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História Sold My Soul. - Frank


Escrita por: mryiero

Notas do Autor


Oizinho, pessoinhas!

Como eu disse, vou tentar postar um capítulo por semana. Estou ficando adiantada, então vai ser por aí mesmo, sempre que possível. O capítulo de hoje é importantíssimo. Os seis primeiros, aliás, são. Eles vão moldando a história e os personagens, então eu acredito que é bom ler com calma mesmo e focar nos pequenos detalhes. Eu gosto MUITO de deixar as coisas nas entrelinhas, algumas meninas já sacam isso, então... É só uma dica que eu dou. Porém, também, nem sempre as entrelinhas são o que vocês pensam, mas só uma parte de algo muito maior. Fica a reflexão no ar.

Hoje a gente vai saber um pouco mais sobre o Frank. E ah, claro, sobre o Bert também. Como eles lidam com tudo, como se conheceram, como é um pouco a questão da família Iero e a importância deles nessa história, enfim. Muita gente também vai criar certas teorias em certas partes, que eu já sei, mas não poderei comentar muito a respeito, então vou deixar em aberto até o fim dessa parte inicial, pois algumas respostas já vão ser respondidas. Me perdoem, novamente, pelo capítulo enorme, ele é preciso, todos vão ser precisos e recheados de coisas acontecendo, como deu pra perceber, o ritmo dessa fic é esse, então, já sabem. Ela tem MUITA coisa ocorrendo, mas é necessária muita calma pra ler.

Ler rapidinho, pular algumas coisas e tudo mais, resulta em uma leitura um tanto quanto pobre, a gente perde a magia da coisa toda, pequenos acontecimentos, enfim. E não falo só daqui, mas de outras fics que cs forem lendo, livros, etc. Fica a diquinha.

É isso, gente. <3

Boa leitura, demoninhos. <3



P.S.: ME PERDOEM PELO FINAL.
EU SOU UM SER HUMANO BOM, PROMETO.

Capítulo 3 - Frank


Fanfic / Fanfiction Sold My Soul. - Frank

Capítulo Dois – Frank

 

“Why should I not hate mine enemies – if I “love” them, does that not place me at their mercy?”

– The Book of Satan 3:1

 

 

Bordeaux estava muito longe da minha cidade natal. Aliás, um oceano inteiro de distância, o que era uma desgraça fodida demais para mim, que já não possuía mais família há um bom tempo e que já deveria ter se acostumado com a Europa e suas particularidades. Eu nunca me acostumaria, sempre reclamaria, mesmo tendo Robert como melhor amigo de todo o mundo ao meu lado. Havia algo nos franceses que me incomodava como formigas subindo involuntariamente pelo meu braço… Talvez ainda mais do que as malditas formigas. Franceses eram cheios de si e trabalhar em uma cidade como Bordeaux, conhecida pelo vinho e toda a parafernália requintada que possa imaginar, era ainda mais frustrante para alguém que vinha de uma linhagem de exorcistas sem o menor método rebuscado ou tido como sério.

 Robert e eu havíamos demorado meses para mostrar eficiência e algumas vezes criado uma paciência não-humana para aguentar famílias de nariz em pé fazendo pouco caso do nosso trabalho. Porém, uma vez que conseguíamos expulsar demônios e livrar suas casas mesquinhas de todo o mal que os aflingia, éramos tidos como super-heróis. Eu poderia me gabar disso, mas eu possuía um histórico de falta de paciência e inquietação que não me permitiam fazê-lo. A não ser que eu estivesse na presença de algum dos Way (de preferência o mais velho desses) e precisasse animar meu humor com uma dose especial de arrogância fingida. Aquele era um sentimento que caminhava ao meu lado desde criança, desde o dia em que meus pais morreram.

 Antes de todo um relato sentimental e escroto a respeito de um Frank Iero órfão e perdido no mundo, devo ressaltar que meus pais eram dois monstros sem sentimentos que largaram o único filho para que o avô o criasse. O único Iero que não havia se misturado com ocultismo, caça à demônios e tudo de mais obscuro que circulava no sangue de nossa família. Meu avô era um homem ilustre, músico de uma orquestra nova iorquina e que se virava para me criar como podia, entristecido pela ausência do filho, mas feliz em ter um pedaço de sua família ao seu lado. Nunca faltou amor, nunca faltou atenção e todo o carinho que meus pais nunca haviam me dado, quando decidiram que era mais prático me abandonar na entrada do apartamento do recém viúvo Iero. Algo me dizia que meu pai havia achado uma boa ideia largar o filho, com apenas dois anos de idade, com o próprio pai, a fim de camuflar a ausência recente da esposa. Até que havia surtido efeito, meu avô havia me criado com todo o amor do mundo e, se bobear, ainda mais.

 O que durou apenas doze anos e, bem antes dos quinze, precisei lidar com uma solidão ao qual não era acostumado. Assim que meu avô morreu, acreditei que tinha idade suficiente para que meus pais conseguissem lidar comigo e, quem sabe, receber um pouco de atenção. Era natural, eu era uma criança ingênua criada ao som de Beatles e Elvis, que acreditava que a música poderia resolver tudo. E que foi destruída, no segundo em que pisei em Londres, onde meus desgraçados pais moravam, e fui massacrado por teorias, práticas e obrigado a treinar e decorar orações, lendas, cânticos e tudo de mais sombrio que a herança de nossa família poderia oferecer. Se eu esperava me tornar um adolescente normal, aquilo tudo foi por água à baixo na primeira noite em que presenciei uma entidade maligna se apoderando de um pequeno garoto.

 Eu tinha apenas quinze anos, estava chorando de medo e quase me mijei nas calças, quando assisti meu pai, com total maestria e rapidez, livrar o pobre garoto daquele mal. Desde então, anos de colégio interno e faculdades foram anulados e, nos dez anos seguintes, tudo o que me restou foram livros sagrados, diários de nossos antepassados, água benta e fingir que a morte dos meus pais, um ano após aquele primeiro exorcismo, não me afetava psicologicamente. A partir dali, o mais próximo que eu tinha de uma família era os McCracken, a família que sempre havia sido braço direito dos Iero, desde os primórdios da caça às bruxas (pois é, nossa história ia muito além de espíritos e fantasmas desocupados), até os dias atuais. Até somente restar Bert e eu, dois emocionalmente desgraçados tentando ganhar a vida.

 Os pais de Robert já eram aposentados, haviam retornado para a Austrália e viviam uma vida pacífica longe de crucifixos, berros demoníacos e quase possessões acidentais. Não os culpava, os dois haviam tido uma paciência divina em nos colocar no caminho certo e nos fazer entender que era inevitável… Estava em nosso sangue, estava na história de defesa e prática ao ocultismo: éramos destinados aquilo e pouco poderíamos fazer a respeito, a não ser aceitar, treinar e ver um pouco de amor nisso. E, assim, eu virei um bêbado amargurado que passava noite e dia viajando pela Europa atrás de almas perdidas para curar.

 Não era o emprego dos sonhos, mas eu era bom naquilo. Poderia negar, fazer o drama que eu quisesse e, por vezes, até pensar em desistir. Mas eu era bom pra caralho. Talvez o melhor… Talvez mais eficiente que dois Way juntos. Algo na raiva e na dor que eu carregava dentro de mim, durante anos, acarretou que parte de mim tivesse sangue frio e destreza suficientes para lidar com situações que a maioria dos exorcistas comuns não saberiam lidar. Eles eram poucos pelo mundo, eu sei, a Igreja ainda tentava nos controlar, mas era notável como a falta de fé e o poder que detinham sobre seus amaldiçoados fiéis estava fazendo com que fossemos cada vez mais requisitados. O mal estava vencendo e a Igreja não tinha o mesmo controle de séculos atrás.

 Era aí que Bert e eu (até mesmo os riquinhos Way) entrávamos e mandávamos cada alma penada para a puta que pariu. Sem receber muito em troca – digo financeiramente –, ainda que o sentimento de satisfação em ver um demônio mergulhando nas profundezas do inferno fosse bastante reconfortante, nós fazíamos a nossa parte em manter a Terra livre de todo o mal. E estávamos muito próximos disso, eu diria.

 Doce ilusão, garoto.

 

- Você é assustadoramente estranho ás vezes. – Robert despertou meus devaneios, ao que eu me encontrava diante daquela mesa amadeirada gigantesca, localizada na luxuosa sala dos Oswald, alinhando nossos objetos de trabalho. – Um punhal?! Nós vamos fazer um exorcismo, não um ritual de sacrifício humano! – A voz aguda de Bert ás vezes me incomodava um tanto, me fazendo torcer o nariz e ajeitar a arma branca sobre a superfície amadeirada, logo ao lado de uma velha Bíblia quase inutilizada. Era o único texto sagrado que levávamos conosco em nossas missões, afinal, todo o resto morava e estava guardado muito bem em nossas cabeças. Anos de treinamento contribuíram para que  nos tornássemos algo à mais, algo que nossos pais nunca realmente haviam sido. – A sua família tem umas tradições muito esquisitas… - Bert se adiantou para tocar o punhal, sua base cravejada de esmeraldas e um tanto quanto envelhecida (aquela merda deveria ter mais de cem anos) e eu me adiantei para acertar-lhe um tapa em sua mão, sabendo muito bem seu histórico de pequenos desastres com objetos cortantes. As cicatrizes em seus dedos e suas tentativas de girar adágas entre tais denunciavam isso.

 

- Todos os McCracken não calam a boca ou isso é só coisa sua? – Não havia medido as palavras, muito menos o tom rude com que o olhei, lhe dando as costas para verificar se estávamos sozinhos naquela sala de jantar. O local era praticamente todo amadeirado e grande demais para que apenas uma família de quatro pessoas morasse, assim como o resto da pequena casa, quase um castelo, localizada no meio de um arvoredo no interior de Bordeaux. Meus passos ecoavam pelo extenso cômodo, ao que me vi parado diante de um quadro da Sagrada Família, meticulosamente posicionado no centro da parede lateral da sala de jantar, ao que escutava Bert resmungar, irritado por minha falta de tato. – Perdão, eu não ando me sentindo muito bem nos últimos dias. – A resposta era automática, assim como o zumbido em minha cabeça que me atormentava continuamente. Fechei minhas pálpebras e as pressionei, assim que Bert perguntou um tímido “Way?”, que fez com que eu arranjasse uma boa desculpa por ter sido um completo idiota com a única pessoa no mundo que se importava comigo. Só andava sendo… Inevitável e doloroso agir daquela forma, sem sequer perceber. – Way.

 

- Eu já superei que perdemos casos por causa daqueles dois… Mudar pra França ajudou um pouco. – Bert tinha razão. Desde que saímos de Londres, as coisas haviam melhorado, conseguíamos descansar e pegar uma quantidade boa de casos a serem solucionados, víamos os Way quase nunca (a não ser pelo caso de dois dias atrás) e possuíamos contatos mais fiéis, como os Oswald (era o que eu pensava). – As pessoas não podem ver figuras engravatadas e subitamente se sentem confiantes, não é a toa que uma quantidade absurda de políticos é posta no poder sem o maior discernimento da população. – Eu simplesmente adorava como Robert era crítico do seu modo, em uma implicância com os Way mais disfarçada do que a minha. Éramos tão diferentes, com Bert sendo todo carismático, falante e divertido, enquanto eu havia me tornado mais recluso com o tempo e as circunstâncias, mais quieto e imerso em minha mente conturbada… Diferenças que nunca eram postas à prova, pois nos entendíamos perfeitamente bem. – Ás vezes sinto vontade de me fantasiar como eles, pra ver se as pessoas param de olhar torto pra gente toda santa vez que nos apresentamos como exorcistas e tudo mais.

 

- Jamais devemos nos igualar a eles, nem pense numa coisa dessas. Não quero me tornar um padrão… Eles tem mais influência da Igreja do que qualquer um, só disfarçam isso. E eu não confio em ninguém que tenha laços com aquela instituição corrupta. – Era hipócrita falar aquilo enquanto eu estava na casa de um ex-devoto do Senhor, como a mulher do próprio homem havia dito, mas era a realidade. Ainda que eu falasse com um pouco mais de raiva que deveria, algo impossível de conter, eu me perguntava, conforme encarava as três figuras no quadro diante de mim, nos limites da fé de cada ser humano. Era deplorável demais ver o que faziam pela mente dos outros, não por si mesmo. – Nós dois ainda temos casos a resolver e esse é um exemplo de que nem tudo está perdido. Recorreram aos nossos métodos, ainda que tenha sido por completo desespero e inúmeras tentativas que resultaram em absolutamente nada.

 

A matriarca dos Oswald havia nos telefonado mais cedo, em completo desespero. A filha mais velha estava morta, após ter fugido para Londres, e o marido estava escoltando o corpo para a França, quando a mais nova perdeu completamente a sanidade. A possessão vinha ocorrendo duplamente durante os últimos dois meses, segundo a mulher, e estava chegando ao seu limite. A pobre coitada temia que a mais nova acabasse seguindo o rumo da primogênita da família e fosse posta em uma cova ao lado da irmã… E eu não a repudiava por isso, talvez apenas pela quantidade de arte tão cafona e religiosa que tinha espalhado em sua casa.

 Aquele quadro era só um exemplo, Bert já havia cometido o sacrilégio divertidíssimo de rir do quadro da Santa Ceia, quase em tamanho real, que a família possuía na sala de estar, enquanto eu me vi obrigado a manter a expressão impassível, até sermos direcionados a aquele cômodo em questão. Sozinhos, pacientemente aguardando que a mulher e o caseiro trouxessem a jovem, aprisionada no quarto dos fundos da casa. Seu quarto havia entrado em combustão na noite anterior, a casa cheirava à queimado e eu estava franzindo meu nariz pela nonagésima vez só naquela meia hora que esperávamos ali, quando a porta se abriu.

 Esperando ver a senhora de cabelos loiros artificiais e vestido florido, já moldei meu melhor sorriso falso e calmo, quando entendi o porquê de ter visto Bert tomando o punhal com uma das mãos, de relance. McCracken era sempre mais drástico e teatral do que eu, quando se tratava dos Way. E da mesma forma com que meu sorriso forçado apareceu, ele sumiu dos meus lábios e deu lugar a uma irritação que gritava através dos meus olhos, ao que eu encarei cada passo que Gerard e Mikey deram ao adentrar a sala de jantar acompanhados de um homem, até então desconhecido por mim.

 

- Iremos trabalhar em equipe novamente, Iero? – Gerard aparentemente estava de bom humor, com aquele narizinho ridículo empinado, ao deixar sua maleta sobre a mesa, logo ao lado de todo o meu equipamento devidamente arrumado. E fez questão de desalinhar duas pequenas garrafas de água benta, definitivamente disposto a testar meus limites. – Vejo que trouxeram o kit infantil de exorcismo de vocês.

 

 Dá pra acreditar que esse cara quase foi padre em algum momento da vida dele?! Sinceramente.

 Eu não lembro exatamente a primeira vez em que vi os Way, eu estava um tanto quanto alto, imerso em vodka e whisky, me arriscando a fazer um maldito exorcismo em paz, quando ele surgiu. Paletó, gravata preta, camisa social, coturno bem lustrado e uma Bíblia maldita na mão, um exemplar antigo e um tanto gasto, que parecia seu companheiro inseparável. Desde então, Gerard e Mikey eram figuras quase constantes em minha vida nos últimos dois anos. Eu tentava escapar, fingir que não existiam, mas era muito complicado quando a única coisa que me assombrava e que eu não conseguia exorcisar eram dois seres humanos vestidos como homens de negócios, prontos para fazerem exorcismos em uma turnê pela Europa.

 Minha implicância tinha todo um fundamento do começo ao fim. Os Ways tinham dinheiro, vinham de uma família rica da Inglaterra e eram insuportáveis com seus sotaques pomposos e equipamentos sofisticados. Eles ainda utilizavam um exorcismo jesuíta, sem a orientação da Igreja (era o que diziam), enquanto Bert e eu fazíamos qualquer coisa que não deveria ser realmente nomeada. E que era forte, mais potente do que orações em latim e crucifixos. As palavras apenas vinham, escritas e modificadas dos ensinamentos enoquianos de meus pais, de origem incerta ou… Ou talvez fosse certa demais, tivesse nome e endereço, e eu não queria admitir para mim mesmo o tipo de método que estávamos utilizando.

 Enfim, eles tinham mais oportunidades financeiras e, ainda sim, tendiam a aparecer toda maldita vez em que Bert e eu achávamos um caso que pudesse nos dar a mesma estabilidade, não só monetária, como também retomar o nome da minha família. Os Iero poderiam ser mundialmente conhecidos, utilizados em estudos e tidos como bases há centenas de anos, mas, infelizmente, Bert estava certo: a partir do momento em que viam figuras engravatadas, os seres humanos passavam a adquirir confiança naquilo. Era muito mais prático acreditar em um ex-padre, do que em um bêbado de moletom listrado e calça rasgada, e um rapaz de cabelos coloridos (Bert agora utilizava azul em seus fios loiros), óculos excêntricos e camisas de séries de TV ou símbolos comunistas.

 Talvez a culpa seja sua por arruinar o nome da sua família e o seu suposto emprego tão medíocre, não dos Way.

 

- Cale a boca. – Rosnei, não sabendo exatamente para quem, mas decidi que as palavras eram para Gerard, uma vez que o encarei, perdendo um pouco a educação, que, aliás, nunca realmente tive. O zumbido em minha cabeça triplicou, causando-me naúseas e eu precisei respirar fundo, conforme os Way ficavam do lado oposto da mesa, em uma ridícula divisão nítida de equipes. De um lado, os excêntricos Iero e McCracken, do outro, os entediantes irmãos Way.

 

 Gerard arqueou uma das sobrancelhas e me vi obrigado a desviar o olhar de seus olhos verdes, sempre contrastando com seus cabelos tão escuros, quando o senhor, posicionado logo ao seu lado, tratou de se antecipar, antes que eu começasse uma discussão estúpida ou Bert arremessasse o punhal e o cravasse no crânio de alguém. Então, o reconheci como uma das figuras das inúmeras fotos na sala, tratando-se obviamente do patriarca dos Oswald, o famoso ex-padre londrino que havia se refugiado na França, assim que se apaixonou por uma mulher e abandonou a batina.

  A vulgaridade começa quando a imaginação sucumbe ao explícito, uma vez li algo sobre isso. Uma visão divertida sobre a fraqueza da fé.

 

- Antes de mais nada, não existe mal entedido algum… Eu e minha esposa concordamos em chamar os senhores para esse trabalho em questão. Nós estamos perdendo a fé, estamos perdendo tudo… - O homem parecia abatido, sombras escuras sob seus olhos claros denotando que aquilo era muito mais do que a idade avançada acentuada por seus cabelos grisalhos. Aquele senhor havia enterrado uma filha e estava prestes a fazê-lo com outra. Eu queria que meus pais houvessem lutado e me desejado da mesma forma que aquele homem o fazia por sua família. Tarde demais para me lamentar. – Como sabem, eu mesmo já fui um discípulo direto do Senhor, mas entendi que a minha realidade era outra, meus desejos e ideais não mais compreendiam o que eu clamava para os meus fiéis… Mas a minha ideia de bem e mal não mudou. E o que está tomando a minha filha é maligno… Inteiramente nefasto.

 

- Tivemos acesso ao caso de Susan e sentimos muito, muito mesmo. – Michael parecia o mais simpático dos Way, diga-se de passagem, ao ajeitar seus óculos e manter-se concentrado nas palavras do homem. E não, eu não o achava uma gracinha, eu só tinha uma mania nada agradável de tentar atingir o mais velho dos Way com o máximo de comentários constrangedores que minha mente era capaz de formular. – Pode nos contar o que realmente vem acontecendo em sua família? É importante que cada mínimo detalhe seja relatado, assim nós quatro podemos trabalhar em uma solução juntos em prol da sua família. – Ótimo, nós quatro. Agora éramos uma maldita equipe.

 

 Aquele era o momento em que o homem, com lágrimas nos olhos, contaria todo o seu drama de família, então, eu me sentei e me preparei psicologicamente para aquilo. Geralmente, eu não era tão descompensado assim, os últimos dias estavam sendo difíceis, Gerard Way olhando fixamente para mim não estava ajudando muito, então eu suspirei, um tanto quanto exausto, arrastando a cadeira ruidosamente pelo chão e assim aguardando. Insolente, senti o olhar de todos sobre mim e apenas arqueei as sobrancelhas, à espera do drama. De algo que iria me deixar tão para baixo quanto a minha vida já o fazia por si só.

 Então, pigarreando e sentando-se em uma das cadeiras diante de mim, Sr. Oswald pôs-se a falar, a voz tão pesarosa quanto a dor que tentava não transparecer.

 

- Jessica não teve tempo de nos contar as coisas que Susan estava nos escondendo, então pouco sabemos de verdade sobre o que está acontecendo, além da possessão. Sei que são raros os casos de possessão dupla em um mesmo ambiente em tão pouco espaço de tempo, estudei isso durante meus anos no seminário, então eu e minha mulher vasculhamos as coisas de Susan em busca de respostas. – Os olhos de Oswald estavam marejados e o homem tinha um controle incrível, que me fez sentir um tanto de culpa por internamente debochar daquela história. Ainda que eu soubesse muito bem que não era minha culpa ter me tornado um completo boçal nos últimos tempos. – Então, encontramos ritos satânicos… Desenhos e pastas com material que reverencia o ocultismo. Bíblias rabiscadas… Coisas que, em nome de Deus, minha filha nunca faria em sã consciência! – Naquele ponto da conversa, Bert já havia largado o punhal, Gerard já não mais olhava para mim e Michael, atenciosamente, havia se sentado logo ao lado de Oswald, anotando todas as informações em algum aplicativo em seu celular. – Então, quando a questionamos… Ela fugiu. E a única notícia que tivemos, desde então, foi a sua morte.

 

- Sentimos muito por isso, Sr. Oswald… - Bert começou e eu o fitei de soslaio, lhe dando aquela permissão silenciosa para que ele tomasse as rédeas de tudo. Eu não queria falar nada, eu sequer conseguia administrar meus pensamentos, a fim de criar uma teoria. Anos de estudos da minha família não haviam sido suficientes para aquele caso, não quando… - Ouvimos falar sobre os símbolos. A jovem Susan apresentava símbolos enoquianos nos braços… Nunca encontramos um caso de possessão demoníaca com algo tão emblemático. Palavras em latim, dialetos desconhecidos… Mas entidades nunca tiveram poder sobre uma língua sagrada dessa forma. Muito menos em uma versão que aparentemente não sabemos desvendar por completo. – McCracken se referia às imagens que a mãe da jovem havia nos mostrado mais cedo, em seu celular, retratos de cortes precisamente bem desenhados nos braços da irmã mais velha, sendo repetidos com uma semelhança milimétrica nos da irmã. 

 

- Não consigo explicar… Não faço ideia da intepretação que podemos seguir. Eu tenho um pouco de noção de enoquiando, tentei ler as palavras e expressões, mas tudo o que consegui foi uma junção desconexa de palavras. Ora diziam “anjos”, ora diziam “redenção”, mas é como se atrás dessas palavras um contexto diferente existisse… Alguma coisa que não conseguimos ler além dos erros na “escrita”. – Oswald parecia menos abalado ao encarar as mãos apoiadas sobre a mesa, no momento em que a porta se escancarou, logo após finalizar suas palavras. Um berro, o tremular súbito da mesa e eu imediatamente desconectei minha mente de todas aquelas informações.

 

 As reações foram quase automáticas e previsíveis.

 Enquanto Oswald se assustava e levantava se sua cadeira, Gerard e eu instintivamente nos direcionamos para a porta, tentando amparar o homem que carregava a jovem Jessica junto a si. Um corpo enrijecido que se recusava a soltar o batente da porta, fincando suas unhas na madeira e forçadamente as quebrando sempre que o homem, um pouco mais novo que o pai da jovem, tentava empurrá-la para dentro da sala. Seria uma cena brutal para alguém que nunca havia lidado com entidades em geral, mas eu estava mais do que acostumado. E Gerard também.

 Way parece até apresentável e bonito, com seus cabelos pretos bagunçados e encarando-me de soslaio, como se esperasse que eu compactuasse com seus atos… Não que eu estivesse preocupado em olhá-lo em um momento como aquele, longe de mim. Então, em movimentos quase sincronizados para duas pessoas que não se suportavam, eu e Gerard a tomamos pelos braços e, para nossa surpresa, facilmente conseguimos afastá-la da porta e a arrastamos em direção à mesa. Antes mesmo que eu exclamasse um “Bert, pegue as malditas cordas!”, meu amigo e Michael o fizeram, em um trabalho tão sincronizado quanto eu e Gerard tínhamos em manter a jovem presa por nossas mãos, empurrando-a sobre a superfície amadeirada. Consegui ver, de relance, seus braços marcados pelos símbolos, sendo ainda mais questionáveis quando vistos de perto. Todo o ensino que eu havia sido obrigado a ter não englobava aquela versão alternativa da língua dos anjos e um mistério daquele tipo era o que deixava o Frank de sempre a um passo de voltar a ser a sua versão mais bem-humorada. E, é sério, essa versão existia.

 Pelo fato da mesa ser enorme, não foi difícil deitá-la ali, ainda que eu tenha quase caído ao ajudar Bert a puxar a corda e amarrá-la à mesa, assim que ele e Michael já haviam amarrado duas delas às pernas da gigantesca mesa. Era improvisado demais, porém, em questão de segundos, havíamos realmente trabalhado como equipe e facilmente prendemos Jessica ao móvel. E eu me atrevi a dar um olhar mais esmiuçado sobre a garota, a fim de verificar quaisquer anormalidades.

 Diferente do último caso em que eu e Gerard havíamos esbarrado, Jessica parecia limpa em sua camisola azulada, longe de qualquer sinal de vômitos e secreções que não fossem dos ferimentos de seus braços, ainda recentes e, em alguns pontos, delicadamente sangrando. Suas feições encontravam-se quase desfiguradas, a boca alargada demais em um sorriso amarelado, enquanto os olhos… Eu sequer poderia cogitar qual cor era de verdade, ao vê-los completamente negros e opacos. Seus cabelos loiros quebradiços apontavam para inúmeras direções, ao que começou uma espécie de tortura a si mesma, erguendo e batendo a cabeça contra a mesa, conforme gargalhava. E não a risada doce de uma garota de quinze ou dezesseis anos, mas sim de uma criatura endemoniada e grosseira demais para o rosto quase doce que Jessica ainda possuía.

 Os “sintomas” eram do início de uma possessão, ainda calculável, se não fosse pelos cortes nos braços e a forma com que o corpo da jovem se envergou, sem qualquer aviso e cessando subitamente todas as gargalhadas desconexas anteriores. Não que existisse um ângulo preciso para definirmos uma possessão demoníaca, mas alguém que ainda podia lutar contra o mal dominando-a por dentro (e que, principalmente, não tivesse um histórico de ginástica acrobática ou algo assim) não conseguiria apoiar as pernas sobre a mesa, assim como as mãos e dobrar-se, literalmente voltando-se para trás, até que as mãos pudessem quase alcançar seus calcanhares.

 Veja só se o filho da puta que estava tentando destruir a pobre garota não era um demônio exibido de marca maior.

 

- Jessica! – A mãe da jovem surgiu, agarrando-se ao pai, enquanto o outro homem desconhecido, se unia a eles, as três figuras encurralando-se em uma das extremidades da sala, enquanto Bert já buscava os frascos de água benta, Michael fazia anotações e Gerard… Bem, ele já havia sacado a sua Bíblia, dali retirando rascunhos de um exemplar que eu conhecia muito bem e começado uma oração. Em um primeiro momento, eu me irritei, xingando baixo e pronto para intervir, quando suas palavras conseguiram súbitos resultados.

 

- Deus de bondade infinita, que na água instituístes admiráveis sacramentos… Atendei às nossas súplicas e infunde sobre este elemento natural o poder de vossa benção. – A voz de Gerard era naturalmente forte e autoritária, causando-me arrepios em uma situação inoportuna como aquela, ganhando minha atenção. O irmão e Robert se anteciparam em borrivar a água benta de seus frascos, rodeando a extensa mesa e até mesmo espirrando o líquido em mim. Conforme eu recuava e permitia que Gerard pregasse suas palavras, sem pensar em minhas atitudes, a jovem lentamente voltava a sua posição inicial, os ossos audivelmente estalando, enquanto podia sentir a temperatura da sala subitamente baixar. – Imploremos a misericórdia de Deus onipotente, para que, pela intercessão de todos os Santos, ouça benignamente a voz da sua Igreja em favor desta nossa irmã que sofre tão grande provação.

 

- A mesma provação que tens ao tocar corpos masculinos, Sr. Way?! – Jessica exclamou, em uma voz feminina e quase infantil, se não fosse por um tom rouco e um sotaque atípico, quase russo, ao pronuciar as palavras. Dessa vez, a reação imediata veio de Gerard, erguendo seu olhar das folhas do Ritual Romano e fechando-as, em um rubor que tomava seu rosto de uma só vez, encarou a jovem, agora sentada, com determinação no olhar. – Você os adora, não é? Colocar a boca e chupá-los… Foi por isso que largou o seu tão amado Deus, não foi? Por amar paus e bundas mais do que as palavras do seu fodido Senhor. – Os pais da jovem exclamaram em surpresa àquelas palavras e iniciaram uma oração audível, entre soluços e lágrimas, quase interrompendo as preces de um Gerard que não se deu por rogado.

 

 Aquele homem era muito diferente da versão que eu havia emoldurado em minha cabeça… Parecia quase totalmente incrível, apoiando as mãos na borda da mesa, entre os pés de Jessica e encarando-a com seu olhar altivo. Não sabia se queria exibir-se ou simplesmente enfrentar o monstro frente a frente, mas Gerard estava muito longe da imagem de ex-seminarista frouxo que eu alimentava em minha mente. Enquanto Jessica pendia seu rosto para o lado, arrastando as unhas pela mesa e bruscamente a empurrando contra Gerard, ele a empurrou de volta, firme, inabalável e ainda tão cheio de sua religiosidade, por mais que aquele demônio a tivesse posto à prova.

 Eu queria não pensar na imagem de Way se relacionando com outros homens, mas, por segundos, havia sido inevitável e surpreendentemente estranho acreditar que um cara como aqueles era gay. Alguém que parecia recluso demais, apegado a uma religião arcaica e que abominava sua orientação sexual indiretamente há séculos… Okay, quem eu queria enganar, estava na cara que ele estava no armário tanto quanto eu fingia não me interessar por homens, mulheres ou qualquer ser humano em geral.

 Voltei à realidade onde eu não deveria pensar em Gerard daquela forma, onde eu precisava me impor, uma vez que Bert me olhava em tom de desespero, pelo fato do Way mais velho quase dominar aquela entidade por completo. Eu queria intervir, claro que queria… Mas a sede em ver aquele homem em ação era muito maior do que meu ego inflado.

 Você se atrai sexualmente por coisas bastante estranhas, pequeno Frankie. Que divertido.

 

- Deus de bondade infinita, que estais sempre pronto a compadecer e a perdoar, atendei a nossa súplica… E fazei que esta vossa serva oprimida pelas cadeias do poder diabólico seja liberta pela vossa benigna misericórdia! – A última palavra havia soado gritada, ao que Gerard tentava segurar a mesa com uma das mãos e, com a outra, arrancava de dentro do bolso do paletó um velho crucifixo de madeira, erguendo-o no ar, enroscando-o parcialmente em seus dedos longos. “Tente o quanto quiser, vadiazinha amante de Jesus, eu estou impregnado nessa piranha!”, a garota gritou no mesmo tom de voz grotesco de antes, os olhos negros sem piscar e cravados nele, que novamente ignorou, respirando fundo e fazendo com que sua voz ecoasse pelas quatro paredes daquela sala com toda a força que sua crença lhe dava. – Senhor, libertai vossa serva do laço do caçador diabólico e do tormento que a persegue; protegei-a à sombra das vossas asas, amparai-a como escudo do vosso poder e manifestai-lhe benignamente a vossa salvação!

 

- Ela não tem salvação, nem um de vocês tem! – A voz brutal voltou a se manifestar, agora mais rouca e menos gritada do que antes, enquanto, aparentemente, Jessica havia parado de tentar medir suas forças com Gerard. E eu percebi o intuito da garota, ou melhor, daquela entidade maligna, ao notar que os dedos ensanguentados e feridos dela se agilizavam para livrar-se das cordas, enquanto distraía Gerard com sua ladainha homofóbica. – Seu veadinho de merda! É assim que gosta de ser chamado enquanto dá a bunda, não é? E depois reza esse terço fodido e acha que está livre dos seus pecados! Veadinho de merda!

 

 Boa parte de mim queria que aquela humilhação continuasse. O Frank que inúmeras vezes havia perdido casos e clientes por causa dos Ways e seu novo marketing a respeito de “como liberar o seu demônio em três dias” ria por dentro, queria debruçar-se sobre a mesa e assistir a tudo aquilo. Mas o Iero, o de verdade, que havia sido criado pelo meu avô e não conseguia ter muita paciência com qualquer tipo de injustiça, ainda mais envolvendo algo sobrenatural, não pensou muito ao afastar uma das cadeiras, utilizá-la como impulso e, finalmente, subir sobre a mesa, um pouco atrás de onde a jovem estava sentada e pronto para escapar das cordas amarradas.

 Exatamente. Subir na mesa.

 Nossa, que selvagem, Frankie.

 

- Daresare Sol‐petahe‐bienu. – Fechei meus olhos, ao mesmo tempo em que, em um último vislumbre, percebi Jessica voltando seu rosto para trás. Não em trezentos e sessenta graus em alguma cena bizarra de filme, mas olhando-me de baixo, erguendo o rosto, enquanto seus ossos brutalmente estalavam, naquele som já habitual a mim. Mantendo meus olhos fechados, em minha própria segurança, senti aquele calor característico percorre meu corpo e, logo em seguida, era como se parte de mim estivesse descobrindo camadas e mais camadas do mundo real que eram totalmente desconhecidas. – Be‐ri‐ta od zodacame jimi‐calazodo: sob‐ha‐atahe tarianu luia‐he od ecarinu MADA Qu‐a‐a‐on! – Gritei, uma das mãos erguendo-se e, encontrando, o topo da cabeça da jovem, onde apoiei minha mão bruscamente e a segurei. Não bruscamente, eu esperava, mas o bastante para que eu pudesse voltar a entoar aquelas palavras.

 

- Ora, ora… O que temos aqui. – Jessica resmungou, talvez para que só eu a escutasse e eu ignorei, repetindo as mesmas palavras, com o intuito de que aquela entidade a libertasse de uma vez. O uso de enoquiano era fundamental em todo o trabalho dos meus pais, mas aquela era minha visão… Palavras de libertação mais específicas e que, nos últimos tempos, estavam funcionando com força total.

 

Gritei aquele cântico com toda a minha força, anulando tudo ao meu redor. As orações dos pais da jovem, Bert pedindo para que eu tomasse cuidado, Michael acompanhando o irmão em suas palavras e Gerard mantendo as palavras do Ritual Romano em sussurros, como uma espécie de base para o que eu proclamava. Parte do enoquiano que eu entoava, era uma mistura do que meus pais haviam plantado em suas pesquisas e práticas, a outra parte… Bem, era obscuro demais ressaltar que eu estava trilhando um caminho um tanto diferente do que eles haviam planejado para mim em toda sua ignorância.

 A mão apoiada sobre a testa de Jessica sentia sua temperatura elevar-se drasticamente a cada vez que o enoquiano era quase gritado por mim. Cada extremidade do meu corpo parecia queimar da mesma forma, pulsando da mesma forma com que meus dedos o faziam, ao apertarem a jovem naquele ponto, sua cabeça tentando, por diversas vezes, desvencilhar-se do que quer que estivesse agindo sobre si. E eu gritava, tentando me manter firme sobre a mesa, ao mesmo tempo em que tremores alastravam-se por pontos dispersos da sala, fazendo-me um tanto quanto sensível àquelas reações. Eu podia sentir algo pairando sobre aquela sala, tão forte quanto a presença que formigava sob meus dedos, trazendo o tipo de sensação que eu nunca demoraria a me habituar, principalmente quando eu senti que o ser maligno em questão seria capaz de fazer aquela mesa levitar ou nos lançar para longe facilmente.

 

- Od bogira aai ta piape Piamoel od Vaoan! Zodacare, eca, od zodameranu! – Minha voz não era apenas uma exclamação, agora tratavam-se de gritos, cada palavra queimando em minha garganta, ao que eu me sentia sendo empurrado drasticamente para dentro de mim. Uma energia pesada trilhava por meus dedos e tentava ultrapassar meu antebraço, inultimente, retornando com tudo em direção a sua hospedeira, insistentemente tentava dominar à mim, um rapaz pequeno e obstinadamente em pé sobre a mesa da casa de uma família tradicional, tentando vencer algo quase incompreensível.

 

 Uma vez que algo tentava se apoderar, uma carga ainda maior brotava, lutando, enfrentando e silenciosamente travando uma batalha com aquele que tentava investir contra mim em um golpe tão baixo. E, pela primeira vez em semanas, eu não me precavi. Abri meus olhos, estrategicamente mantendo a cabeça baixa, o olhar fixado na garota que olhava para mim como se eu fosse algum Deus mitológico, sorria, fascinada, em toda sua demência causada pela criatura ameaçando sair de si. Mas ainda ali, sorridente, olhando em meus olhos, em minha alma e reconhecendo-a, de alguma forma. E, talvez, meu maior erro tenha sido olhar aquele demônio diretamente nos olhos e deixar-me levar. Por ambos os lados, por ambas as forças que meu corpo, tão despreparado e fraco, não sabia equiparar.

 

- Me tome! Me possua por minhas entranhas! Eu imploro! Se alimente de mim! – Jessica ou o que quer que fosse, não utilizava de sua força arrebatadora para falar tais palavras. Era fraco, abalado por ritos que eu continuava a repetir, agora com as duas mãos agarradas em seus cabelos claros, segurando-a, pedindo, internamente, que cada frase fosse devidamente cravada em sua alma. Ou o que quer que ainda restava dela. – Leve essa vadiazinha de uma só vez! Eu imploro! – Eu estava demorando a entender exatamente o que queria com aquelas palavras, se era uma distração ou um pedido mais profundo, até… Porra, eu deveria ter percebido.

 

 Quando me dei conta do tanto que me distraí ao fitar aquelas íris completamente escurecidas, já era tarde demais.

 Eu não estava no controle, como toda a minha prepotência enganava-me ao afirmar com tamanha propriedade, que sentia ao achar-me tão superior com minhas palavras desconhecidas. A manipulação era oposta, enganando-me com uma pseudo fraqueza, com um sorriso final, que, mesmo tão descrente em temer seres como aquele, me fez recuar. O único passo que dei para trás foi o suficiente para que eu tropeçasse em meus próprios pés e alguns itens desconhecidos sobre a mesa (possivelmente algo meu), quando então observei a garota livrar-se das cordas, puxando-as de seus braços com brutalidades, um rastro de sangue deixado sobre esta e sobre a mesa, uma vez que o que a possuía não fazia a menor questão de manter aquele corpo ileso. E assim prosseguiu.

 As luzes começaram a piscar, sem qualquer aviso anterior, arrancando um grito vindo da mãe da jovem e um xingamento que, sem sombra de dúvidas, era de McCracken. Talvez por me ver cair sobre aquela mesa, sentado, arrastando-me rapidamente em direção a borda, para que eu pudesse saltar e buscar uma das cordas, assim como Michael, a fim de voltar a prendê-la. Em um último vislumbre permitido pela iluminação da sala, antes dessa cessar, eu vi Jessica ficar de pé bem diante de mim. E não só apoiar os pés sobre a maldita mesa, enquanto eu ridiculamente tentava fugir e saltar desta, tonto e alucinado por algo incapaz de ser classificado, vi a menina erguer-se, alguns centímetros da superfície amadeirada, ainda que seus pés estivessem presos às cordas.

 E eu não fui o único. Não quando os nossos olhares se encontraram e eu vi um Gerard determinado, ainda exclamando sua adorada oração de São Bento como se fosse o hino nacional da salvação, tentando não se abalar, mas tão preocupado quanto eu. A última coisa que vi, antes da escuridão, foi o esverdeado de seus olhos, tão questionadores ao encarar os meus, do tipo que conseguia ler cada fragmento de minha alma. O que era uma grande merda.

 Internamente, implorei para que ele não houvesse visto nada, principalmente minha fraqueza naquele momento. Esta tão atípica, que já não mais me causava uma reles preocupação, mas sim ira... Uma raiva me dominando, quando, às cegas, fui puxado para fora da mesa por um Bert que chamava meu nome. E, pelo metal gélido contra um de meus pulsos, notei que meu amigo segurava o punhal com uma das mãos, enquanto eu ria comigo mesmo, lembrando-me de Robert desdenhando tanto daquela arma, mas sendo o primeiro a mantê-la junto a si.

 Ah, o doce e adorado carma.

 Quando coloquei meus pés no chão, a luz piscou uma só vez e bradei uma série de xingamentos, ao ver Robert diante de mim. Não por ele, Bert estava preocupado, os olhos azuis procurando, ainda que sensíveis pela escuridão, algum sinal de que eu estava machucado, o que realmente me chamou atenção foi a jovem, agora não mais em cima da mesa, mas posicionada bem atrás de meu amigo. O sorriso era enegrecido, o espaço entre os dentes brancos remarcados por algo que beirava sangue apodrecido, enquanto olhava-me de baixo, erguendo o rosto sorridente para mim.

 Uma criança infernal, era isso o que Jessica me remetia, piscando seus grandes olhos negros, enquanto sibilava palavras de baixo calão em enoquiano, que, aparentemente, só eu conseguia entender, ao que minha reação não foi de espantou ou um grito (como a mãe da garota só sabia fazer, ao invés de voltar a rezar ou ajudar com alguma coisa), e sim de indignação. Era uma entidade brincalhona, divertindo-se com a crença dos outros e nitidamente descobrindo minha total falta de paciência. E se era isso que queria, me ver explodir, aquele demônio desgraçado iria ter muito mais do que achava que arrancaria de mim.

 Antes de exorcista, antes do que quer que fosse, eu era a pessoa mais irritada que eu conhecia.

 É pra sentir medo de uma criaturinha como essa?

 

- Carma Toltorn! – Exclamei, empurrando Bert para o lado, quase contra uma das cadeiras diantes da mesa, na tentativa de protegê-lo. Mas, mais uma vez, eu havia sido enganado, quando Jessica não veio para cima de mim ou do meu amigo, quando saltou para cima da mesa novamente, com a destreza de um animal. As mãos e os pés, com os filetes de sangue transbordando dos cortes em seus pulsos e calcanhares, deslizando sobre a madeira, em um rastejar monstruosamente sonoro, até atingir seu alvo.

 

 A mãe chorava copiosamente, o homem e o pai a amparavam, sem interromper a cena, o que era uma boa escolha. Ainda mais quando, a última imagem vista ao cessar das luzes de uma só vez, havia sido Jessica saltar sobre Michael (que havia tentado recuar, até desgraçadamente encontrar a parede) e encaixar suas mãos ensanguentadas em seu pescoço, muito antes de Gerard conseguir correr ou eu conseguir contornar a mesa, tentando interceptar o que quer que fosse. Na escuridão, era difícil entender o que estava acontecendo, mas fácil de entrar em pânico, quando a voz de Michael ecoava pelo cômodo, chamando o irmão.

 Os gritos não duraram muito, assim que corri em direção aonde Michael estava, julgando ser a direção certa, até encontrar um silêncio absoluto. Não por realmente ter cessado todo o barulho ao nosso redor, mas sim por esbarrar em algo, aliás, alguém… Mãos cercando-me vagamente, dedos apertando meus braços, segurando-me, ao que nós dois quase caímos. Gerard eliminou tudo ao meu redor, como uma espécie de filtro, sem barulho, sem berros, sem Jessica e suas risadas estridentes, sem a sensação de sufocamento que cada exorcismo ocasionava, sem uma lista fodida de coisas que me atormentavam e me deixavam tonto naquele mesmo instante.

 Eu não conseguia respirar, eu só… Gerard. Era como se eu conseguisse enxergá-lo, visualizasse bem sua expressão perdida, afundando tanto quanto eu, quase implorando para ser despertado, por simplesmente não querer entender aquilo. Pensar no quanto nos abominávamos não era mais uma realidade e, sim, a ideia de que alguém era capaz de calar o caos em minha cabeça… De forma tão simples, sem precisar de muito mais do que um esbarrão como aquele. E eu cogitei tanta coisa, que era melhor me calar… Eu não falava por mim há muito tempo, eu não queria ter que me precipitar a um absurdo como aqueles.

 Gerard não era agradável. Não mesmo.

 Tudo aquilo veio seguido de um drástico empurrão, dando-me conta de que havia sido apenas um momento… Talvez um ou dois segundos, mas que se alastraram por uma linha atemporal, que parecia resplandescer bem diante de meus olhos com uma resposta óbvia que eu preferia ignorar. Na realidade, eu até agradeci por quebrar aqueles breves segundos de caos silencioso, quando alguns centímetros longe dele haviam sido o suficiente para que eu voltasse à realidade e escutasse um estrondo. Ao mesmo tempo em que o baque brutal e seco ecoou pela sala, as luzes se acenderam e relevaram uma cena insólita e perturbadora.

 Outro estrondo, dessa vez um estilhaçar insuportável, repentino, me fez encolher os ombros, dessa vez tomando um susto maior do que o interior. Eu, sempre tão seguro das coisas e que me colocava muito além e acima de todos os padrões, me sentia cada vez mais improdutivo e perdido nos últimos tempos. Não sei em que momento exato havia me distraído tanto (na real, eu sabia muito bem), mas o dilúvio de informações que veio em seguida fez com que eu ficasse indeciso para que lado olhar.

 À minha esquerda, a janela no fundo da sala estava estilhaçada, escancarada, sem qualquer pista do que havia causado aquilo. As cortinas brancas esvoaçavam, indo e vindo lentamente, exibindo o céu nublado e uma vista dos fundos do terreno constituída unicamente por árvores… Verde, galhos e terra. Era até bonito de se ver, por alguns segundos, se não fosse pela cena sufocante bem à minha frente. Agora o silêncio era real, quebrado, volta e meia, por respirações ofegantes e o uivar do vento vindo do lado de fora, assim que os olhares recaíam na mesa da sala. E veja só se não tínhamos um banquete mais interessante do que o tão aclamado e pintado na Última Ceia.

 Jessica estava largada sobre Michael, nos impedindo de ver seu rosto ou sequer verificar se estava vivo. Os cabelos caíam como cascata sobre a mesa, enquanto seus braços e pernas estavam igualmente largados em ângulos estranhos, mal cobrindo o corpo magrelo e comprido de Michael. Nem um dos dois se movia… Nem mesmo podíamos notar se respiravam ou agonizavam por algo… Nada. Só dois corpos imóveis, abraçados de uma forma ridícula, em meio a objetos sagrados, garrafas de água benta, castiçais velhos, etc. Agarrados fortemente um no outro, antes de serem arrebatados por algo.

 Do outro lado da mesa, Bert franzia o rosto em uma expressão curiosa, os pais de Jessica corriam em direção ao móvel, mas sem ainda criar coragem para tocar os corpos sobre a mesa, enquanto o homem desconhecido e completamente inútil para mim, assistia tudo com horror em suas feições. Eu estava me acostumando com a claridade repentina e, dessa vez, sem denotar que iria fraquejar mais uma vez, quando Gerard foi o primeiro a quebrar o silêncio.

 

- Mikey?! Hey… Me responda! – Gerard parecia tão naturalmente paciente quanto eu, talvez gritando mais do que deveria, quase imitando os pais da jovem, se não fosse por meus instintos o impedirem. Havia algo de estranho ali e eu não demorei em puxá-lo pelo paletó, recebendo um olhar enfurecido como resposta. E, ao mesmo tempo em que Gerard Way, todo religioso e certinho, estava disposto a xingar todas as gerações da minha família, um dos corpos da mesa se mexeu.

 

 Talvez eu fosse um pouco mais sádico do que já demonstrei aqui. Talvez eu realmente tivesse perdido um pouco da minha sanidade e do coração que eu deveria possuir em algum momento desse caminho fodido que chamam de vida. Precisei me segurar muito – e quando digo muito, era absurdamente muito – para não gargalhar, quando o corpo de Jessica foi arremessado para o lado, rolando a mesa casualmente, e caindo diretamente ao chão, muito provável que diante dos pés dos pais, que, em unissóno, gritaram. Michael parecia não ter força para tal, mas, no momento, o fez com tamanha facilidade, espreguiçando-se, que eu quase senti Gerard relaxado, bem ao meu lado, possivelmente pensando “Ótimo, meu irmão está bem.”, se não fosse por um delicado e adorável detalhe.

 Michael estava possuído.

 

- Irmãozinho? – A voz era bem diferente do que eu estava acostumado, sempre arrastado e falando apressadamente, Michael falava de forma pausada e um tanto venenosa. Lembrava-me de uma serpente preguiçosa e nociva, os olhos ligeiramente esverdeados tornando-se cada vez mais enegrecidos bem diante dos nossos olhos. “Ah, não…” Gerard grunhiu, ainda imóvel, enquanto minha mão igualmente se mantinha entrelaçada ao tecido de seu paletó, enquanto nós dois assistíamos Michael colocar-se de pé sobre a mesa, levando as mãos sobre a gravata, afrouxando, ao que, com a mão livre, retirava os óculos e os arremessava longe. – Porquê a surpresa? Achou que eu fosse me contentar com uma humana tão fraca? Achou mesmo que fosse tão fácil se livrar de mim dessa forma? Vocês são patéticos… Subestimam o poder do Supremo.

 

- Cale a boca, seu ser imundo! – Aquele deveria ser o limite dos xingamentos de Gerard, o que era quase um combo para que eu realmente risse de toda aquela situação patética, observando-o empinar aquele narizinho ridículo e tentar impor-se de tal maneira diante de um demônio. Os tão aclamados Way estavam fodidamente encurralados, mas, talvez ainda existisse um vestígio de bondade dentro de mim.

 

- Eu não obedeço à você, bichinha! – Michael gritou, os punhos cerrados e todo resto, ao que o irmão recuava, abalado. Meu lado sentimental imaginou que fosse bastante difícil para Gerard escutar e visualizar o próprio irmão falando aquela merda homofóbica de forma tão natural… E, no fundo, o meu único fraco (vamos fingir que existe apenas um em todo o universo) era injustiça de toda e qualquer forma… Ali eu estava vendo uma. Por mais imbecis que fossem, os Way não mereciam enfrentar aquela merda toda.

 

 Que piedoso.

  Já era o bastante. Demônios falantes demais eram o meu limite precioso de resistência em situações como aquelas e, antes que ele ganhasse tempo suficiente para fazer uma rodada de possessão em todos naquela sala, dei um basta em toda uma ladainha que deveria ser levada diretamente ao inferno.

 Que irônico.

 

- Então vai obedecer à mim. – Era nítido que eu possuía uma quantidade exorbitante de tatuagens por todo o corpo. Também era bastante claro que a grande maioria se tratava de imagens de filmes de terror ou minhas músicas favoritas, afinal, eu ainda era um ser humano ligeiramente normal. Mas algumas, em especiais, haviam sido feitas com um propósito claro de proteção ou que me auxiliassem em algumas invocações. O selo de Aemeth havia sido tatuado por um conhecido, em uma versão mais minimalista e na palma da minha mão direita, cuja levantei instintivamente, forçando Michael, ou melhor, a entidade, olhá-lo diretamente… O símbolo dos anjos, do universo e de tudo o que eu estava sendo capaz de invocar para aquele momento. Em caso de toda a oração enoquiana não surtir efeito, aquele era o meu plano B, um mais exagerado e gritante, que, na maioria das vezes, esgotava quase toda a minha energia. Eu estava mesmo inteiramente descompensado para utilizar uma merda daquelas para salvar Gerard e Michael Way. – Amma Noasmi oi Monasci od oi adoian Tonvg… Arept Bampoi Madache. – A sensação de que parte da minha energuia estava se dissipando a cada entoar daquela oração. Meu pai havia ensinado aquele cântico dos anjos para mim desde cedo, desde que eu era ainda uma criança e não havia sido abandonado… O exorcismo dos anjos, era como chamava. E era coma força de todo o exército alado, que eu tentava expulsar Michael de todo o mal. – Oiad Amma loncho obza nostoah, oi mad gemeganza noasmi!

 

 Precavido, fechei meus olhos, entoei a última parte daquela súplica, pressionando bem minhas pálpebras e sentindo meu corpo enfraquecer. Em algum momento, não muito bem registrado por mim, eu cedi. Caí de joelhos, ruidosamente colidindo ao chão, enquanto ainda mantinha a mão erguida, sem desistir nem por um segundo de continuar a expulsá-lo. E gritava, sentindo toda a dor do mundo alastrar-se por meu peito, queimando-me por dentro, dilacerando-me segundo após segundo, ainda que eu pudesse sentir a presença de Robert ao meu lado, tentando me amparar, colocar-me de pé e sustentar um pouco do meu peso, para que eu não parasse e proclamar aquelas palavras abençoadas.

 Minha mão pegava fogo, a parte mais afetada de todo o meu corpo, enquanto eu tremia e não sabia muito bem o que falava, se estava continuando a proferir enoquiano ou latim… Eu não sabia responder, não me atentava à mais nada, a não ser Robert me abraçando, pedindo para que eu parasse imediatamente. Não o obedeci em súbito, eu havia perdido o controle do que quer que estivesse acontecendo, até sentir uma mão gélida entrar em um choque térmico nada bem vindo, sobre a minha.

 Abaixou minha palma, drasticamente, fazendo-me sentir todo um tremor dissipando-se de seus dedos longos, até os meus… Até o meu corpo, extinguindo todo o fogo que atentava a me dominar. No mesmo segundo, abri meus olhos e notei Gerard segurando-me, Robert tentando me puxar para longe, protegendo-me, enquanto eu não sabia se me segurava em meu amigo, o puxava minha mão da posse de Way. Até que o próprio largou-me, a expressão beirando o nojo e choque, em meio a vermelhidão de seu rosto enfurecido e seus cabelos dramaticamente bagunçados, até deixar sua voz completamente rasgada e enfurecida ecoar por toda a sala. E eu não só pude ver, mas como também sentir, que Gerard estava por um fio… Próximo de me trucidar a qualquer instante.  

 

 - O que foi que você fez com o meu irmão, seu desgraçado?! – Imaginei que fosse encontrar Michael morto, estirado na mesa, sem alma… Ou alguma merda muito sombria do gênero em um quadro gótico satanista medieval… O que seria até mais reconfortante do que veio em seguida.

 

 Vasculhei a sala, encontrando as demais figuras do outro lado da mesa, o pai de Jessica com a menina nos braços e a mãe abismada, observando um rastro de sangue que marcava uma linha sinuosa ao longo da mesa. E eu a segui, exatamente partindo do ponto onde Michael estava parado sobre a mesa, o sangue tornando-se cada vez mais escuro, quase preto, recaindo, então, pelo carpete esverdeado da sala, rumando até a enorme janela estilhaçada. E parava ali, exatamente ali… Obrigando meus olhos a rodearem a sala mais uma vez, sem encontrar nada, só a porta fechada, o caos de objetos largados pelo chão, a sensação de que o ar ficava cada vez mais escasso para mim… Até que eu deixei que fosse levado para a escuridão, sem antes pontuar um fato que mudaria violentamente meus dias: Michael Way havia desaparecido. E a culpa era toda minha.

 

 


Notas Finais


Playlist de Sold My Soul : https://open.spotify.com/user/12146824956/playlist/0JEieaGAAfRir5sQawkngv


Eu atualizei a playlist essa semana, então tem umas coisinhas novas e super lindinhas por lá. Lindinhas = bem satânicas e trevosas.


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