando-me então, sozinha. Tirei parte de meus cabelos que estavam no rosto, e rodeei os olhos pela sala, até perceber que, ao outro lado da piscina, na borda contrária a mim. Shawn me observava, sentado, somente com os pés sob a água quente. Ele me olhava fundo, com uma aparente vontade de sorrir, e com certa... Vergonha?

Dei uma risada tímida, e então, ao longe, avistei as duas garotas loiras saindo do vestiário, dando logo risada de mim novamente. E de novo, me aborreci ao ponto de quase cair em lágrimas ali mesmo.

Logo fomos instruídos pela professora, a fazermos um jogo ridículo de arremessar uma bola (do lado externo da piscina), e tentar acertar uma argola, presente dentro da piscina. Ficamos em filas, de meninas e meninos. Atrás de mim, encontrava-se justo quem eu não queria perto. A garota loira com o cabelo fosforescente, que insistia em fazer comentários maldosos em tom baixo, sabendo que mesmo assim eu escutava.

Enfim chegara minha vez, posicionei a bola da forma que deveria ser, e quando fui arremessa-la, sinto duas mãos empurrar-me para frente, levando meu corpo para dentro da água. Mas antes disso, as mesmas mãos trataram de arrancar a touca de látex que mantinha meus cabelos presos e impenetráveis.

Ao cair na piscina, com os meus cabelos soltos, era natural que o cloro arrancasse parte da tinta vermelha do meu cabelo, fazendo todo perímetro ao meu redor, ficar da mesma cor. Qualquer um saberia que a cor vinha do meu cabelo. Porém, um comentário fez com que eu virasse o centro de risadas.

- Ih, professora, a garota tá menstruada!

Eu sabia de onde vinha aquela voz irritante, mas no momento, o que eu senti, foi desânimo.

Esperei até a hora do intervalo, enquanto meu eu canceriano, mas com um espírito escorpiano remoía uma vingança. Eu sabia que não teria coragem de fazer muito. Porém, esse tipo de coisa precisa acabar, bulling é coisa séria, e não apenas pelo mico, e sim por todas as coisas que ela me obriga a ouvir, não apenas hoje, e sim todos os dias.

Do nada, enquanto eu estava sentada sobre uma cadeira no pátio, sinto algo escorrer pela minha cabeça, algo gelado. Até tomar meu rosto, água com corante vermelho.

- Você tá sempre menstruada. - Disse Nathalie, a garota do cabelo fosforescente.

- Chega, já chega. – Exclamei, virando-me depressa, enquanto levantava-me e ficava da mesma altura. – Qual o seu problema? Sua vida é tão ruim que tem que infernizar a minha, para que alguém sinta o mesmo que você? Não sei se pensa que alguém é inferior que você, mas essa não é a realidade. Você é o nível mais baixo, ninguém vence você.  

Logo, um circulo de pessoas juntou-se ao nosso redor, fazendo torcida, não sei dizer se era para mim ou para ela.

- Ah, e vai se foder. – Disse por fim, juntando toda força presente em mim e socando seu rosto. Fazendo a mesma cair. Abaixei-me e mostrei um canivete, que por acaso estava comigo hoje. – Nunca mais se meta comigo, ou vai acabar empalhada dentro de um saco plástico. E ninguém vai vingar você. Será um nome apagado do mundo e uma história de vida que nunca foi escrita. Vou anular qualquer marca que você já tenha deixado em qualquer lugar.

Ninguém pode ver o que eu segurava, ou sequer ouvir o que eu sussurrava ao pé de seu ouvido. Somente ela, que tremia ao som de minha voz.

- Agora, quero que me peça desculpas, em alto em bom som, senão, vou cravar isso em você agora mesmo. Eu não tenho medo. – Ordenei. Fazendo a mesma gritar um “me desculpe”, que ecoou ao ouvido de todos. Foi como uma revolução, suas amigas que espalhavam veneno juntamente a Nathalie, cruzaram seus braços e se arquearam diante ao povo que gritava ao redor, aplaudindo a mim, e vaiando a garotinha indefesa que se encontrava no chão.

Não sei nem de onde tirei tanta ferocidade, filmes de suspense valem a pena. Até parece que eu faria algo do gênero, não tenho coragem nem de matar insetos. As vantagens de ser alguém invisível diante outras pessoas, é que elas não sabem como você é, atuações são bem-vindas na hora de botar a cara para bater.

Bem vindos à minha vida.